Acórdão nº 41/13.8T2SVV-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução01 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 41/13.8T2SVV-A.P1-Apelação Origem: Comarca de Aveiro-Albergaria-a-Velha-Inst. Local- S. Comp. Gen.- J2 Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Caimoto Jácome 2º Adjunto Des. Macedo Domingues Sumário: I- O pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, (princípio da adesão) só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei-artigo 71.º do CPP.

II- A pendência do processo crime (inquérito) como que representa uma interrupção contínua ou continuada do prazo em curso, ex vi, do artigo 323.º, nºs 1 e 4, do C.Civil, quer para o lesante, quer para aqueles que com ele são solidariamente responsáveis pela reparação dos danos.

III- Só depois de esgotadas as possibilidades de punição criminal ficará o lesado a deduzir, em separado, a acção de indemnização, face ao disposto no nº 1 do artigo 306.º do C. Civil.

IV- Com a participação dos factos (em abstracto criminalmente relevantes) ao Mº Pº ou às entidades policiais competentes, se interromperá o prazo de prescrição contemplado no nº 1 do artigo 498.º do C. Civil, não começando, de resto, este a correr enquanto se encontrar pendente o processo penal impeditivo da propositura da acção cível em separado.

V- A interrupção, (bem como o alargamento do prazo da prescrição nos casos em que é admissível-artigo 498.º, nº 3 do CCivil), aplica-se (é oponível) aos responsáveis meramente civis na medida em que estes representam (substituem) em última ratio, o lesante civilmente responsável.

VI- Terminando o inquérito com despacho de arquivamento dos autos a cessão da interrupção do prazo previsto no artigo 498.º, nº 1, apenas ocorre, não na data da notificação desse despacho ao lesado, mas apenas quando tal despacho adquirir estabilidade processual, ou seja, quando se encontrar precludido o direito de requerer a abertura da instrução ou a intervenção hierárquica (artigos 278.º e 287.º do CPP).

*I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B… e esposa C…, casados no regime da comunhão geral, residentes em …, …, Sever do Vouga, instauraram a presente acção com processo sumário contra D…, divorciada, residente na …, Vivenda .., …, E…, solteira, maior, residente na Rua …, nº ., . Dtº, ….-… …, F…, divorciada, residente na Rua …, em …, Sever do Vouga, 4ª G…, solteiro, maior, residente na Rua …, em …, Sever do Vouga, e, H…, Lda, sociedade unipessoal por quotas de responsabilidade limitada, pessoa colectiva nº ………, com o mesmo numero de matricula na Conservatória do Registo Comercial de Arouca com sede em …, Arouca.

*O processo seguiu os seus regulares termos.

*Exarado despacho saneador nele se conheceu da excepção da prescrição, invocada, aliás, por todos os Réus nas respectivas contestações, julgando-a improcedente.

*Não se conformando com o assim decidido vieram as Rés F…, E…, D… e ainda a Ré H…, Lda, interpor o presente recurso concluindo, as suas alegações da seguinte forma: Conclusões das Rés F…, E… e D… 1 - A apelante não se conforma com o teor do despacho saneador–Ref. 21528598-, que julgou improcedente a excepção peremptória de prescrição e a excepção de caso julgado e de autoridade do caso julgado, daí que o impugne nessa parte, sendo o recurso sobre matéria de direito.

2- O tribunal a quo fundamentou a sua decisão da seguinte forma, quanto à prescrição: “ È inegável que, no caso concreto, se verificou a interrupção da prescrição na data em que foi apresentada queixa crime, a qual só cessou com o término do processo criminal–ou seja com o término do prazo para os aqui autores requererem a abertura da instrução no processo crime nº 27/10.4GBSVV–15 4-2010–conforme documento junto pelos autores a fls. 163. O prazo do artigo 498 nº 1 do Código Civil de três na 3-anos expirava a 15-4-2013, tendo os réus sido citados para a presente acção a 28-03-2013. O direito de indemnização que por esta acção os autores pretendem fazer valer não está prescrito, por ter ocorrido interrupção da prescrição entre Agosto de 2009 e 15-04-2010–arts. 306 nº 1, 323 nº 1 e 327 nº 1 do Código Civil. Pelo exposto, julga-se procedente a excepção da interrupção da prescrição arguida pelos autores, o que extingue a excepção da prescrição invocada por todos os réus”(Cfr. Despacho saneador, Ref: 21528598).

4- Da fundamentação do tribunal a quo, resulta claro que para o mesmo, existindo processo crime, o inicio da contagem do prazo prescricional previsto no art. 498 nº 1 do Código Civil, conta-se a partir do transito em julgado do despacho de arquivamento e não da notificação do despacho de arquivamento ao lesado.

