Acórdão nº 8529/08.6TDPRT.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DEOLINDA DEON
Data da Resolução15 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

RECURSO PENAL n.º 8529/08.6TDPRT.P1 2ª Secção Criminal Relatora: Maria Deolinda Dionísio Adjunta: Maria Dolores Sousa Processo: Instrução n.º 8529/08.6TDPRT (do extinto TIC Porto - 2º Juízo) Comarca – Porto Porto - Instância Central – 1ª Secção Instrução Criminal-J5 Arguidos B…… C…… Assistentes D…….

E……..

Acordam os Juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO 1.

Nos autos de inquérito n.º 8529/08.6TDPRT, da 3ª Secção do Departamento de Investigação e Acção Penal do Porto, o Ministério Público, finda a investigação, proferiu despacho de arquivamento, de harmonia com o disposto no art. 277º n.º 1, do Cód. Proc. Penal, nos seguintes termos: (transcrição) “Declaro encerrado o inquérito.

Os presentes autos iniciaram-se em Junho de 2008 com a participação criminal apresentada por D…..

contra a sua ex-mulher B…… e também contra C……, os quais acusou da prática do crime de furto qualificado porquanto, no dia 20 de Novembro de 2003, a denunciada B…., na companhia de uma advogada, ter-se -á dirigido à agência do F.... sita na Rua …. - onde, à data, estavam domiciliados os serviços de apoio aos chamados "clientes Cayman"- local onde ordenara a transferência dos activos da sociedade "E….." para outra conta, tendo, para este efeito, subscrito a respectiva ordem de transferência que, de imediato, terá sido cumprida pelo gestor da conta vazada, o denunciado C….., sendo que este mesmo funcionário, posteriormente, recusou reverter essa ordem de transferência quando, nesse mesmo dia, algumas horas mais tarde, o denunciante declarou revogar aquela ordem de transferência e reclamou o regresso dos activos à conta da E…...

Ainda de acordo com a sobredita participação: - A mencionada ordem de transferência foi dada sobre a conta da carteira de títulos da E…. n.º 45213017164, visando a transferência de títulos no valor global de € 2.693.496,71, ou seja, a totalidade dos títulos em carteira com a excepção de 1.576 acções preferenciais do F…. no valor nominal de € 157.600,00; - A conta destinatária da transferência estava identificada com o n.º 45252994647, sem indicação do respectivo titular, nem do nome ou domicílio do Banco onde se encontrava aberta; - Porém, só em 08 de Janeiro de 2004 é que esta conta destinatária da transferência (n.º 45252994647) registou um saldo de € 2.604.282; - O titular desta última conta era a sociedade "G…..", a qual - tal como a conta da "E….." - se encontrava domiciliada na empresa subsidiária do F…., denominada F1….(Cayman) Limited; - A sociedade "G…..." tem como procuradores a denunciada B….. e os três filhos do casal em referência: H…., I……. e J…. .

Sobre a origem da conta alegadamente objecto de furto, aquela mesma participação esclareceu que: - O denunciante e a denunciada B…., estando casados, subscreveram, no ano de 1998, acordo de intermediação financeira, nos termos do qual o F…. forneceria a estes seus clientes uma sociedade constituída em "off-shore" para desempenhar a função de titular da propriedade e da custódia de determinados bens e direitos que o referido casal, na qualidade de mandatários, representantes e "beneficial owners", poderia gerir como lhe aprouvesse, já que tinham poderes para "abrir e/ou movimentar ou encerrar contas bancárias tituladas pela sociedade em causa, em qualquer filial ou sucursal do K…., S.A., e bem assim, poderes para vincular a sociedade em actos escritos, em conjunto ou separadamente; - A referida sociedade foi constituída em 24 de Julho de 1998, nas Ilhas Virgens Britânicas, com a denominação social de "E….." e o respectivo capital social encontrava-se representado por dois títulos ao portador, um de 25.500 e outro de 24.500 acções; - A (primeira) conta bancária titulada pela "E….." sediada no K1…. veio a cessar por decisão do respectivo Director em 10 de Maio de 2002, sendo que a essa data, a mesma "E…." tinha já procedido à abertura de uma outra conta no F1….. (Cayman) Limited, com o n.º 45213017164, para onde passaram todos os valores e activos existentes na primeira; - Apesar desta operação, o casal constituído pelos mencionados D….. e B….. mantiveram os poderes para "abrir e/ou movimentar ou encerar contas bancárias tituladas pela sociedade em causa, em qualquer filial ou sucursal, desta feita, do F….., S.A., e a gestão da respectiva carteira de títulos manteve-se nas mãos do anterior Private Banker, Sr. L….. - situação que, ao que parece, se ficou a dever à ocorrência da incorporação por fusão do K…., SA, no F….., SA; - Mais tarde, em meados de Outubro de 2003, esta gestão passou a ser exercida pelo Private Banker, Dr. C…..; Para justificar a apresentação de queixa contra este último gestor, a aludida participação criminal, referiu, ainda, o seguinte: - No acordo de intermediação financeira subscrito pelo assistente D….. e pela arguida B….. ficou exarado que o serviço pretendido pelos clientes era "a criação e administração de sociedade" para actuar como fiduciária-trustee e, nessa qualidade desempenhar a função de titular da propriedade e da custódia dos bens e direitos constituídos em trust; - Os Private Bankers do F....., em carta datada de 10 de Maio de 2004, reconheceram que o casal formado pelos referidos D..... e B..... eram, conjuntamente, os "beneficial owners" da sociedade "E....", isto é, "as pessoas no interesse das quais o objecto da fidúcia ou do trust vai ser realizado" (cfr. fls. 5); - Todos os serviços de investimento (recepção, transmissão e execução de ordens) sempre tiveram centralizada a sua actividade na sede de uma sucursal do F....., na cidade do Porto, na chamada "área Cayman", local onde o F..... considerou estabelecida a sede da E.... e o Seu domicílio (ref. ponto 25. da participação criminal); - A gestão dos valores imobiliários aplicados nos investimentos financeiros da E.... e as correspondentes movimentações da conta bancária sempre se localizaram na referida sede social do F.....; - As decisões mais importantes ligadas à actividade de investimento e à gestão da carteira de títulos em referência eram tomadas na sequência dos contactos mantidos entre o denunciante/investidor e o gestor de conta L....; - A substituição do gestor de conta ocorrida em meados de Outubro de 2003, para além de nunca ter sido confirmada pela área directiva do F....., preparou a dissipação dos vínculos de confiança do mandato de actividade gestória mantido com o F....., em particular com o gestor de conta, acabando por permitir o êxito da operação de transferência da quase totalidade dos activos contabilísticos da "E...."; - O gestor da conta C.... omitiu intencionalmente o dever de colher mais informações sobre transferência de valor tão elevado, tendo-se limitado "...a dar ao caso um tratamento maquinal e uma execução cega, como se esta operação de «transferência» não representasse senão um movimento escritural na conta."; - O mesmo gestor assumiu sozinho a transferência, fazendo-a em circuito fechado, não se submetendo ao controlo de um superior hierárquico, violando, assim, alguns procedimentos cautelares recomendados pela CMVM; - O gestor C.... providenciou, igualmente, a abertura da referida conta n.º 45252994647, da qual também era gestor, bem sabendo que embora a carteira estivesse formalmente titulada pela sociedade E...., devia ser administrada em benefício dos investidores; - O gestor da conta C.... exerceu uma gestão infiel da carteira de valores mobiliários pertencente à E...., na medida em que tinha obrigação de não efectuar uma operação que só pode classificar-se como de "intermediação excessiva" já que visava e abrangia a quase totalidade do valor da carteira de títulos e, por isso, tinha carácter manifestamente abusivo; - O gestor da conta C...., por decisão própria, ou em conluio com a denunciada B.... actuou da forma supra relatada, permitiu a subtracção dos títulos, contribuindo, activa e imprescindivelmente, para a consumação do crime, constituindo-se, por isso, co-autor do crime denunciado[1].

Sobre o trajecto/movimentação dos bens alegadamente furtados, aquela mesma participação e outros requerimentos posteriores (requerimento de abertura de instrução, a fls. 258 e segs. e recurso, a fls. 279 e segs.) esclareceram que: - É de admitir a hipótese do gestor denunciado ter transferido os títulos, não para a conta especificada na ordem de transferência, mas para outra ou outras que, até hoje, se desconhecem; - A "G...." , representada pela denunciada B...., em Janeiro de 2004 vendeu os títulos (parte deles) em carteira, numa ocasião em que aquela já não era representante da E....; - O saldo correspondente a tal alienação foi depositado na conta n.º 45252994647, da qual era titular a referida "G...."; - Desconhece-se o destino dos restantes títulos transferidos no valor de € 89.214,71.

***Procedeu-se a inquérito com a realização de várias diligências, nomeadamente: - A solicitação ao F..... e ao F1..... Company (Cayman) Limited, de todos os elementos bancários susceptíveis de documentarem a supra mencionada transferência de títulos no valor global de € 2.693.496,71, e, bem assim, das eventuais operações intermédias ou subsequentes à respectiva ordem de transferência, de molde a explicar o trajecto dos aludidos títulos até ao registo do valor correspondente à venda parcial dos mesmos na conta destinatária da dita transferência, ocorrido a 08 de Janeiro de 2004; - A constituição de arguidos e interrogatório dos denunciados B.... e C....; e, - A inquirição das testemunhas indicadas quer pelo assistente quer pela arguida B.....

***Findo o inquérito, passamos à análise do acervo probatório reunido nos autos.

Do conjunto da prova documental obtida e do teor das declarações prestadas pêlos arguidos, apurou-se, que: 1. Em data não concretamente apurada do mês de Novembro de 2003, - podendo tratar-se do dia 20 desse mês - a arguida B...., na companhia de uma advogada, dirigiu-se à agência do F.... sita na Rua …. onde, na qualidade de mandatária da sociedade constituída em "off-shore" denominada...

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