Acórdão nº 13932/13.7TDPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelANA BACELAR
Data da Resolução11 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I. RELATÓRIO No processo comum n.º 13932/13.7TDPRT, da Comarca do Porto, Porto – Instância Local – Secção Criminal, J3, por decisão judicial datada de 15 de maio de 2015, foi remetido para os meios comuns o conhecimento do pedido de indemnização civil nele formulado pelo Instituto da Segurança Social, I.P., contra a Companhia de Seguros “B…, S.A.” Inconformado com tal decisão, o Instituto da Segurança Social, I.P. dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «1. Uma vez que o comportamento que consubstancia responsabilidade penal é também gerador de responsabilidade civil, a prova produzida e gravada no âmbito da acção penal serve ambos os propósitos – civil e penal – pelo que a remessa da questão civil para os meios comuns implica uma duplicação inadmissível de diligências probatórias, atentando contra o princípio da economia processual.

  1. A questão suscitada pelo pedido de indemnização cível parece ser, salvo melhor opinião, manifestamente fácil de apreciar uma vez que a por força do disposto no artigo 369.º do Código Civil a certidão comprovativa dos valores pagos e que se pretendem reembolsar é um documento autêntico e por força do disposto no artigo 371.º do Código Civil faz prova plena dos factos que refere como praticados pelo ISS, IP/CNP.

  2. Assim, à semelhança do que tem acontecido em centenas de outros processos o Tribunal normalmente dá esses factos como provados, a menos que seja alegada e demonstrada a falsidade do documento autêntico (coisa rara dado que na prática nunca aconteceu no que se reporta ao ISS,IP) e vai decidi-los de acordo com toda a matéria probatória produzida em julgamento, até porque é comumente sabido que no pedido de reembolso dos autos, em conformidade com o que sempre foi feito, o ISS, IP limita-se a aderir e a reproduzir os factos constantes da acusação do Ministério Público. Por outras palavras, o ISS, IP não traz novas questões na medida em que o seu pedido de reembolso está dependente do resultado da acusação e a única questão que traz já é velha e fácil de apreciar pois resulta da prova produzida por um documento autêntico relativamente aos valores antecipados pela morte do beneficiário.

  3. Ora, isso significa que estamos perante uma questão que acima de tudo não gera qualquer atraso nos Tribunais, na medida em que a procedência do pedido de reembolso e a sequente condenação dos terceiros responsáveis depende de duas coisas: da prova produzida em julgamento conforma acusação do Ministério Público (há aqui um aproveitamento total dos factos vertidos na acusação por parte do ISS, IP dado que esta entidade não acrescenta qualquer facto novo que influencie a decisão relativa ao acidente que gerou a morte do beneficiário); da prova de um documento autêntico que faz prova plena (o caso da certidão de valores pagos).

  4. Por esse motivo quer-nos parecer, salvo melhor opinião, que não existe qualquer fundamento válido para se não conhecer do pedido cível tempestivamente deduzido, remetendo-o para os meios comuns.

  5. Até porque admitindo-se o incidente referido no caso, sempre cumpre referir que em caso algum este iria retardar intoleravelmente o procedimento criminal até porque até ao dia designado para a audiência de julgamento de 01/10/2015b decorreria tempo mais do que suficiente para ser feita a notificação exigível e por isso é bastante previsível que muito antes da data do julgamento tudo ficaria resolvido.

  6. O despacho recorrido violou as regras constantes dos artigos 71.º do CPP, o princípio da economia processual e o dever de fundamentação previsto no artigo 97.º, n.º 5 do CPP.

  7. A fundamentação utilizada no despacho é, salvo melhor opinião, deficiente por considerar que por base num mero incidente se justifica remeter as partes para os Tribunais Civis.

  8. A fundamentação é deficiente por não se alicerçar corretamente no disposto no n.º 3 do artigo 82.º, na medida em que inverte absolutamente a sua lógica por se basear num mero incidente para fundamentar o atraso no decurso da audiência, quando em alternativa deveria verificar a data em que estava marcado o julgamento e fazer a análise se aquilo que se impunha fazer seria ou não susceptível de retardar intoleravelmente o processo penal. Ao fazê-lo o Tribunal decidiu contra legem.

  9. Significa que não se encontra, nem parece ser possível fundamentar, a existência de qualquer desvantagem para o processo penal, pois o pedido de reembolso e o referido incidente, conforme melhor demonstrado supra, pela sua simplicidade não o retarda intoleravelmente.

  10. De resto, tendo o ISS, IP junto um documento autêntico a provar os montantes pagos para que possa ser ressarcido, não havia qualquer fundamento razoável para supor que a resolução das questões suscitadas pelo pedido de indemnização geraria incidentes que retardariam intoleravelmente o processo penal, nem parece fazer sentido uma sentença surpresa como esta ora em análise.

  11. Face ao exposto, conclui-se que o despacho recorrido, ao remeter as partes para os tribunais civis, violou o disposto no artigo 71.º e no n.º 3 do artigo 82.º, ambos do CPP.

  12. O despacho recorrido violou ainda os artigos 97.º, n.º 5, 118.º e 123.º do CPP.

  13. Mais grave ainda, o despacho recorrido viola expressamente o artigo 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 59/89, de 22 de fevereiro, porquanto existe norma expressa para que o pedido de reembolso seja feito diretamente na ação penal. Por outro lado, em caso algum poderá haver remessa para o processo civil, porque contrariamente ao que acontece no processo-crime em que o Centro Nacional de Pensões é tido como lesado nos termos e para os efeitos do artigo 74.º do CPP e faz pedido de reembolso sem precisar de se encostar ao pedido civil das partes, no processo civil já não é assim, dado que nesse caso o pedido de reembolso está dependente do pedido de indemnização civil (leia-se os artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 59/89, de 22 de fevereiro).

  14. Significa que o Tribunal a quo ao remeter o ISS pata o Tribunal Civil não avaliou da (im)possibilidade de concretização do despacho por violação dos artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 59/89, de 22 de fevereiro e parece-nos, salvo melhor opinião, que estava obrigado a fazê-lo.

  15. Por outras palavras, ao fazê-lo o Tribunal a quo está a negar a possibilidade de o ISS ser ressarcido através d aplicação do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 59/89, de 22 de fevereiro, em conformidade com o que se tem feito ao longo dos anos em milhares de processos idênticos a este.

  16. E se realmente a remessa para o Tribunal Civil for impossível (que é o que nos parece da leitura do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 59/89, de 22 de fevereiro) está-se a negar o direito constitucional à tutela jurisdicional efectiva (artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa).

  17. Assim, o despacho deverá também ser declarado violador dos artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 59/89, de 22 de...

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