Acórdão nº 648/12.0PIVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelELSA PAIX
Data da Resolução10 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 648/12.0PIVNG.P1 4º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia Acordam, em Conferência, os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO No 4º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, no processo comum singular nº 648/12.0PIVNG, foi submetido a julgamento o arguido B…, tendo sido proferida decisão com o seguinte dispositivo: CONDENO B…, como autor imediato, sob a forma consumada, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelos arts. 14.º, n.º 1, 26.º, 152.º, n.º 1, al. b) e n.º 2, do C.P., cujo último acto ocorreu em 09-07-2013, na pena de 2 (DOIS) ANOS E 8 (OITO) MESES DE PRISÃO, cuja EXECUÇÃO SE SUSPENDE por um período de 2 (DOIS) ANOS E 8 (OITO) MESES, acompanhada de REGIME DE PROVA assente num plano de reinserção social, a definir e a executar com vigilância e apoio pelos serviços de reinserção social, de forma a alcançar os seguintes objectivos: a) Prevenir o cometimento no futuro de factos de idêntica natureza; b) Permitir o confronto do arguido com as suas acções e tomada de consciência das suas condicionantes e consequências; c) Promover a consciência e assumpção da responsabilidade do comportamento violento e a utilização de estratégias alternativas ao mesmo, objectivando a diminuição da reincidência; d) Alcançar o conhecimento de alternativas de comportamentos mais integrados e a tomada de consciência das vantagens de adopção de tais comportamentos, ficando desde já condicionada: a) Proibição de contacto, por qualquer forma, com a demandante, nomeadamente na residência e no local de trabalho desta, devendo o cumprimento de tal condição ser fiscalizado, caso se verifiquem os legais pressupostos, por meios técnicos de controlo à distância, mediante a motorização telemática posicional, ou outra tecnologia idónea, de acordo com os sistemas tecnológicos adequados; b) Responder a convocatórias do magistrado e do técnico de reinserção social responsável pela execução; c) Receber visitas do técnico de reinserção social e comunicar-lhe ou colocar à sua disposição informações e documentos dos seus meios de subsistência, se tal for determinado; d) Informar o técnico de reinserção social sobre alterações de residência e de emprego, bem como sobre qualquer deslocação superior a oito dias e sobre a data do previsível regresso; e) À frequência do programa para agressores de violência doméstica (PAVD).

CONDENO ainda o arguido no pagamento das CUSTAS do processo, fixando em 2 UC o valor da taxa de justiça devida e nos demais encargos a que a sua actividade deu causa (cfr. arts. 3.º, n.º 1, 8.º, n.º 9, do RCP e Tabela III do mesmo, 513.º, n.º 1 e n.º 2 e 514.º, n.º 1, do C.P.P.).

APÓS TRÂNSITO, REMETA boletim (cfr. art.º 5.º, n.º 1, al. a), da Lei n.º 57/98, de 18 de Agosto).

JULGO, ainda, PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido de indemnização civil formulado por C… e, em consequência CONDENO o demandado B… a pagar àquela a quantia de € 2.000 (dois mil euros), acrescida de juros moratórios à taxa legal decorrente do art.º 559.º, n.º 1, do C.C., que tem sido de 4 %, desde 26-03-2014 e até efectivo e integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado.

CONDENO a demandante e o demandado no pagamento das custas do pedido de indemnização civil, na proporção do decaimento, que será de 74 % para aquela e de 26 % para este (cfr. arts. 527.º, n.º 1 e n.º 2, e n.º 2, 529.º, 607.º, n.º 6, do C.P.C., 523.º, do C.P.P., 3.º, n.º 1, 4.º, n.º 1, al. n), à contrário, 11.º, 13.º, n.º 1, do R.C.P. e Tabela I a ele anexa).

COMUNIQUE a presente decisão aos serviços de reinserção social competentes que deverão proceder à reelaboração do plano de reinserção social, ouvido o condenado, no prazo de 30 (TRINTA) DIAS, e submetê-lo à homologação do tribunal (cfr. art.º 494.º, nºs 2 e 3, do C.P.P.).

COMUNIQUE ao organismo da Administração Pública responsável pela área da cidadania e da igualdade de género, bem como à Direcção-Geral da Administração Interna, para efeitos de registo e tratamento de dados, nos termos do art.º 37.º, n.º 1, do Regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica, à protecção e à assistência das suas vítimas, aprovado pela Lei n.º 112/2009 de 16 de Setembro, tendo presente a Divulgação n.º 29/2012, do CSM e o ofício circular n.º 32 da DGAJ/DSAJ.

SOLICITE, DESDE JÁ, aos serviços de reinserção social competentes pelos meios técnicos de controlo à distância.

DÊ CONHECIMENTO aos órgãos de polícia criminal competentes.

Ao abrigo do disposto no art.º 214.º, n.º 1, al. e), do C.P.P., na redacção dada pela Lei n.º 20/2013, de 21 de Fevereiro, as medidas de coacção aplicadas ao arguido EXTINGUEM-SE com o trânsito em julgado da presente sentença, sendo que as obrigações decorrentes do TIR apenas se extinguirão com a extinção da pena (cfr. art.º 5.º do C.P.P.).

