Acórdão nº 5046/13.6TBVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Junho de 2015
Magistrado Responsável | FERNANDO SAM |
Data da Resolução | 23 de Junho de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo n.º 5046/13.6TBVFR.P1 Da Comarca de Aveiro – Núcleo de Santa Maria da Feira - Instância Central – 2.ª Secção Cível - J1, à qual foi redistribuído após a extinção do 3.º Juízo Cível da comarca da mesma localidade, onde dera entrada em 17/10/2013.
Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró * Acordam no Tribunal da Relação do Porto - 2.ª Secção I. Relatório B....... – ….., Lda., e C....... – ….., Lda., ambas com sede na Avenida da …., Fiães, sendo a primeira n.º …, Apart. … e a segunda no n.º …, instauraram a presente acção declarativa comum contra D.......
, com domicílio profissional na Rua de …, n.º …, em Lamego, pedindo que a ré seja condenada a pagar à autora B....... a quantia de 61.298,35 € e à autora C....... a quantia de 9.518,54 €, quantias essas acrescidas de juros de mora vincendos, à taxa em vigor para as transacções comerciais, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Para tanto, alegaram, em resumo, que, no exercício das suas actividades comerciais, forneceram à ré, a seu pedido, tintas e produtos correlacionados, nos valores totais de 52.459,26 € e 8.027,67 €, respectivamente pela B....... e pela C......., conforme fizeram constar das facturas juntas aos autos de arresto, as quais deviam ter sido pagas a 60 dias, mas que nunca foram, apesar de aquela mercadoria ter sido recebida pela demandada, pelo que deve aqueles valores, acrescidos dos juros vencidos, nos montantes de 8.839,35 € e de 1.491,54 €.
A ré contestou, por impugnação e por excepção, alegando que nada deve, pois pagou toda a mercadoria recebida, tendo pago 87.228,78 € à B....... e 14.936,77 € à C......., concluindo pela improcedência da acção e pela condenação das autoras como litigantes de má fé.
Dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar, bem como foram exarados despachos de identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas de prova, que não foram objecto de qualquer reclamação.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, após o que, em 27/2/2015, foi lavrada douta sentença que decidiu julgar a acção totalmente procedente e, em consequência: - “conden(ar) a R. a pagar à A. “B......., …, Ldª” a quantia de € 52.459,26, (cinquenta e dois mil, quatrocentos e cinquenta e nove euros e vinte e seis cêntimos) acrescida dos juros de mora já vencidos, no valor de € 8.839,35 (oito mil, oitocentos e trinta e nove euros e trinta e cinco cêntimos) e dos vincendos sobre o capital em dívida, à taxa em vigor para as transacções comerciais, desde a citação até efectivo e integral pagamento; - conden(ar) a Ré a pagar à A. “C.......-…., Ldª”, a quantia de € 8.027,67, (oito mil, oitocentos e vinte e sete euros e sessenta e sete cêntimos), acrescida dos juros de mora já vencidos, no valor de € 1.491,54, (mil, quatrocentos e noventa e um euros e cinquenta e quatro cêntimos) e dos vincendos sobre o capital em dívida, à taxa em vigor para as transacções comerciais, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.
” Inconformada com o assim decidido, a ré interpôs recurso de apelação e apresentou a sua alegação com as seguintes conclusões: “
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No dia 20-01-2015, o ilustre colega, mandatário à data da ora recorrente, enviou requerimento, via citius, a comunicar, ao Tribunal a renúncia ao mandato.
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Apesar das diligências do Tribunal para fazer cumprir o vertido no artigo 47 do Código de Processo Civil, enviando carta registada com AR de forma a notificar a mandante, C) Certo é que a mesma não teve conhecimento da renúncia antes da audiência de julgamento, pois, D) E apesar da ora recorrente não ter mudado de endereço, a carta voltou ao Tribunal (dando entrada no mesmo dia 28-01-2015) com a indicação “mudou-se”.
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Frustrando-se, assim, a notificação pessoal da ora recorrente.
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Segundo António Santos Abrantes, I Volume, Temas Judiciários, a notificação pessoal é prevista devido à “relevância que é atribuída a comunicação, tendo em conta a natureza do acto comunicado e as consequências que resultam da inacção do notificado”.
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Pois é isto que efectivamente aqui está em causa.
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A Mma Juiz “a quo” entendeu que, não tendo existido notificação pessoal, os efeitos da renúncia não se produziam, e, por isso, a falta do mandatário da ora recorrente sem qualquer outra justificação não era motivo para adiamento da audiência, prosseguindo com a mesma.
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Sucede que, a falta de mandatário aquando da audiência de julgamento prejudicou em larga medida a defesa dos direitos e interesses da Ré (ora recorrente), visto que, apenas foi produzida a prova requerida pelo ilustre mandatário das AA., situação que a Ré não pode acautelar devido à falta de comunicação oportuna.
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Mais não fosse, a ora recorrente foi realmente lesada no que toca a junção do documento das AA. denominado “conta corrente” que a Mma Juiz “a quo” determinou como relevante para a boa decisão da causa.
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O referido documento, e contrariando o disposto nos números 1 e 2 do artigo 423 do CPC, foi junto apenas no momento da audiência de julgamento, o que indica que não foi sequer dado conhecimento à contraparte (ora recorrente) para se pronunciar, visto que não estava devidamente representada.
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O que, pelo menos (e já bastante) viola um princípio basilar do direito – Princípio do Contraditório.
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Considera-se assim, que, frustrando-se a notificação da mandante, devia ter sido, a data da audiência de julgamento dada sem efeito, sendo remarcada, dando assim possibilidade a Ré, ora recorrente de preparar um defesa condigna com o seu novo mandatário.
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Pois, e apesar de, da leitura do artigo 47 do CPC se retirar a obrigação imposta ao “mandatário renunciante” de assegurar as diligências necessárias ao processo quer enquanto o mandante não for notificado da renúncia, quer após essa notificação enquanto não tiverem decorrido os 20 dias de prazo que a lei determina para a constituição de novo mandatário, não se afigura, qual a vantagem do mandante continuar a ser patrocinado por mandatário que já tenha manifestado a intenção de terminar com o mandato, correndo o risco, tal como veio a verificar-se, de não ver assegurada a sua defesa.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exªs, a sentença recorrida deverá julgar-se nula, devendo ser repetida a audiência de julgamento, dando oportunidade a Ré, ora recorrente de se defender condignamente.” Não foram apresentadas contra-alegações.
O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Neste tribunal, foram mantidos o regime de subida e o efeito fixados.
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir o mérito do presente recurso.
Sabido que o seu objecto e âmbito estão delimitados pelas conclusões da recorrente (cfr. art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do NCPC, aqui aplicável, doravante apenas CPC), não podendo este Tribunal de 2.ª instância conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser em situações excepcionais que aqui não relevam, e tendo presente que nele se apreciam questões e não razões, a única questão que importa dirimir consiste em saber se a renúncia ao mandato é causa de nulidade da sentença e de repetição da audiência de discussão e julgamento.
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Fundamentação 1. De facto Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos: “1º- As autoras são duas sociedades comerciais que têm como objecto social a produção e venda de tintas e seus derivados. (artigo 1º da p.i.) 2º- A ré é comerciante de tintas e seus derivados. (artigo 2º da p.i.) 3º- As autoras no exercício das suas actividades comerciais, mantiveram relações comerciais com a ré, a quem forneceram tintas e outros produtos correlacionados. (artigo 3º da p.i.) 4º- Parte dos fornecimentos efectuados pela autora B.......-….., Lda corresponderam à emissão das facturas juntas como doc.1 a 80 à providência cautelar de arresto apensa a estes autos. (artigo 4º da p.i.) 5º- Parte dos fornecimentos efectuados pela autora C......., Lda corresponderam à emissão das facturas juntas como doc.82 a 121 à providência cautelar de arresto. (artigo 5º da p.i.) 6º- Estas facturas deveriam ser pagas 60 dias após a sua emissão, conforme resulta do respectivo teor. (artigo 6º da p.i.) 7º- Todos os produtos constantes das citadas facturas corresponderam a encomendas da ré e foram efectivamente entregues e por ela recebidos, sem que tenha apresentado qualquer defeito ou reclamação. (artigo 7º da p.i.) 8º- Nada foi pago pela ré por conta destes fornecimentos até à presente data. (artigo 8º da p.i.) 9º- A ré está em dívida para com a autora B......., Lda, no montante de 52.459,26 €, e à autora C......., Lda, no montante de 8.027,67€. (artigo 9º da p.i.) 10º- Por conta de fornecimentos efectuados no período em que mantiveram relações comerciais, a Ré pagou à A. B....... a quantia de €70.214,97 através de cheques da conta à ordem por si titulada na CGD, agência de Lamego e €8.246,27 através de cheques recebidos de clientes. (artigo 12º e parte do artigo 13º da contestação).
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- A quantia de €1.929,89 foi deduzida por força das Notas de Crédito emitidas pela autora B........ (artigo 14º da contestação).
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- Por conta dos fornecimentos efectuados, a Ré pagou à C......., a quantia de €11.944,54 por cheques...
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