Acórdão nº 17/11.0TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução15 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

17/11.0TVPRT.P1 Sumário do acórdão proferido no processo nº 17/11.0TVPRT.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil: 1. O dano futuro da perda ou afectação de rendimento deve ser computado usando valores líquidos de impostos.

  1. Nos casos de incapacidade permanente total ou parcial não há lugar à redução de um terço, correspondente àquilo que o lesado gastaria para a sua própria sobrevivência, só havendo lugar a tal redução nos casos de morte.

    *** * ***Acordam, em audiência, os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório[1] A 06 de Janeiro de 2011, nas Varas Cíveis da Comarca do Porto, B… propôs acção declarativa de condenação, com forma de processo ordinária, contra a Companhia de Seguros C…, SA, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 552.507,48 €, acrescida de juros de mora a contar da citação, bem como aquela que se vier a apurar em liquidação em execução de sentença.

    Alega, para tanto, resumidamente, que, no dia 20 de Janeiro de 2006, pelas 5h20, era transportado, gratuitamente, no assento ao lado do condutor, no veículo de matrícula ..-..-OM-…. e invoca os danos patrimoniais e não patrimoniais por si sofridos, na sequência do acidente ocorrido, em França, na auto-estrada …, “…”, …, …, sentido Paris – Província, causado por culpa exclusiva do condutor do referido veículo, que, devido a não ter adequado a velocidade do veículo que tripulava à daquele que circulava imediatamente à sua frente, foi embater com a frente do seu na traseira do que seguia imediatamente à sua frente. Alega, ainda, que a responsabilidade civil emergente de tal acidente se encontrava transferida para a ré, por contrato de seguro titulado pela apólice nº ………..

    Efectuada a citação da ré, esta contestou, não impugnando o modo como ocorreu o sinistro, nem pondo em causa a sua responsabilidade pela reparação dos prejuízos dele emergentes e impugnando alguns dos factos articulados pelo autor, concluindo que o pedido do autor deverá ser julgado em função da prova a produzir em audiência de julgamento.

    A audiência preliminar foi dispensada, fixou-se o valor da causa em € 552.507,48, proferiu-se despacho saneador tabelar e procedeu-se à condensação da factualidade considerada relevante para a boa decisão da causa, discriminando-se os factos assentes dos controvertidos, estes últimos a integrar a base instrutória.

    As partes reclamaram contra a condensação da matéria de facto, sendo indeferida a reclamação do autor e deferida a reclamação da ré.

    As partes ofereceram as suas provas, requisitando-se as provas documentais e realizando-se a prova pericial colegial requerida por ambas as partes.

    A 10 de Outubro de 2013, a ré ofereceu articulado superveniente, pronunciando-se o autor pelo seu indeferimento.

    A 11 de Novembro de 2013 foi proferido despacho a rejeitar o articulado superveniente apresentado pela ré.

    Inconformada com a rejeição do articulado superveniente, a 02 de Dezembro de 2013, a ré interpôs recurso de apelação contra essa decisão.

    Realizou-se a audiência de discussão e julgamento em quatro sessões.

    A 31 de Janeiro de 2014 foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente por provada e, em consequência, condenou a ré a pagar ao autor a quantia global de € 211.201,01, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar da citação e até integral pagamento, absolvendo a ré do demais peticionado.

    A 19 de Março de 2014, inconformado com a sentença final, B… interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: “1. São fundamentos do presente recurso (I) o errado julgamento da matéria de facto, constante do quesito 26 face à prova produzida, pugnando-se pela alteração da resposta dada ao quesito 26 de “provado apenas que se não tivesse sofrido o referido acidente, o recorrente, em 2006, ia atingir rendimentos anuais de, pelo menos, 12.000,00€” para “provado que se não tivesse sofrido o referido acidente, o autor, em 2006, ia atingir rendimentos anuais de, pelo menos, cerca de 20.000,00€”. E ainda, em consequência, 2. (II)O valor exíguo arbitrado ao recorrente a título de indemnização pelo dano futuro (IPP) atento o disposto nos art.s. 562º e 564º, nº. 1 do C.C, pugnando-se pela alteração do montante arbitrado ao recorrente a esse título na douta sentença de 175.000,00€ para 461.347,77€.

    I-Quanto à alteração da resposta dada ao quesito 26: 3. Tendo-se a Mª. Juíza “a quo” fundamentado na resposta que deu ao quesito 26º da forma que expôs na sentença recorrida não podia ter chegado à conclusão a que chegou de que o recorrente iria ter em 2006 rendimento de, pelo menos, 12.000,00€.

  2. Nenhuma testemunha falou neste número nem sequer o sugeriu ou se pronunciou sobre ele 5. A testemunha D…, cujo depoimento foi prestado na audiência de 13 de Dezembro de 2013, conforme acta, gravado em 2013/1217134902-517912-2175860, depôs no sentido de que o recorrente ia ganhar mais do que ganhava enquanto trabalhador por conta de outrem.

