Acórdão nº 1789/13.2TBVCD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelCAIMOTO J
Data da Resolução19 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. n.º 1789/13.2TBVCD.P1 - APELAÇÃO Relator: Desem. Caimoto Jácome(1503) Adjuntos: Desem. Macedo Domingues Desem. Oliveira Abreu ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 1-RELATÓRIO B…, C…, D… e E…, com os sinais dos autos, instauraram acção declarativa, constitutiva (exercício do direito de preferência), com processo comum e forma sumária, contra F… e mulher G…, e H… e mulher I…, com os sinais dos autos, para haver para si o prédio vendido pelos primeiros aos segundos réus pela escritura de 27.5.2013, sem que qualquer deles tenha oferecido às autoras a preferência que lhes assiste, dado que o prédio vendido, tal como o seu, é de área inferior à unidade de cultura fixada para a região e confina com o das demandantes.

Citados os réus, apenas contestaram os RR. compradores, afirmando a caducidade da acção, por proposta mais de seis meses sobre o conhecimento da venda; que pretendem dar ao prédio comprado destino diferente da agricultura, destinando-o à ampliação do seu parque de campismo e construção de armazém de apoio; além do prédio com a área de 15.000 m2, confinante com o vendido, as AA. são donas de outro prédio confinante com a área de 4.900 m2, assim ficando salvaguardada a unidade de cultura, sem necessidade do prédio vendido que não é cultivado há mais de 30 anos; o prédio dos RR está onerado com uma servidão de passagem a favor do objecto da preferência.

Houve resposta das demandantes.

**Saneado e instruído o processo, após julgamento, foi proferida sentença, na qual se decidiu (dispositivo): “Termos em que, vistos os factos assentes e as normas legais estudadas, julgo a acção de todo procedente e, como tal, condeno os RR. a: a) - Reconhecerem que as AA são proprietárias do prédio rústico melhor identificado no artigo 1° supra e que são confinantes com o prédio adquirido pelos 2° Réus aos 1° Réus, prédio rústico este denominado "J…" ou "J1…", sito na …, composto por pastagem, inscrito na matriz rústica sob o artigo 94 de … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde sob o n° 1293, da freguesia …; b) - Reconhecerem o direito de preferência das Autoras na aquisição do prédio agora identificado, pelos RR. H… e mulher I… comprado a F… e mulher G… por Escritura Pública de 31 de Janeiro de 2013, lavrada no Cartório da Sr.ª Notária Dr.ª K…, exarada a fls. 26 a 27 verso do Livro de Notas para Escrituras Diversas n.° 19-G; c) - Abrir mão do objecto da venda a favor das AA., vendo-se os Réus compradores substituídos pelas Autoras na posição de adquirentes.

d) - Julgo nulos todos e quaisquer registos efectuados na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde, posteriormente a 31.1.2013, data da venda do prédio objecto de preferência.

Custas pelos RR. – art.ºs 527, 1 e 2 e 528, 1, do CPC e tabela I-A anexa ao RCP”**Inconformados, os réus apelaram, tendo, na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões: 1.ª Em razão quer da matéria alegada quer da prova produzida em audiência, não podem, restar dúvidas de que os 3 prédios em causa estão juntos uns dos outros, sendo certo que o prédio identificado em G confina com o prédio das Autoras, identificado em A, que por sua vez confina com o prédio identificado em B.

  1. Ou seja, todos estes prédios, bem como o identificado em H, são confinantes entre si, encontrando-se, portanto, juntos uns dos outros.

  2. Pelo que a matéria referida em 1 deve a matéria supra ser considerada PROVADA.

  3. A primeira das questões suscitadas pelos Recorrente relaciona-se com o regime de excepção previsto no art.º 1381º al. a) do Código Civil, ou seja, “Não gozam de direito de preferência os proprietários de terrenos confinantes quando algum dos terrenos constitua parte componente de um prédio urbano ou se destine a algum fim que não seja a cultura.”, sendo que o normativo em causa não exige quaisquer formalismos especiais no que respeita à prova de tal destinação.

