Acórdão nº 507/12.7TXPRT-H.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelPEDRO VAZ PATO
Data da Resolução24 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 507/12.7TXPRT-H.P1 Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto I – B… vem interpor recurso da douta decisão do 2º Juízo do Tribunal de Execução das Penas do Porto que não lhe concedeu o regime de liberdade condicional.

Da motivação do recurso constam, em síntese, as seguintes conclusões: - O crime por que o recorrente foi condenado configura uma situação isolada no seu percurso de vida.

- O recorrente reconhece a ilicitude dos factos por que foi condenado, a gravidade dos prejuízos dele decorrentes e a justeza da pena da pena aplicada, chegando mesmo a verbalizar, em jeito de introspeção e auto-censura, ter sido movido pela ganância.

- Já depois de ter praticado esses factos, manteve um percurso de vida exemplar durante os sete anos que mediaram entre a data dessa prática e o início do cumprimento dessa pena, em junho de 2012, nunca mais tendo cometido qualquer ilícito, sequer contra-ordenacional, pese embora tenha continuado a exercer cargos de elevada responsabilidade nas demais empresas onde laborou.

- Como decorre do relatório dos Serviços de Reinserção Social, demonstra efetiva vontade de mudar o seu percurso de vida.

- Desse mesmo relatório decorre que não só verbaliza efetiva vontade de pagar a avultada indemnização em causa, como tem vindo a promover e efetuar as necessárias diligências, através do seu mandatário, junto da entidade bancária lesada, para realizar tal pagamento.

- Rejeita-se por completo o juízo constante da decisão recorrida de que esta questão é encarada pelo recorrente numa perspetiva de “comodidade” e não necessidade, já que foi ele quem tomou a iniciativa de diligenciar pelo cumprimento dessa sua obrigação.

- A conclusão da decisão recorrida de que a assunção pelo recorrente da gravidade dos factos cometidos é ainda superficial e inconsequente não se compadece com o teor do referido relatório.

- Rejeita-se, por absurda, a ideia de que a sua principal preocupação é preservar a sua imagem social.

- O recorrente sempre demonstrou efetivo interesse no seu processo de ressocialização, participando em inúmeras atividades de natureza sócio-cultural e desportiva e insistindo para que lhe concedessem ocupação laboral.

- No que respeita ao comportamento e disciplina, o recorrente apresenta, segundo o relatório dos Serviços Prisionais, uma avaliação positiva, adequada ao contexto, ausente de conflitos, quer com os pares, quer com as figuras de autoridade.

- Quanto ao alegado procedimento disciplinar referido na decisão recorrida (e que não vem sequer mencionado no relatório da Equipa de Reinserção Social elaborado posteriormente), esclareça-se que a suposta “infração” ocorrida em 27 de janeiro de 2014 se deveu ao facto de o recorrente se incluir num grupo de reclusos que, o fazerem o caminho da escola até ao pavilhão principal, e porque chovia copiosamente, aceleraram o passo para não ficarem encharcados, episódio a que a própria guarda-prisional que os acompanhava não deu importância, reconhecendo que, de facto, chovia intensamente.

- O recorrente conta com todo o apoio da sua família, mormente da sua companheira (ex-esposa), com quem reatou o relacionamento em meados de 2010, e dos seus amigos próximos.

- Em termos laborais, perspetiva auxiliar a sua companheira no Lar de Idosos de que a mesma tem a exploração.

- Verifica-se, assim, um juízo de prognose favorável sobre o comportamento futuro do recorrente, ou seja, verifica-se o pressuposto material a que alude a alínea a) do nº 2 do artigo 61º do Código Penal.

- A pena concreta aplicada já satisfaz integralmente as exigências de tutela do ordenamento jurídico.

- As razões de prevenção geral já ditaram a decisão de não suspensão da pena de prisão aplicada ao recorrente.

- Não estamos perante criminalidade violenta, mas perante um crime contra o património, que, embora revista particular gravidade pelo valor envolvido, não acarretou prejuízo para o cliente do Banco lesado, circunstância que suaviza naturalmente os denominadores alarme social e insegurança da comunidade.

- A libertação do recorrente é, pois, compatível com a defesa da ordem e da paz social (nº 2, b), do artigo 61º do Código Penal).

- Deve, pois, ser concedida a liberdade condicional ao recorrente, nos termos do nº 2 do artigo 61º do Código Penal.

O Ministério Público junto do Tribunal de primeira instância apresentou resposta a tal motivação, pugnando pelo não provimento do recurso.

Nos termos do artigo 414º, nº 4, do Código de Processo Penal (aplicável ex vi do artigo 239º do Código de Execução de Penas e Medidas Privativas da Liberdade), o Mº Juiz a quo sustentou a decisão recorrida.

O recorrente requereu a realização de audiência, mas esse seu requerimento foi indeferido, tendo em conta o disposto no artigo 419º, nº 3, b), do Código de Processo Penal.

Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir.

II – A questão que importa decidir é, de acordo com as conclusões da motivação do recurso, saber se se verificam, quanto ao recorrente, os pressupostos de concessão do regime de liberdade condicional.

