Acórdão nº 2025/11.1TAPVZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelELSA PAIX
Data da Resolução22 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 2025/11.1TAPVZ.P1 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Póvoa de Varzim Acordam, em Conferência, os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO No 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Póvoa de Varzim, no processo comum singular nº 2025/11.1TAPVZ, foram submetidos a julgamento os arguidos B… e C…, tendo sido proferida decisão com o seguinte dispositivo: 4.A – Face ao exposto julgo a acusação pública procedente por provada e, em conformidade, decido: 4.1 – Condenar o arguido B… na pena de 14 (catorze) meses de prisão pela prática, em co-autoria material, de um crime de descaminho, previsto e punido pelo art.º 355.º, n.º 1 do CP que lhe vinha imputado na acusação pública.

4.1.1 - Nos termos conjugados do disposto nos artigos 50.º, n.º 1, 2, 3, 4 e 5, 51.º, n.º 1, al. c) e n.º4 todos do Código Penal, suspender a execução da pena de 14 (catorze) meses de prisão pelo período de 14 (catorze) meses, no âmbito do qual se impõe ao arguido a obrigação de entregar contribuição monetária ao L… no valor de € 600,00 (seiscentos euros) a comprovar nos autos, no prazo de 12 (doze) meses; 4.2 – Condenar o arguido C… na pena de 10 (dez) meses de prisão pela prática, em co-autoria material, de um crime de descaminho, previsto e punido pelo art.º 355.º, n.º 1 do CP, que lhe vinha imputado na acusação pública.

4.2.1 - Nos termos conjugados do disposto nos artigos 50.º, n.º 1, 2, 3, 4 e 5, 51.º, n.º 1, al. c) e n.º4 todos do Código Penal, suspender a execução da pena de 10 (dez) meses de prisão pelo período de 12 (doze) meses, no âmbito do qual se impõe ao arguido as obrigação de entregar contributo económico no valor de € 600,00 à K…, a comprovar nos autos, no prazo de 12 (doze) meses.

5.A.2 - Mais se condena cada um dos arguidos no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça devida em 2 UC – arts. 513.º, n.º 1 do CPP e art.º 8.º, n.º 5 do RCP.

Proceda-se ao depósito da sentença, em conformidade com o previsto no art.º 372.º, n.º 5 do Código de Processo Penal.

Remeta boletins ao registo criminal.

***Inconformado com a decisão condenatória, o arguido C… veio interpor recurso, terminando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição): 1) O Arguido C… não podia, nem devia ter sido condenado pelo crime de descaminho, cuja prática em co autoria já lhe era indevidamente imputada na acusação do M.P.; 2) Porquanto, já aí os autos de Inquérito careciam de quaisquer factos materiais e objectivos a provar para que tal imputação pudesse levar à sua condenação pela sua prática; 3) Aos documentos já existentes nos autos, que serviram para a acusação, apenas foi acrescentado pelo M.P. e Tribunal na audiência, o depoimento do Sr. Agente de Execução, que se limitou a confirmar o teor do auto de penhora efectuado em 14 de Junho de 2010, fls. 4 a 9 dos autos; 4) Do qual resultava e resultou que na diligência judicial, apenas estiveram presente e nela intervieram o Sr. A.E., o Arguido B… e a mandatária do Exequente, que não foi testemunha; 5) O Arguido/Recorrente em momento algum pôs em causa o teor do auto de penhora e o cumprimento pelo Sr. A.E. das suas obrigações na execução daquele, com excepção do valor atribuído; 6) Sendo que, para contraprova deste, bem como dos condicionalismos sobre os mesmos, requereu prova documental ao IMTT e indicou testemunha da mesma entidade; 7) Factos que resultaram plenamente provados, de acordo com a lei aplicável; 8) Nenhuma outra prova foi produzida, com excepção da documental relativamente a todos os factos do relacionamento dos Arguidos entre si, antes da penhora e depois da penhora; 9) Nem da prova documental dos autos, nem da testemunhal produzida em audiência de julgamento, resultou qualquer prova directa ou indirecta para o teor dos “Factos 2; 4; 7; 9; 10; 11 e 12” da decisão da matéria de facto, com ressalva do teor dos documentos que lhes servem de base; 10) Sendo que, desses documentos não resulta qualquer prova relativa a qualquer “conluio”; “conjugação de esforços”; “arquitectar plano”; “manter bem penhorado em seu poder”; “desse modo obstar à concretização das finalidades da penhora efectuada”; “execução de plano previamente delineado”; “frustrar as finalidades da penhora efectuada”; “impedir venda do bem penhorado”; e ainda “com o propósito comum concretizado de subtraírem o bem penhorado da disponibilidade do processo de execução, prejudicando, deste modo, a finalidade da penhora, pela frustração da venda”; 11) E por não ter ocorrido qualquer descaminho, os credores exequentes estão a prosseguir com a penhora e venda do bem, no património da adquirente, tudo nos termos dos arts 610; 612; 613 e 616 todos do C.C., como sempre o puderam fazer desde logo, não se percebendo sequer a espera; 12) De resto, tais normativos comprovam que a penhora, não encerra em si qualquer impedimento à livre disponibilidade, pois que aquela mais não constitui que um ónus ou encargo sobre o bem, que desse modo se mantém como garantia do crédito, podendo até ser excutido no património do adquirente; 13) Com a transmissão não ficou pois, o credor com garantia de penhora sobre o bem impedido de obter a satisfação do crédito através da sua venda, ao contrário de tudo o vertido conclusivamente, quer na matéria de facto, quer na fundamentação da decisão; 14) Pelo que, o bem penhorado não foi objecto de nenhum acto de descaminho ou destruição; 15) A decisão recorrida viola a matéria de direito constante dos arts 610; 612; 613 e 616 todos do C.C. e viola o conceito de descaminho ou destruição para efeitos de punição, nos termos do art.355 do C.P.; 16) Os factos dados como provados, não têm qualquer suporte, seja na prova documental dos autos, seja na prova testemunhal produzida em julgamento; 17) Já que, nenhum depoimento foi produzido sobre os factos supra enunciados na conclusão 10, devendo por isso ser anulada a decisão da matéria de facto por violação dos meios probatórios admissíveis, já que, tais ilações para além de não serem factos, foram extraídas por meras convicções, indirectamente formuladas e de modo meramente conclusivo, sem qualquer factos susceptíveis de os fundamentar; 18) Ou, até com base em factos que não só não resultam dos documentos como até estão em oposição com aqueles.

