Acórdão nº 718/07.7TAVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelELSA PAIX
Data da Resolução04 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 718/07.7TAVFR.P1 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira Acordam, em Conferência, os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO No 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira, no processo comum singular nº 718/07.7TAVFR, foi submetido a julgamento o arguido B…, tendo sido proferida decisão com o seguinte dispositivo: Nos termos expostos, decido: 1).

Condenar o arguido B…, pela prática de um crime de atos proibidos em caso de incumprimento do contrato, previsto e punido pelos artigos 467.º do Regulamento do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, por referência ao artigo 301.º, n.º 1, alínea e), do mesmo diploma legal, na pena de nove (9) meses de prisão.

2).

Substituir a pena de prisão aplicada pela pena de pena de 270 (duzentos e setenta) dias de multa, à taxa diária de € 10 (dez euros), o que perfaz o montante global de € 2.700 (dois mil e setecentos euros).

3).

Declarar parcialmente extinta a instância cível conexa, por inutilidade superveniente da lide, no que concerne ao pedido de condenação do demandado civil no pagamento da quantia € 8.295,10 (oito mil duzentos e noventa e cinco euros e dez cêntimos), acrescida dos juros de mora legais, correspondente ao valor das retribuições não pagas.

4).

Condenar o arguido e demandado civil B… a pagar à demandante civil C… da quantia de € 1.000 (mil euros) a título de compensação pelos danos não patrimoniais.

5). Condenar o arguido nas custas criminais do processo, fixando a taxa no mínimo legal.

6). Condenar o demandado civil nas custas cíveis do processo (artigos 523.º do Código de Processo Penal, 446.º, n.º 1, e 447.º, do Código de Processo Civil).

*Remeta, após trânsito, boletim ao registo criminal.

*Notifique e deposite.

***Inconformado com a sentença condenatória, o arguido veio interpor recurso, terminando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição): - O douto acórdão ora recorrido condenou o recorrente pela prática, em autoria material, de um crime de atos proibidos em caso de incumprimento de contrato, previsto e punido pelo disposto no artigo 467° do Regulamento do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 35/2004, de 29/07, por referência ao artigo 301, nº 1, al. e), do mesmo diploma legal, correspondendo atualmente ao crime previsto e punido pelo artigo 324º, n° 3 do Código do Trabalho, na redação da Lei 7/2009, de 12/02, por referência ao disposto no artigo 313°, n° 1, al. e) do mesmo diploma legal, - Na pena de 9 meses de prisão, substituída pela pena de 270 dias de multa, à taxa diária de € 10 (dez euros), e também condenado a pagar à demandante civil C…, a quantia de €1000 (mil euros), a título de compensação pelos danos não patrimoniais, e ainda, nas custas criminais e cíveis do processo; - O recorrente não se conforma com a douta decisão proferida porque a mesma não interpretou, de forma adequada e razoável, o artigo 467° do Regulamento do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 35/2004, de 29/07, por referência ao artigo 301, nº 1, al. e), do mesmo diploma legal, correspondendo atualmente ao crime previsto e punido pelo artigo 324º, n° 3 do Código do Trabalho, na redação da Lei 7/2009, de 12/02, por referência ao disposto no artigo 313°, n° 1, al. e) do mesmo diploma legal e 71º do Código Penal; - Julgou incorretamente determinados pontos da matéria de facto; - Não fez a aplicação do princípio “in dubio pro reo”; - A matéria de facto dada como provada é manifestamente insuficiente para se poder concluir, como o fez o douto acórdão recorrido, que se verificou a prática de um crime de atos proibidos em caso de incumprimento de contrato; - Com referência ao recorrente, a ofendida C…, prestou depoimento que é pouco claro, impreciso e incoerente, que apenas se limitou a dizer que não tinha recebido os seus salários, e que todos os outros funcionários, nas mesmas datas, os receberam.

- Declarações das testemunhas (prova) designadamente, os depoimentos produzidos por D…, E…, F…, que impõem uma decisão diversa da ora proferida; - Devem, os depoimentos destas testemunhas ser considerados e, em consequência, a decisão ora impugnada deve ser alterada; - Deve, pois, ser reapreciada a prova gravada; - Para a condenação do recorrente, considerou o Tribunal, no douto acórdão proferido, fundamentalmente apenas o depoimento da ofendida, o que não se pode aceitar; - Não tendo valorado, como o devia, o depoimento das testemunhas D…, E…, F…; - Que, quando muito, sempre levariam à aplicação do princípio “in dubio pro reo”; - Não estão, pois, salvo o devido respeito, preenchidos os elementos constitutivos, quer objetivos quer subjetivos, do crime de atos proibidos em caso de incumprimento de contrato; - Por fim, o douto acórdão proferido, na determinação da medida da pena, valorou, indevidamente, as circunstâncias que depõem a desfavor do recorrente, designadamente, tendo em atenção os princípios da adequação, da proporcionalidade, da necessidade e da razoabilidade das penas; - Pelo que, deve ser revogado o douto acórdão proferido, absolvendo-se o arguido do crime de atos proibidos em caso de incumprimento de contrato de que foi acusado e condenado; - E, consequentemente, absolvendo-se igualmente o arguido do pedido de indemnização civil em que foi condenado; - Se assim não se entender, o que apenas por mera hipótese académica se concede, deve a medida da pena aplicada ser alterada, e, consequentemente, reduzida.

NESTES TERMOS Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se o douto acórdão proferido, substituindo-se o mesmo por outro que absolva o recorrente; Caso assim não se entenda, deve a medida da pena aplicada ser alterada, e, consequentemente, reduzida.

***O recurso foi admitido (cfr. despacho de fls. 495).

***Em resposta ao recurso, o Ministério Público pugnou pela sua improcedência.

***Nesta Relação, o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto, acompanhado a posição do Ministério Público na 1ª instância, emitiu parecer no sentido de que a “sentença recorrida não merece qualquer censura, devendo, por isso, ser totalmente confirmada”.

***Cumpriu-se o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, não tendo sido apresentada resposta.

***Efetuado exame preliminar e, colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência.

***II – FUNDAMENTAÇÃO Passemos agora ao conhecimento das questões alegadas no recurso interposto da decisão final proferida pelo tribunal singular.

Para tanto, vejamos, antes de mais, o conteúdo da decisão recorrida.

Segue-se a enumeração dos factos provados, não provados e respetiva motivação, constantes da sentença recorrida (transcrição): FUNDAMENTAÇÃO Matéria de facto provada Da discussão da causa resultou provada a seguinte matéria de facto: Da acusação pública: a).

Desde o momento da constituição da sociedade “G…, Lda.” e concretamente durante os anos de 2006 e 2007, a gerência de direito e de facto de tal sociedade encontrava-se a cargo do arguido B… que assim se encarregava de todos os assuntos atinentes ao normal exercício da atividade da sociedade que dirigia competindo-lhe, em exclusivo, todas as decisões relativas à gestão comercial e financeira da empresa, incluindo as obrigações para com o Fisco e com a Segurança Social, bem como o pagamento dos salários aos trabalhadores.

b).

A ofendida C… foi admitida ao serviço da sociedade “G…, Lda.” em novembro de 2004, assinando contrato de trabalho que, em representação da entidade patronal, foi outorgado pelo arguido.

c).

A ofendida manteve-se ao serviço da referida entidade patronal até ao final do mês de maio de 2007, altura em que o contrato de trabalho veio a ser rescindido pela ofendida com justa causa.

d).

Durante tal período, para além da ofendida C…, a referida entidade patronal mantinha igualmente ao seu serviço, pelo menos, mais quatro trabalhadores, entre os quais, E…, D… e F….

e).

Face a alguns atrasos pontuais no pagamento da retribuição, a ofendida foi confrontando o arguido com tais atrasos, passando a exigir-lhe o pagamento atempado da retribuição devida, bem como os acréscimos legais devidos pela prestação de trabalho suplementar.

f).

Descontente com as exigências apresentadas pela ofendida, o arguido decidiu deixar de proceder ao pagamento do salário devido à mesma, não obstante proceder ao pagamento da retribuição devida aos demais trabalhadores.

g).

Assim, tendo pago à ofendida a retribuição referente ao mês de dezembro de 2006, o arguido deixou de lhe pagar as retribuições referentes aos meses de janeiro, fevereiro, março, abril e maio de 2007.

h).

Não obstante, nos indicados meses de janeiro, fevereiro, março, abril e maio de 2007 o arguido procedeu ao pagamento das retribuições devidas aos demais trabalhadores.

i).

O arguido, enquanto gerente da sociedade entidade patronal da ofendida, sabia que estava obrigado a proceder ao pagamento integral do salário devido à ofendida e demais trabalhadores.

j).

Sabia igualmente que, ainda que sociedade por si representada não dispusesse dos necessários fundos para proceder ao pagamento integral das remunerações devidas a todos os trabalhadores, os fundos disponíveis para tal fim deveriam ser distribuídos por todos os trabalhadores na proporção dos respetivos salários, o que não aconteceu.

k).

Estava pois o arguido ciente que não poderia omitir totalmente o pagamento do salário devido à ofendida, ao mesmo tempo que pagasse ainda que apenas parcialmente os salários devidos aos demais trabalhadores.

l).

Assim, atuou o arguido de forma livre, deliberada, premeditada e consciente, com o propósito que concretizou de omitir por completo o pagamento do salário devido à ofendida C…, bem sabendo que dessa forma violava a obrigação que sobre si impendia de proceder ao pagamento pontual da retribuição devida à ofendida e que ao assim proceder prejudicava-a relativamente aos demais colegas de trabalho, junto de quem sempre cumpriu com tal obrigação.

m).

Sabia igualmente o...

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