III - Da fundamentação da douta decisão recorrida consta o seguinte: «(…) 2 – Factos com relevo para a decisão a proferir, tidos como provados: A.

O condenado encontra-se a cumprir, pela prática do indicado crime, a pena de: a) NUIPC PCC 863/06.6TDPRT – 2.ºVaraCrTJPorto 1 crime de burla informática e nas comunicações (forma agravada – valor consideravelmente elevado) [art. 221.º, n.ºs 1 e 5 b) CP] 3A6M de prisão (factos de nov2004/2005, no exercício de funções, como gerente bancário do C…, por via informática – através de utilização incorrecta ou incompleta de dados e de processamento de dados sem autorização -, retirou de conta titulada por terceiro, um total de €536.000,00 (quinhentos e trinta e seis mil euros), que integrou no seu património e no dos seus pais, e que não restituiu) (os terceiros prejudicados pela actuação do condenado foram ressarcidos pelo C…) (Foi fixada indemnização em sede de pedido cível, operando condenação no valor de €€536.000,00, acrescida de juros, a ser paga pelo condenado ao C…, a qual não está ressarcida) (Ac. de 1.ª instância de 21jul2010) (Ac. do TRP de 16mar2011) (Ac. do TC de 17mai2011) (trânsito em julgado de 14abr2011) B.

Iniciou o cumprimento da pena em 19jun2014, com termo previsto para 19dez2015, com ½ vencido em 19mar2014, os 2/3 para 19out2014.

C.

Não tem outros antecedentes criminais conhecidos.

D.

Cumpre a 1.ª reclusão.

E.

Correu termos apenso supletivo para declaração de contumácia (apenso A), instaurado em 24abr2012, face a inviabilidade de cumprimento de mandados de detenção, emitidos pelo Tribunal da condenação em 10jan2012, atenta ausência do condenado.

F.

Referências constantes do SIPR (ficha biográfica – situação jurídico penal – do condenado): 1 - processos pendentes: a) nada consta.

2 - outras penas autónomas a cumprir: a) nada consta.

3 – medidas de flexibilização de pena: a) Regime Comum b) LSJ – 0 (3 indeferimentos – o último em dez2013); c) LCD – 0.

G.

Os elementos do Conselho Técnico emitiram parecer unânime desfavorável à concessão da liberdade condicional.

H.

Ouvido o condenado, declarou o mesmo consentir na liberdade condicional.

I.

O Ministério Público emitiu parecer desfavorável à concessão da liberdade condicional.

J.

Dos relatórios das Equipas de Reinserção Social e Serviços Prisionais da DGRSP, e da audição do condenado, em conclusão, extrai-se que: 1 – comportamento prisional /registo cadastral: O condenado vem mantendo ao longo da reclusão uma postura adequada de contexto, mantendo comportamento normativo, sem conflitos; conta com um procedimento disciplinar, face a infracção de 27jan2014, sancionada com mera advertência; é pessoa educada e cordial, correcta no relacionamento interpessoal.

2 – situação económico-social e familiar: O condenado é divorciado – ainda assim mantém coabitação com a ex-esposa -, pai de um filho (12A), conta com habilitação literária de licenciatura em gestão de empresas, acrescida de pós graduação e formação na área; era bancário à data dos factos e nessa qualidade os praticou; cresceu em agregado familiar com média condição económica-financeira, estruturado; desde os 25 anos que trabalhava na área bancária, com evolução de carreira – em que sempre investiu – ligado a várias e sucessivas entidades; no EP esteve impedido na lavandaria (pós 16jan2013), após o que optou por formação e ocupação lúdica [pintura e desenho e curso de cidadania e relacionamento interpessoal (pós 11out2013)]; conta com apoio externo por parte da família nuclear - mãe e companheira (ex-esposa), pretendendo residir com esta e o filho do casal em liberdade – habitação arrendada, T4, com muito boas condições de conforto e habitabilidade, situada em zona pacata e privilegiada; inexistem, no meio social, concretos problemas de reintegração, mormente face a desconhecimento da situação do condenado (apenas parte da família nuclear e amigos muito próximos conhecem a situação de reclusão, a qual é escondida face a pessoal e pretendida protecção de imagem social.

3 – perspectiva laboral/educativa: O condenado verbaliza intenção de trabalhar na empresa que geria antes da reclusão – ligada ao ramo de consultadoria e projectos financeiros (actualmente gerida pela companheira) – e num Lar de Idosos que entretanto (já em sede de reclusão) adquiriram e iniciaram na exploração.

4 – caracterização pessoal: O condenado é pessoa que, no decurso da execução da pena, vem a evoluir ao nível da assunção dos factos como da sua autoria (que parcialmente negava, e no demais deturpava na responsabilidade, em sede de audiência), assumindo-os; tendo-se como inconsequente e irresponsável, verbaliza, de forma ainda superficial, arrependimento (que centra sempre no prejuízo pessoal e na preocupação em relação às consequências negativas na sua imagem profissional e, por último, familiar); centra a ratio actuacional e subsequente justificação da sua autoria de forma...

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