Acórdão nº 1643/13.8TBPNF-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução14 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 1643/13.8TBPNF-A.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório Por apenso à acção executiva que lhes moveu B.......... S.A., Sociedade Aberta, os executados C......... e D......... deduziram oposição à execução, alegando, em síntese, que são avalistas na livrança dada à execução, mas que a sociedade subscritora se encontra em processo de insolvência, tendo a exequente ali reclamado o seu crédito.

Por outro lado, a grua, objecto do contrato de locação subjacente à emissão da livrança, foi entregue voluntariamente à exequente, tendo esta procedido à sua venda e conseguido obter com a mesma a quantia suficiente para o pagamento da quantia exequenda (em débito), bem como para cobrir o valor das rendas que se venceriam no caso de cumprimento do contrato.

Contestou a exequente, sustentando não existir fundamento para a oposição, por os avalistas não poderem opor ao exequente a circunstância de o devedor solidário estar insolvente, tal como o risco contratual de obter benefício ou prejuízo com a venda de equipamentos alugados, diz apenas respeito ao proprietário, neste caso o exequente.

Pedem ainda a condenação dos executados por litigância de má-fé.

Foi proferida sentença julgando a oposição improcedente.

Inconformados, apelaram os executados, apresentando as seguintes conclusões: «1. O aval constitui uma obrigação materialmente autónoma, embora dependente quanto ao lado formal, uma vez que a lei estabelece o princípio de que a obrigação do avalista se mantém, ainda que a obrigação garantida seja nula e abre uma única excepção a este princípio para o caso de a nulidade desta segunda obrigação provir de um vício de forma.

  1. A verdade é que, no caso em apreço, o título que serve de base à execução se transmudou e agora passou a existir um novo título (sentença de homologação do plano de recuperação).

  2. Logo, o facto de as obrigações se encontrarem regularizadas no âmbito de um plano, não podem ser exigidas de forma diversa aos avalistas – até porque nem existe incumprimento, podendo, neste caso, o avalista pode opor e socorrer-se das excepções que poderia opor o avalizado.

  3. No caso concreto e com a aprovação e homologação do plano nasce uma nova dívida suportada num novo título, com novos valores, prazos e garantias (a grande maioria das vezes, com a consentimento do próprio credor – instituição financeira – o que, efectivamente sucedeu no caso em apreço).

  4. Não faz sentido permitir que, ao mesmo tempo e fazendo tábua rasa dessa negociação e declaração de vontades, venha o credor executar o avalista pela totalidade da dívida, de forma diferente que aprovou no plano de insolvência.

  5. Não podemos deixar de entender que tal alteração se repercute necessariamente na relação processual estabelecida entre o credor/exequente e o avalista sendo fundamento válido de oposição no processo executivo instaurado contra este (a quem cabe, no âmbito do processo executivo, invocar a existência de causa superveniente conexa com a modificação da obrigação tornando-a inexigível por ainda não ter decorrido o prazo de seu cumprimento.) 7. Tal situação não é aceitável sendo contrária aos princípios gerais e fundamentais do nosso direito e vigentes na ordem jurídica comunitária.

  6. Somos de concluir que, para além de tudo o exposto, estarmos, neste segmento, perante uma causa de extinção da instância, por impossibilidade ab initio da lide, ou seja, da instância executiva e, na sua decorrência, da presente instância, que se mostra dependente daquela.

  7. Prescreve o artigo 334º do CCivil “É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa -fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.

  8. No caso em apreço, no exercício da sua actividade creditícia, o exequente/ Recorrido, e a devedora originária celebraram um contrato de locação financeira, em que os executados/ora Recorrentes deram o seu bom aval.

  9. Atenta a insolvência da devedora originária/insolvente, os executados entregaram voluntariamente o objecto que esteve na base da celebração daquele negócio jurídico.

  10. À data da entrega do bem, os executados deviam à exequente o montante de € 9.920,63.

