Acórdão nº 154/15.1YRPRT de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelELSA PAIX
Data da Resolução17 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 154/15.1YRPRT (advindo da Procuradoria-Geral Distrital do Porto – nº 239/13.2TRPRT) Acordam, em Conferência, os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO No processo nº 239/13.2TRPRT a correr termos na Procuradoria-Geral Distrital do Porto – nº 239/13.2TRPRT a Instância Local da Maia - Secção Criminal – J2 – Comarca do Porto, a requerente B…, em 07.11.2014, apresentou um pedido de apoio judiciário solicitando as modalidades de dispensa de taxas de justiça e demais encargos com o processo, nomeação e pagamento de compensação de patrono e atribuição de agente de execução, para intervir no processo judicial em causa.

Em 17.03.2015, foi proferida pelo Instituto da Segurança Social, I.P. (Centro Distrital do Porto) a seguinte decisão: DECISÃO: O sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina-se a assegurar que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, o conhecimento, o exercício ou a defesa dos seus direitos - cfr. art. 1° da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 47/2007, de 28 de agosto.

Têm direito a proteção jurídica os cidadãos nacionais e da União Europeia bem como os estrangeiros e os apátridas com título de residência válido num Estado membro da União Europeia, que demonstrem estar em situação de insuficiência económica - cfr. art. 7° da cit Lei.

Encontra-se em situação de insuficiência económica aquele que, tendo em conta fatores de natureza económica e a respetiva capacidade contributiva, não tem condições objetivas para suportar pontualmente os custos de um processo - cfr. art. 8° n. °1 da cit Lei.

A prova e a apreciação da insuficiência económica é feita de acordo com os critérios estabelecidos e publicados em anexo à Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n." 47/2007, de 28 de agosto - cfr. art. 8°-A e do Anexo ao referido diploma.

A Portaria n.º 1085-A/2004, de 31 de agosto, alterada pela Portaria 288/2005 de 21 de março, procedeu à concretização dos critérios de prova e de apreciação da insuficiência económica - cfr. texto preambular e art. 80-8, Lei n." 34/2004, de 29 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 47/2007, de 28 de agosto.

Da análise do requerimento de APJ, datado de 07.11.2014, resulta que não foi entregue com o mesmo a documentação necessária para comprovar a situação de insuficiência económica. Mais se salienta, não ter sido entregue qualquer documentação que esclareça como subsiste a requerente. Assim, ao requerimento citado, a aqui requerente junta cópia dos documentos de identificação Civil e Fiscal, da Nota de Liquidação e da Declaração de IRS relativa ao ano de 2013.

Foi enviada à requerente Audiência Prévia datada de 25.02.2015, à qual, não obstante a requerente ter respondido, efetivamente não esclareceu qual o montante global dos rendimentos que atualmente lhe permitem fazer face às despesas da vida quotidiana, nem tão pouco, o que faz face a essas mesmas despesas. Mais alegou a requerente, o deferimento Tácito.

Ora, no que respeita a esta última questão do deferimento tácito, alegada pela requerente, cumpre referir que o ato tácito, embora não constitua, propriamente um ato voluntário da administração, será, para todos os efeitos, um ato administrativo, podendo ser revogado, suspenso, confirmado, alterado, interpretado, substituído, etc. (Cfr. Prof Diogo Freitas do Amaral, "Direito Administrativo lições policopiadas aos alunos de direito, em 1989/90", 1989, volume III, pág. 273). Ora se assim é, sucede que, a considerar-se existir o ato tácito, sempre estaria o mesmo ferido do vício de anulabilidade (artigo 135.° do Código de procedimento administrativo), porque proferido em violação da lei, designadamente o disposto no artigo 13.º, n.º 1 da Lei 34/2004, de 29 de julho, e, atento o disposto no n.º 1 do artigo 136.º do Código de Procedimento Administrativo seria revogável, ou passível de substituição.

Seguindo tal entendimento, temos que, ao ser proferida a decisão final sobre o pedido formulado pelo requerente, já depois de se ter formado ato tácito de deferimento, em violação da lei, porque não se encontrava o requerente em condições objetivas para poder beneficiar de proteção jurídica nas modalidades por si requeridas, sempre terá de configurar-se a mesma como revogatória do ato tácito que invalidamente se formou.

Saliente-se o que dispõe o artigo 1.º e 8.º da Lei 3412004, de 29.07, com as alterações introduzidas pela Lei n° 47/2007, de 28/08, designadamente quando se refere que se encontra em situação de insuficiência económica "aquele que, tendo em conta fatores de natureza económica e a respetiva capacidade contributiva, não tem condições objetivas para suportar pontualmente os custos de um processo", bem como o anexo da mesma Lei que concretiza o conceito de insuficiência económica para efeitos de aplicação do instituto de proteção jurídica e a Portaria 1085-A/04, de 31.08, nos artigos 6.º e ss.

