Acórdão nº 3596/12.0TJVNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução15 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 3596/12.0TJVNF.P1-Apelação Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Vila Nova de Famalicão, 5º Juízo Cível Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Caimoto Jácome 2º Adjunto Des. Macedo Domingues Sumário: I- Tal como já acontecia no anterior CPCivil, também na actual lei processual podem na decisão, para além dos factos essenciais, que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas, alegados pela partes, ser considerados pelo juiz: a) os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; c) os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.

II- A grande diferença em relação ao anterior Código de Processo Civil é que a consideração dos factos essenciais que sejam complemento ou concretização dos alegados não depende já de requerimento da parte interessada, isto é, a sua consideração pode ser oficiosa.

III- É claro que, essa consideração oficiosa, não pode ser feita sem que as partes se pronunciem sobre ela, ou seja, o juiz, ante a possibilidade de tomar em consideração tais factos, tem que alertar as partes sobre essa sua intenção operando o exercício do contraditório e dando-lhe a possibilidade de arrolar novos meios de prova sobre eles.

IV- Se da instrução da causa resultarem factos que sejam complemento ou concretizadores dos alegados pelas e o Sr. juiz do processo não os tenha tomado em consideração não pode a Relação, em princípio, substituir-se à 1.ª instância e valorar já em termos definitivos a prova produzida quanto aos novos factos, ampliando em 2.ª instância a matéria de facto sem que previamente, em fase de audiência de julgamento, as partes estejam alertadas para essa possibilidade e lhes seja facultado produzir toda a prova que entenderem.

V- Todavia, já a Relação o poderá fazer se os novos factos resultarem de confissão judicial no âmbito do depoimento de parte.

*I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B…, Lda, com sede na Rua …, nº …, …, V. N. de Famalicão, veio intentar acção declarativa contra C… e D…, residentes na Rua …, nº .., …, V. N. de Famalicão, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 25.000,00, acrescida dos juros vencidos no montante de € 2.679,45 e dos vincendos até efectivo e integral pagamento, ou, caso assim não se entenda, que os RR sejam condenados a restituírem a mesma quantia a título de enriquecimento sem causa.

Para tanto, e em síntese, sustenta que vendeu aos RR uma moradia pelo preço de € 120.000,00.

Contrariamente ao que foi outorgado na escritura, aquele valor não foi efectiva e integralmente entregue pelos RR, mas sim a quantia de € 95.000,00, sendo que, a diferença de € 25.000,00 não foi entregue à A. para garantir um conjunto de obras que faltavam efectuar.

Acontece que, as obras de acabamento foram efectuadas e concluídas os RR. recusam-se a pagar a aludida quantia de €25.000,00.

*Regularmente citados, os RR contestaram, alegando, em síntese, que nenhum dinheiro devem à A., pois que, as obras referidas por esta na petição inicial não foram por ela realizadas mas sim por um outro empreiteiro que eles contrataram.

Concluem, pedindo que a acção seja julgada improcedente por não provada.

*Notificada da contestação a A. veio responder, tendo mantido o que já havia alegado na petição inicial.

*Seguiu-se, então, a prolação do despacho saneador, com a fixação dos factos assentes e elaboração da base instrutória.

*Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do formalismo legal.

*A final foi proferida sentença que julgou improcedente por não provada a acção absolvendo os Réus do pedido.

*Não se conformando com o assim decidido veio a Autora interpor o presente recurso concluindo da seguinte forma: i – da matéria factual assente nos autos ressalta que os réus, por conta do preço estipulado não pagaram à a. a quantia de 25.000,00€; ii- mais ressalta dos autos que, as obras foram feitas a mando da autora, ora recorrente; iii- que os réus não pagaram obras no montante de 25.000,00€; iv – contrariamente ao decidido e prova carreada para os autos, os réus não provaram, que as obras no valor de 25.000,00€, foram realizadas e pagas por eles; v – aliás, não se podia, nem pode concluir que a autora não provou como lhe competia que realizou as obras que faltavam; vi – do testemunho de E… ressalta que o cheque no valor de 23.800,00€, foi um empréstimo, que não emitiu a referida factura, e mencionou que só factura quando os réus quiserem; vii – o tribunal não pode considerar que a autora não provou que cumpriu o contrato; viii – por isso, atenta a factualidade carreada para os autos, quer documental, quer testemunhal, só por abissal equivoco se pode ter considerada provada a factualidade referida no iten 34 da sentença; ix – aliás, não se compreende como na sentença o sr. juiz repetidamente diz que foi a autora que mandou executar as obras em causa e depois diga que ela não provou nada; x - assim, atenta a prova produzida, documental e testemunhal, reproduzida supra, deve a factualidade constante do item 34 dos factos considerados provados, ser considerada não provada, provando-se antes que foi a autora que realizou as obras a que estava vinculada como condição para o recebimento da quantia de 25.000,00 em falta do preço estipulado, ou seja, dando-se como provado que as obras de acabamento foram efectivamente concluídas pela autora no prazo que foi sendo acordado pelas partes, sendo certo que tais acabamentos foram levados a cabo por subempreiteiros contratados pela própria autora, conforme foi alegado e consta dos quesitos 16º, 17º e 18º da base instrutória e, alterando-se, consequentemente, as respostas da primeira instância, por estarem em total contradição com a matéria fáctica carreada para os autos e efectivamente reproduzida; xi - está provado o que competia á autora, no sentido de que cumpriu totalmente a sua prestação, conforme lhe era exigido pelo nº 1 do artigo 342º do c.c.; xii – a convicção formada pelo tribunal a quo está assim incorrecta, como aliás decorre do referido depoimento de parte do legal representante da autora e das testemunhas F…, G… e H…; xiii – assim, deve-se alterar a matéria de facto no sentido de dar como provados os factos constantes dos artigos 16º, 17º e 18º da base instrutória e não provado o artigo 34 da sentença e, em consequência revogar-se a decisão recorrida, sendo a mesma substituída por outra que julgue procedente e provada a acção, condenando-se os réus a pagar á autora a quantia de 25.000,00€, acrescidos dos respectivos juros; xiv - ou caso assim se não entenda, e tendo em conta a própria confissão dos réus, ao referirem que a autora depois da outorga da escritura executou um corrimão nas escadas interiores e um móvel na casa de banho e ainda que estes juntaram aos autos uma factura de 4.000,00€, ainda que referente a outra moradia de que são proprietários em …, entendemos, que o tribunal tem elementos para condenar os réus a restituir á autora a quantia de 21.000,00€ (25.000,00–4.000,00); xv – na hipótese de se entender, o que não se concebe, que a autora só realizou parte das obras a que estava obrigada, deverão, assim os réus ser condenados a pagar à autora a sua contraprestação na proporção do montante dessas obras; sem prescindir–do enriquecimento sem causa xvi - vindo provado que não foram os réus que concluíram as obras e que até ao dia de hoje não entregaram á autora a quantia de 25.000,00€, sempre os réus teriam e terão que ser condenados a pagar à recorrente a peticionada quantia de 25.000,00€, a título de ressarcimento, por enriquecimento, injusto e sem causa, conforme o disposto no artigo 473 do c. civil.

*Devidamente notificados os Réus contra-alegaram concluindo pelo não provimento do recurso.

*Foram dispensados os vistos.

*II- FUNDAMENTOS O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 3, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.

*No seguimento desta orientação são duas as questões que importa decidir: a)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto.

b)- decidir em conformidade tendo em conta a decisão que venha a recair sobre a impugnação da matéria de facto.

*A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO É a seguinte a matéria de facto que vem dada como provado pela primeira instância: 1º)- A Autora dedica-se no exercício da sua actividade à compra, venda e arrendamento de bens imóveis e ou suas fracções e revenda dos adquiridos para esse fim.

  1. ) - No âmbito do exercício da sua actividade, em 03/12/2009, vendeu aos RR. o prédio urbano, destinado a habitação, composto de casa de cave, rés-do-chão e andar, com logradouro, sito no …, actual Rua …, n.º .., freguesia … concelho de Vila Nova de Famalicão, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 208–…, inscrito na respectiva matriz sob o artigo n.º627, com alvará de licença de utilização n.º …/2008, emitido em...

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