Acórdão nº 1388/09.3TBPVZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelRODRIGUES PIRES
Data da Resolução30 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 1388/09.3 TBPVZ.P1 Tribunal Judicial de Póvoa de Varzim – 1º Juízo Cível Apelação Recorrentes: B… e “C…, Lda.” Recorrido: Condomínio … Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Pinto dos Santos Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO O autor Condomínio do Edifício Sito na …, Póvoa de Varzim com entrada pelo nº … da … instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra os réus B… e mulher D…, E… e mulher F…, G…, H…, Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de I…, J…, K…, Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de L…, Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de M…, N… e “C…, Lda.”, tendo formulado o seguinte pedido: - Reconhecer o condomínio autor como dono e legítimo possuidor das fracções “AK” e “AL” do edifício descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o nº 2.794 e inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 6.852, por as haver adquirido por usucapião, abstendo-se de praticar quaisquer actos ofensivos do direito de propriedade do condomínio autor, relativamente a tais fracções, tudo com as legais consequências.

Subsidiariamente, formulou ainda o seguinte pedido: - Ser declarada nula, por simulação e fraude à lei, a venda efectuada pela sociedade décima ré à sociedade décima primeira ré, através de escritura pública outorgada aos 30 de Dezembro de 2005, no cartório do Dr. O…, tendo por objecto as fracções “AK”, correspondente a rés-do-chão, destinado a habitação, e “AL”, destinado a posto de transformação, de um edifício constituído em regime de propriedade horizontal, descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o nº 239 e inscrito na matriz predial da respectiva freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 6.852.

- Em qualquer caso, sempre se ordenará o cancelamento de todos os actos e registos da Conservatória do Registo Predial e, designadamente aqueles efectuados com base em tal documento autêntico, cuja validade e eficácia do acto se impugna.

Posteriormente, em ampliação do pedido, que foi admitida, o autor pediu ainda a condenação de todos os réus a, subsidiariamente, reconhecerem os espaços, divisões, áreas, paredes, tectos e equipamentos existentes nas fracções autónomas identificadas pelas letras “AK” e “AL”, como sendo partes e espaços comuns.

Contestaram a presente acção os réus B…, D…, H… e “C…, Lda.” na qual se defenderem por excepção e por impugnação.

Por excepção invocaram a ilegitimidade do autor para intentar acções judiciais, a ineptidão da petição inicial e a ilegitimidade da ré D…, as quais foram já julgadas improcedentes em sede de despacho saneador.

Seleccionou-se a matéria de facto assente e organizou-se a base instrutória.

Efectuou-se audiência de julgamento com observância do legal formalismo e depois proferiu-se sentença que julgou a acção procedente e, em consequência: - Declarou que os espaços correspondentes às fracções autónomas “AK” e “AL” do edifício descrito na conservatória do registo predial da Póvoa de Varzim sob o nº 2.794 e inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 6.852, são partes comuns destinadas, respectivamente, a “habitação do porteiro” e “posto de transformação de electricidade” do edifício representado pelo autor, Condomínio do Edifício Sito na … e …, Póvoa de Varzim, condenando-se os réus, B… e mulher D…, E… e mulher F…, G…, H…, Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de I…, J…, K…, Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de L…, Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de M…, N… e “C…, Lda.” a assim o reconhecerem.

- Ordenou o cancelamento da inscrição no registo enquanto fracções autónomas dos espaços correspondentes às identificadas fracções “AK” e “AL”, assim como o cancelamento do registo da sua aquisição efectuado em favor da 11ª ré, “C…, Lda.” Inconformados com o decidido interpuseram recurso de apelação os réus B… e “C…, Lda.”, os quais finalizaram as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. Salvo o sempre devido respeito, que é muito, os Recorrentes não se podem conformar com a douta sentença aqui sob censura. 2. Na verdade, esta é nula porquanto, como vimos, os seus fundamentos estão em manifesta oposição com a decisão proferida (artigo 615º, nº1, alínea c) do CPC).

  1. Acresce que, na douta sentença, declara-se que os espaços correspondentes às fracções autónomas “AK” e “AL”, são partes comuns.

  2. Ao contrário do que consta no título constitutivo da respectiva propriedade horizontal.

  3. Acontece que, o artigo 1419º, nº1, do CC não permite que qualquer alteração ao título constitutivo da propriedade horizontal seja efectuada sem acordo de todos os condóminos.

  4. Mesmo que tal alteração decorra de sentença judicial.

  5. Isto porque o artigo 1419º, nº1, do CC, é uma norma imperativa.

  6. Ora, a douta sentença ao declarar os espaços correspondentes às fracções autónomas “AK” e “AL”, como partes comuns, violou o estatuído no artigo 1419º, nº1, do CC.

  7. Por outro lado, por força do consagrado no título constitutivo da propriedade horizontal, a fracção “AK” não goza da presunção prevista na alínea c), do nº2, do artigo 1421º, do CC.

  8. Acrescente-se ainda que não há qualquer desconformidade entre o título constitutivo da propriedade horizontal e o licenciamento camarário.

  9. Não constando do projecto de construção aprovado pela Câmara Municipal a indicação que a fracção “AK” se destina a ser utilizada como casa do porteiro.

  10. As fracções em apreço constituem unidades prediais autónomas e independentes.

  11. Não violando, por isso, o disposto no artigo 1415º, do CC.

  12. Por fim, tem de se dizer que a sentença impugnada violou o disposto nos artigos 615º, do CPC e 1419º, nº1, do CC.

    Pretendem assim a revogação da sentença recorrida.

    O autor apresentou contra-alegações, mas quais se pronunciou pela improcedência do recurso e subsidiariamente formulou pedido de ampliação do seu âmbito, tendo neste segmento formulado as seguintes conclusões: Sem prescindir, Ampliação subsidiária do recurso, 9.- Quando se entenda pela procedência do recurso apresentado pelos Recorrentes, e prevenindo a necessidade de apreciação dos fundamentos da acção, sempre deve ser reconhecido ao condomínio a capacidade e a personalidade jurídicas para adquirir por usucapião as referidas fracções autónomas identificadas pelas letras “AK” e “AL”; 10.- Tal aquisição por usucapião retroage à construção do edifício e constituição da propriedade horizontal, em que a sociedade construtora destinou tais fracções ao bem comum do edifício e absteve-se e alheou-se de se apoderar ou praticar quaisquer outros actos de apropriação das mesmas, sempre as tendo reconhecido como comuns; 11.- O condomínio, apesar da especial ressalva da alínea e) do artigo 6.º do C.P.C., não deixa de ser uma pessoa colectiva, cuja capacidade jurídica advém, além do mais, do disposto ao artigo 160.º do Código Civil, e que é sujeito de deveres e obrigações que ultrapassam os meros poderes do administrador; Sem prescindir, Ampliação subsidiária do recurso 12.- Em caso de improcedência do anterior fundamento da acção, sempre deve ser declarada a nulidade da escritura pública de compra e venda de 30 de Dezembro de 2005, por simulação e fraude à lei.

  13. - Não houve transferência de posse, intenção de compra e venda, entrega ou recebimento do preço, e as fracções integram espaços comuns e com destino comum, que assim sempre foi cumprido desde a construção do edifício; 14.- E contraria a lei a apropriação, por um qualquer particular, de espaços ou equipamentos comuns, indispensáveis ao funcionamento do edifício; Pretende assim que não sendo confirmada a sentença recorrida, se admita a ampliação subsidiária do recurso, condenando-se os recorrentes a reconhecer que o recorrido adquiriu por usucapião as fracções autónomas identificadas pelas letras “AK” e “AL” e/ou, ainda subsidiariamente, declarar-se a nulidade da escritura pública de compra e venda de 30 de Dezembro de 2005, por simulação e fraude à lei e, consequentemente, se ordene o cancelamento do registo de tal acto de compra e venda.

    Os réus/recorrentes pronunciaram-se no sentido do indeferimento do pedido de ampliação do objecto do recurso.

    Cumpre então apreciar e decidir.

    *FUNDAMENTAÇÃO Uma vez que estamos perante decisão proferida em 22.1.2014 em processo que foi instaurado depois de 1.1.2008, é aplicável ao presente recurso o regime previsto no Novo Cód. do Proc. Civil.

    *O âmbito do recurso, sempre ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – cfr. arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Novo Cód. do Proc. Civil.

    *As questões a decidir são as seguintes: I – Questão prévia: Ampliação do âmbito do recurso; II – Nulidade da sentença [oposição entre os fundamentos e a decisão]; III – Alteração do título constitutivo da propriedade horizontal [violação do disposto no art. 1419º, nº 1 do Cód. Civil]/declaração dos espaços correspondentes às fracções autónomas “AK” e “AL” como partes comuns].

    * OS FACTOS Na sentença recorrida consideraram-se provados documentalmente e por acordo das partes os seguintes factos:

    1. Conforme decorre dos documentos juntos aos autos de fls. 37 a 49, de fls. 51 a 54 e de fls. 55 a 59, cujo teor aqui se dá integralmente por reproduzido, o autor é o condomínio do Edifício sito no gaveto … e …, cidade da Póvoa de Varzim, com entrada pelo nº … da …, pessoa colectiva nº ……… e representa as partes comuns do edifício constituído em regime de propriedade horizontal através de escritura pública outorgada a 11/06/1986, exarada a fls. 44 e seguintes, do livro D-33, no segundo cartório notarial da Póvoa de Varzim, descrito na conservatória do registo predial da Póvoa de Varzim sob o n.0239 e inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 6.852.

    B) Conforme decorre dos documentos...

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