  3. No mesmo sentido tendo ido o depoimento da testemunha E…, cujo depoimento foi prestado na audiência de 16 e 17 de Dezembro e 2013, conforma acta, gravado a 2013/1216102946-517860-217860 nomeadamente que se não fora o acidente o recorrente obteria em 2006 um rendimento equivalente aquele que tinha enquanto trabalhador por conta de outrem.

  4. O objectivo do recorrente era o de, pelo menos, manter aquilo que tinha, atingir o valor que tinha atingido em 2004, cerca de 20.000,00€, sendo este o valor expectável, e tais expectativas eram reais.

  5. A lei basta-se com uma probabilidade séria da existência dos danos não exigindo a certeza absoluta, basta-se com a mera previsibilidade.

  6. Esta probabilidade e previsibilidade sérias foram demonstradas de forma credível e convincente, segundo a própria Mª. Juíza “a quo”, pelas testemunhas D… e E….

  7. A incerteza quanto aos rendimentos futuros do recorrente, sendo estes, no entanto, prováveis e previsíveis, deve reverter contra o lesante, ser encargo ou ónus seu.

  8. Os 12.000,00€ fixados pela Mª. Juíza “a quo” afiguram-se como um número arbitrário, que tanto podia ser aquele como outro qualquer.

  9. As especificidades do caso concreto, as circunstâncias do caso concreto, o curso normal das coisas, de modo algum apontam para a hipótese de o recorrente ir ganhar menos enquanto empresário, trabalhador por conta própria, do que ganhava enquanto trabalhador por conta de outrem.

  10. A resposta dada ao quesito 26º deve ser alterada para “Provado que se não tivesse sofrido o referido acidente, o autor, em 2006, ia atingir rendimentos anuais de, pelo menos, cerca de 20.000,00€.

    II-Quanto à fixação da indemnização pelo dano futuro (IPP) 14. O Tribunal deu como adquirido que o A. nunca ganharia menos do que 12.000,00€, mas admite que poderia ganhar mais, tendo adoptado na formulação da resposta ao quesito 26º a expressão “pelo menos”.

  11. Esta circunstância exige que na consideração do rendimento a ter em conta se prescinda do seu valor líquido, tomando-o antes pelo seu valor bruto.

  12. Com este pelo menos deve também ter-se por prejudicada a consideração do argumento tendente a corrigir o desvio do resultado matemático a que se chegou traduzido no facto de o A. ir receber o capital de uma só vez.

  13. Na determinação do montante a atribuir a título de indemnização pela perda da capacidade de ganho não se deve atender à esperança de vida activa da vítima, mas sim à sua esperança média de vida, uma vez que as necessidades básicas do lesado não cessam no dia em que deixar de trabalhar por virtude da reforma.

  14. As perdas salariais resultantes das consequências de acidente continuarão a ter reflexos uma vez concluída a vida activa, com a passagem à reforma, em consequência da sua antecipação e/ou do menor valor da respectiva pensão, se comparada com aquela a que o lesado teria direito se as expectativas de progressão na carreira não tivessem sido abruptamente interrompidas.

  15. O recorrente, a partir do dia do acidente, deixou de poder contribuir para a constituição da sua pensão de reforma e ficou condenado a viver toda a sua vida, e não apenas até à idade normal da reforma, e da quantia que lhe for arbitrada a título de dano futuro.

  16. As regras da experiência dizem-nos que o recorrente está inapelavelmente arredado do mercado de trabalho, pelo que é utópico e irrealista sustentar-se que um homem nas suas condições físicas e com a sua idade seja alguma vez oferecido o desempenho de uma qualquer actividade minimamente digna e minimamente renumerada de forma justa.

  17. Estando provado que o recorrente ficou totalmente incapacitado para o desempenho da sua profissão de motorista de pesados e de exercer quaisquer outras actividades que envolvam esforços de marcha ou com os membros inferiores, apenas podendo desenvolver outras actividades mas com esforço acrescido, é-lhe devida indemnização pela perda da sua capacidade, “in totum”, não relevando para a determinação do quantum desta indemnização o facto de o recorrente poder exercer aquelas outras actividades com aqueles condicionalismos.

  18. Não pode derivar da actividade que o recorrente possa desenvolver, actividade positiva, concretizada com esforço e sacrifício próprio, qualquer benefício para a recorrida, cuja consideração e admissão seria a todos os títulos imoral e ilegítima.

  19. Deve ser fixada ao recorrente, a título de indemnização pela perda da sua capacidade de ganho, a quantia de 461.347,77€, conforme foi peticionado, sendo que este montante reclamado na petição inicial é inferior ou aproxima-se do que se encontra para o rendimento liquido correspondente aos € 20.000,00 ilíquidos, para o período de 36 anos, em qualquer um dos cenários resultantes dos diversos métodos de cálculo trabalhados, pelo que se revela equilibrado, equitativo e justo.

  20. Violou a douta sentença recorrida o disposto nos artºs.607 nº 4, última parte do CPC e 562º e 564º, nº 1 do C.C.

    ” Também inconformada com a...

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