É pela aplicação destes normativos que se conclui, caso a caso, quem deve ou não beneficiar da concessão de proteção jurídica, e, em que termos ou modalidades, sendo que um eventual ato tácito que se forme em violação de tais normativos, concedendo, ainda que por via tácita a um requerente, um benefício a que ele não tem direito, não pode deixar de ser considerado ferido de ilegalidade, anulável e em consequência suscetível de revogação ou substituição. Revoga-se o ato de deferimento tácito, pelo presente ato expresso nos termos e para os devidos efeitos do art. 141º CPA. Porquanto, nos termos do referido preceito legal, podem ser revogados os atos que sejam inválidos, com fundamento nessa invalidade e dentro do prazo de impugnação, ou seja, dentro do prazo de um ano, uma vez que é esse o prazo (mais longo – nº 2) para o Ministério Público poder impugnar os atos anuláveis.

Logo, no termos do artigo 141º, nº 1 do CPA, os atos revogatórias de atos constitutivos de direito são válidos, desde que proferidos dentro do prazo de um ano (nº 2) com fundamento em ilegalidade.

Quanto à situação de insuficiência económica, salienta-se que incumbe à requerente a prova da sua situação de insuficiência económica, a qual, salvo melhor opinião, entendemos não ter sido feita.

Não podemos esquecer que o acesso à justiça não é gratuito e que o legislador, ao consagrar o instituto de Apoio Judiciário, apenas pretendeu contemplar as situações de impossibilidade económica para fazer face às despesas normais de uma ação, e não os casos de simples dificuldades ou de maiores ou menores esforços a suportar, para se aceder à justiça, cabendo necessariamente ao requerente a prova da sua insuficiência económica.

Assim, e dado a requerente não ter junto os documentos solicitados, nem ter esclarecido de e com que rendimentos vivia, conclui-se no sentido do indeferimento do presente pedido de proteção jurídica, formulado pela aqui requerente. Neste caso em concreto, não dispõem estes serviços de documentos suficientes para a devida análise do processo porquanto não basta alegar que nada se tem. A insuficiência económica carece de prova.

Mais se refere que o direito ao Apoio Judiciário não é um direito inato à cidadania, antes carece de prova cabal da situação económica concreta de cada um, cujo ónus incumbe a quem pretende beneficiar desse direito, conforme dispõe o nº 1 do art. 342° do C.C. Prova esta que a requerente não logrou fazer.

Assim e atento aos critérios estabelecidos para a apreciação da insuficiência económica, definidos no Anexo da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei nº 47/2007, de 28 de agosto, constata-se que a requerente não reúne os requisitos legais para ver deferido o seu pedido de proteção jurídica, sendo que não fez prova de que não dispõe de meios económicos bastantes para custear, total ou parcialmente os encargos do pleito, pelo que não tem direito a proteção jurídica nas modalidades por si requeridas.

No uso da competência prevista no art. 20°, n.º 3 da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 47/2007, de 28 de agosto, INDEFERE-SE o pedido de benefício de Proteção Jurídica, atento os fundamentos de facto e de direito supra expostos.” A requerente B… veio impugnar judicialmente esta decisão de indeferimento nos seguintes termos: ASSUNTO: IMPUGNAÇÃO JUDICIAL do DESPACHO de INDEFERIMENTO de 31/03/2015 (V/ ofício SEM NÚMERO de 30/03/2015, datado de 17/05/2015, assinado por C…) B… vem, ao abrigo do art.º 27º, nº 1 e 2, da lei 34/2004 de 29/07 na redação da lei 47/2007 de 28/08 - adiante designada por LAJ -, IMPUGNAR o DESPACHO DE INDEFERIMENTO do pedido de proteção jurídica identificado supra, com base nos seguintes fundamentos: O despacho de indeferimento de 31/03/2015 do pedido de apoio judiciário de 7/11/2014 é completamente inválido e nulo, baseia-se na ilegalidade, tendo por isso que ser revogado. Vejamos porquê: I. CONTRADIÇÃO ABSOLUTA ENTRE OS FUNDAMENTOS DE FACTO E DE DIREITO INVOCADOS E A DECISÃO Começa o referido despacho de indeferimento por enunciar - bem - os artigos da LAJ (art.s lº, art.º 7º, art.º 8º nº 1, art.º 8º-A e Anexo), e respetivas portarias (Portaria nº 1085A/2004, de 31/08 com as alterações impostas pela Portaria 288/2005, de 21/03), que definem os critérios do acesso e do direito ao benefício do apoio judiciário requerido, bem como os documentos de prova da insuficiência económica a apresentar com o requerimento (p. 1 e 2).

Depois, tal despacho de indeferimento reconhece que: - o requerimento deu entrada em 7/11/2014 (p. 2), - que a requerente entregou com o mesmo a última declaração de IRS e da respetiva nota de liquidação, cf. o art.º 3º da portaria 1085/2004, citando, a p.2: "Assim, ao requerimento citado, a aqui requerente junta cópia dos documentos de identificação Civil e Fiscal, da Nota de Liquidação e da Declaração de IRS relativa ao ano de 2013."...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT