Acórdão nº 1069/14.6JAPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Dezembro de 2014
Magistrado Responsável | MARIA LU |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
P.1069/14.6JAPRT-A.P1 Acordam, em conferência, os juízes na 1ªsecção criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO Nos autos de inquérito n.º1069/14.6JAPRT que correm termos nos serviços do Ministério Público junto do Tribunal Judicial de Valongo, em que é arguido B…, foi proferido, em 18/6/2014, no âmbito de primeiro interrogatório de arguido detido, nos termos do disposto no art. 141.ºdo C.P.Penal, despacho judicial que aplicou a este arguido a medida de coacção de termo de identidade e residência.
Inconformado com este despacho, o Ministério Público interpôs recurso, extraindo da motivação apresentada, as seguintes conclusões [transcrição]: I. O mandado de detenção fora de flagrante delito foi validamente emitido, pelo que não deveria ter sido julgada inválida a detenção do arguido B….
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O mandado de detenção fora de flagrante delito foi emitido dentro do condicionalismo previsto no artigo 257.° n.º 2 do CPP, pelo que a detenção do arguido foi válida.
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Ao não validar a detenção do arguido o Mmo J.IC. violou as normas constantes dos artigos 250.º n.º 1 e 8, 254.º nº2 e 257.° nºs 1 e 2 do Código de Processo Penal.
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Face aos elementos constantes do processo, forçosa é a conclusão da existência de fortes indícios da participação do arguido nos factos que se investigam.
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Ponderados todos os elementos constantes dos autos, à luz das regras da normalidade e da experiência comum, devidamente apreciados em face também da concreta personalidade do arguido, entende-se que existe também vincado perigo de continuação da actividade criminosa e de perturbação da ordem e tranquilidade públicas, o qual deveria também ter sido considerado pelo Mmo JIC aquando da aplicação da medida de coacção aos arguidos.
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Apenas as medidas de apresentações periódicas no posto policial da área de residência, com a periodicidade bissemanal e de proibição de aproximação e permanência em zona florestal se mostravam adequadas às exigências cautelares existente ín casu, pelo que deveria o Mmo. J.I.C. ter aplicado tais medidas e, não o fazendo, violou as normas dos artigos 193.°, 202.° e 204.° do CPP.
Termos em que, decidindo pela revogação do despacho recorrido e determinando-se a sua substituição por outro que considere válida a detenção do arguido B… e lhes aplique as medidas de coacção de apresentações periódicas no posto policial da sua área de residência, com a periodicidade bissemanal e de proibição de aproximação e permanência em zona florestal, farão V.Exas., como sempre, Justiça! O arguido respondeu ao recurso, pugnando pela sua rejeição, por inadmissibilidade legal, no que se refere à não aplicação das medidas de coacção promovidas pelo Ministério Público e pela improcedência quanto à ilegalidade da detenção [fls.87 a 105 do presente apenso].
Remetidos os autos ao Tribunal da Relação e aberta vista para efeitos do art.416.º n.º1 do C.P.Penal, a Sra.Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer em que se pronunciou no sentido da improcedência parcial do recurso, sustentando que a detenção foi legal, contrariamente ao decidido no despacho recorrido, mas a medida de coacção aplicada – TIR – a adequada [fls.110 a 115].
Cumprido o disposto no art.417.º n.º2 do C.P.Penal, o arguido apresentou resposta ao parecer, sustentando que a detenção foi ilegal [fls.119 a 120].
Colhidos os vistos legais, foram os submetidos à conferência.
II – FUNDAMENTAÇÃO Despacho recorrido A decisão recorrida, na parte com relevância para o presente recurso, tem o seguinte teor: «Iniciado o presente ato, o Mm.º Juiz de Direito, que preside ao interrogatório, advertiu o arguido de que a falta de resposta às perguntas que lhe vão ser feitas sobre a sua identidade, ou a falsidade da mesma, o pode fazer incorrer em responsabilidade penal, tendo respondido da seguinte forma: Chamar-se: B… filho(a) de C… e de D… natural de: … [Valongo]; nacional de Portugal nascido em 17-02-1992 estado civil: Solteiro, profissão: electricista Documento(s) de identificação: , BI - ……..
domicílio: Rua … Nº … .º Esq, ….-… Sobrado Valongo*Em seguida, nos termos do disposto no artº 141º, nº 4, al. a), do C. P. Penal, o Mm.º Juiz de Direito informou o arguido dos direitos referidos no art.º 61.º, n.º 1, do referido diploma legal, explicando-lhe os mesmos.
Cumpriu-se igualmente o disposto no art.º 141.º, n.º 4, al. b), do C.P.P. (consigna-se que foi o arguido advertido que de não exercendo o direito ao silêncio as declarações que prestar poderão ser utilizadas no processo, mesmo que seja julgado na ausência, ou não preste declarações em audiência de julgamento, estando sujeitas à livre apreciação da prova).
Informou-os, ainda, nos termos das al. b), c) e d) do nº 4 do citado artº 141º do C. P. Penal, dos: 1 - Motivos da detenção: Detido fora de flagrante delito nos termos constantes do despacho de fls.29 a 33 emanado pelo Sr.Coordenador da Policia Judiciária do porto e cuja execução ocorreu pelas 23:30 horas do dia de ontem, conforme se alcança do mandado de fls.34.
