Acórdão nº 229/13.1TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAM
Data da Resolução09 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 229/13.1TVPRT.P1 Da Comarca do Porto - Instância Central – 1.ª Secção Cível - J6, a quem foi distribuído após a extinção da 2.ª Vara Cível da mesma localidade, onde dera entrada em 27/3/2013.

*Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró Acordam no Tribunal da Relação do Porto - 2.ª Secção: I. Relatório B…, com sede na Rua …, Mealhada, instaurou contra C… e mulher D…, residentes na Rua …, …, ..º Esq., …, Porto, e E…, solteiro, maior, residente na …, n.º …., R/c Dt.º Frente, …, Matosinhos, a presente acção declarativa nos termos do DL n.º 108/2006, pedindo: a) que se declare ineficaz e sem qualquer efeito em relação à Autora a doação titulada pela escritura de 19 de Março de 2010, outorgada no Cartório Notarial da Maia, referente à Fracção C, correspondente a uma habitação no r/c direito, descrita na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n.º 94/19780218-C, e Fracção D, correspondente a uma habitação no r/c esquerdo descrita na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n.º 94/19780218-D, ambas da freguesia …, concelho de Sintra, e as mesmas restituídas ao património dos RR. C… e mulher D…, na medida do interesse da Autora, a fim de serem executados, penhorados e vendidos, seja no património dos primeiros Réus, seja no património do segundo Réu, para satisfação do crédito da Autora, e que, consequentemente, se declare ineficaz em relação à Autora, a transmissão dos mesmos prédios registados sob a Ap. 4348 de 2010/03/22, constante dos respectivos registos, com condenação do 2.º Réu a aceitar que os bens descritos possam ser penhorados pela Autora, mesmo no património dele, segundo Réu, para a Autora se cobrar do crédito que tem sobre os primeiros Réus, e, bem assim, que todos os Réus sejam condenados a permitir que a Autora pratique os actos de conservação dos imóveis em causa autorizados por lei.

  1. SUBSIDIARIAMENTE, para o caso de improcedência do pedido principal, a Impugnação Pauliana, seja decretada a nulidade das transmissões dos primeiros RR. para o segundo RR. dos mesmos imóveis, por se tratar de negócio simulado, decretando-se a anulação do registo predial que titula tal transmissão.

Para tanto, alegou, em resumo, o seguinte: Por escritura pública de 19 de Março de 2010, os primeiros réus doaram ao segundo, seu neto, aí representado pelos seus pais, F… e G…, os imóveis supra identificados, tendo como única intenção impedir que a autora pudesse satisfazer o seu crédito, no montante de 174.969,42 €, resultante de um empréstimo concedido ao mesmo F… em Dezembro de 2008 e por ele utilizado no dia 15 do mesmo mês, garantido por uma livrança por ele subscrita e avalizada pelos réus C… e esposa D… e por H…, a qual foi preenchida e dada à execução depois de ter deixado de pagar as prestações do reembolso, em 1 de Julho de 2010.

Os réus sabiam que, após tal doação, não restava qualquer património de valor minimamente suficiente para reembolsar a autora pela totalidade do valor de que é credora.

Além disso, a mesma doação é nula, por simulação, pois que os outorgantes não quiseram doar, nem receber, mas tão só prejudicar a autora, impedindo que recebesse o seu crédito.

Os réus contestaram, em separado, por impugnação e alegando, em síntese: O E…, que desconhece a existência de qualquer crédito contraído pelo seu pai e pelos seus avós e, bem assim, de qualquer incumprimento contratual e que os primeiros réus decidiram doar-lhe os referidos bens porque já haviam beneficiado a sua filha H…, em valor equivalente, de 40.000,00 €, tendo ele recebido tais bens e comportando-se como seu verdadeiro proprietário.

O C… e mulher D…, que nunca poderiam estar de má fé, visto que a escritura de doação foi realizada antes do preenchimento da livrança, estando convencidos de que a dívida do F… para com a autora já se havia extinguido pela adjudicação de outro imóvel no processo de execução, e que a doação foi para compensar o segundo réu em valor equivalente ao que já haviam dado à sua filha H….

Concluíram todos pela improcedência da acção, com a consequente absolvição dos pedidos.

