Acórdão nº 1393/12.2TBFLG-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Junho de 2015
Magistrado Responsável | JOS |
Data da Resolução | 15 de Junho de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Sumário (da responsabilidade do relator): 1 – O regime insolvencial do contrato de locação financeira é o previsto nos artigos 102 e 104 do CIRE e não no artigo 108 deste mesmo diploma. 2 – Sendo o insolvente o locatário, e encontrando-se ele na posse da coisa locada, aquele regime resulta da conjugação do disposto nos artigos 102 e 104, n.º 3 do CIRE.
Processo 1393/12.2TBFLG-A.P1 Recorrente – B… Recorrido – C…, SA Relator: José Eusébio Almeida; Adjuntos: Carlos Gil e Carlos Querido.
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto: 1 - Relatório 1.1 – Os autos na 1.ª instância: B… deduziu oposição à execução que lhe move o C…, SA e pediu que a mesma (a) seja julgada extinta ou, caso assim se não entenda, que (b) seja reduzida a quantia exequenda; (c) se declare que com a execução do imóvel dado em garantia, a oponente nada deve; (d) se declare a inexigibilidade da quantia exequenda no respeitante a juros moratórios liquidados, juntamente com o capital alegadamente em dívida e, caso assim se não entenda, (e) a redução da quantia exequenda ao capital que se apurar em dívida, deduzidos “os juros exorbitantes e cláusulas penais”.
Alegou a oponente, em síntese, que se verifica litispendência e que inexiste título executivo; impugnou a quantia exequenda e a existência de resolução do contrato de locação financeira, tanto mais que a executada esta só deixou de pagar as prestações quando entrou em processo de insolvência. Acrescenta que, por haver garantia superior ao débito, o exequente abusa do direito de ação e encontram-se pagas inúmeras prestações, não havendo direito ao recebimento de quantia superior à do capital de dívida. A exequente contestou (fls. 22 e ss.), impugnando o alegado pela oponente e concluindo pela improcedência da oposição.
No despacho saneador foi fixado o valor da causa (13.379,33€) e decidiram-se as exceções de litispendência e de inexistência de título executivo, que foram desatendidas[1]. Realizou-se a audiência de julgamento nos termos documentados no processo e foi proferida decisão sobre da matéria de facto. Conclusos os autos, foi proferida sentença que decidiu “julgar parcialmente procedente a oposição e fixar a quantia exequenda em €7.626,34 a título de capital (que inclui já IVA), acrescido de juros de mora a` taxa contratada de 4,474% e das sobretaxas máximas previstas na Lei para contratos desta natureza, sem prejuízo do valor máximo executado pela exequente e constante do ponto N) dos factos provados.
” 1.2 – Do recurso: Inconformada, a oponente veio apelar. Pretende a revogação da sentença e apresenta as seguintes Conclusões: A - O contrato de locação em causa nos presentes autos apenas deixou de ser cumprido em virtude de ter sido declarada a insolvência da locatária, sendo que o mesmo foi pontualmente cumprido até 30.12.2011, data em que foi paga a última prestação.
B - A Administradora de Insolvência da devedora principal, D…, Lda. apenas em 18.04.2013 é que declarou optar pelo não cumprimento do contrato de locação, conforme consta de fls. 155.
C - Ora, até essa data, nos termos do disposto no art. 102, n.º 1 do CIRE, o cumprimento do contrato ficou suspenso até à declaração emitida pela Administradora de Insolvência.
D - Não pode concluir-se nos presentes autos que o incumprimento do contrato de locação ocorreu em 30.12.2011, porquanto, o cumprimento do referido contrato encontrava-se suspenso por efeito da falta de declaração de opção que deveria ter sido efectuada pela Senhora Administradora e que apenas ocorreu em 18.04.2013.
E - Na verdade, a exequente não poderia ter resolvido o contrato de locação com fundamento em incumprimento desde 30.12.2011, pois que a haver incumprimento o mesmo ocorreu depois de ter sido emitida a declaração pela Senhora Administradora a não optar pelo cumprimento do mesmo.
F - Por outro lado, resultou provado que a oponente não recebeu qualquer comunicação de resolução do contrato.
G - Encontra-se previsto nas condições gerais do Contrato de Locação no seu artigo 11.º que o contrato “poderá ser resolvido por iniciativa do locador, no caso de incumprimento de qualquer uma das obrigações do locatário, se o mesmo, interpelado para o efeito, através de carta registada do locador, não eliminar o incumprimento”.
H - Ora, se o próprio contrato de locação financeira exige que a interpelação admonitória seja comunicada à parte contrária por carta registada do locador, a não receção de qualquer comunicação por parte da oponente, tal formalidade não se pode ter por cumprida.
I - O não cumprimento de tal formalidade invalida também a resolução posteriormente operada pela ré, pelo que tal implica a improcedência do pedido executivo.
J - Acresce que, mesmo que assim se não entenda, é errada a interpretação levada a cabo pelo tribunal no sentido de que “como resulta dos factos dados como provados, a locatária apenas cumpriu o contrato supra identificado até 30/12/2011, data a partir da qual não procedeu ao pagamento de qualquer das rendas convencionadas”.
K - Pois, a haver incumprimento, o que não se concede, o mesmo ocorreu em data posterior, ou seja, apenas após a declaração emitida pela administradora de insolvência, sendo que até essa data o cumprimento do contrato encontrava-se suspenso.
L - Após essa data não foi dado qualquer conhecimento à oponente relativamente ao incumprimento do referido contrato de locação.
M - Por outro lado, entende o tribunal que “nos termos do artigo 11.º n.º 7 das condições gerais do contrato de locação financeira celebrado, em alternativa à resolução, (a exequente podia) exercer os seus direitos de crédito sobre a locatária, vencidos na dada de verificação do incumprimento (30/12/2011), vencendo juros de mora à taxa convencionada, desde essa data”, mas tal interpretação não pode prevalecer. Senão vejamos: N - Na verdade, à data do preenchimento da livrança ainda nem sequer está vamos perante uma situação de incumprimento, porquanto a Sra. Administradora de Insolvência ainda não se havia pronunciado quanto à opção ou não pelo cumprimento do contrato.
O - Acresce que a exequente recuperou o veículo objeto do contrato de locação e procedeu de imediato a` sua venda, pelo preço de 10.000,00€.
P - De facto, a sentença proferida em 1.ª Instância pretende em alternativa à resolução do contrato de locação, conferir à exequente o direito a uma indemnização correspondente ao pagamento de todas as rendas vincendas, acrescidas dos juros moratórios, desde as datas do vencimento dessas mesmas rendas até às da sua efetiva cobrança.
Q - Ora, a resolução do contrato, ao importar o pagamento de todas as rendas vincendas, gera uma situação de grave desequilíbrio.
R - Pelo que, esta cláusula (penal) invocada pelo Tribunal é abusiva e como tal nula.
S – Neste sentido foram já proferidos diversos acórdãos entre os quais o da Relação do Porto proferido em 24/10/2005, disponível in dgsi que dispõe que “É nula, num contrato de locação financeira mobiliária, cláusula que estabelece que, em caso de resolução do contrato por incumprimento do locatário, este é devedor da totalidade das rendas”.
T - Determina o n.º 1 do art. 811 do Código Civil que a locadora não pode...
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