Acórdão nº 442/13.1TTMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução27 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Procº nº 442/13.1TTMAI.P1 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 810) Adjuntos: Des. Rui Penha Des. Maria José Costa Pinto Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, instaurou a ação declarativa de condenação, com processo comum laboral contra C…, Lda.

, pedindo: a) o reconhecimento da existência de justa causa para a resolução do contrato de trabalho; b) a condenação da ré no pagamento das seguintes quantias: a. 18.000,00€ (dezoito mil euros) de indemnização pela rescisão com justa causa; b. 1.100,00€ (mil e cem euros) relativos a férias vencidas em 01/01/2012; c. 1.100,00€ (mil e cem euros) de subsídio de férias vencidas em 01/01/2012; d. 2.200,00€ (dois mil e duzentos euros) relativos a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal proporcionais ao tempo de trabalho prestado em 2012; e. 1.750,00€ (mil setecentos e cinquenta euros) relativo a crédito de horas de formação); f. 920,01€ (novecentos e vinte euros e um cêntimo) de juros de mora vencidos, bem como os vincendos desde a citação até integral pagamento.

Alega, em síntese, que desempenhou as funções de chefe de qualidade para a ré desde 01/09/2004, mediante o pagamento do vencimento mensal de 1.100,00€, acrescido de 5,30€ diários de subsídio de alimentação, mantendo simultaneamente com o único sócio e gerente da ré uma relação amorosa, vivendo ambos maritalmente. Em 04 de Agosto de 2012, o gerente da ré insultou e agrediu a autora na casa de família, situação que deu origem a um processo crime que se encontra pendente e que ditou o fim da relação, com a saída da autora da casa de morada de família. Por força da situação em causa, a autora não tinha condições para continuar ao serviço da sociedade da qual o seu companheiro era o único sócio e gerente, tanto mais que eram ambos os únicos trabalhadores da sociedade, motivo pelo qual resolveu o contrato invocando justa causa, através de carta enviada à ré em 28/08/2012. Além da indemnização pela rescisão com justa causa, pede o pagamento de diversos créditos laborais que alega estarem em dívida.

A ré contestou admitindo a existência do contrato de trabalho mas negando que a situação alegada tenha alguma relação com ele, antes sendo da esfera privada da autora e do gerente da ré, sem reflexos ao nível da relação laboral, tendo sido a autora quem deixou voluntariamente de comparecer no local de trabalho a partir do dia 04/08/2012. Mais nega os factos alegados quanto às agressões e insultos, dizendo que a autora foi ela própria também constituída arguida no processo criminal pendente. Alega que, na sequência da carta enviada pela autora, colocou à disposição desta os valores que em seu entender estariam em dívida, compensando-os, no entanto, com a indemnização devida pela autora por falta de aviso prévio, do que resultou um saldo credor a favor da ré. Deduz reconvenção contra a autora, alegando que esta se apropriou de doze caixas de mercadoria pertencentes à ré, no valor total de 21.600,00€ (vinte e um mil e seiscentos euros).

Termina pedindo a improcedência da ação e a sua absolvição dos pedidos e a procedência do pedido reconvencional, com a condenação da autora a pagar-lhe a quantia de 21.600,00€ (vinte e um mil e seiscentos euros), acrescida de juros de mora até integral pagamento.

A autora respondeu a fls. 46 e ss., negando ter-se apropriado de quaisquer caixas, antes tendo acedido a um pedido da ré no sentido de as guardar numa garagem pertença da sua mãe, mas estando tais caixas disponíveis para levantamento por parte da ré, conforme sempre a esta foi transmitido.

Por despacho de fls. 48 e ss., foi fixado o valor da ação, em €46.670,01, não foi admitido o pedido reconvencional deduzido pela ré, foi proferido despacho saneador e enunciado o objeto do litígio e os temas da prova.

Realizada a audiência de discussão e julgamento (aos 28.03.2014), com gravação da mesma, foi proferida sentença [dela constando a decisão da matéria de facto e respetiva fundamentação] que, julgando a ação parcialmente procedente, decidiu nos seguintes termos: “a) reconheço a existência de justa causa na resolução do contrato de trabalho levada a cabo pela autora B… em 28/08/2012; b) condeno a ré C…, Lda. a pagar à autora B… as seguintes quantias: a. 13.198,08€ (treze mil, cento e oitenta e nove euros e oito cêntimos), a título de indemnização pela resolução com justa causa; b. 1.100,00€ (mil e cem euros) a título de férias vencidas em 01/01/2012 e não gozadas; c. 2.178,90€ (dois mil, cento e setenta e oito euros e noventa cêntimos), a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2012; d. 1.333,50€ (mil, trezentos e trinta e três euros e cinquenta cêntimos) a título de formação profissional não prestada; sendo todas as quantias acrescidas de juros de juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde 28/08/2012 até integral pagamento.” Inconformada, a Ré (aos 02.06.2014) recorreu, tendo formulado, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: “I.

