Acórdão nº 4666/11.8TBMAI-AA.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA
Data da Resolução23 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso de Apelação Processo n.º 4666/11.8TBMAI-AA.P1 [Comarca Porto/Inst. Central/Santo Tirso/Sec. Comércio] Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto: I.

No processo de insolvência de B…, uma vez transitada em julgado a sentença que declarou a insolvência e aprovada pelos credores a passagem à fase da liquidação do activo, vieram C… e D…, após a realização das diligência de liquidação, requerer o seguinte: “1. Os requerentes são filhos da insolvente (conforme certidões de nascimento que protestam juntar).

  1. Como resulta dos autos, é conhecido por todos os sujeitos processuais que a insolvente tem dois filhos, os ora requerentes.

  2. Os requerentes não foram notificados pelo douto Tribunal ou pelo Exmo. Senhor Administrador de insolvência nomeado, que o imóvel vendido, ia ser objecto de venda.

  3. Imóvel esse que constitui a casa de morada de família onde residem com os pais e os avós maternos, pessoas estas de idade avançada e com graves problemas de saúde.

  4. Tão pouco o foram para, querendo, exercerem o direito de remição.

  5. Estabelece o artigo 913º n.º 1, alínea b), do CPC, que, fora das situações previstas para a venda por propostas em carta fechada, o direito de remição pode ser exercido até ao momento da entrega dos bens ou da assinatura do título que a documenta.

  6. Por força da sua relação de parentesco, ao abrigo do artigo 912º do CPC, ex vi artigo 17º do CIRE, é ainda reconhecido aos requerentes o direito de remição sobre os bens adjudicados ou vendidos da insolvente.

  7. Caso tal negócio seja anulado, terá de ser assinado o respectivo título de transmissão e, nessa eventualidade, as requerentes estão em tempo para exercer o direito de remição.

  8. Pelo que, vêm os requerentes exercer o seu direito de remição requerendo-se para efectivação do seu direito quanto a tal bem, as necessárias notificações para efectivação do seu direito.

Nestes termos nos melhores de direito e ao abrigo do artigo 912º do Código de Processo Civil, requer a anulação da venda e a remição do bem vendido nos presentes autos.” (sublinhados nossos).

Sobre este requerimento foi proferido o seguinte despacho: “(…) No que se refere ao requerimento de C… e D…, arrogando-se a qualidade de filhos da insolvente (qualidade que, em rigor, não demonstram, apesar de o terem protestado fazer), o mais que há a dizer é que não são partes intervenientes no processo, pelo que nenhuma notificação/comunicação lhes deveria ter sido efectuada.

É certo que, sendo descendentes da insolvente, lhes assistiria o direito de remir o bem vendido/ adjudicado, nos termos dos arts. 842 e ss. do Código de Processo Civil. Porém, tal direito deveria ter sido exercido até ao momento da assinatura (escritura pública) do título que documenta a transmissão do bem (art. 843 nº 1 al. b) do Código de Processo Civil). Não o tendo feito até esse momento, deixa tal direito de poder ser exercido.

Também a este respeito não se mostra cometida qualquer nulidade, pois que tendo os descendentes direito de remissão não têm que ser notificados para, querendo, exercerem tal direito. Com efeito, como se decidiu no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15 de Dezembro de 2010, disponível em www.dgsi.pt, ainda que em relação ao anterior Código de Processo Civil mas que, nessa matéria, se mantém com o Novo Código de Processo Civil, “o direito de remição é o direito que a lei confere a certas pessoas da família do executado (cônjuge, descendentes e ascendentes) de haverem para si, na acção executiva, os bens adjudicados ou vendidos pelo preço da adjudicação ou da venda – cf. art. 912 do Cód. do Proc. Civil. Pode ser exercido até ao momento da entrega dos bens ou da assinatura do título que a documenta, conforme decorre do disposto no art. 913, nº 1, al. b) do Cód. do Proc. Civil. Assim, tal significa que, tendo-se efectuado a escritura pública de cessão de quinhões hereditários em 9.12.2008, o pedido de remição que se contém no requerimento apresentado em 28.5.2009 é manifestamente intempestivo. Por outro lado, deverá assinalar-se, tal como se fez no despacho recorrido, que do art. 912 do Cód. do Proc. Civil não resulta que as pessoas que sejam titulares do direito de remição devam ser notificadas para o exercer.” Pelo exposto, … julgo improcedentes as arguições de irregularidades/nulidades suscitadas …por C… e D....” Do assim decidido, os mencionados requerentes interpuseram recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões:

  1. Os requerentes são filhos da insolvente, como resulta dos autos.

  2. Dos mesmos autos, decorre também que esse facto é conhecido por todos os sujeitos processuais.

  3. Os requerentes não foram notificados pelo douto Tribunal ou pelo Exmo. Senhor Administrador de insolvência nomeado, que o imóvel apreendido, ia ser objecto de venda.