5 - Tal prazo de prescrição, conforme Jurisprudência recente do Supremo Tribunal de Justiça, começa a contar a partir da data em que o ofendido é notificado do despacho final do processo crime – art. 323 nº 1 CC -, nomeadamente por arquivamento ou em decorrência de despacho que remete as partes civis para os meios comuns. Mais referindo que” são interruptivos da prescrição á luz do art. 323 do CC, a constituição de assistente e dedução de acusação ou a dedução de pedido cível em processo crime (Vide in AC STJ de 22/05/2013, in www.DGSI.pt).

6- Ora, a data do transito em julgado não assume relevância a nível de interrupção do prazo de prescrição, mas apenas a data em que o lesado foi notificado do despacho de arquivamento, o que ocorreu como confessaram os Autores, em 10 de Março de 2010. (Cfr. Despacho saneador, Ref: 21528598, onde se dá por assente esta data, por confissão dos autores e resposta dos autores de 20/05/2013, Ref: 4096907).

7- De toda a Jurisprudência conhecida, nenhuma dá qualquer relevância à data do transito em julgado do despacho de arquivamento, mas sim, à notificação do despacho de arquivamento ao lesado, (Vide neste sentido, Acs. STJ de 29-10-2002, Ac STJ de 05-11-2013, Ac STJ de 19-12-1995, todos acessíveis em www.dgsi.pt).

8- Decidiu igualmente o tribunal da relação de Coimbra: “O prazo de prescrição não começa a correr desde a data do acidente, mas sim daquela em que foi notificada aos interessados o despacho de arquivamento dos autos de inquérito instaurados na sequência do mesmo” (Vide in Ac. Rel. Coimbra, de 03-05-2011, proc: 223/07.1TBPCV.C1in www.dgsi.pt, no mesmo sentido, AC RC, 09-01-2012, Proc: 113/11.3TBTND.A.C1, in www.dgsi.pt).

9- De facto do acórdão em cima citado, resulta claramente a data a partir da qual se deve iniciar a contagem do prazo de prescrição “por apelo ao disposto nos artigos 306 nº1 e 323 nº1, ambos do CC, que, no caso em apreço, o prazo de prescrição, não começa a correr desde a data do acidente, mas sim daquela em que foi notificada aos interessados o despacho de arquivamento dos autos de inquérito na sequência do acidente em causa……..Atento a que o despacho de arquivamento foi proferido em 16 de Fevereiro de 2005 e notificado á mãe da D em 21 de Fevereiro de 2005, é nessa data que se inicia o prazo de três anos”(ide, Ac. Rel. Coimbra, 03-05-2011, proc: 223/07.1TBPCV.C1, in www.dgsi.pt).

10- Ademais, mesmo que não se demonstrasse o que entende a Jurisprudência referida, sempre se dirá que os Autores não se podem salvaguardar de tal data do transito em julgado, tendo em conta o prazo de 20 dias para requerer abertura da instrução, pois os mesmos nem sequer tinham legitimidade para requerer a instrução, já que eram ofendidos no processo, não se tendo constituído assistentes.

11- Não se pode atribuir eficácia interruptora ao trânsito em julgado do despacho de arquivamento, quando no momento em que o despacho de arquivamento é notificado ao lesado, este não é susceptível de impugnação judicial, nem por este nem pelo arguido, já que o arguido não tinha legitimidade nem interesse em agir, já que a decisão tinha-lhe sido favorável.

12- Toda a interpretação do instituto da prescrição, nomeadamente as situações de interrupção de prescrição, devem ter em conta o espírito do legislador, onde resulta claramente que as situações de interrupção são excepcionais, e dai que não possa haver interpretação extensiva de normas excepcionais, sob pena de se converter a excepção em regra.

13- No entanto, foi o que o tribunal a quo fez. Retardou o início da contagem do prazo de prescrição, com base na data de trânsito em julgado do despacho de arquivamento, quando tinha de contar o prazo desde a notificação do despacho de arquivamento ao lesado, pois a partir desse momento o mesmo já poderia exercer o seu direito através da propositura de acção cível.

14- Daí que tendo o art. 498 nº 1 do CC de ser devidamente conjugado com o art. 306 nº 1 do Código Civil, o tribunal a quo interpretou indevidamente estas disposições legais, já que o direito poderia ser exercido com a notificação do despacho de arquivamento e não com o transito em julgado do mesmo.

15- E como entende a nossa Jurisprudência: “O início do prazo de prescrição reporta-se não ao momento da lesão do direito do titular da indemnização, mas àquele em que o direito possa ser exercido “Vide neste sentido, Ac. Trib. Relação de Coimbra, de 30-11-2010, Proc: 637/09.2T2AVR.C1, in www.dgsi.pt).

16- Por outro lado, “o prazo de prescrição não deixa de correr mesmo que o lesado não saiba quem é que lhe causou o dano. O Lesado enquanto não souber quem é o responsável...

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