*2 - Factos que lhe são concretamente imputados, incluindo, sempre que forem conhecidas, das circunstâncias de tempo, lugar e modo, e cuja cópia de fls. 42 a 44 foi neste momento entregue à ilustre mandatária do arguido.
Os factos imputados ao arguido B…, e pelos quais o mesmo foi detido, constam da informação de fls. 2 e expediente anexo e que indiciam fortemente a prática, por este, de factos abstratamente suscetíveis de consubstanciarem 7 (sete) crimes de Incêndio florestal, p. e p. pelo disposto no artigo 274.º, n.º 1, do Código Penal.
Na verdade, resultam indiciados nos autos os seguintes factos: 1) No dia 16/06/14, cerca das 11:00h, o arguido que se fazia transportar no veículo automóvel de marca Ford …, matrícula ..-AJ-.., cor azul-escuro, ao passar junto ao arvoredo que ladeia a Rua …, no …, em …, Valongo, sem razão aparente e sem que nada o fizesse prever, com recurso a bombas de Carnaval (vulgarmente conhecidas como “bichas de rabiar”), que trazia consigo, ateou por 5 (cinco) vezes fogo ao eucaliptal aí existente, incendiando-o.
2) Na sequência da conduta do arguido, ardeu uma área total de 7Ha de floresta composta por eucaliptal.
3) No dia 17/06/14, cerca das 12:00h, o arguido que se fazia transportar no veículo automóvel de marca Ford …, matrícula ..-AJ-.., cor azul-escuro, ao passar junto ao arvoredo que ladeia a via pública, na Rua …, em …, Valongo, sem razão aparente e sem que nada o fizesse prever, com recurso a bombas de Carnaval (vulgarmente conhecidas como “bichas de rabiar”), que trazia consigo, ateou por 2 (duas) vezes fogo ao mato aí existente, incendiando-o.
4) O combate a estes incêndios, mobilizou diversas viaturas de combate a incêndios dos Bombeiros Voluntários de Valongo e dos Sapadores Florestais de Valongo.
5) O arguido, ao agir como o descrito, bem sabia que poderia provocar diversos incêndios, o que aconteceu.
6) O arguido não ignorava que a sua conduta é proibida e punida por lei penal.
*3 – Elementos do processo que indiciam os factos imputados: a) - Informação de serviço de fls. 2 b) - Reportagem fotográfica de fls. 5 a 20 c) - Ficha de Registo Automóvel de fls. 24.
d) - C.R.C. de fls. 39 e) - o depoimento de E… f) - o depoimento de F…*O arguido foi devidamente advertido nos termos do disposto no artigo 141º, n.º 4, al. b) do CPP, ou seja, de que não exercendo o direito ao silêncio, as declarações que prestar podem ser utilizadas no processo, mesmo que julgado na ausência, ou não preste declarações em audiência de julgamento, estando sujeitas à livre apreciação da prova.
Pelo arguido foi dito que não desejava prestar declarações.
*Seguidamente, foi dada a palavra à Digna Magistrada do Ministério Público, que no seu uso disse: Promovo se valide a detenção nos termos já solicitados Em face dos elementos já constantes do processo, mostra-se suficientemente indiciada nos autos a prática pelo arguido de 7 (sete) crimes de incêndio florestal, p.p. artigo 274.°, n.° 1, do C.P com pena de prisão de 1 a 8 anos.
Ora, nos termos do art. 191.º do C.P.P a liberdade das pessoas só pode ser limitada, total ou parcialmente, em função de exigências processuais de natureza cautelar, pelas medidas de coacção e de garantia patrimonial previstas na lei.
Considerando o tipo de crime cometido e a época do ano em que nos encontramos, temos de concluir que existe perigo de continuação da actividade criminosa e que as condições em que os factos ocorreram são susceptíveis de fazer perigar completamente a ordem e a tranquilidade públicas.
De facto, os factos indiciados nos autos, enquadráveis no tipo legal de crime de incêndio florestal, causam alarme social, têm grande repercussão social e relevância jurídico-criminal e exigem especiais necessidades de prevenção geral.
Nestes termos, considera-se que, desde logo, os perigos de continuação da actividade criminosa e de alarme social que as situações como a dos autos sempre causam, exigem a aplicação de medida de coacção para além do TIR já prestado.
Face a todo o exposto, entendemos que as medidas de coacção capazes de afastar os enunciados perigos e que são adequadas as exigências cautelares envolvidas no caso concreto e proporcionais à gravidade do crime indiciado e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas, face à ausência de antecedentes criminais e à inserção social e familiar do arguido são: - obrigação de apresentação periódica na GNR da área de residência, com uma periodicidade bissemanal; - proibição de se aproximar e de permanecer em zona florestal.
cuja aplicação se promove, ao abrigo dos art. 191.° a 193.º, 196.°, 198 e 204, al. c) todos do C.P.Penal.
*Após, foi dada a palavra à ilustre mandatária do arguido, a qual no seu uso disse: Face aos elementos constantes dos autos e à parca prova existente, a defesa considera que a aplicação de TIR é suficiente e adequada para acutelar as finalidades da punição.
*Seguidamente, o Mm.º Juiz de Direito proferiu o seguinte: DESPACHO (…) Visto o regime legal que preside ao instituto da...
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