O arguido à ordem destes autos e até este momento não sofreu qualquer período de privação de liberdade (cfr. art.º 80.º, n.º 1, do C.P.).

***Inconformado com a decisão condenatória, o arguido B… veio interpor recurso, terminando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição): A.

O presente recurso é interposto de decisão proferida na douta sentença que condenou o arguido, como autor material de um crime de violência doméstica previsto e punido pelo artigo nº 152º nº 1 b), agravado na sua moldura penal abstracta pelo nº 2 do mesmo artigo; B.

Dos factos dados como provados e com relevância para condenação temos que arguido e a ofendida mantiveram uma relação de namoro durante três anos; C.

Que durante esse três anos de namoro existiram várias discussões e que, não se determinando qual o dia, hora ou local, apenas que foi no interior de uma viatura, o arguido desferiu um estalo à ofendida; D.

Que numa dessas discussões o arguido afirmou “puta, vais para os corredores técnicos do centro comercial com outros homens, não queres ter relações sexuais comigo por as teres com outros homens”; E.

Posteriormente ao término do namoro, Janeiro de 2012, foi dado como provado uma outra situação de violência física, pela qual o arguido terá desferido um estalo na face da ofendida e pontapés nas pernas, não se determinando quais as concretas circunstâncias de facto que envolvem a dita agressão física; F.

Após isso foi dado como provado outros acontecimentos de injúrias derivados de discussões; G.

Os factos descritos e dados como provados pelo Tribunal a quo são genéricos e inconclusivos, nomeadamente quando afirma “Desde que romperam a relação que os unia, por diversas vezes, o arguido disse à demandante, em tom sério e intimidatório, “puta, andaste às minhas custas, és uma vaca”; H.

Não circunstanciando minimamente essas discussões e injúrias; I.

Igualmente quando se afirma na sentença que “A partir de Agosto de 2012 o arguido passou a telefonar à demandante várias vezes ao dia, bem como a segui-la em todos os seus percursos”, não se explica para que telefone fazia os arguidos o telefonema, o que dizia concretamente, quantas vezes, aproximadamente, é que o arguido ligava, até quando teve este comportamento; J.

Não pode o tribunal a quo fundar uma sentença, em que condena um arguido a pena de prisão de 2 anos e 8 meses, em factos tão fracamente circunscritos, vagos e genéricos; K.

Quanto à questão da medida de coacção de proibição de aproximação da ofendida e da afirmação de que o arguido continuou a surgir em lugares frequentados pela ofendida cumpre afirmar que nos autos inexiste qualquer indicação de incumprimento da medida de coacção, e que arguido e ofendida são ambos residentes em Vila Nova de Gaia, habitando a poucos quilómetros um do outro e na mesma freguesia, …; L.

Sendo assim natural que frequentem os mesmos locais e que neles e se cruzem; M.

Mas inexiste qualquer prova que o arguido terá entrado em contacto com a ofendida, e, assim, tal facto não pode ser tido em conta para efeitos de condenação; N.

Ora, conforme supra indicado suficientemente circunstanciado para poder fundamentar uma sentença temos provado que no espaço que correu entre Janeiro de 2009 e Julho de 2013 ocorreram dois momentos de agressão física, de baixa gravidade e 3 a 4 momentos de injúria; O.

O que será manifestamente insuficiente para qualificar o crime como violência doméstica, e absolutamente impossível agravá-lo nos termos do nº 2 do artigo 152º do C.P.; P.

A punição das condutas descritas no artigo 152º do C.P., visa salvaguardar a pessoa humana na sua irrenunciável dimensão de liberdade e dignidade e pretende prevenir consequências gravosas que possam surgir para a saúde física e psíquica e para o desenvolvimento normal e correto da personalidade do indivíduo; Q.

Os actos praticados terão necessariamente de ser capazes de atingir precisamente a saúde física e psíquica do indivíduo de forma a afectar e marcar de forma irreparável o desenvolvimento harmonioso do sujeito ofendido, pelo que terão de se revestir de reiteração e gravidade suficientes para o efeito; R.

Sendo ainda que a autonomização do crime de violência doméstica de outros menos graves exige, ainda, ou uma reiteração de condutas ofensivas ou, no mínimo, um acto que seja de tal forma grave que por si só, e sem mais, seja susceptível de produzir o dano descrito; S.

É necessário que o comportamento o agressor demonstre uma especial crueldade, insensibilidade, uma atitude de vingança desnecessária e desmesurada ou ainda uma vontade de subjugar a vítima aos seus desejos e torna-la dependente de si; T.

O que no caso concreto não se verifica e não se encontra nem provado nem dado como provado, pelo que não poderão os factos dados como provados integrar o ilícito de violência doméstica; U.

Não poderá também ser o ilícito agravado uma vez que apenas um dos factos descritos aconteceu nos termos do artigo 152º nº 2, mais especificamente em frente a menor; V.

Ao aplicar o mesmo artigo o tribunal faz uma incorrecta apreciação da norma, isto porque se entende que uma agravação a um tipo legal de ilícito implica a prática dos factos em circunstâncias...

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