19) Com violação do disposto nos arts 128, 129, 130, 164, 169 e 355, todos do C.P.P.; 20) A decisão recorrida, viola, ainda, o disposto no art.355 do C.P. e art.32 da C.R.P..

Nestes Termos e nos de Direito aplicáveis, que doutamente serão supridos, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva o Arguido/Recorrente do crime que indevidamente lhe é imputado.

ASSIM, decidindo, Vªs Exªs farão, aliás como sempre, JUSTIÇA.

***Também inconformado com a decisão condenatória, o arguido B… veio interpor recurso, terminando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição): 1- O presente recurso tem como objecto a matéria de facto e de direito da sentença preferida nestes autos que condenou o arguido pela prática do crime de descaminho ou destruição de objectos colocados sob o poder público, previsto e punido pelo artigo 355.º do Código Penal.

2- O tribunal “à quo” fez um errado enquadramento jurídico-penal da matéria dada como provada.

Vejamos: 3- Estipula o artigo 355.º do CP, que: “quem destruir, danificar ou inutilizar, total ou parcialmente, ou por qualquer forma, subtrair ao poder público a que está sujeito, documento ou outro objecto móvel, bem como coisa que tiver sido arrestada, apreendida ou objecto de providência cautelar, é punido com pena de prisão até cinco anos, se pena mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal…” 4- O bem jurídico protegido por esta norma incriminadora é autonomia intencional do Estado que, neste tipo legal em particular, se concretiza através de uma ideia de inviolabilidade das coisas sob custódia pública.

5- O crime em questão só se consumará quando o agente frustre a finalidade da custódia da coisa pelo Estado, que no caso em apreço, seria em último ratio, a venda judicial do estabelecimento comercial penhorado.

6- A transmissão do estabelecimento comercial (in casu, escola de condução), nas circunstâncias de tempo e lugar em que fez o arguido/recorrente, não frustrou tal finalidade.

7- Com a penhora o executado perde os poderes de gozo sobre a coisa, mas não o poder de dispor da mesma.

8- Parafraseando o insigne Professor Lebre de Freitas (in A Acção executiva à Luz do Código Revisto, 2.ª edição, pag. 216), “…mantém, assim, a titularidade de um direito esvaziado de todo o seu restante conteúdo. E, sendo assim, continua a poder praticar, depois da penhora, actos de disposição e oneração…”, o sublinhado é nosso.

9- Já o artigo 819.º do C.C., relativamente ao exequente (mas aplicável também aos credores reclamantes e comprador do bem), refere-nos que o acto de transmissão é puramente ineficaz, ou seja, é inoponível à execução.

10- Assim sendo, a transmissão do estabelecimento comercial efectuada pelo arguido aqui recorrente é inoponível à execução onde o mesmo foi penhorado, ou seja, o exequente pode requerer a venda judicial do estabelecimento comercial, fazendo com que direito do actual proprietário caduque.

11- Isto é, a transmissão do bem penhorado, não tem reflexos na execução, pois caso o exequente assim pretenda, prosseguirá contra esse bem penhorado como se o mesmo pertencesse ainda ao executado.

12- Destarte, uma conduta que seja perfeitamente legal, válida e eficaz no âmbito do direito civil, não poderá, em simultâneo, vir a ser considerada como ilícita e sancionável no âmbito do direito criminal, atenta à unidade e harmonia do ordenamento legal português.

13- Assim sendo, dos factos dados como provados, não resulta a prática pelo arguido, de qualquer crime, tendo andado mal o tribunal “a quo”, ao condenar o arguido, incorrendo dessa forma em erro na apreciação da prova, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, violando ainda o disposto...

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