Acórdão nº 174/14.3SJPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelRENATO BARROSO
Data da Resolução25 de Novembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. 174/14.3SJPRT.P1 1ª Secção ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 1. RELATÓRIO A – Decisão Recorrida No processo comum singular nº 174/14.3SJPRT, da Instância Local de Aveiro, Secção Criminal, J3 o M.P. deduziu acusação contra o arguido B…, da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, p.p., pelo Artº 203 nº1 do C.Penal.

Produzida a prova, foi proferida sentença, na qual se declarou extinto o procedimento criminal, por força das disposições combinadas dos Artsº 207 nº1 al. b) do C. Penal e 48 e 50, ambos do CPP.

B – Recurso Inconformado com o assim decidido, recorreu o M.P., tendo concluído as suas alegações da seguinte forma ( transcrição ): 1 – O arguido B… foi absolvido da prática de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do Código Penal, com base no despacho proferido nos presentes autos, no dia 19 de Março de 2015, em sede de audiência de discussão e julgamento que considerou que os factos pelos quais o arguido vinha acusado integram a prática de um crime de furto formigueiro, p. e p. pelo artigo 207.º, alínea b) do Código Penal; 2 – Encontrava-se o arguido acusado da prática de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do Código Penal, porquanto, em súmula, no dia 19-03-2014, cerca das 10.50, dirigiu-se ao estabelecimento comercial “C…”, sito na Rua…, pertencente à “D…, Lda”, e chegando a um expositor de produtos retirou um pacote de vinho no valor de €0,99 e saiu do estabelecimento sem efectuar o respectivo pagamento.

3 – O Tribunal ad quo optou assim por integrar os factos no disposto no artigo 207.º, alínea b) do Código Penal, o que não concordamos:.

4 – O furto simples assume a natureza de crime particular quando a coisa furtada for de valor diminuto e for destinada a utilização imediata e indispensável à satisfação de uma necessidade do agente ou de um dos seus familiares enunciados na alínea b) do artigo 207º do Código Penal.

5 – São pois três os requisitos exigíveis: - o valor diminuto, - a pretensão de utilização imediata - e a indispensabilidade da coisa para a satisfação de uma necessidade do agente ou de um dos indicados familiares.

6 – Ao incluir na incriminação deste “crime formigueiro” na categoria dos crimes de acusação particular, o legislador teve em vista a premência da satisfação de necessidades básicas do agente, pelo que o tipo se refere, essencialmente, a coisas comestíveis, bebidas, em pequena quantidade e de pequeno valor, para utilização imediata do agente.

7 – Não se põe em causa o valor diminuto do pacote de vinho que foi subtraído pelo arguido pois este, mesmo tendo em conta o preço de venda ao público, tinha um valor muito inferior a 102,00 € (alínea c) do artigo 201º do Código Penal) 8 – Também não se pões em causa os hábitos alimentares de ingestão de bebidas alcoólicas que, de acordo com as regras de experiência comum, se deva considerar que o pacote de vinho se destinava a ser consumido a curto prazo pelo agente. Destinava-se, por isso, à sua utilização imediata.

9 – A questão que se suscita é a de saber se o pacote de vinho era indispensável à satisfação de uma necessidade do agente.

10 – Considerou o Tribunal Ad quo encontrar-se preenchido este requisito, porquanto o arguido mantinha na referida data hábitos de consumo imoderado e muito frequente de bebidas alcoólicas, adquirindo praticamente com frequência diária pacotes de vinho no referido supermercado. Na data em causa, estava a sentir grande desconforto em razão da privação de álcool e não tinha dinheiro. Consumiu imediatamente o pacote de vinho que retirou.

11 – Com o conceito de “necessidade básica” parece-nos que o legislador visou referir-se a uma satisfação de uma necessidade básica da pessoa (a fome, a sede); apesar de o arguido consumir álcool em excesso afigura-se-nos não ser de enquadrar um pacote de vinho numa “necessidade básica”. Caso contrário, o tipo está aberto a todo o tipo de furtos considerados “necessidade básica” do ponto de vista do agente, por exemplo: um toxicodependente que furta medicamentos numa farmácia, de valor diminuto, com vista a atenuar os efeitos da privação de drogas; 12 – No Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, Processo:7216/2008-3 de 19-09-2008 considerou-se que “É apenas necessário que se trate de um...

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