Entende a Recorrente que o tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento da matéria de facto, com relevo na aplicação do Direito, sendo que, independentemente daquele errado julgamento, outra terá de ser a solução jurídica aplicável, a qual será determinante à revogação do decidido na 1ª instância.

II.

Por tal motivo, o presente recurso versa a impugnação de matéria de facto, visando com esta a alteração de concretos pontos da matéria de facto (como concretizado no corpo da motivação deste recurso), nos termos previstos nos arts. 662.º e 640.º do NCPC, e de Direito, conforme o disposto no art. 639.º do mesmo diploma adjectivo.

III.

A Recorrente discorda da resposta afirmativa dada à matéria constante das alíneas i) a o), e consequentemente das alíneas p) a v) do relatório da sentença quanto a factos provados, por entender que nenhuma prova se encontra ou foi produzida nos termos da qual se possa concluir pela existência de uma agressão à Recorrida por parte do gerente da Recorrente.

IV.

A prova, como resulta evidenciado na motivação da douta sentença, adveio sobretudo do depoimento de duas testemunhas indicadas pela Recorrida, D… (cujo registo consta da gravação em CD, com início às 11h13m e fim às 11h30) e E… (cujo depoimento se encontra registado das 11h44 às 12h08).

V.

Porém, ouvida a gravação de tais depoimentos, constata-se que as testemunhas em causa admitem não ter presenciado qualquer agressão, apenas tendo sido capazes de corroborar a existência de um episódio de alguma discussão entre o casal, sem que nenhuma delas tenha conseguido descrever minimamente o que se terá passado, quem o terá causado, mas apenas que o calor dessa discussão terá resultado em alguma animosidade de parte a parte.

VI.

A única testemunha que presenciou grande parte da cena em causa nos presentes autos, e que ofereceu ao Tribunal um depoimento convicto, sincero e até emotivo, foi a testemunha F…, cujo testemunho, por se tratar da irmã do gerente da Recorrente, o Meritíssimo juiz reputou de “comprometido”, desconsiderando-o por completo.

VII.

A testemunha F… (cujo depoimento se encontra gravado das 14h51 às 15h06) revelou ter bem presente tudo quanto assistiu (que foi bastante!) no dia em questão, e descreveu-o de forma precisa, rejeitando frontalmente que o Sr. G… tenha agredido a Recorrida, sendo injusto e mesmo irrazoável desvalorizar um relato tão valioso do que se passou apenas e só pela circunstância de a testemunha ser irmã do Sr. G….

VIII.

Resulta cristalino de toda a prova produzida que a Recorrida não conseguiu, de forma absolutamente alguma, demonstrar ter sido vítima de agressão, seja de que tipo for, perpretrada pelo Sr. G…, factualidade essa de que a procedência da presente acção depende.

IX.

A recorrente, diante de tudo quanto deixa alegado na presente motivação de recurso, considera que foi incorrectamente julgada a factualidade constante das alíneas i) a p) do relatório da sentença referente a factos provados.

X.

Assim e, de acordo com tais elementos probatórios, deveria (e deverá) a matéria das alíneas i) a p) do relatório da sentença ser alterada e, inversamente, ser dada como não provada.

XI.

Do mesmo modo, não deveria ter sido dado como provada a matéria constante das alíneas w) a y) do relatório da sentença sob recurso, uma vez que, como resulta claro da prova testemunhal, a Recorrida desempenhava as funções para as quais foi contratada predominantemente fora das instalações da empresa, o que aliás resulta do depoimento da testemunha H… (que se encontra gravado de 14h38s03 a 14h50s58 no CD que contém as gravações da audiência), cujo posto de trabalho na Recorrente a Recorrida veio substituir.

XII.

De acordo com tais elementos probatórios, deveria (e deverá) a matéria das alíneas w) a y) do relatório da sentença ser dada como não provada.

XIII.

Acresce que todo o circunstancialismo descrito pela Recorrida diz respeito a um episódio da vida familiar e privada desta e do Sr. G…, gerente da Ré.

XIV.

Sendo que esse episódio ocorreu no domicílio e na intimidade da vida privada de ambos, e não num contexto laboral.

XV.

O empregador da Recorrida é a Recorrente e não o Sr. G….

XVI.

Em momento algum ficou demonstrado que a conduta do Sr. G…, no mencionado dia 4 de Agosto de 2012, tenha tido qualquer cariz profissional, ou que este a tomasse no exercício das suas funções.

XVII.

O comportamento com base no qual a Recorrida ancora a suposta justa causa para a resolução do seu contrato de trabalho pertence, pois, a pessoa diversa do seu empregador.

XVIII.

Não ficou sequer demonstrado (até porque a Autora nem sequer o alegou) que o mencionado desentendimento tivesse tido na sua base algum aspecto da vida profissional de ambos.

XIX.

Mesmo que nos permitíssemos tentar atribuir alguma relevância laboral a factos de índole meramente pessoal, o que só por mera cautela de patrocínio se admite, sempre se dirá que o episódio em causa, perante todos os elementos que foram carreados para o processo, nunca seria...

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