Acórdão nº 202/13.0GAVLC.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelNETO DE MOURA
Data da Resolução28 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 202/13.0GAVLC.P1 Instância Central, 3.ª Secção de Instrução Criminal, da Comarca de Aveiro Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I – Relatório No âmbito do processo comum que, sob o n.º 202/13.0GAVLC, corre termos pela Instância Central, 3.ª Secção de Instrução Criminal (J2), da Comarca de Aveiro, B…, melhor identificado nos autos, arguido que intervém, também, como assistente, não se conformando com o despacho de arquivamento do Ministério Público relativamente à queixa que apresentou contra C…, requereu a abertura de instrução, no termo da qual foi proferida decisão instrutória de não pronúncia (fls. 392 e segs.).

Ainda irresignado, o arguido/assistente B… recorreu dessa decisão para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, que “condensou” nas seguintes conclusões (em transcrição integral): “Considerando que 1.ª - Não concordamos com a decisão instrutória que não pronunciou o Arguido C… pela prática de um Crime de Ofensa à Integridade Física, isto porque ao contrário do referido pelo Tribunal "a quo'', foram recolhidos indícios suficientes na fase de inquérito e na fase de instrução que permitem, com segurança pronunciar o Arguido C… pela prática de tal crime.

  1. - Na fase de inquérito, temos a queixa de fls. 97 a 101 dos autos, apresentada pelo B… contra o C… em 12/07/2013, na qual o mesmo refere que no dia 31/05/2013, por volta das 18:30 horas, foi agredido por parte de C…, quando se encontrava no interior e no exterior da residência do mesmo. O C… virou-se para si e desferiu-lhe um murro na face do lado esquerdo por baixo do olho; o C… pretendia continuar a agredir o B… com murros e foi quando este se defendeu; contudo, a dada altura da contenda o arguido C… desferiu um murro nas partes baixas (entre as pernas) do B…, tendo este ficado combalido, com falta de ar e tonto e foi nessa altura que o B… tentou abrir a porta da casa para poder vir para o exterior, numa tentativa de evitar as agressões de que estava a ser alvo e já no exterior da habitação, o B… encostou-se a um muro e quando ali se encontrava o Arguido que veio no seu encalço, desferiu-lhe outro murro nas partes baixas (entre as pernas). Esclareceu ainda o B… que em virtude das agressões de que foi alvo por parte do Arguido C… ficou com um hematoma na zona dos lábios, uma mordedura no braço direito, um arranhão na face do lado esquerdo por baixo do olho e com várias escoriações/hematomas na zona das costelas e das costas. Daqui decorre que o C… não actuou ao abrigo da legítima defesa, mas antes agiu de forma livre, voluntária e consciente, com intenção de molestar, como queria e concretizou, o corpo e saúde do B….

  2. - A credibilidade do B… não pode ser posta em causa, como o fez a decisão instrutória, tanto mais que o mesmo nunca negou terem existido agressões mútuas entre si e o C…, ao contrário do que a fez o C… - num primeiro momento (queixa) refere que houveram agressões mútuas e num segundo momento (ainda na fase de inquérito e na fase de instrução) já diz que apenas foi agredido e que nada fez (entenda-se, não agrediu).

  3. - Refere a decisão instrutória erradamente que a queixa apresentada pelo B… foi apresentada quando este já sabia da existência e do teor da queixa apresentada pelo C… contra si, contudo não se entende em que se baseou o Tribunal "a quo" para chegar a tal conclusão falsa repita-se. O B… tinha, como decorre da lei seis meses a contar dos factos para apresentar queixa contra o Arguido C…, mas apresentou-a cerca de um mês e meio após os factos, isto é, no dia 12/07/2013 ponderadamente, dadas as relações familiares existentes e ainda o facto de no passado o B… ter sido agredido na cabeça com umas chancas pelo C…, ter apresentado queixa e no decurso do processo-crime, as relações familiares falaram mais alto e o assistente acabou por desistir da queixa. Apenas em 17/07/2013 (após a apresentação da queixa) é que o B… foi notificado para comparecer na GNR para ali ser ouvido na qualidade de Arguido, no dia 1/08/2013. Após a recepção de tal notificação, o B… solicitou no posto da GNR se podia ser ouvido antes da data agendada, tendo sido agendado o dia 26/07/2013 para que o mesmo fosse interrogado na qualidade de arguido, tomando assim conhecimento dos factos que lhe eram imputados.

  4. - Não atendeu o Tribunal "a quo" devidamente ao facto de o B… no dia dos factos apresentar ferimentos e ao facto de o mesmo no dia 3/06/2013 (segunda-feira), pelas 9:15 horas, se ter deslocado ao Centro de Saúde de Sever do Vouga - fls. 163 dos autos (ainda não havia decidido apresentar queixa) onde apresentava contusões e escoriações na pálpebra inferior esquerda, no lábio superior esquerdo, na face medial do punho direito por dentada e hematoma sub parietal esquerda. Tendo, nesse dia, o B… referido ao Dr. D… que havia sido vítima de violência fisica por parte do seu cunhado no dia 31/05/2013, motivado por conflitos familiares e nessa consulta foi prescrito ao Assistente medicação - Bepanthene Plus e Paracetamol e a realização de duas incidências - RX Craneo. Relativamente à medicação, o B… adquiriu-a no próprio dia 3 de Junho de 2013, conforme recibo emitido pela E… e junto aos autos no dia 27/04/2015.