  4. Exige isso sim, e de acordo com as regras da distribuição do ónus da prova, que seja quem invoca um facto, que o tenha que provar, facto que resulta evidente, tanto mais que o Tribunal considerou esta matéria como PROVADA nos pontos 2 a 7.

  5. Ou seja, tendo os Réus/Recorrentes alegado em sede de contestação que o prédio objecto da preferência de destinava a outros fins que não a cultura, mormente que se destinava a servir para a instalação de estruturas de apoio ao parque de campismo de que são proprietários e respectiva ampliação, tanto mais que já se encontravam a diligenciar nesse sentido, viram o Tribunal considerar provada essa sua intenção.

  6. Sendo certo que esta excepção ao direito de preferência consubstancia na prática uma verdadeira excepção perentória, pelo que, cabe a quem invoca os factos em que assenta, prova-los, COMO ACONTECEU.

  7. Perante tudo isto, não se percebe como é que, na aplicação do Direito, o Tribunal não considera verificada a excepção à existência do direito de preferência consagrada no art.º 1381 al a) do CC, tanto mais que grande parte da sua argumentação/fundamentação e consequente jurisprudência citada, vão precisamente no sentido defendido pelos Recorrentes, acerca da intenção da utilização/destino a dar ao prédio adquirido.

  8. Em suma, a matéria apurada integra todos os requisitos de que depende a aplicação desta excepção, mas o Tribunal não a reconhece – erradamente.

  9. Facto que torna a sentença nula por violação do disposto no art.º 615. N.º 1 al. c) do CPC, uma vez que os factos apurados se encontram em contradição com a decisão.

  10. O Tribunal deveria, atenta a factualidade apurada, ter considerado verificada a excepção prevista no art.º 1381 al. a) do CC, e nessa conformidade não reconhecer o direito de preferência dos Autores, uma vez que o prédio objecto da venda, claramente se destinava a um fim que não a cultura.

  11. De igual forma, não se verifica a existência do direito de preferência invocado pelos Autores em razão da dimensão quer do prédio objecto da venda quer dos prédios de que as Autoras são já proprietárias e que confinam com aquele.

  12. Já que, constatamos que as Autoras são proprietárias de uma área global de terreno de, pelo menos, 19.900 metros quadrados.

  13. À qual, por força da decisão recorrida, poderão vir a acrescer mais 3.200 metros quadrados, num total de 23.100 metros quadrados.

  14. Num local em que a unidade de cultura é de 20.000 metros quadrados.

  15. Facto que em nosso modesto entendimento afasta a existência do direito de preferência relativamente às Autoras.

  16. É que se o DL 384/88 de 25/10 teve em vista propiciar a extinção progressiva dos minifúndios, visando combater a fragmentação dos prédios, certo é também que o legislador não pretendeu incentivar a criação de latifúndios que se pretendem eliminar, afrontando o artº 94º da C.R.P.

  17. Assim, cremos que se o preferente já de si puder considerar-se um latifúndio não lhe deverá ser reconhecido o direito de preferência, com base precisamente na referida norma constitucional tal como, se o preferente for um minifúndio mas pela junção decorrente da preferência se transformar em latifúndio.

  18. A entender-se de outro modo, tal como na douta sentença recorrida, permitindo-se o exercício da preferência sobre um prédio que excede a unidade de cultura, ao proprietário de diversos prédios rústicos contíguos entre si, ainda que tivesse área inferior à unidade de cultura mas que no seu total excedem aquela unidade, estar-se-ia a constituir verdadeiro latifúndio e consequentemente, a violar frontalmente o disposto no referido artº 94º da CRP.

  19. Este foi, aliás, o entendimento perfilhado no douto acórdão do Tribunal da Relação de Évora, no processo que ali correu termos sob o n.º 217/1997.E1, datado de 17 de Janeiro...

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