Acórdão nº 1011/14.4T8PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAM
Data da Resolução09 de Dezembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 1011/14.4T8PRT.P1 Da Instância Central – 1.ª Secção de Execução – J9, Comarca do Porto.

Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró*Acordam no Tribunal da Relação do Porto - 2.ª Secção: I. Relatório B…, Lda., instaurou a presente execução sumária contra C…, S.A.

, em 26/9/2014, com vista a obter desta o pagamento da quantia de 4.857,60 € e juros que liquidou em 283,57 €, com base na “confissão de dívida com acordo de pagamento e prestação de garantia”, datada de 2 de Julho de 2013 e por ela assinada, que juntou, constituindo fls. 4 dos autos.

Por despacho de 6/10/2014, foi indeferido liminarmente o requerimento executivo, ao abrigo do disposto no art.º 726.º, n.º 2, al. a) do CPC, com fundamento em falta de título, por o documento junto, sendo particular, ter deixado de poder basear a execução com a entrada em vigor do NCPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26/6, visto não constar no elenco do seu art.º 703.º.

Inconformada com esse despacho, a exequente interpôs recurso de apelação e apresentou a sua alegação com as seguintes conclusões: “1. A Exequente/Recorrente intentou uma acção executiva tendo apresentado como título executivo um documento particular assinado pelo devedor e que importou o reconhecimento de uma obrigação pecuniária, cujo montante é determinado ou determinado por simples cálculo aritmético, assinado em 2 de Julho de 2013.

  1. O Ilustre Julgador no seu despacho refere que “os documentos particulares (...) previstos na al. c) do n.º 1 do art. 46.º do C.P.C revogado pela referida L. 41/2013 deixaram de gozar de exequibilidade por se entender “... que os pretensos créditos suportados em meros documentos particulares devem passar pelo crivo da injunção (...)” e não poderia a Recorrente concordar mais com tal afirmação. No entanto, considera a Recorrente que tal não se pode, nem deve aplicar ao caso aqui em análise.

  2. O documento particular que serve de título executivo à presente execução foi elaborado e assinado a 2 de Julho de 2013 e a Lei n.º 41/2013, de 26 de Julho entrou em vigor no dia 1 de Setembro de 2013 e no n.º 3 do art. 6.º da mesma, vem referido que relativamente aos títulos executivos só se aplica às execuções iniciadas após a sua entrada em vigor, não vindo ressalvar os títulos executivos formados antes da entrada em vigor da nova lei.

  3. Assim, quando as partes elaboraram o documento que serve aqui como título executivo, ainda estava em vigor o antigo C.P.C. e portanto, as partes, criaram as legítimas expectativas de que o documento em causa além de ser um documento em que há o reconhecimento de uma obrigação, o mesmo poderia servir de título executivo em caso de incumprimento.

  4. Expectativas que não podem e não devem ser agora defraudadas pela entrada em vigor de uma nova lei, merecendo assim a tutela do direito.

  5. Portanto, a Requerente é da opinião que a referida norma não pode ter aplicação retroactiva, uma vez que estando perante uma alteração substancial no ordenamento jurídico e que não era previsível à data em que o documento particular foi legalmente constituído, a aplicação retroactiva da lei constitui manifesta violação dos princípios da segurança e protecção da confiança constitucionalmente previstos, mais precisamente no art. 18.º da C.R.P..

  6. Posto isto, só deve admissível uma alteração da ordem jurídica que sacrifique as legítimas expectativas de particulares juridicamente criadas quando o sacrifício imposto vise tutelar outros valores constitucionais, devendo em qualquer caso, ser respeitada a proporcionalidade entre o Direito que se visa tutelar e a posição sacrificada.

    Pelo exposto, se requer a V. Exas. que se dignem a julgar procedente o presente recurso revogando o despacho proferido pelo Ilustre Julgador, devendo o processo executivo seguir os seus trâmites.

    Fazendo assim, inteira e sã Justiça!” Não foram apresentadas contra-alegações.

    Admitido o recurso e remetido a este Tribunal, cumpre apreciá-lo e decidi-lo.

    Sabido que o seu objecto e âmbito são delimitados pelas conclusões da recorrente [cfr. art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do NCPC, aqui aplicável, por se tratar de uma decisão proferida numa execução instaurada após a sua entrada em vigor (cfr. art.ºs 6.º, n.º 3 e 8.º, ambos da Lei n.º 41/2013, de 26/6)], não podendo este Tribunal de 2.ª instância conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser em situações que para aqui não relevam, e tendo presente que se apreciam questões e não razões, a única questão que importa dirimir consiste em saber se o documento particular junto com o requerimento inicial pode ser reconhecido como título executivo.

    1. Fundamentação 1. De facto Os factos a considerar na decisão do recurso são aqueles que constam do antecedente relatório, já que outros não foram dados como provados, nem resultam como tal dos autos.

  7. De direito Sabe-se que toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva (cfr. art.º 10.º, n.º 5 do NCPC).

    Esta, cujos limites e fins estão determinados pelo título que, necessariamente, lhe serve de base, é a acção “em que o credor requer as providências adequadas à realização coactiva de uma obrigação que lhe é devida” (cfr. citado art.º 10.º, n.º 4 e art.º 817.º do Código Civil).

    Deste modo, podemos dizer que a acção executiva, além de ter por objecto uma ou mais pretensões, constitui um instrumento concedido pela ordem jurídica para obter a realização efectiva das pretensões materiais que se encontram incorporadas num título executivo[1].

    Enquanto pressuposto indispensável da execução, o título não só possibilita o recurso imediato à acção executiva como define o seu fim e fixa os seus limites.

    É o título que constitui a base da execução e é por ele que se determinam o “fim e os limites da acção executiva”[2].

    O título executivo pode assim ser definido “como o documento de acto constitutivo ou certificativo de obrigações, a que a lei...

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