  11. A exequente, ora Recorrida vendeu a grua pelo montante de € 22.140,00 (com IVA).

  12. Ora, salvo opinião em contrário, é nosso entendimento de que a actuação do exequente/ora Recorrido após a venda da grua, tendo recuperado todo o montante em dívida, configura uma situação de abuso de direito, na modalidade de desequilíbrio no exercício de direito.

  13. O abuso de direito na modalidade do desequilíbrio entre o exercício do direito e entre os efeitos dele derivados, abrange subtipos diversificados, nomeadamente o do exercício de direito sem qualquer benefício para quem o exerce, porém com dano considerável a outrem, o da actuação dolosa daquele que vem exigir a outrem o que lhe deverá restituir logo a seguir e o da desproporção entre a vantagem obtida pelo titular do direito exercido e o sacrifício por ele imposto a outrem.

  14. A executoriedade do direito do exequente/Recorrente no nosso modesto entender, acarretaria consequências perversas para os ora executados/Recorridos, pois além de ficarem na indisponibilidade daquele bem, mantinham-se na obrigação de pagamento por incumprimento do contrato de locação financeira o montante de € 10.017,78., quando o exequente já beneficiou com a venda daquele bem o montante de € 22.140,00.

  15. O contrato de locação financeira outorgado foi colocado ao serviço de uma específica condição - o aluguer e tendencialmente, o contrato de compra e venda da Grua.

  16. Com o incumprimento da prestação sinalagmática, por banda da devedora originária, o resultado visado pelo negócio jurídico deixou de existir.

  17. No entanto, não obstante esse facto se revelar uma perda para os executados, certo é que para o credor se mostrou de grande utilidade, pois conseguiu vender o bem pelo preço de € 22.140,00, pelo que deverá, forçosamente ser considerado e contabilizado, abatendo ao passivo global.

  18. Cientes de que não se pode generalizar e/ou vulgarizar o recurso à figura do abuso do direito, entendemos, salvo melhor opinião, que haverá, do tudo o exposto, de concluir que, no caso em apreço, existe manifesto abuso do direito por parte da exequente/Recorrida, pelo que, por força do disposto no artigo 334º do CCivil, se deverá considerar extinto o direito que esta pretendia fazer valer com a interposição da acção executiva contra os avalista/Recorrentes.

  19. Mesmo que assim não se entenda, o desequilíbrio no particular exercício deste direito de crédito pelo exequente, ora Recorrido encontra também cobertura no princípio do enriquecimento sem causa previsto no artigo 473º e ss do C. Civil.

    Nestes termos e nos melhores de Direito que V/ Excelência mui doutamente suprirá, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida, por ilegal, substituindo-a por outra que atenda à pretensão dos ora Recorrentes, nos termos exposto, em conformidade com o direito substantivo a aplicar, Far-se-á Sã JUSTIÇA» Não foram apresentadas contra-alegações.

  20. Fundamentos de facto A 1.ª instância considerou provados os seguintes factos, que não foram objecto de impugnação: 1. Entre o Exequente e a sociedade E......... – Construções, S.A. foi celebrado um acordo que denominaram «contrato de locação financeira nº 10020001», constante de fls. 15 e 16, com as condições particulares de fls. 19 e 20, que aqui se dá por reproduzido, através do qual a exequente cedeu àquela o gozo temporário do equipamento descrito a fls. 28 (Grua Potain), adquirida por indicação da sociedade E........., nos termos do qual aquela estava obrigada ao pagamento de 60 rendas mensais, a primeira no valor de € 5.200,00 e as outras 59 no valor de € 925,09, cada, com indicação que findo este período poderia ser adquirida pela requerida pelo valor residual acrescidos dos encargos e impostos que forem devidos.

  21. Para garantia das responsabilidades do contrato referido em 1., foi entregue à exequente o documento dado à execução (livrança), com...

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