Acórdão nº 184/12.5TBVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Janeiro de 2015
Magistrado Responsável | MARIA AM |
Data da Resolução | 27 de Janeiro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº 184/12.5TBVFR.P1 – Apelação 1ª Comarca de Aveiro – Santa Maria da Feira Instância local – Secção Cível – J1 Relatora: Maria Amália Santos 1º Adjunto: Desembargador José Igreja Matos 2º Adjunto: Desembargador João Diogo Rodrigues*Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*B…, residente na Rua …, nº .., …, em Santa Maria da Feira, veio propor a presente acção em processo comum sob a forma ordinária, contra C… – Companhia de Seguros, com sede na Rua …, .., em Lisboa, alegando, em síntese, que: - A A. é proprietária de um veículo automóvel, que identifica, que se encontrava segurado na R.; - Em 25 de Janeiro de 2011, o veículo incendiou-se, tendo ficado totalmente destruído; - Nos termos da apólice, e de acordo com a informação da própria R., a perda total do veículo implicava o pagamento da indemnização de € 33.500.
- Conclui pedindo que a R. seja condenada a pagar à A. a quantia de € 33.500, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal, desde a citação e até efectivo pagamento.
*A R. veio contestar, dizendo que: - Confirma a existência do contrato de seguro celebrado entre as partes relativo ao veículo em causa, abrangendo danos próprios no valor de € 34.500; - Porém o contrato deverá ser anulado, uma vez que o veículo em causa já tinha sofrido 6 acidentes, no período de 5 de Janeiro de 2005 a 25 de Janeiro de 2011, sendo que no acidente anterior ao sinistro dos presentes autos sofreu danos que impossibilitavam a sua circulação e afectavam gravemente as suas condições de segurança e cuja reparação não se mostrava viável, sendo, por isso, considerado uma perda total; - Os salvados foram vendidos à A. que se limitou a reparar o exterior, dando-lhe a aparência de arranjado, sendo que apesar de a A. ter obtido o certificado de inspecção, o mesmo é falso, pois nunca sujeitou aquele veículo a inspecção; - Assim, a A. celebrou o contrato de seguro com a R. sem que o veículo tenha sido inspeccionado, sem informar que o veículo tinha sofrido os sobreditos danos de perda total, sem informar que a matrícula tinha sido cancelada ou devia tê-lo sido e que o verdadeiro objecto do contrato eram uns meros salvados que não valiam mais de € 5.000, tendo indicado o valor de € 34.500; - A A. sabia de todos os factos, tendo-os declarado e omitido de forma dolosa para obter a celebração do contrato de seguro, que, sabendo a R. caso tivesse conhecimento dos factos, não o celebraria; - Caso não se entenda que o contrato é anulável, com a consequente absolvição do pedido, a R. apenas deverá ser condenada a pagar o valor real do veículo, na pior das hipóteses € 22.474,00.
- Remata requerendo que se julgue procedente a excepção de anulabilidade do contrato de seguro e a acção improvada e improcedente.
*A A. apresentou réplica, na qual, em suma, reafirmou o alegado na petição inicial, impugnado a versão dos factos trazida aos autos pela R., que reputou de falsa, pugnando, novamente, pela procedência da acção e ainda pela condenação da R. como litigante de má fé em multa e indemnização não inferior a € 5.000,00.
*Foi proferida Decisão a Julgar a acção totalmente improcedente, absolvendo-se a Ré do pedido.
*Não se conformando com a decisão proferida, veio a A. dela interpor recurso de Apelação, apresentando Alegações e formulando as seguintes Conclusões: 1. Entre a autora e a ré foi celebrado um contrato de seguro do ramo automóvel, intitulado C1…, titulado pela apólice n.º …………, tendo por objecto o veículo automóvel identificado em “1”, com início a 5 de Agosto de 2010, mediante o qual a primeira transferiu para a segunda a responsabilidade civil emergente da circulação do referido veículo automóvel, incluindo danos próprios, e que se rege pelas condições particulares constantes do documento de fls. 37 a 39, as quais damos aqui por reproduzidas, sendo o capital seguro para os danos próprios no montante de 34.500,00 euros; 2. A Ré invoca a anulabilidade do contrato por força da inexistência do veículo, resultante do cancelamento da matrícula por destruição do veículo. Não tendo o mesmo sido reparado e não tendo ocorrido a inspeção legal.
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Que caso o tribunal assim não entendesse, deveria esta ser condenada a pagar à autora o valor real do veículo, na pior das hipóteses € 22.474,00.
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A Ré aquando da celebração do contrato aceitou o valor de € 34.500,00 para efeito de valor seguro.
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O Tribunal não deu como provado o mencionado em 2. das conclusões.
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O Tribunal deu como provado o mencionado em 3. das conclusões.
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Resulta da prova documental que o valor do veículo era de pelo menos € 29.235,84, conforme resulta dos documentos de fls. 223 e 259 dos autos.
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Pelo que, e nesta medida, existe manifesta violação do disposto no artigo 662º do CPC.