Foi realizada uma audiência prévia, onde foi proferido despacho saneador tabelar e foram seleccionados os factos considerados assentes.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento e, em 12/2/2015, foi proferida douta sentença que decidiu declarar “ineficaz e sem qualquer efeito em relação à Autora a doação titulada pela escritura de 19 de Março de 2010, outorgada no Cartório Notarial da Maia, referente à Fracção C, correspondente a uma habitação no r/c direito, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o nº. 94/19780218-C, e Fracção D, correspondente a uma habitação no r/c esquerdo descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o nº. 94/19780218-D, ambos da freguesia …, concelho de Sintra, e os mesmos restituídos ao património dos RR. C… e mulher D…, na medida do interesse da Autora, reconhecendo-se-lhe o direito de executar tais bens na medida do valor do seu crédito, bem como o de praticar que os actos de conservação dos imóveis em causa autorizados por lei, prejudicado ficando o pedido deduzido a título subsidiário”.

Inconformado com o assim decidido, o réu E… interpôs recurso de apelação e apresentou a respectiva alegação com as seguintes conclusões: “I. Vem o presente Recurso interposto da Douta Sentença, proferida nos Autos supra epigrafados que julgou declarar ineficaz e sem qualquer efeito em relação à Autora (B…, Crl.) a doação titulada pela escritura de 19 de Março de 2010, outorgada no Cartório Notarial da Maia, referente à Fração “C”, correspondente a uma habitação no R/C Direito, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n.º 94/19780218-C e Fração “D”, correspondente a uma habitação no R/C Esquerdo, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n.º 94/19780218-D, ambos da freguesia …, concelho de Sintra e os mesmos restituídos ao património dos RR. C… e mulher D…, na medida do interesse da Autora, reconhecendo-se-lhe o direito de executar tais bens na medida do valor do seu crédito, bem como de praticar os actos de conservação dos imóveis em causa autorizados por lei, prejudicado, ficando o pedido deduzido a título subsidiário; II. Entende o recorrente que não se verificam os pressupostos objectivos e subjectivos da impugnação pauliana, designadamente o pressuposto da anterioridade do crédito da autora em relação à outorga do contrato de doação, nem a intenção deste, nem dos doadores nessa outorga, de impedir a realização do direito de crédito do Banco autor III. É convicção do Recorrente que quando recebeu por doação os imóveis descritos na Douta Sentença recorrida os seus avós RR. nos Autos e doadores ainda não se haviam constituído devedores da A./ Recorrida; Pois eles doadores não intervieram na celebração do contrato de mútuo que data de 23 de Fevereiro de 2008 e apenas em 15 de Dezembro de 2008 foi emitida a livrança que os doadores avós do aqui recorrente subscreveram, livrança essa sob a execução que motivou a instauração da Acção de Impugnação Pauliana, cuja Sentença motiva o presente Recurso; IV. Resulta provado por documentos juntos aos Autos que a doação sob impugnação Pauliana feita a favor do aqui Recorrente foi efetuada no dia 19 de Março de 2010 V. A subscrição do título cambiário (Livrança) foi feita pelos avós do Recorrente que deram o seu aval à livrança subscrita pelo devedor principal que é seu pai F…, constituindo-se assim devedores autónomos da respectiva importância, pois, como é sabido, o aval “representa uma obrigação cambiária que tem por finalidade garantir ou caucionar obrigação cambiária idêntica e preexistente de um signatário da letra de câmbio”, nas palavras do Prof. José Engrácia Antunes; VI. Se é certo que a partir do momento em que o subscritor da livrança a entrega a outrem, fica o primeiro vinculado àquela convenção, sem que possa impedir o exercício pelo segundo do seu direito potestativo de dela extrair plenamente os concernentes efeitos jurídicos, tal não implica que o direito de crédito cambiário se constitua no momento da emissão das livranças, principalmente em situações como a que está aqui em análise.

  1. Com efeito, a emissão das livranças, com o fim restrito de garantia, ocorreu em momento em que o Banco autor não dispunha de qualquer direito de crédito contra o subscritor – devedor principal - e a capacidade de disposição dos títulos de garantia ficou dependente do incumprimento por ele do...

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