Acórdão nº 1172/13.0GBAGD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES SILVA
Data da Resolução28 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 1172/13.0GBAGD.P1 Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO: Nos presentes autos de processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, foram submetidos a julgamento os arguidos B… e C…, tendo sido proferido acórdão que os condenou, pela prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado, do tipo previsto e punível pelo artigo 204.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, alínea e), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão efectiva.

*Inconformados com o acórdão condenatório, os arguidos B… e C… interpuseram recurso, extraindo da motivação as conclusões que a seguir se consignam.

RECURSO DO ARGUIDO B… CONCLUSÕESI. O Tribunal a quo tinha o dever de atender “...a todas as circunstâncias que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do réu...” (vide douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 16/10/2003, in http://www.dgsi.pt), dando como provado, na sua decisão sobre a matéria de facto, que o arguido, caso fosse posto em liberdade, tinha fortes possibilidades de obter um trabalho, facto que ignorou, violando o Princípio da Livre Apreciação da prova, que emana do disposto no artigo 127º do Código de Processo Penal.

  1. Assim, da impugnação da decisão sobre matéria de facto realizada supra, decorre que deveria ter sido considerado provado pelo douto Acórdão recorrido o aludido facto relativo às suas condições pessoais do recorrente, pelo que se impõe decisão diversa da proferida.

  2. O princípio da livre apreciação da prova consagrado no artigo 127º do Código de Processo Penal, não liberta o julgador das provas que se produziram nos autos, ou da sua falta, sendo com base nelas que terá de decidir, circunscrevendo-se a sua liberdade à livre apreciação dessas mesmas provas dentro dos parâmetros legais, não podendo estender essa liberdade até ao ponto de cair no puro arbítrio.

  3. Com efeito e conforme se alegou supra, ao não considerar, nem apreciar, a prova testemunhal, no que toca ao depoimento da testemunha F…, o tribunal a quo julgou arbitrariamente, sem respeitar os limites impostos pelo disposto no artigo 127.º do Código de Processo Penal, violando o Princípio da Livre Apreciação da Prova.

  4. O recorrente foi surpreendido pelos militares da G.N.R., no local do objecto da tentativa de furto, ainda antes do momento do terminus do mesmo, ou seja, antes da sua resolução de abandonar o local com o fruto da subtração, tendo-se posto em fuga e tendo sido capturado, imediatamente, quando se encontrava escondido num silvado, nas imediações.

  5. Em bom rigor, o perigo sofrido pelos bens jurídicos protegidos é aqui relativo, o que se coaduna com a natureza tentada da correspondente infracção, já que terceiros qualificados, aqui os militares da G.N.R., estavam em condições concludentes para imediata e razoavelmente pôr fim à situação de perigo que já estava criada e restituir os bens à situação em que se encontravam antes da intervenção do arguido ora recorrente.

  6. Na verdade, os bens que o arguido, ora recorrente, vem acusado de subtrair encontravam-se em espaços distintos, uns à porta das instalações objecto da tentativa de furto e um outro (o cofre), encontrava-se numa carrinha. Todavia, em momento algum os bens chegaram a sair da esfera jurídica do seu titular original e entraram na posse do arguido, ora recorrente, de modo a que este pudesse, de alguma forma, dispor dos mesmos, pelo que não decorreu aquele mínimo temporal necessário a criar o falado mínimo de estabilidade necessário ao seu efectivo domínio.

  7. Não foi consumado, pelo recorrente, o crime de furto, de facto, “...o crime de furto consuma-se quando a coisa sai da esfera de domínio do titular inicial e o agente adquire um mínimo de estabilidade no domínio de facto correspondente ao seu empossamento, uma estabilidade que lhe assegure uma possibilidade plausível, ainda que não absoluta (posse pacífica), de fruição e disposição da coisa subtraída...” (vide douto Acórdão dessa Relação, de 12/05/2010, in http://www.dgsi.pt), o que, in casu, não aconteceu.

  8. Assim, ao considerar que a previsão legal do crime de furto foi preenchida, na forma consumada, pela actuação do arguido ora recorrente, ao invés de se decidir pela tentativa da prática do crime, o douto Acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 204.º, 203.º e 22.º do Código Penal.

  9. Deve a douta Decisão recorrida ser substituída por outra, que condene o arguido pela prática do crime de furto qualificado, na forma tentada, com as devidas consequências legais.

    sem prescindir ou conceder no que acima se alegou, XI. A suspensão da execução da pena de prisão terá que satisfazer as “...exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico" (Prof. Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 344), sendo que, in casu, estas exigências mínimas parecem estar preenchidas, dado que, o desvalor da conduta das recorrentes, apesar de muito grave, não foi muito acentuado – facto que ressalta até da pena concretamente aplicada ser mais próxima do limite mínimo da moldura penal aplicável.

