Acórdão nº 183/08.1PBVLG.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Abril de 2015
Magistrado Responsável | AUGUSTO LOUREN |
Data da Resolução | 15 de Abril de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Proc. nº 183/08.1PBVLG.P2 Acordam, em conferência, os Juízes da 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto, RELATÓRIO No âmbito do processo nº 183/08.1PBVLG.P2, que correu termos no 1º Juízo do Tribunal Judicial de Valongo em processo comum singular, foi o arguido B… (entre outros – não recorrentes), julgado e condenado por aquele Tribunal nos seguintes termos: - «Por tudo quanto antecede, decido:
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Absolver o arguido C… da prática, em autoria material e na forma tentada do crime de homicídio privilegiado, p. e p. pelo artigo 133º/1 e 22º, ambos do Código Penal.
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Condenar os arguidos D…, E… e B…, como co-autores materiais e na forma consumada, de um crime de ofensas à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 143º/1, 145º/1/al. a) e 2, por referência ao artigo 132º/2/al. h), todos do Código Penal e, consequentemente, condenar o primeiro arguido, D… na pena de 2 (dois) anos de prisão, e os dois arguidos E… e B… na pena, cada um, de 18 (dezoito) meses de prisão.
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Suspender a execução das penas de prisão aplicadas em b) por iguais períodos de tempo, suspensões essas com regime de prova, durante o período da suspensão determinada, nos termos do artigo 53º do Código Penal, com plano de reinserção social a elaborar pelos serviços de reinserção social e a executar pelos mesmos, durante tal período.
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Julgar totalmente improcedente o pedido de indemnização civil contra o demandado C….
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Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado pelo demandante C… e consequentemente condenar os demandados E…, D… e B… no pagamento, solidário, da quantia de € 10.000.00 (dez mil euros) a título de indemnização pelos danos não patrimoniais e a quantia de € 700.00 (setecentos euros) a título de danos patrimoniais, acrescidos de juros de mora vencidos desde a notificação para contestar do pedido cível até efectivo e integral pagamento.
As custas criminais serão suportadas pelos arguidos, E…, D… e B…, fixando-se a taxa de justiça individual em 2 U.C.
As custas cíveis serão suportadas pelo demandante C… e pelos demandados na proporção dos respectivos decaimentos- artigo 446º/1 e 2 do Código de Processo Civil e pelo demandante B… no que concerne ao pedido cível por si deduzido.
*Inconformado com a decisão, veio o arguido B… a recorrer nos termos de fls. 1.569 a 1.632, tendo apresentado as seguintes conclusões: «1. É notória a incongruência que resulta da descoordenação factual patente e da fundamentação da decisão quanto à matéria de direito.
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A prova produzida em julgamento não permite concluir que o B…, ora Recorrente, tivesse praticado, em coautoria, o crime que lhe foi sentenciado (ofensas à integridade física qualificadas); 3. Impunha-se, por lógica implicância, que o Tribunal a quo tivesse absolvido o B…; 4. Ao invés, a prova produzida em audiência de julgamento, impunha que fosse declarada a ilicitude da conduta do arguido C…; 5. O C…s, ao golpear o B… no pescoço, causando-lhe laceração da carótida, tinha consciência das características corto-perfurantes da faca com que se munira há já vários dias e da perigosidade e consequências que poderiam advir da sua utilização como arma de defesa; 6. O C… procurou atingir, como aliás atingiu, uma zona do corpo do B… de enorme vulnerabilidade, sabendo bem que o golpe desferido no pescoço poderia ser fatal; 7. Sendo certo que o arguido C… agiu para repelir uma agressão actual ou eminente, fê-lo conscientemente e com premeditação, recorrendo a meio desproporcionado e extravasando claramente o “animus deffendendi”; 8. Efectivamente, excluem a justificação dos factos praticados pelo arguido C… a utilização de meios que, embora adequados a repelir a agressão, são mais danosos (para o “agressor”) do que os considerados necessários; 9. O meio que transponha a barreira da estrita necessidade – necessidade do meio, mas também da própria defesa – entrará em excesso de legítima defesa; 10. Impõe-se, assim, a condenação do arguido C… pela prática do ilícito penal de que vinha acusado, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 22º, 33º nº1 e 133º, todos do Código Penal; 11. No que ao pedido de indemnização civil formulado pelo Demandante C… concerne, e na parte que respeita ao B…, não existindo prova da prática do crime que lhe foi sentenciado, impõe-se naturalmente que o Demandado seja absolvido; 13. No que tange pedido de indemnização civil formulado pelo Demandante B…, e atenta a factualidade provada, designadamente no que respeita aos danos de natureza patrimonial e aos danos de natureza não patrimonial sofridos pelo B…, considerando a intensidade da dor, o longo período de incapacidade a que esteve sujeito, as intervenções cirúrgicas a que foi submetido, o prejuízo estético permanente, o desgosto sofrido, a sintomatologia psicótica que sobreveio, a labilidade emocional, a permanente perturbação de stress pós-traumático e a deterioração da sua autoestima, tudo sequelas emergentes da agressão de que foi vítima, impõe-se que o mesmo seja julgado parcialmente provado e procedente, e o Demandado C… condenado a pagar ao Demandante o quantum indemnizatório em EUR 25.390,21 por ser este adequado a uma justa reparação.
Nestes termos e nos melhores de Direito que doutamente forem supridos, deverá dar-se provimento ao presente recurso e, em consequência: I. Revogar-se a douta decisão recorrida, no segmento em que condenou o arguido B… pela prática, em coautoria, do crime de ofensas à integridade física qualificadas que lhe foi sentenciado; II. Revogar-se a douta sentença, na parte em que julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado pelo Demandante C…, na parte respeitante ao Demandado B…; III. Revogar-se a douta decisão na parte em que absolveu o arguido C… da prática do crime que lhe era imputado, substituindo-se por outra que condene o dito arguido pela prática do crime de homicídio privilegiado, na forma tentada, por ser manifesto o excesso dos meios empregados em legítima defesa; IV. Revogar-se a douta decisão na parte em que absolveu o Demandado C… do pedido de indemnização civil formulado pelo Demandante B…, condenando-se aquele a pagar ao Demandante a quantia de EUR 25.390,21, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida dos juros moratórios vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento.
Assim se fará lídima Justiça».
*O Ministério Público em 1ª instância respondeu nos termos de fls. 1650, limitando-se aí a remeter para as conclusões de anterior recurso, constante de fls. 1328 a 1351 e que na ocasião foram as seguintes: «1. Vem o arguido recorrer da douta sentença na parte em que absolveu o arguido C… da prática de um crime de homicídio privilegiado tentado e julgou improcedente o pedido de indemnização civil deduzido pelo recorrente, e ainda na parte em que condenou o arguido B… pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, alegando que a mesma padece do vício de erro notório na apreciação da matéria de facto, colocando ainda em crise o entendimento que levou à absolvição do arguido C…, por ter agido em legítima defesa.
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Constitui entendimento pacífico do Supremo Tribunal de Justiça, há muito estabelecido, que não há erro na apreciação da prova quando o que o recorrente invoca não é mais do que uma discordância sua quanto ao enquadramento da matéria de facto provada, pelo que, o facto de o recorrente entender que as declarações do arguido C… e o depoimento da testemunha F… não seriam merecedores da credibilidade que lhe foi conferida pelo Tribunal não integra tal vício.
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A matéria de facto provada é suficiente para fundamentar a condenação do arguido B… pelo crime de que vinha acusado, não existindo quaisquer motivos para que a mesma seja alterada.
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A actuação do arguido C…, tal como resulta dos factos provados, foi motivada pelo intuito se defender, constituindo o único meio de resposta que tinha perante o número de indivíduos que o rodeavam, traduzindo-se num contra-ataque absolutamente necessário para afastar a agressão que era contra si perpetrada, pelo único meio capaz de rivalizar com os meios que estavam a ser empregues pelos seus agressores, pelo que nenhuma censura merece a sentença recorrida ao considerar que tal actuação configura uma situação de legítima defesa.
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Ainda que se entendesse que o arguido C… agiu em excesso de legítima defesa, o que não se concede, sempre seria a sua conduta motivada por perturbação, medo e susto não censuráveis, motivo pelo qual, nos termos do nº 2 do artigo 33º do cód. penal, não deveria ser-lhe aplicada qualquer pena.
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Quanto ao pedido de indemnização civil formulado pelo recorrente, outra não poderia ser a decisão senão a sua improcedência, atenta a não ilicitude da conduta do arguido C…, sustentada na figura da legítima defesa.
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Nenhuma censura merece, nestas partes, a sentença recorrida, que não violou nenhum dos preceitos legais invocados.
Termos em que, decidindo pela manutenção da douta sentença recorrida, nos seus exactos termos e fundamentos, farão V. Exas., como sempre, Justiça!»*Respondeu ao recorrente, o ofendido (e também co-arguido), C…, nos termos de fls. 1651 a 1660, tendo concluído nos seguintes termos: - «Não se verificou manifestamente qualquer excesso de legítima defesa, o que inequivocamente funda e determina a absolvição do arguido, ora recorrido.
No que toca ao pedido indemnizatório e tendo em conta o princípio da adesão o mesmo tem de soçobrar em consequência da total improcedência da acusação e da absolvição do recorrido.
Além disso e à cautela do patrocínio faz-se menção de que inexistem elementos factuais nos autos e igualmente na douta sentença que fundamentem a quantia ligeiramente superior a 25.000,00 (vinte e cinco mil euros) que o recorrente pretende seja fixada a título indemnizatório.
Quanto à condição do aqui recorrente no pagamento da indemnização ao recorrido, a mesma deve manter-se por ajustada.
Termos em que o recurso deve improceder in to tum, por...
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