Acórdão nº 2553/11.9TAVLG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA MANUELA PAUP
Data da Resolução10 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo número 2553/11.9TAVLG.P1 Acordam em conferência na Primeira Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I)- Relatório Por decisão proferida no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Valongo foi o arguido B… condenado, pela autoria de um crime de material de jogo, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 3º 3 4º número 1 alínea g) e 115º do Decreto Lei nº 422/89 de 2 de dezembro, na pena de 10 meses de prisão, substituída por 320 dias e na multa de 180 dias, sendo a soma das penas de multa de 500 dias, à taxa diária de 8,00€, o que perfaz a multa de 4.000,00€.

Inconformado com a decisão proferida dela veio interpor recurso, nos termos que constam das suas alegações de folhas 608 a 661, alegações que condensa nas conclusões seguintes: (transcrição) A. - No que se refere à subsunção da conduta que se imputa ao Recorrente em sede de factualidade tida como provada, entende modestamente aquele que, ao contrário do decidido no douto Acórdão sob recurso, não se poderia haver concluído por preenchidos os elementos constitutivos do tipo legal em causa relativamente a todo o material apreendido nos autos.

B. - Na verdade, entende-se que não será de limitar a exploração dos jogos disponibilizados pelas máquinas e material dos autos aos casinos existentes nas referidas zonas de jogo, pois que, não serão de entender os mesmos jogos como um qualquer desses jogos nefastos (em que efetivamente "pensava" o legislador quando decidiu restringir a sua prática/exploração às zonas de jogo) cuja exploração a tais zonas se limita.

C. - Pois que, como bem resulta de tudo o processado nos autos, e da matéria tida como provada, os jogos disponibilizados, do modo corno se "apresentaram", são livremente disponibilizados via "on-line" a um qualquer utilizador, seja por intermédio da máquina dos autos ou mediante a utilização de uni qualquer computador com ligação à Internet, D. - Além do que, tais jogos não efetuavam um qualquer pagamento de prémios e/ou atribuição de fichas, directa ou indirectamente, tão pouco, conforme referido, permitiam quaisquer apostas de "dinheiro real" nos ditos jogos disponibilizados on-line, não sendo assim os valores despendidos de tal forma relevantes a ponto de lesarem uma qualquer família ou património, e, não resultando uma qualquer "exploração", no sentido estrito e legal do termo, de tais jogos por parte de quem quer que fosse, mormente, o Recorrente.

E. - Ademais, tendo por base a Jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, no seu douto Acórdão n.º 4/2010 (proferido no Processo n.º 2485/08 e publicado na 1ª Série, N.º 46°, do D.R. de 08 de Março de 2010), e após uma rigorosa análise e enquadramento de tudo o aí vertido e decidido, da sua fundamentação, sempre se dirá que naquele douto Aresto é defendido que o tipo legal em causa (exploração ilícita de jogo) é dotado de uma certa rigidez, que o constitui como tipo de garantia, sendo essa precisamente uma das manifestações do princípio da legalidade.

F. - Pois que, para se concluir pela exploração de um qualquer jogo de fortuna ou azar terão que se ter por verificados os 3 (três) pressupostos elencados na lei, corno seja, a dependência da sorte, o desenvolvimento de temas próprios dos jogos de fortuna 011 azar e, bem assim, o pagamento feito directamente em fichas ou moedas, na medida em que, esse é o pagamento efectuado nos "jogos de casino" - Cfr. arts. 1º e 4°, n. º 1, als. f) e g) -, sendo que, no caso concreto, este requisito se encontra totalmente afastado relativamente a ambas as máquinas dos autos.

G. - Isto sem descurar do facto de a própria "Lei do Jogo" (arts.1º e 4° do D.L. n.º 422/89, de 02 de Dezembro, na redacção do D.L. n." 10/95, de 19 de Janeiro), na definição de jogos de fortuna ou azar, combinar uma fórmula generalizadora (art. 1°) com a técnica exemplificativa (art. 4°), donde resulta que os diversos tipos de jogos considerados como de fortuna ou azar e que são autorizados nos casinos são os que estão especificados na lei, e não outros.

H. - Pois que, não obstante exemplificativa, a especificação dos jogos de fortuna ou azar constante da lei, sempre tal especificação é tendencialmente completa e comporta uma certa rigidez, como é próprio de um tipo legal de crime, que é um tipo de garantia, I. - Ao que acresce o facto de, nem mesmo pelas Portarias actualmente em vigor (nºs 817/2005, de 13 de Setembro e 217/2007, de 26 de Fevereiro), relativamente às regras de execução dos jogos de fortuna ou azar, porque os tipos de jogos (bancados, não bancados, e, em máquinas electrónicas) quase totalmente coincidentes com os especificados no D.L. n.º 422/89, de 02 de Dezembro, se poder concluir pela observância por parte dos jogos das máquinas dos autos das características dos denominados jogos de casino.