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Impondo-se uma alteração da decisão, que passe por considerar como provado que o valor do veiculo é de pelo menos € 29.235,84.
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O disposto nos artigos 24º e 25º do Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de Abril, não tem aplicação nos presentes autos.
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Porquanto o valor considerado para efeitos de seguro do ramo automóvel não tem relevância para análise de risco; tão só para montante de prémio de seguro.
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A Ré tem como aferir a justeza do valor indicado para o seguro, no momento em que é indicado, tendo-o aceitado.
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Pelo que o Tribunal faz uma interpretação errada das mencionadas normas jurídicas, 14. Devendo as mesmas ser interpretadas de forma restritiva, no que ao montante indicado para efeitos de seguro diz respeito.
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Pelo que, a ser assim considerado, não existe fundamento para a declaração de anulabilidade do contrato, devendo assim ser revogada a decisão nesta parte e em consequência ser considerado como válido o contrato.
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A ser assim considerado, deverá ser revogada a decisão e substituída por outra que condene a Ré a indemnizar a A. no montante peticionado.
Sem prescindir, 17. A Ré em momento algum invoca o valor como fundamento para a anulabilidade do contrato, 18. Tão só o invoca para efeito de redução da indemnização.
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A própria Ré reconhece que o valor não colocaria em causa a realização do contrato, tão só uma correcção do valor.
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Pelo que manifestamente se impõe, na sequência do supra mencionado, uma alteração da sentença, que passe pela condenação da Ré a indemnizar a A. na quantia de € 29.235,84, ou 21. Caso assim não se entenda e se considere o valor constante dos factos provados, ser a Ré condenada a indemnizar a A. no valor de € 22.474,00; Ainda sem prescindir, 22. Tendo-se o Tribunal pronunciado sobre factos que manifestamente não foram invocados, designadamente a anulabilidade do contrato por força do valor indicado para efeitos de seguro, foi violado o disposto na alínea d) do nº 1 do artº 615º do CPC pelo que ocorre nulidade da sentença.
Pede, a final, que seja revogada a sentença recorrida e substituída por outra que face ao exposto condene a ré a indemnizar a A na quantia peticionada de € 33.500,00 ou, caso assim se não entenda, de, pelo menos, € 29.235,84, ou, considerando o valor dado como provado no ponto 17 da douta sentença, no valor de € 22.474,00.
Sem prescindir, deverá ser considerada a nulidade da sentença por violação do disposto na alínea d) do nº1 do artº 615ºdo CPC.
*Foram apresentadas contra-alegações nas quais o recorrido pugna pela manutenção da decisão recorrida.
*Cumpre decidir, sendo certo que o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da recorrente, acima transcritas, no qual se apreciam apenas as questões invocadas e relacionadas com o conteúdo do acto recorrido e não sobre matéria nova, excepção feita para o que for do conhecimento oficioso.
*Nessa linha de orientação, as questões a decidir, suscitadas pela recorrente na presente apelação são: - a de saber se é admissível a alteração da matéria de facto dada como provada; - se tem aplicação aos autos os artºs 24º e 25º da Lei do Contrato de Seguro; e - se a decisão é nula por ter conhecido de questão de que não podia tomar conhecimento.
*Foram dados como provados na 1ª Instância os seguintes factos: 1 - A autora é dona do veículo automóvel marca Renault, modelo …, com a matrícula ..-..-XC; 2- Entre a autora e a ré foi celebrado um contrato de seguro do ramo automóvel, intitulado C1…, titulado pela apólice n.º …………, tendo por objecto o veículo automóvel identificado em “1”, com início a 5 de Agosto de 2010, mediante o qual a primeira transferiu para a segunda a responsabilidade civil emergente da circulação do referido veículo automóvel, incluindo danos próprios, e que se rege pelas condições particulares constantes do documento de fls. 37 a 39, as quais damos aqui por reproduzidas, sendo o capital seguro para os danos próprios no montante de 34.500,00 euros; 3 - Foi participada à ré a ocorrência, a 25 de Janeiro de 2011, de um sinistro com intervenção do veículo automóvel identificado em “1”, a qual iniciou as diligências de averiguação para efeito de peritagem; 4 - O veículo automóvel identificado em “1” apresentava estragos em toda a sua extensão; 5 - A ré enviou à autora a carta cuja cópia se encontra junta a fls. 18, datada de 8 de Fevereiro de 2011, cujo teor se dá aqui por reproduzido, onde se lê, para além do mais, o seguinte: “Após vistoria (…) efectuada pelos nossos serviços técnicos (…) verificou-se que nos termos das condições contratuais e demais legislação em vigor não nos é possível dar instruções de reparação da mesma em virtude de estarmos perante um sinistro abrangido pelo conceito de perda total, pelo que não sendo possível a sua reconstituição natural fixaremos a eventual indemnização em dinheiro (…). Nesta conformidade, informamos que para efeito de indemnização iremos considerar o valor de Eur...
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