Acórdão nº 85254/13.7YIPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Março de 2015
Magistrado Responsável | ANA PAULA AMORIM |
Data da Resolução | 23 de Março de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
DissolSoc-AçPend85254-13.6YIprt Comarca do Porto Inst Local Povoa de Varzim-Seç Cível J1 Proc. 85254/13.6YIPRT Proc. 225/15-TRP Recorrente: B…, Lda - Em Liquidação Recorrido: C…, Lda-Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim Juízes Desembargadores Adjuntos: Rita Romeira Manuel Fernandes* * *Acordam neste Tribunal da Relação do Porto[1] (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível) I. Relatório Em 04 de junho de 2013 no Balcão Nacional de Injunções B…, Lda - Em Liquidação, com sede na Zona Industrial …, Lote .. – … instaurou contra C…, Lda com sede na Rua …, N.º .. - … procedimento de injunção, no qual pediu a condenação da requerida no pagamento da quantia de € 8.160,49 ( capital e juros ), alegando para o efeito que no exercício da sua atividade de agente transitário e a solicitação da Requerida, prestou serviços de logística/distribuição, mas a requerida não procedeu ao pagamento dos serviços, apesar da emissão das respetivas faturas a solicitar tal pagamento.
-Notificada a requerida veio deduzir oposição.
-O procedimento foi remetido à distribuição.
-Designou-se data para a realização do julgamento.
-Oficiosamente, diligenciou-se pela junção aos autos de certidão de matrícula da requerente-Autora.
-Proferiu-se despacho com a decisão que se transcreve: “Em face do supra exposto, estando em causa o conhecimento de exceção dilatória, nos termos preceituados nos citados normativos legais e ainda art. 576º/2, 577º e 578º do CPC, absolve-se a ré- “C…, Lda” da presente instância e, consequentemente, dá-se sem efeito a audiência de julgamento agendada.
Notifique e informe da forma mais célere possível atenta a proximidade.
Registe.”-Por despacho de 06 de outubro de 2014 supriu-se a omissão de pronuncia quanto a custas, condenando-se a Autora no pagamento das custas.
-D…, Sociedade de Advogados, RL, na qualidade de liquidatária da B…, Lda. e em representação dos seus sócios, nos termos do disposto no artigo 162º do Código das Sociedades Comerciais, Autora veio interpor recurso do despacho.
-Nas alegações que apresentou a apelante formulou as seguintes conclusões: A. A sentença proferida pelo tribunal a quo, que absolveu a Recorrida da instância por julgar procedente a exceção dilatória de falta de personalidade da Recorrente enferma do vício de violação de lei, por referência aos artigos 3º, nº 3 e 195º do Código de Processo Civil, bem como do vício de errónea interpretação e aplicação de normas jurídicas, maxime dos artigos 160º, nº 2 e 162º do Código as Sociedades Comerciais, pelo que deverá ser revogada e substituída por outra decisão judicial que permita a normal prossecução dos autos e a realização da audiência de julgamento.
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A Recorrente, depois da deliberação de dissolução e por conseguinte já em liquidação, apresentou um requerimento de injunção no dia 04/06/2013 no Balcão Nacional de Injunções, peticionando da Recorrida o pagamento do valor total de € 8.160,49 (€ 7.643.79 de capital em dívida, acrescido de € 384,70 de juros de mora vencidos e de € 102,00 de taxa de justiça).
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A Recorrida deduziu oposição à injunção, o processo foi à distribuição e deu origem aos presentes autos.
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Foi designado o dia 12 de março de 2014, pelas 10:30 para a realização da audiência de julgamento. Contudo, e não obstante estarem presentes os Mandatários e as testemunhas, o tribunal a quo declarou que se encontrava “impedido na continuação do julgamento no procº 48900/13.00YIPRT” – cfr. “ata de audiência de julgamento” de 12/03/2014 -, e foi adiada a diligência para o dia 17 de setembro de 2014, pelas 9h30, sendo certo que, por absoluto impedimento de agenda, esta era a data mais próxima que foi disponibilizada pelo tribunal.
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No dia anterior ao julgamento, isto é, no dia 16 de setembro de 2014, pelas 17:05, foi a Recorrente surpreendida com uma notificação, através de fax, do tribunal a quo, que continha a sentença que ora se coloca em crise.
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Logo no início da sentença, verifica-se que o tribunal a quo pediu informações à Conservatória do Registo Comercial, recebeu-a e não deu qualquer conhecimento dessas diligências ou desses documentos às partes.
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Depois, louvando-se nesse documento, proferiu o tribunal a quo a sentença recorrida, com fundamento na procedência da exceção dilatória de falta de capacidade judiciária da Recorrente, sem cuidar de notificar as partes dessa intenção e de lhes dar a hipótese de se pronunciarem acerca do propósito do julgador.
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Ao não ter dado a conhecer previamente às partes a solução jurídica que pretendia vir a adotar, para que estas se pudessem pronunciar, o tribunal a quo violou frontalmente o princípio do contraditório, previsto no nº 3 do artigo 3º do Código de Processo Civil.
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Violação essa que encontra cominação legal no nº 1 do artigo 195º do mesmo diploma legal, que refere que “fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa”.
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No caso em apreço, não só a lei declara expressamente o princípio do contraditório (artigo 3º, nº 3 do CPC), como a omissão influiu na decisão da causa.
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Atente-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27/09/2011, proferido no âmbito do processo nº 2005/03.0TVLSB.L1.S1 e disponível www.dgsi.pt, retira-se desde logo do seu sumário o seguinte:“I - O juiz tem o dever de participar na decisão do litígio, participando na indagação do direito – iura novit curia –, sem que esteja peado ou confinado à alegação de direito feita pelas partes. Porém, a indagação do direito sofre constrangimentos endoprocessuais que atinam com a configuração factológica que as partes pretendam conferir ao processo.
II - Há decisão surpresa se o juiz de forma absolutamente inopinada e apartado de qualquer aportamento factual ou jurídico envereda por uma solução que os sujeitos processuais não quiseram submeter ao seu juízo, ainda que possa ser a solução que mais se adeque a uma correta e atinada decisão do litígio.
III - Não tendo as partes configurado a questão na via adotada pelo juiz, cabe-lhe dar a conhecer a solução jurídica que pretende vir a assumir para que as partes possam contrapor os seus argumentos.” L. Por outro lado, o aresto em causa refere ainda que “(…) as partes terão direito a insurgir-se contra uma decisão se a via nela seguida não se ativer, com um mínimo de arrimo, ao que foi alegado e sufragado pelas partes durante o curso do processo.” M. A sentença recorrida configura uma decisão surpresa, em franca violação do princípio do contraditório prescrito no nº 3 do artigo 3º do Código de Processo Civil, porquanto não tiveram as partes oportunidade de conhecer e de se pronunciar acerca da exceção dilatória de...
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