  10. Por outro lado, no que toca à vertente subjectiva da atribuição da suspensão, o recorrente: - antes da sua detenção, “...residia com a companheira e os três filhos de ambos, a companheira de um dos filhos e a neta, em casa própria, num acampamento de etnia cigana, o qual está a ser alvo de um projecto de intervenção comunitária a cargo da D… e da E…, sendo o casal do arguido participativo, empenhado e cumpridor das acções que lhe são dirigidas, nomeadamente nas áreas da saúde e escolaridade dos menores. (vide ponto 13. da matéria de facto dada como provada pelo douto Acórdão recorrido); - nunca antes foi condenado por crimes perpetrados contra o património; - conforme consta do já aflorado depoimento da testemunha arrolada pelo arguido ora recorrente F…, gravado em suporte digital das 11h40m às 12h00m, do dia 09/09/2014, com o ficheiro informático correspondente, e com relevância para a fundamentação dos factos dados como provados no douto Acórdão recorrido, a referida testemunha daria emprego ao recorrente para o exercício das funções de servente da construção civil, se este se encontrasse em liberdade e mal houvesse alguma vaga na sociedade da qual é sócio e gerente – G…, L.da.

    - teve, até hoje um comportamento exemplar no Estabelecimento Prisional onde se encontra preso preventivamente, e; - o relatório social do recorrente juntos aos autos, conclui em prol da execução da pena a aplicar junto da comunidade, com um enquadramento formativo/profissional, o que assegurará as finalidades da punição, numa lógica de reinserção social.

  11. Pelo que pugnamos que existe um juízo de prognose favorável quanto ao recorrente.

  12. Por outro lado ainda, relembramos as finalidades das penas, sendo que, salvo o devido respeito por opinião diversa, in casu, a prisão efectiva do recorrente teria um efeito acima de tudo retributivo e pouco ressocializador, uma vez que este se encontra integrado na sociedade.

  13. Temos que concluir no sentido de lhe dar, pelo menos, o benefício da dúvida no que diz respeito à sua rejeição do mal que praticou, não sendo previsível que volte a delinquir se vier a ser confrontado com situação idêntica, pelo que, também por este prisma, pende sobre o recorrente um juízo de prognose favorável.

  14. Outrossim, o Tribunal a quo não cumpriu o seu dever de atender “...a todas as circunstâncias que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do réu...” (vide douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 16/10/2003, in http://www.dgsi.pt), ao não considerar, para qualquer efeito, o depoimento da testemunha F…, pelo que está irremediavelmente inquinado o Seu julgamento acerca do juízo de prognose acerca do recorrente.

  15. Impõe-se a substituição da pena aplicada por outra, não restritiva da liberdade, mesmo que sujeita ao regime de prova, suspendendo-se a execução da pena de prisão aplicada, o que para os devidos e legais efeitos se requer.

    Pelo exposto, ao não suspender, na sua execução, a pena de prisão aplicada ao recorrente, violou o douto Acórdão recorrido o disposto no artigo 50º do Código Penal, uma vez que, uma vez verificados os pressupostos objectivos e subjectivos dos quais depende a sua aplicabilidade, tal suspensão constitui um poder-dever que se impunha ao julgador ad quo.

    RECURSO DO ARGUIDO C… CONCLUSÕES I.

    Invoca-se, nos termos do artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo Penal, o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, por o Acórdão recorrido, sendo condenatório, não conter os factos necessários para a decisão sobre a pena, nomeadamente os elementos pessoais do arguido, ora recorrente.

    II.

    Não procurando obter outros meios de prova que obviassem à falta do relatório social, o Tribunal a quo incorreu num vício cuja cominação é o reenvio do processo para novo julgamento, nos termos do artigo 426.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.

    III.

    Ainda que assim não se entenda, sem prescindir ou de alguma forma conceder, impugna-se a decisão proferida sobre a matéria de facto, nos termos dos n.os 3 e 4 do artigo 412.º do Código de Processo Penal.

    IV.

    Consideramos incorrectamente julgados os pontos melhor identificados na motivação do presente recurso, nomeadamente os pontos 1, 2, 3, 4, 5, 6, 9, 11 e 12 da matéria de facto dada como provada pelo Acórdão recorrido, correspondentes, por sua vez, à prática do alegado crime de furto qualificado por parte do arguido, ora recorrente, C….

    De facto, não foi produzida prova em audiência de discussão e julgamento que permita sejam os mesmos julgados nos termos em que o foram.

    V.

    Efectivamente, nenhuma das testemunhas inquiridas em sede de audiência de discussão e julgamento conseguiu identificar o arguido ora recorrente, como um dos elementos do grupo que praticou os factos ilícitos objecto dos presentes autos e que se pôs em fuga após a chegada dos elementos da OPC.

    VI.

    De igual forma, a...

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