  5. - Da prova documental junta aos autos na fase de inquérito decorre que no dia 17/07/2013, o B… recorreu ao Centro de Saúde de … com sintomas do trato urinário baixa e incapacidade em manter a erecção por dor testicular (fls. 164 dos autos). Sendo que estas queixas iniciaram-se após o episódio de agressão por parte de C…, ficando o B… com os testículos inchados e vermelhos, sofrendo lesões na região genital. Em face das dores no escroto /testículos; problemas de micção e sintomas da função sexual por parte do B…, o Dr. D… solicitou a realização de análises clínicas; ecografia prostática e das vesículas seminais, por via endocavitária e ecografias vesical supra-pubica e partes moles. No dia 1/08/2013 (fls. 165 dos autos), o B… regressou ao Centro de … com vista a mostrar os resultados dos exames solicitados ao Dr. D…, tendo a ecografia às partes moles revelado alterações as quais são compatíveis com orquite bilateral (inflamação dos testículos direito e esquerdo), podendo esta ser causa traumática.

  6. - Na fase de inquérito foram também carreados para os autos os relatórios periciais de avaliação do dano corporal em direito penal constantes de fls. 92 a 94 (1ª relatório) e fls. 238 a 240 (2° relatório), os quais não foram atendidos pelo Tribunal "a quo", e dos quais decorre que a data da cura das lesões do B… é fixável em 01/08/2013; as lesões referidas no relatório pericial terão resultado de traumatismo de natureza contundente o que é compatível com a informação; que tais lesões determinarão em condições normais 62 dias para a cura, sem afectação da capacidade de trabalho geral e trabalho profissional e do evento não resultarão, em condições normais, quaisquer consequências permanentes.

  7. - Da queixa apresentada por C… constante de fls. 2 a 3 dos autos, verificamos que o mesmo refere que "O ora denunciante em sua defesa, começou a medir forças com o denunciado envolvendo-se em agressões mútuas, agressões essas que ocorreram desde o interior da residência até ao exterior da mesma, cessando apenas aquando da intervenção dos vizinhos que se aperceberam da situação e os separaram.", assim não andou bem o Tribunal "a quo" ao desconsiderar o teor de tal queixa, dado que o mesmo confirma que "mediu forças" com o B…; ambos envolveram-se em "agressões mútuas", as quais ocorreram não só dentro da habitação, mas também no seu exterior e tudo cessou com a intervenção de terceiros que os separaram - é isto que consta dos autos e não pode ter qualquer outra interpretação. E não se entenda, como o fez o Tribunal "a quo" que as expressões constantes da queixa do C… são "de teor conclusivo'', dado que o C…, homem actualmente com 66 anos, quando se deslocou ao posto da GNR de Vale de Cambra para apresentar queixa referiu estes factos ao autuante e no final assinou na qualidade de denunciante.

  8. - Quando o C… foi interrogado em sede de instrução, no dia 27 /04/2015, das 10: 16:37 às 10:38:40, tal demonstrou ter agredido o B…, quando responde à Sr. Dr. Juiz "R: Pois não sei, eu não falei nada para ele. Eu até me dava bem com ele, não o queria bater, não lhe queria fazer mal nenhum. Eu estava baixado, e ele bateu-me tanta pancada na cabeça que se não era a minha mulher eu caía mesmo para o chão." 10.ª - A única questão que se podia colocar é quem iniciou a contenda, se o C…, se o B…. Isto porque o B… refere que quem iniciou a mesma foi o C… e o C… e a testemunha F… (a qual é esposa do primeiro e embora irmã do segundo, com o mesmo se dá mal) referem que terá sido o B… a iniciar a agressão. Entender-se que a descrição dos factos por parte do C… e da esposa F… é mais credível do que a descrição dos factos feita pelo B… parece-nos, salvo melhor opinião, errada. Na verdade, esqueceu-se o Tribunal "a quo" que o C… é parte interessada no desfecho desta demanda e a testemunha F… apresenta uma relação de proximidade com o C…, em virtude do facto de ser sua esposa, e como tal também tem um especial interesse. Logo, deveria a decisão instrutória ter feito uma exigente ponderação da credibilidade dos depoimentos de ambos – C… e esposa F…. Tanto mais que a outra testemunha ocular dos factos, G… (mãe do C… e da F… e sogra do C…), infelizmente (e por razões que se desconhecem), não descreveu o que de facto aconteceu no dia, hora e local dos factos, limitando-se a afirmar que se gerou uma ligeira confusão - fls. 145 dos autos 11.ª - A testemunha F… (fls. 45 a 47 dos autos) não confirma de forma consistente e coerente a versão dos factos fornecida por C…, ao contrário do que entendeu a decisão instrutória. Isto porque deveria o Tribunal "a quo" ter atendido ao facto da testemunha em causa ser esposa do Arguido C… e embora irmã do Assistente B…, como o...

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