J. - Pois que, tal como se infere do Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 4/2010 (Diário da República, L," série – Nº 46 - 8 de Março de 2010), tendo o critério de distinção entre o ilícito criminal e o ilícito contraordenacional que ser um critério material, imposto pelo princípio da legalidade e pela função de garantia inerente a cada tipo de crime K. - Sempre os jogos de fortuna ou azar serão aqueles que se encontram especificados no n.º 1 do artigo 4.°, e, como tal, nunca as máquinas e material dos autos poderão ser enquadradas nesses jogos, pois que, relativamente a eles, está totalmente afastado o preceituado na al. f) do n.º 1 daquele art. 4°, na medida em que, nenhum pagava directamente em prémios em fichas ou moedas, mas tão só apresentam pontuações, as quais dependiam então da sorte e poderiam então, alegadamente, ser convertíveis posteriormente em numerário.

L. - No entanto, sempre se diga que, nem essa possibilidade de conversão das aludidas pontuações em numerário poderá, por si só, fazer precludir a sua “integração” enquanto mera modalidade afim dos jogos de fortuna ou azar, mas tão só; poderá consubstanciar, ela própria, uma distinta contra-ordenação.

M. - Donde, se entende como não preenchido o elemento objectivo do tipo de ilícito dos autos, relativamente às máquinas e material apreendido, impondo-se, por isso, atento tudo o exposto, a absolvição do Recorrente no que concerne ao crime pelo qual foi condenado.

N.

- Não obstante, sempre se diga que, relativamente a todo o material apreendido nas instalações buscadas, nunca se poderia concluir pela verificação, no que à utilização de todo esse material se refere, de um qualquer crime dos preceituados no Capítulo IX do D.L. n.º 422/89, de 02 de Dezembro, como seja, o crime de material de jogo p, e p. nos termos do art. 115º desse mesmo diploma legal.

O. - Nos presentes autos, e concretamente no que se refere ao funcionamento das máquinas apreendidas (a todas elas) e aos jogos pelas mesmas desenvolvidas, apenas foi possível verificar que as mesmas desenvolviam jogos de diversão, e, já não um qualquer jogo de fortuna ou azar, não se tendo visualizado em funcionamento qualquer dos jogos ilícitos que alegadamente aquelas máquinas poderiam disponibilizar, não se podendo concluir, por isso, pela existência de mais do que “meras” suspeitas ou suposições, P. - Sem que, no entanto, existam quaisquer certezas a tal respeito, mormente, certezas quanto n operacionalidade dos alegados jogos de fortuna ou azar que aquelas máquinas pudessem permitir desenvolver, bem como, certezas quanto à concreta identificação desses jogos e ao seu concreto modo de funcionamento.

Q. - Nada se podendo, por isso, concretamente concluir quanto ao alegado destino a ser dado às mesmas na prossecução de jogos de fortuna ou azar, até porque, se ignora se os elementos informáticos referidos no relatório pericial se encontram, ou encontravam, em qualquer momento, operacionais e aptos a ser utilizados, de modo a permitirem então o desenvolvimento de um qualquer desses jogos.

R. - Na verdade, no caso presente, nada mais existe para além da "mera" susceptibilidade das máquinas em causa, aliás como qualquer outra máquina de vídeo e/ou electrónica, desde que devidamente preparadas para o efeito, puderem vir a ser utilizadas na prática do crime de jogo ilícito.

S. - Assim, atento tudo o exposto, e porque, conforme resulta do relatório pericial referente a tais máquinas, não se visualizaram quaisquer outros jogos em desenvolvimento, ou aptos a serem utilizados, que não fossem jogos de diversão, nada se aferindo da efectiva operacionalidade, e mesmo do concreto funcionamento, de um qualquer sistema que alegadamente permitiria o desenvolvimento de jogos ilícitos, T. - Não se poderá então concluir, objetiva e efectivamente, que as máquinas apreendidas nos autos serviriam ou estavam destinadas a servir a prática de um qualquer crime dos preceituados na "Lei do Jogo” U. - O mesmo se diga, quanto a todo o demais material apreendido, como fossem os discos rígidos apreendidos, pois que, a sua simples "potencialidade" de utilização na prossecução de uma qualquer actividade ligada à prática de jogos de fortuna ou azar não poderá consubstanciar uma qualquer condenação do ora Recorrente relativamente ao referenciado crime de material de jogo, V. -Sob pena de, "laborando-se" no ramo das hipóteses, das possibilidades, uma tal condenação ser baseada única e exclusivamente em meras presunções, e já não em provas concretas, mormente, o alegada destino final a dar ao material e jogos apreendidos, como fosse, a sua alegada colocação em exploração no mercado W. - Sendo, nessa sequência, forçoso concluir-se que, atentos os factos por si dados como provados, nomeadamente, quanto as características de todo o material apreendido, não poderia o Digníssimo Tribunal "a quo" ter concluído pela subsunção da conduta do Recorrente à prática de um qualquer crime de material de jogo, impondo-se a sua absolvição.

X.

- Sem conceder, se assim não se entender, e se considerar que as máquinas e material apreendidos são de entender como material de jogo de fortuna ou azar, sempre se dirá que, ainda assim não...

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