Acórdão nº 4858/12.2TBMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelANA PAULA AMORIM
Data da Resolução30 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Transp-4858-12.2TBMAI Comarca do Porto Maia-Inst Local-Sç Cv-J2 Proc. 4858/12.2TBMAI Proc. 286/16 -TRP Recorrente: B…, Lda Recorrido: C…, Lda Companhia de Seguros D…, SA-Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim Juízes Desembargadores Adjuntos: Manuel Fernandes Miguel Baldaia de Morais* * *Acordam neste Tribunal da Relação do Porto[1] (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível) I. Relatório Na presente ação declarativa que segue a forma de processo ordinário em que figuram como: - AUTORA: B…, Lda., com sede no …, n.º .., em Barcelos; e - RÉUS: C…de, Lda com sede na …, Sector ., Armazém nº .., ….-… Maia; e Companhia de Seguros D…, SA com sede na Avenida …, nº …, ….-… Lisboa pede a Autora que as rés sejam condenadas: - a pagar-lhe a quantia de Eur. 24.865,59, correspondente aos danos patrimoniais por si sofridos; - a suportar as despesas decorrentes do transporte efetuado entre Frankfurt e a Holanda; - a pagar-lhe os juros de mora, contados à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Para fundamentar a sua pretensão a autora alegou, em síntese, que se dedica à atividade de produção e venda de carne, explorando para o efeito o estabelecimento onde tem a sua sede. No exercício da sua atividade, no dia 2 de Março de 2012, uma empresa austríaca encomendou-lhe 300 pistolas de bovino para consumo humano. Tais mercadorias deveriam ser entregues na Alemanha, tendo contratado a ré “C…, Lda.” para proceder ao seu transporte.

Mais referiu que deu instruções à ré “C…, Lda.” para que o aludido transporte fosse efetuado a uma temperatura entre os 0º e os 2º graus. Devido à inobservância dessa instrução e devido ao atraso na entrega da mercadoria, parte da mesma chegou danificada ao seu destino, tendo sido recusada.

A carne recusada foi enviada para outra empresa, sediada na Holanda, tendo ali sido adquirida mediante uma redução do preço. Por força dessa redução do preço teve um prejuízo efetivo de Eur. 24.865,59.

-Citadas as rés, contestaram.

-Na contestação, a ré “Companhia de Seguros C…, S.A.” defendeu-se por exceção e por impugnação.

Alegou, em síntese, que celebrou com a ré “C…, Lda.” um contrato de seguro de responsabilidade civil do transportador, o qual se encontrava em vigor à data do sinistro. Tendo recebido a comunicação do sinistro em apreço, diligenciou pelo apuramento das circunstâncias em que o mesmo ocorreu.

Na sequência da peritagem efetuada, concluiu-se que o sinistro não decorreu de qualquer anomalia do transporte, mas, ao invés, da circunstância de os animais em causa terem sido abatidos vários dias antes do início do seu transporte.

Conclui, requerendo que a presente ação seja julgada improcedente, com a consequente absolvição do pedido.

-A Ré “C…, Lda.” veio apresentar a sua contestação, deduzindo ainda pedido reconvencional contra a autora.

Para fundamentar a sua pretensão alega, em síntese, que durante a execução do transporte, cumpriu com todas as obrigações a que estava vinculada, incluindo a observância da temperatura adequada para a conservação da mercadoria.

A mercadoria transportada não foi aceite na sua totalidade pelo facto de a mesma já não se encontrar em perfeitas condições aquando do seu carregamento.

Mais refere que não foi causadora de qualquer prejuízo sofrido pela autora, impugna o valor indemnizatório peticionado, porquanto nunca seria devido o valor da mercadoria avariada, mas apenas os valores previsto no artigo 23º da CMR.

Alega, ainda, que tendo celebrado um contrato de seguro, a responsável pelo pagamento de uma eventual indemnização seria a ré seguradora.

O transporte inicial foi efetuado pelo preço de Eur. 3.000,00.

No dia 7 de Março de 2012, a autora solicitou-lhe um transporte de 186 pistolas de bovino de Frankfurt para a Holanda. Tal transporte ascendeu ao preço de Eur. 984,00. Apesar de interpelada para o efeito, a autora não procedeu ao pagamento dos transportes supra mencionados.

Conclui, pugnando pela improcedência da presente ação, com a consequente absolvição do pedido, bem como pela procedência do pedido reconvencional, com a consequente condenação da autora a pagar-lhe a quantia de Eur. 3.984,00, acrescida de juros de mora devidos desde a citação até integral e efetivo pagamento.

-Notificada para o efeito, a autora veio apresentar articulado de resposta, pugnando pela procedência da ação e pela improcedência do pedido reconvencional.

-Mediante despacho proferido a fls. 337 dos autos, foi admitido o pedido reconvencional deduzido pela ré “C…, Lda.” e determinado que os autos passassem a seguir a forma de processo ordinário.

-Foi proferido despacho saneador e procedeu-se à seleção dos factos assentes e à elaboração da base instrutória, sendo que as reclamações apresentadas a esse propósito foram indeferidas.

-Realizou-se o julgamento, com gravação da prova e com respeito pelo formalismo legal.

-Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve: “Pelo exposto, decide-se julgar a ação interposta pela autora B…, Lda. improcedente e, em consequência, absolver as rés C…, Lda. e Companhia de Seguros D…, S.A. do pedido contra as mesmas deduzido. Mais se decide julgar o pedido reconvencional deduzido procedente e, em consequência, condenar a autora B…, Lda. a pagar à ré C…, Lda. a quantia de Eur. 3.984,00 (três mil, novecentos e oitenta e quatro euros), acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos contados desde 18/10/2012 até integral e efetivo pagamento e calculados à taxa legal.

Custas pela autora, nos termos do artigo 527º do CPC”.

-A Autora veio interpor recurso da sentença.

-Nas alegações que apresentou a apelante formulou as seguintes conclusões: 1. O Tribunal fez uma errada apreciação da prova quanto aos factos nº 27, 31, 32, 34, 36, 37, 38, 42, 47, 48, 49, 50, 53 e 54 constantes da douta sentença.

  1. A matéria de facto incorretamente dada como provada e não provada, nos termos supra expostos, assentou somente na prevalência da prova testemunhal produzida pelas Recorridas, em detrimento da prova documental e testemunhal, que notoriamente a contradiz.

  2. Em especial, não se percebe que o Tribunal a quo admita que a viagem duraria três dias, com saída no dia 02 e chegada no dia 05, e não tenha considerado em prol da tese que a mercadoria deveria ter sido descarregada no dia 5, nas instalações da cliente da Recorrente, a circunstância do veículo ter furado um pneu às 4:11:38 da madrugada do dia 05 e, por esse motivo, ter permanecido em … cerca de 14h, quando apenas faltariam 4h de caminho até ao destino, dado ter sido esse o tempo que a 1ª Ré despendeu para lá chegar.

  3. Se não tivesse parado esse tempo todo, teria chegado ao local de descarga pelas 8h da manhã desse dia 5, indo ao encontro do depoimento prestado pelo gerente da Recorrente, E…, que afirmou, conforme alegado na p.i., que a descarga deveria ter sido efetuada nesse dia, como era aliás prática corrente, e não no dia 6.

  4. É também incongruente imputar o estado da carne à data em que foram abatidas as pistolas, quando decorre da peritagem não existir qualquer nexo de causalidade a esse respeito.

  5. É igualmente incongruente dar-se como não provado que a carne não estava refrigerada quando a inspeção da Direção Geral de Veterinária afirmou que estava apta para consumo humano e quando a peritagem concluiu, pela análise de suporte documental técnico – registos das câmaras e certificação de calibração – que o estava.

  6. A discordância reside também na forma como o Julgador considera provado que o motorista programou a refrigeração entre os 0º e os 2ºC, quando o único meio de prova decorre do testemunho do motorista da 1ª Ré e de um perito contratado pela 2ª Ré, que analisa a situação depois dela ter acontecido, isto é à chegada da carne a Frankfurt, descartando sem razão aparente, e novamente, a prova documental, técnica, que sustenta o oposto, que mais não é do que o registo de temperaturas do reboque frigorifico, e onde nele se identifica que os graus de saída do ar (T1), só estiveram à temperatura contratada a partir do dia 4, pelas 10h.

  7. A Recorrente, por um lado, junta suporte técnico-documental do registo das camaras, junta certificado de calibração dos sensores das câmaras, junta documento oficial da Direção Regional de Veterinária a atestar a aptidão da carne para consumo humano, junta o CMR onde o motorista não coloca qualquer reserva à carne transportada, junta registo de temperaturas do reboque frigorífico que mostra valores superiores aos contratados e, em contraponto, temos a Recorrida a admitir que, aparentemente, no ato da carga, não havia qualquer defeito, a sustentar a tese da refrigeração nos 2ºC na prova testemunhal por si arrolada e do seu interesse, em especial do motorista F… (aquele que diz ter descansado 23h em 24h), a assumir que não existe verificação metrológica das sondas dos instrumentos de medição e registo de temperaturas do veículo; e a juntar o registo do GPS onde evidencia que a mercadoria só não chegou ao destino no dia 05/03, pela manhã, porque teve um percalço, mais especificamente um furo, não estando a Recorrente, obviamente, em condições de demonstrar o contrário, porque não acompanhou o transporte.

  8. Em suma, o depoimento “perfeito” das testemunhas das Recorridas teve o condão de colocar tudo em causa, nomeadamente peritos, documentos e outras testemunhas, quando nos parece notório que a conjugação dos meios de prova constantes do processo deveriam levar o Tribunal a quo, a sustentar a tese defendida pela Recorrente, que entregou a carne devidamente refrigerada e que a 1ª Ré não cumpriu duas vezes com o contrato, não colocou a mercadoria no dia 05, nas instalações da cliente da Autora em Frankfurt e não observou a temperatura acordada, algo se tendo passado nesse transporte, que a Autora desconhece porque não o acompanhou, que causou a avaria.

  9. Por outro lado, à Autora/Recorrente caberia provar que contratou a 1ª Ré/Recorrida para um transporte internacional, que entregou a mercadoria à 1ª Recorrida, e que a mercadoria se danificou/deteriorou nesse...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT