Acórdão nº 9304/13.1TDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Janeiro de 2015
Magistrado Responsável | L |
Data da Resolução | 21 de Janeiro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
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secção criminal Proc. nº 9304/13.1TDPRT.P1 ________________________ Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO: Nos autos de instrução n.º 9304/13.1TDPRT.P1 do 1º Juízo b do Tribunal de Instrução criminal do Porto, 1º Juízo B, o SINDICATO DOS TRABALHADORES DA INDÚSTRIA DE HOTELARIA, TURISMO, RESTAURANTES E SIMILARES DO NORTE apresentou denúncia contra B…, Ldª., C…, D… e E… pela prática de um crime de violação do direito à greve, p.p. à data dos factos, pelos artsº 596º, nº1, 607º e 613º do Código do Trabalho e, actualmente, p.p. pelos artigos 535º, nº1 543º e 546º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº7/2009, de 12/2.
. Na sequência do despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público, a fls.31-36 o Assistente Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Norte requereu a Abertura da Instrução contra os arguidos B…, Ldª, C…, D… e E… pela prática de um crime p.p. pelos arts 535º e 543º do Código do Trabalho.
Realizado o debate instrutório foi proferida decisão instrutória, a fls. 223 a 229 na qual se decidiu: Indeferir a arguição de falta de legitimidade do sindicato para se constituir assistente e concordar com o despacho de arquivamento determinando o arquivamento dos autos, Com a seguinte fundamentação: (transcrição) (…) O Tribunal é o competente.
O processo o próprio.
Não há nulidades ou excepções a decidir.
Questão prévia: Por requerimento de fls. 200, vieram os arguidos a falta de legitimidade do sindicato para se constituir como assistente, pugnando pela inadmissibilidade legal da presente instrução.
Apesar de ser recente a intervenção do Ilustre Mandatário subscritor nestes autos, não podemos deixar de consignar que o pedido é tardio, sendo que foram até realizadas diligências instrutórias com a presença do advogado dos arguidos, nada tendo sido arguido a este respeito.
Alegam então os arguidos que não há norma legal que confira aos sindicatos legitimidade para se constituírem assistente por crimes previstos no Código do Trabalho, pelo que, para o poderem fazer em sede de processo penal, têm que poder ser qualificados como ofendidos. Referem ainda que o direito á greve é um direito individual dos trabalhadores, sendo estes os ofendidos para os efeitos do disposto no art.º 68º, do CPP.
Em sede de debate instrutório pronunciou-se o Sr. Procurador no sentido do indeferimento da pretensão dos arguidos, pelas razões consignadas na respectiva acta, sendo que no mesmo acto e louvando-se nas razões aduzidas no AC da RC, datado 26/2/2014, aderiu o Mandatário da assistente, àquela posição.
Cumpre decidir: Além das pessoas a quem leis especiais confiram tal direito, podem constituir-se assistentes os ofendidos, considerando-se como tais os titulares dos interesses que a lei quis especialmente proteger com a incriminação, as pessoas de cuja queixa ou acusação particular depender o procedimento e as elencadas nas demais alíneas do art.º 68º, do CPP.
É sabido e pacífico que só ao titular do interesse jurídico tutelado pela norma penal é reconhecida capacidade e legitimidade para intervir no processo penal como assistente.
As associações sindicais podem exercer o direito de ação no que respeita aos interesses coletivos que representam bem como à violação de direitos individuais mas com caráter de generalidade, ou seja, que respeitem à maioria dos trabalhadores seus associados - artigo 5º, n.ºs 1 e 2, c), do C.P.T. Como se refere no AC da RP, datado de 14/10/2013, N.º Conv.
31013669/12.3TTBRG.P1, in, www.dgsi.pt, “etimologicamente, a palavra sindicato tem as raízes no latim "sindicus", que por sua vez deriva do grego "syndicos" (que significa aquele que defende a justiça). Actualmente, e dito de uma forma muito sintética, um sindicato é uma associação livre, estável e permanente de empregados ou de trabalhadores pertencentes a uma mesma profissão (ou profissões relacionadas) ou a um mesmo sector de actividade, que se unem para defesa dos respectivos interesses profissionais, individuais ou colectivos, nomeadamente ao nível das condições de trabalho e condições salariais. (…) no que tange à legitimidade processual dos sindicatos para a representação dos interesses, quer colectivos quer individuais dos trabalhadores que representam, a jurisprudência é maioritária no sentido de defender tal legitimidade por parte do sindicato.” Por ter interesse relativamente ao que aqui se discute e do mesmo Acórdão, “Assim, podemos ler no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24-02- 1999, disponível in BMJ, 484.º-237, o seguinte “o interesse colectivo não elimina nem ofusca os interesses de cada um dos interessados, conferindo-lhes, antes, uma maior força que, pela sua importância, justifica a respectiva tutela.” (sublinhado e negritos serão sempre da nossa autoria). É referido, também, no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 08-09-2010, disponível em www.dgsi.pt, o seguinte: “Os sindicatos, para além da legitimidade para defender os interesses próprios de que sejam titulares, como qualquer outra pessoa colectiva, têm legitimidade para a defesa dos direitos e interesses colectivos e para a defesa dos direitos e interesses individuais dos trabalhadores que representam.” Também é este o entendimento maioritário no Tribunal Central Administrativo Sul, o qual refere no seu Acórdão de 19-05-2005, disponível em www.dgsi.pt, que “A legitimidade dos sindicatos para defesa colectiva de todos os direitos e interesses individuais legalmente protegidos dos trabalhadores que representam, em matéria sócio-profissional, é independente de, no caso concreto, estar ou não em causa o interesse de todos os seus associados.” Também o Tribunal Central Administrativo Sul refere, no seu Acórdão de 22-04-2010, disponível em www.dgsi.pt, o seguinte: “(…) decorre directamente do citado nº 1 do art° 56° da CRP que reconhece às associações sindicais a competência para defenderem os direitos e interesses dos trabalhadores que representem, sem restringir tal competência à defesa dos interesses colectivos desses trabalhadores, antes supondo que ela se exerça igualmente para defesa dos seus interesses individuais.” Ainda neste Tribunal, citamos o Acórdão de 09-03-2006, proferido à luz da legislação então em vigor, disponível em www.dgsi.pt, que diz o seguinte: “A disposição do nº3 do artº 4 do DL 84/99, de 19.3, ao reconhecer às associações sindicais legitimidade «para a defesa colectiva dos direitos e interesses individuais legalmente protegidos dos trabalhadores que representem», consagra a legitimidade processual activa dessas mesmas associações para a defesa dos direitos e interesses individuais de um só trabalhador.” Para não sermos demasiados exaustivos com citações, indicam-se, a título de exemplo, outros Acórdãos que sufragam a posição defendida pelo Recorrente, a saber: Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 18-10-2007; de 28-03-2007; de 10-05-2007; de 17-05-2007; de 28-06-2007; de 26-07-2007 e de 26-11-2009; Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 22-10-2003; de 25-04-2004; de 21-09-2004; de 06-10-2005 e de 16-12-2010, todos disponíveis em www.dgsi.pt.” Considerando o referido na lei a propósito de quem deve ser considerado ofendido, para efeitos de constituição de assistente, e vista a jurisprudência a este respeito, dúvidas não temos em considerar como válido o despacho de fls. 61, que aliás, nunca até então foi sindicado.
Com efeito, os sindicatos são estruturas colectivas de representação de trabalhadores, que estes podem constutir/aderir, para prossecução e defesa dos seus interesses e direitos, estando a sua competência balizada e definida no art,º 56º, da CRP. Ora o direito à greve, o seu exercício, a comunicação da aderência, será, por excelência, um dos direitos que poderá ser exercido sindicalmente e nada mais representa do que a união dos direitos individuais numa génese comum que fortalece e agiliza aquele direito. Um sindicato não pode assim deixar de ser considerado como titular do interesse que a lei quis especialmente proteger com a incriminação.
A considerarmos o referido nos artigos 530º, 531º, 535º e 543º, do CT, reflicta-se no AC da RC referido pelo assistente (Nº conv. 729/11.8TACBR-A.C1, in www.dgsi.pt,), onde se diz, “essencial daqueles normativos do Código de Trabalho acima referidos ressalta que (1) a competência para declarar a greve é fundamentalmente atribuída às associações sindicais, (2) os trabalhadores em greve são representados pela associação ou associações sindicais que decidiram o recurso à greve, que podem delegar os seus poderes de representação e (3) o empregador não pode, durante a greve, substituir os grevistas por pessoas que, à data do aviso prévio, não trabalhavam no respectivo estabelecimento ou serviço nem pode, desde essa data, admitir trabalhadores para aquele fim. Claramente se vê que o bem jurídico protegido naquelas normas é a autonomia e independência sindical, assim se assegurando o exercício do direito de representação que cabe às estruturas de trabalhadores, e por isso a legitimidade dos sindicatos se estende, quer à defesa dos interesses colectivos que representam, quer à defesa colectiva dos interesses individuais dos trabalhadores – Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol I, 4.ª edição revista, Coimbra, 2007, p. 742.
A mesma filosofia emerge, de resto, do dispositivo do art. 5.º do Código de Processo do Trabalho (…).Portanto, a legitimidade para a constituição como...
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