Acórdão nº 3880/13.6TBVFR-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução09 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação nº 3880/13.6TBVFR-B.P1– 3.ª Relator: José Fernando Cardoso Amaral (nº 187) Des. Dr. Trajano Amador Seabra Teles de Menezes e Melo (1º Adjunto) Des. Mário Manuel Batista Fernandes (2º Adjunto) Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto: I. RELATÓRIO Na ex-Comarca de Santa Maria da Feira (2º Juízo Cível), pende acção declarativa (sumária) instaurada, em 25-07-2013 (antes, portanto, da entrada em vigor do novo CPC) por B… contra C…, SA, na qual formulou o pedido de condenação dela a pagar-lhe a quantia de 8.055,00€ (e juros).

Invocou, como causa de pedir, o não cumprimento, por parte da ré (que não se dispôs a ressarci-lo, não assumiu a sua responsabilidade civil emergente da exploração da via nem lhe indicou a seguradora para a qual a tivesse transferido), da obrigação de a indemnizar pelos danos que alega ter sofrido, derivados do acidente com o seu veículo numa auto-estrada de cuja exploração é concessionária e em que aquele, por causa de um “lençol de água” existente na faixa de rodagem, não sinalizado, e, assim, do incumprimento do dever que sobre ela impendia de garantir as condições de segurança, maxime o de fazer a eficaz manutenção e garantir o funcionamento do sistema de escoamento das águas da chuva que caíra – e que, devido à obstrução das respectivas sarjetas e caixas com terras e detritos, gerou aquele efeito –, se descontrolou, despistou, embateu nos railes centrais e ficou estragado (“perda total”).

Ao contestar, em 30-09-2013 (estando já em vigor o novo CPC), a ré “C…” alegou[2] que, sendo embora a concessionária (doc. 1), não é responsável por tais danos porque as obrigações, por culpa ou risco, nos termos da lei geral, derivadas da prestação de serviços de operação e manutenção da via, entre as quais se inserem as de promover a vigilância e segurança das condições de circulação rodoviária, já haviam sido, por contrato celebrado em 28-12-2007 (doc. 2), transferidas para a Brisa (ao abrigo da Base 49º, nº 1, do DL nº 392-A/2007, de 27 de Dezembro) e, por subcontrato (doc. 3), para a “D… (cfr. itens 17 a 26).

Daí que qualquer responsabilidade pelo não cumprimento ou pelo cumprimento defeituoso das obrigações atinentes à operação e manutenção do lanço de auto-estrada, no local do acidente, nunca poderia ser invocada pelo autor contra a ré, que não podia, nem tal lhe é exigível, assegurar as condições de circulação por não ter qualquer controlo sobre o funcionamento da via nem, assim, responder pela violação da obrigação de as manter, mas apenas contra a referida “D…”.

Ademais, sendo a responsabilidade das operadoras entendida na jurisprudência como extracontratual[3], não se verifica, em relação a si, qualquer dos pressupostos inerentes.

Assim: a) arguiu a excepção dilatória de ilegitimidade passiva e pediu a sua absolvição da instância; b) caso assim não se entenda, e porque qualquer responsabilidade só pode ser invocada perante a “D…”, requereu, à cautela, o chamamento desta aos autos por via de intervenção principal provocada, nos termos do artº 325º, nº 1, CPC (ou 316º, do actual), “enquanto titular de um direito incompatível com o alegado pelo autor”.[4] Na sequência, por despacho de 27-01-2014, o tribunal recorrido decidiu:

  1. Julgar improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade passiva arguida pela ré.

    Para tanto, depois de apontar a norma aplicável (artº 26º, nº 3, CPC anterior) e de considerar que esta consagrou a chamada tese de Barbosa de Magalhães sobre a conhecida controvérsia, fundamentou assim, nesta parte, a sua decisão: “Ora, analisado o pedido e a causa de pedir, tal como configurados pelo Autor na petição inicial (critério que é, para este efeito, o único que interessa), resulta que a Ré "C… …" é titular, do lado passivo, da relação material controvertida, pois que tem interesse directo em contradizer, atento o prejuízo que para si advém da procedência da presente acção. Efectivamente, é à aqui Ré que o Autor imputa a responsabilidade pela ocorrência do acidente versado nos autos, enquanto entidade responsável pela manutenção da via onde se deu o sinistro. Já a questão de saber se é ou não tal entidade a responsável pela manutenção da via onde se deu o sinistro é matéria que se prende com o mérito da causa, não relevando para a questão processual da legitimidade das partes.” b) Julgar inadmissível a intervenção principal provocada passiva da “D…”.

    Para o efeito, citando primeiramente o artº 31º-B, CPC, e sua ratio explanada no preâmbulo do DL nº 329-A/95, considerou o tribunal recorrido: “Nos termos do preceituado no artigo 325º, nº1 do CPC (agora artigo 316º), qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com direito a intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária. A intervenção principal, espontânea ou provocada, em acção pendente, pressupõe que o interveniente tenha, em relação ao objecto da causa, um direito próprio, igual ou paralelo ao do autor ou do réu, que com este seja compatível e coexistente. Ora, no caso em apreço não estamos perante uma situação de cumulação subjectiva subsidiária, que dá origem a diversos pedidos subsidiários, já que o Autor não vem subsidiariamente demandar diversos réus em consequência do pedido principal, alegando dúvida fundada sobre o sujeito da relação controvertida. De facto, o presente incidente de intervenção de terceiros não foi deduzido pelo Autor, mas pela Ré, e para esta não resulta duvidoso saber, no caso concreto, quem é a entidade responsável pelo ressarcimento dos danos invocados nesta acção – a Ré sustenta que não é ela, mas sim a sociedade “D…, S.A.”. E, não tendo o Autor, em face da contestação apresentada pela Ré, alegado dúvida fundada acerca da entidade responsável pelo ressarcimento dos danos que invoca nesta acção nem declarado que pretendia dirigir o pedido contra a mencionada sociedade “D…, S.A.”, afigura-se-nos não se mostrarem verificados os pressupostos legalmente previstos para a requerida intervenção principal provocada passiva.” A ré não se conformou e, apelando para este Tribunal, concluiu assim as suas alegações: “A. Emerge o presente recurso do despacho proferido em 27 de janeiro de 2014 pelo Tribunal a quo que julgou (i) improcedente a exceção de ilegitimidade passiva invocada pela C… e (ii) inadmissível a intervenção principal da D… requerida pela Ré, aqui Apelante.

    1. Na ação ora sub judice está em causa a eventual responsabilidade por um alegado incumprimento da obrigação de operação e manutenção de um lanço integrante da E… de que a Apelante é concessionária.

    2. Através do Contrato de Operação e Manutenção celebrado com a C… e previsto tanto no diploma legal que aprovou as Bases da referida concessão – o Decreto-Lei n.º 392-A/2007, de 27 de dezembro -, como no contrato de concessão celebrado entre o Estado Português e a C…, a BRISA assumiu a prestação dos serviços de operação e manutenção dos lanços de autoestradas que integram a E….

    3. Nesses serviços inclui-se a promoção da “(…) vigilância e segurança das condições de circulação rodoviária” (cf. cláusula 2.8 do Anexo 1.1 (w) ao Contrato de Operação e Manutenção).

    4. Nos termos do Contrato de Operação e Manutenção, o qual constitui um anexo ao Contrato de Concessão, a BRISA declarou responder “(…) pela culpa e pelo risco e nos termos da lei geral, por quaisquer danos ou prejuízos causados no exercício das actividades que constituem objecto deste Contrato”.

    5. A BRISA e a D…, celebraram o Acordo de Subcontratação nos termos do qual a BRISA transferiu para a D…, entre outras, a atividade de operação e manutenção prevista no Contrato de Operação e Manutenção.

    6. O artigo 26.º do Antigo CPC que estabelece o conceito de legitimidade, dispõe no seu n.º 1 que “(…) o réu é parte legítima quando tem interesse directo em contradizer”.

    7. O n.º 2 do citado preceito acrescenta que o interesse direto em contradizer exprime-se pelo prejuízo que da procedência da ação advenha para o réu.

      I. Ora, da análise conjugada do Acordo de Subcontratação com o Contrato de Operação e Manutenção e com o Contrato de Concessão, não restam dúvidas sobre qual a entidade que responde pelos danos ou prejuízos que resultem da inobservância dos deveres de manutenção das estradas que integram a E….

    8. Pelo que a haver responsabilidade pelo cumprimento defeituoso ou pelo não cumprimento das obrigações atinentes à operação e manutenção dos lanços das autoestradas que fazem parte da E…, designadamente do lanço “A../IC.. – … (IC.) / … (IC.)”, onde o Acidente teve, alegadamente, lugar, esta sempre seria da D… e nunca da C….

    9. E ainda que o Autor não tivesse conhecimento do Contrato de Operação e Manutenção e do Acordo de Subcontratação, tal facto nunca poderia ser impeditivo da procedência da exceção de ilegitimidade deduzida pela ora Apelante.

      L. Em primeiro lugar, a transferência das obrigações de operação e manutenção das vias que integram a E… para a BRISA encontram previsão legal na Base 49, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 392-A/2007, de 27 de dezembro, pelo que não pode, assim, o ora Apelado invocar o desconhecimento da lei quanto a este ponto.

    10. Resulta da análise da petição inicial que o Autor pretende assacar responsabilidade pelo alegado acidente à entidade a quem compete assegurar as condições de segurança da via em causa, pelo que o titular da relação material controvertida tal como configurada pelo Autor é a D… – enquanto operadora das estradas em questão – e não a C….

    11. Deve, pois, o despacho ora recorrido, na parte que julgou improcedente a exceção de ilegitimidade passiva da C…, ser substituído por outro que a julgue procedente e que absolva a C… da instância.

    12. Quanto à intervenção principal provocada da D…, não se justifica, na decisão recorrida, por que razão se entendeu que não se encontram reunidos os requisitos para o chamamento da D…, limitando-se, o Tribunal a quo, a referir que o Autor não invocou dúvida fundada acerca da entidade responsável pelo ressarcimento dos danos que invoca, nem declarou...

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