Acórdão nº 1653/12.2JAPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA DEOLINDA DION
Data da Resolução17 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

RECURSO PENAL n.º 1653/12.2JAPRT.P1 2ª Secção Criminal CONFERÊNCIA Relatora: Maria Deolinda Dionísio Adjunta: Maria Dolores Sousa Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO No âmbito do processo comum, com intervenção de Tribunal Colectivo, n.º 1653/12.2JAPRT, da 4ª Vara Criminal do Porto, na sequência da condenação dos arguidos B… e C…, ambos com os demais sinais dos autos, pela prática de 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo art. 21º n.º 1, do Dec. Lei n.º 15/93, de 22/1, foram, além do mais, julgados parcialmente procedentes os incidentes de liquidação contra eles deduzidos pelo Ministério Público, nos termos dos arts. 7º e 8º, da Lei n.º 5/2002, de 11/1, e declarados perdidos a favor do Estado os montantes de, respectivamente, €72.985,53 (setenta e dois mil novecentos e oitenta e cinco euros e cinquenta e três cêntimos) e €275.803,22 (duzentos e setenta e cinco mil oitocentos e três euros e vinte e dois cêntimos), equivalentes ao património incongruente com os seus rendimentos lícitos, com a consequente condenação de cada um dos arguidos na quantia devida e manutenção do arresto de bens.

***Inconformados com tal decisão interpuseram recurso os mencionados arguidos e ainda D…, com os demais sinais dos autos, esta estribada na circunstância de haver bens arrestados que considera serem sua propriedade, rematando a motivação com as seguintes conclusões: (transcrição sem destaques) Arguido B… 1 - No caso dos presentes estamos perante um crime de tráfico de estupefacientes, é a primeira condição para a decisão da perda ampliada.

2 -Só que, não basta.

3 - Efectivamente e é o que falta no caso, há que explicitar e fundamentar a incongruência do património global com aquele que resulta de uma fonte lícita.

4 - Aqui e desde logo no apuramento do património global leva-se à soma parcela de registo de movimentos bancários que podem muito bem ser movimento de rendimentos lícitos e levam-se à colação bens sem expressão económica da actividade do recorrente.

5 - Efectivamente ao recorrente não foram apreendidas quantias avultadas nem provas de depósitos de quaisquer quantias.

6 - Ao recorrente foi apreendido 120 euros e em casa tinha l.000,00 euros.

7 - Levam-se à soma do património bens que não têm ligação com a actividade de tráfico: Um não foi comprado com proventos do tráfico (seat); Outro foi depois de finda a actividade (Renault) e Outro sem qualquer utilização na actividade.

8 - Mas como quer que seja, sem expressão económica da actividade lucrativa do recorrente e sem expressão ou referência de ganhos e lucros deste como resultado da prova colhida quanto a si a decisão ora recorrida nesta parte não se sustenta por não ser nem clara nem explícita no apuramento da "incongruência" do património.

9 - Nem a explicitação pormenorizada do co-arguido no que ele - co-arguido -escreveu e explicou - como quis e entendeu - chegam para a decisão proferida quanto ao recorrente, pois não resulta outra prova que as complemente ou acompanhe ou corrobore, nomeadamente resultante de depósitos ou saldos ou dinheiro apreendido que sustente aquelas declarações.

10 - A decisão recorrida nesta parte impugna-se por estar ferida de nulidade nos termos do artigo 379º, n.º l al. a) do CPP e por ter violado o artigo 12º da Lei 5/2002.

***Arguido C… 1 - Entende o recorrente que o douto acórdão padece de nulidade por falta de fundamentação.

[1] 3 - Na verdade, dispõe o artigo 97º n.º 5 do C.P.P, que "os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão.

4 - Dispõe ainda o preceito no artigo 379º n.º 1 do C.P.P. n.º 1 al. c): "É nula a sentença (....), quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (....) 5 - No caso em apreço, o Acórdão recorrido deu como parcialmente procedente, o incidente de liquidação deduzido pelo Ministério Público nos termos dos Arts. 7º e 8º da Lei 5/2002 de 11/1, contra o Arguido C… e, declarou perdido a favor do Estado, o montante de € 275.803,32, valor esse que o Arguido foi condenado a pagar, mantendo o arresto dos bens anteriormente decretado.

6 - Ora, a decisão supra descrita padece de fundamentação, uma vez que, o tribunal, quanto a esta matéria, se limita, a remeter a decisão, para os factos provados e a concluir "tout court", que o valor do património total do arguido C…, é € 296.154,64, sendo que o rendimento lícito obtido é de € 20.351,42, pelo que, presume que o valor indicado no ponto 5 das conclusões, se mostra incongruente com o rendimento lícito por este declarado, considerando que não foi ilidida a presunção da Lei 5/02, e como tal declara que este valor tem origem ilícita determinando-o perdido a favor do Estado.

7 - Ora, o Tribunal "a quo" não fundamenta, nem especifica como lhe cabia, o motivo da redução e consequentemente, da diferença entre o valor por si alcançado, e o do Ministério Público sendo que, ao longo do Douto Acórdão não se vislumbra quais os bens arrestados que são abrangidos por aquela diferença.

E muito menos, reitera-se, a base de recalculo matemático para a retirada do referido valor.

8 - Nomeadamente o Douto Acórdão não faz qualquer referência aos documentos anexos aos autos, solicitados à E…, e aos documentos juntos em audiência pelo arguido, reportados a valores auferidos pela avó da companheira, que de acordo com as suas declarações foram utilizados na aquisição de alguns dos bens móveis e imóveis por si adquiridos.

9 - A situação supra descrita, na perspectiva da defesa faz com que a decisão enferme da nulidade p. p no artigo 379º n.º 1 al. c) do C.P.P.

10 - Devendo nos termos do n.º 2 do citado aresto ser suprida, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 414º n.º 4 do C.P.P.

11 - Violou-se o disposto no arts 97º n.º 5 e 379º n.º 1 al. c) ambos do C.P.P.

12 - Acresce ainda, que, contrariamente ao sufragado pelo tribunal, entende o recorrente, ter ainda que parcialmente ilidido a presunção da Lei 5/02, e retira tal ilação da conjugação da factualidade apurada e não apurada, descriminada no acórdão ora recorrido.

13 - Na verdade, o tribunal dá como provado que para além dos valores legalmente declarados, o arguido desenvolveu actividade laboral, desde há vários anos, estando inclusive a trabalhar aquando da sua detenção. (Cfr. pag. 27 dos factos provados do acórdão.) 14 - Ora ainda que, a acusação tenha fixado o período entre Agosto de 2011 a Maio de 2013, para o exercício da actividade ilícita, resultou provado, que o arguido desenvolveu essa actividade ente Abril e Maio de 2013.

15 - Pelo que, não se tendo apurado, que o mesmo utilizasse os bens móveis e imóveis na referida actividade, nem fossem tais bens adquiridos com dinheiro proveniente desta, conjugando, com a actividade laboral por si exercida, tal circunstancialismo teria sempre que ser valorado em seu benefício, e ainda que não tendo sido declarados na totalidade os rendimentos obtidos pelo trabalho, resulta, que o mesmo auferiu tais rendimentos, podendo estes ser a origem dos proventos que estiveram na base da aquisição dos referidos bens.

Tanto mais, que a actividade por si exercida, na loja "F…", não foi considerada como fachada do negócio ilícito.

16 - Pelo que, da conjugação dos factos provados e não provados, não se pode concluir, como fez o Tribunal "a quo", que todo o património do Arguido C… foi obtido ilicitamente, muito menos, declará-lo como perdido a favor Estado e ainda, condená-lo no pagamento desse valor.

17 - Condenação essa que, face à elisão da presunção não pode operar.

18 - Violou-se o disposto nos arts. 7º e seguintes da Lei 5/02.

19 - Sem prescindir, considera ainda o recorrente, que o valor do património apurado quanto a si, não é o vertido no douto acórdão, porque, para o seu cálculo não foram observados, os critérios legais, previstos nas alíneas do n.º 2 do Art. 7º da Lei 5/2002 de 11/01.

20 - Na verdade, o Ministério Público indicou e contabilizou o valor de bens que já não pertenciam ao C… à data da sua constituição como Arguido (15.05.2013) ou seja, que já não se encontravam na sua esfera jurídica, nem tão pouco foram indiciados como instrumentos, ou adquiridos, com proventos de atividade ilícita (vide. Pag. 29 do Acórdão).

Como é o caso do veículo de marca Opel …, com a matrícula ..-AX-.. avaliado em € 6.000,00 e o veículo Seat …, com a matrícula ..-EI-.., avaliado em € 11.000,00.

21 - Assim, o valor porque ambos foram avaliados € 17.000,00 (€ 6.000,00 + € 11.000,00) não podia, nem pode, ser contabilizado como fazendo parte do património do Arguido C….

22 - Contabilizou ainda, erradamente o Ministério Público, o montante de € 149.029,09, referente a "supostos" depósitos bancários existentes em contas tituladas pelo Arguido C… e pela D…, o que também não podia ter feito, por não corresponder à verdade.

23 - De acordo com as informações constantes nos autos fornecidas pela E… as únicas contas, de que era titular, era a conta identificada a fls. 312 e ss. que em Maio de 2015 apresentava um saldo de € 703,45, e a conta identificada a fls. 320 e ss. que em Maio de 2013 apresentava um saldo de € 9.045,58, o que totaliza € 9.749,03.

24 - Montante manifestamente inferior, aos erroneamente contabilizados pelo Ministério Público.

25 - Contas essas, tituladas quer pelo Arguido C…, quer em co-titulariedade com a sua irmã e não com a D…, sua companheira.

26 - Também, quanto aos bens imóveis, e embora se entenda, que deveria ser indicado apenas um, o imóvel sito na Rua … n.º … casa . no Porto, por ser o único que é da exclusiva propriedade do Arguido C….

27 - Ainda assim e sem conceder, mesmo que tivessem sido considerados os três bens imóveis, o valor a ser contabilizado seria o das aquisições, por ser esse que retraía o valor pago pelo Arguido e não, o valor patrimonial ou comercial dos mesmos. Valor indicado no ponto 45 da motivação de recurso e que aqui se dá por integralmente reproduzido.

28 -...

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