Acórdão nº 3716/10.0TXPRT-R.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelNETO DE MOURA
Data da Resolução28 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 3716/10.0 TXPRT-R.P1 Recurso penal (liberdade condicional) Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório No âmbito do processo instaurado com vista à eventual concessão de liberdade condicional ao recluso B…, a correr termos, sob o n.º 3716/10.0 TXPRT-R, pelo 1.º Juízo do Tribunal de Execução de Penas do Porto, após audição deste, foi proferida decisão que lhe negou a concessão daquela medida.

Inconformado com essa decisão e almejando a sua revogação e substituição por outra que lhe conceda a liberdade condicional, dela interpôs recurso o recluso, com os fundamentos que explanou na respectiva motivação e que condensou nas seguintes “conclusões” (em transcrição integral): a) “O despacho em crise está ferido de ilegalidade porque a notificação está desprovida de data e da assinatura e nome do magistrado decisor.

  1. É ainda nulo porque é patente que dele ressalta contradição na fundamentação que aduz e entre a fundamentação e a decisão.

  2. Pois na verdade, cumpridos muito mais do que os dois terços da pena, o tribunal mantém uma apreciação sempre e continuadamente marcada de insistência no passado.

  3. Mas também porque, ao definir desde já - liminarmente - que terá que cumprir em situação de prisão efetiva os cinco sextos da pena, contradiz a própria finalidade do modelo legal da execução das penas e até, de certo modo, a utilidade da existência do próprio Tribunal de Execução das Penas.

  4. Incorrendo ainda em nulidade por erro de aplicação da lei, dado que não fundamentou com assento na vasta gama de elementos factuais transparentes e decisivos os motivos por que considerou que o arguido não interiorizou o desvalor das condutas passadas.

  5. Chegando ao ponto de contrariar as opiniões vertidas nos relatórios sociais, menorizando assim a idoneidade da experiência vivida no acompanhamento do condenado e, por via disso, desvalorizando a própria utilidade dessa opinião.

  6. Produzindo desse modo uma fundamentação vaga e abrangente que nada explica, mas tão só aparenta cumprir o objetivo de manter o recorrente preso até ao fim, embora não o dizendo.

  7. Também omitiu de se pronunciar sobre a contradição patente entre o teor dos relatórios e os alegados pareceres desfavoráveis no C.T. dos mesmos que sempre foram favoráveis ao seu percurso.

  8. Num discurso inaudito e surpreendente, para além de tecnicamente inoperante do ponto de vista da aplicação da lei. Como se o condenado tenha que ser continuadamente prejudicado pela antiga reincidência quando é certo que cumpriu na totalidade as penas e castigos a essa situação passada referentes.

  9. É ainda nulo por contradição insanável da fundamentação porque expressamente afirmou que o comportamento exemplar do recorrente nos últimos 5 anos não pode ser sobrevalorizado ao mesmo tempo que acentuou a recordação dos castigos impostos e cumpridos no 1.º ano da reclusão.

  10. Oferecendo desse modo uma fundamentação que, para além de tecnicamente duvidosa, configura uma mensagem subliminar a saber que, o comportamento prisional é indiferente para a recuperação da liberdade.

  11. Fundamentação que, assim colocada expressamente no despacho, aparenta um acolhimento intelectual contrário ao espírito da lei, senão mesmo de atuação contra legem.

  12. Feriu assim o despacho em crise, os arts. 97.º n.º 5; 379º nº 1, al. c) e 410º n.ºs 2, al. b) e 3 do CPP; arts. 61º, 62º e 63º do Código Penal”.

*Admitido o recurso (despacho a fls. 23) e notificada a digna Magistrada do Ministério Público no tribunal recorrido, veio esta responder à respectiva motivação, resposta que sintetizou assim: - o despacho judicial em apreço não padece de qualquer irregularidade, nulidade, insuficiência ou contradição, mostrando-se a decisão proferida devidamente fundamentada e assente na análise de todos os factores pertinentes; - na situação em apreço, não se mostram reunidos todos os pressupostos necessários para a concessão da liberdade condicional nos termos da previsão dos artigos 61.º, n.º 2, al. a), e n.º 3 e 63.º, n.º 2; - a decisão recorrida afigura-se correta e bem fundamentada em termos de facto e de Direito, pelo que, não merecendo censura, deverá ser mantida nos seus precisos termos.

*Nesta instância, na intervenção prevista no artigo 416.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer em que, secundando a posição assumida pela Magistrada do MP na primeira instância, se pronuncia pelo não provimento do recurso.

*Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, sem resposta do recorrente.

*Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

II – Fundamentação O recorrente começa por questionar a validade formal do acto de notificação da decisão em crise e da própria decisão, que considera “juridicamente inexistente”.

Importa começar por assinalar que a conclusão 1.ª (“O despacho em crise está ferido de ilegalidade porque a notificação está desprovida de data e da assinatura e nome do magistrado decisor”) não espelha o alegado na motivação do recurso.

O recorrente começa por afirmar que não consta da nota de notificação (referindo-se à notificação por via postal registada, de que está uma reprodução a fls. 171 destes autos, dirigida ao seu ilustre mandatário) a data em que foi enviada, o que configuraria uma irregularidade.

No seu entendimento, “está a tornar-se um hábito (mau hábito, diga-se) produzir notificações em processo penal através de meios electrónicos da moda. Mas isso não é legal”.

Por seu turno, o despacho recorrido seria juridicamente inexistente porque “em lado algum consta o nome do decisor que proferiu o despacho ora em crise. Ora, a identificação e a assinatura do magistrado é essencial”.

O recorrente, certamente, concordará que a circunstância de, em processo penal, não ser obrigatória (como o é no processo civil) a tramitação electrónica do processo não implica a proibição de utilização de meios electrónicos para a prática de actos processuais.

Com a revisão do Código de Processo Penal operada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, ficou, expressamente consagrada essa possibilidade, através de utilização de “formulários em suporte electrónico” e da “assinatura electrónica certificada” (n.º 3 do artigo 94.º do Cód. Proc. Penal).

No que, especialmente, se refere aos processos nos tribunais de execução de penas, o artigo 150.º do CEPMPL é bem claro ao dispor que “a tramitação dos processos é efectuada electronicamente em termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça”, especificando o seu n.º 2 que tal portaria regula, designadamente, (…) c) A prática, necessariamente por meios electrónicos, dos actos processuais dos magistrados e dos funcionários.

É a Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto, que, actualmente, regula a tramitação electrónica, concretizando o n.º 2 do seu artigo 1.º que essa regulamentação abrange “a apresentação de peças processuais e documentos por transmissão eletrónica de dados, distribuição de processos por meios eletrónicos, prática de atos processuais por meios eletrónicos por magistrados e funcionários judiciais e notificações e comunicações por transmissão eletrónica de dados, de acordo com o previsto no Livro II do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade”.

Os artigos 19.º e 21.º dispõem, respectivamente, sobre os actos processuais dos magistrados e os actos dos funcionários e determina que são sempre praticados “em suporte informático através do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais”.

Os actos dos magistrados são praticados “com aposição de assinatura eletrónica qualificada ou avançada” que “substitui e dispensa para todos os efeitos a assinatura autógrafa em...

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