  4. Imóvel esse que constitui a casa de morada de família onde residem com os pais e os avós maternos, pessoas estas de idade avançada e com graves problemas de saúde.

  5. Tão pouco o foram para, querendo, exercerem o direito de remição.

  6. Estabelece o artigo 913º n.º 1, alínea b), do CPC, que, fora das situações previstas para a venda por propostas em carta fechada, o direito de remição pode ser exercido até ao momento da entrega dos bens ou da assinatura do título que a documenta.

  7. Por força da sua relação de parentesco, ao abrigo do artigo 912º do CPC, ex vi artigo 17º do CIRE, é ainda reconhecido aos requerentes o direito de remição sobre os bens adjudicados ou vendidos da insolvente.

  8. Caso tal negócio seja anulado, terá de ser assinado o respectivo título de transmissão e, nessa eventualidade, os requerentes estão em tempo para exercer o direito de remição.

  9. Pelo que, os requerentes quando tomaram conhecimento da venda, exerceram o seu direito de remição requerendo que para efectivação do seu direito teriam que ser notificados para o fazer e não foram.

  10. A razão da dúvida reside no facto se aquele direito se reconhecer no processo de execução – singular – mas não, ao menos expressamente, na venda em processo de falência ou de insolvência. Como a remição é, nitidamente, um privilégio de carácter excepcional, parece só dever ser admitido nos casos em que a lei claramente o estabelece.

  11. Mas a boa doutrina é a de que o direito de remição pode ser exercido em processo de insolvência.

  12. E para esta conclusão podem ser dadas múltiplas e probantes razões.

  13. O direito de remição pressupõe, sempre, uma venda coactiva ou forçada de bens do devedor, com a finalidade de com o produto da sua venda se dar satisfação aos credores.

  14. Mas a estes é de todo indiferente a origem do dinheiro com que vão ser pagos os seus créditos: quer o dinheiro provenha dos compradores ou antes do cônjuges, descendentes ou ascendentes do devedor, para os credores é a mesma coisa.

  15. Com a actuação do direito de remição, os credores não sofrem qualquer prejuízo, pois que pouco lhes importa que o adquirente seja uma pessoa da família do devedor ou uma pessoa estranha: a única coisa que verdadeiramente lhes interessa é o preço por que os vens são vendidos e é esse preço que os remidores hão-de pagar.

  16. Neste contexto, dada a razão que anima o direito de remição, este deve ser admitido quando a venda de bens tenha o carácter coactivo de que se reveste no processo de execução – e outra não é, decerto, a feição da venda em processo de falência ou de insolvência: é uma venda executiva, forçada, consequente à apreensão dos bens do devedor para a massa.

  17. O processo de insolvência mais não é que uma execução colectiva ou universal (art.º 1 nº 1 do CIRE).

  18. Na acção executiva promove-se, em geral, a realização coactiva de uma única prestação contra um único devedor e, em observância de um princípio de proporcionalidade, apenas são penhorados e excutidos os bens do devedor que sejam suficientes para liquidar a dívida exequenda (artºs 735 nº 3 e 813 nº 1 do nCPC). Esta execução distingue-se do processo de insolvência que é uma execução universal, tanto porque nela intervêm todos os credores do insolvente, como porque nele é atingido, em princípio, todo o património deste devedor (artºs 1 nº 1, 47 nºs 1 a 3, 128 nºs 1 e 3 e 149 nºs 1 e 2 do CIRE).

  19. Como o devedor se encontra em situação de insolvência, quer dizer, impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas, todos os credores, podem reclamar os seus créditos e todo o património do devedor responde pelas suas dívidas (art.º 3 nº 1 do CIRE).

  20. Na execução singular, um credor pretende ver satisfeito o seu direito a uma prestação; esse credor necessita de uma legitimação formal, que é um título executivo e se o devedor for solvente obtém na acção executiva a satisfação do seu crédito (art.º 10 nºs 4 e 4 do nCPC).

  21. No processo de insolvência podem apresentar-se todos os credores do insolvente, ainda que não possuam qualquer título executivo, porque todos eles podem concorrer ao pagamento rateado do seu crédito, através do produto apurado na venda de todos os bens arrolados para a massa insolvente.

  22. O processo de insolvência baseia-se na impossibilidade de o devedor saldar todas as suas dívidas e, portanto, orienta-se por um princípio de distribuição de perdas entre os credores.

  23. Mas para que possa iniciar-se a liquidação total do património do devedor é absolutamente indispensável que o tribunal emita uma sentença que o declare em estado de insolvência.

  24. Quer dizer: a sentença é o único título executivo susceptível de servir de base à execução...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT