Acórdão nº 7928/11.0TAVNG de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução04 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. Nº 7928/11.0TAVNG 3º Juízo – A do Tribunal de Instrução Criminal do Porto Acordam, em Conferência, os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: No 3º Juízo – A do Tribunal de Instrução Criminal do Porto, processo supra referido, em que são arguidos B… e C…, foi proferida Decisão Instrutória de Não Pronúncia com o seguinte teor: “D… participou criminalmente contra B… e mulher C…, imputando-lhes a prática dos factos descritos a fls. 3 a 10.

Realizado o inquérito, o M°P° encerrou-o com o despacho de arquivamento de fls. 168 a 172, nos termos do art. 277° nº 1 do C.P.P. quanto aos eventuais crimes de denúncia caluniosa p. e p. pelo art. 365° nº 1 (do C.P.) por não se indiciar, da prova recolhida, que os arguidos, ao terem apresentado queixa crime contra o aqui denunciante no NUIPC nº 5343/10.2TAVNG, sabiam que as imputações que lhe faziam eram falsas, e de difamação agravada p. e p. pelos arts. 180º nº 1 e 184° por referência ao art. 132° nº 2 l) todos do Cód. Penal, porque da mesma prova indiciária resulta que os arguidos ao apresentarem a dita queixa crime contra o aqui ofendido, agiram no legítimo exercício de um direito nos termos do art. 31° nº 2 do Cód. Penal, nomeadamente o de verem esclarecidas as razões que levaram à morte da sua filha E….

Inconformado com esta decisão, veio o assistente a fls. 192 a 200, requerer a abertura da instrução, nos termos ali melhor expostos e aqui dados por reproduzidos.

Termina concluindo pela Pronúncia dos arguidos como autores de um crime de difamação agravado p. e p. pelos arts. 180º nº 1 e 184º do Cód. Penal.

Aberta a instrução, efectuaram-se as diligências tidas por necessárias.

Foi realizado o debate instrutório.

Com interesse para a decisão a proferir, este tribunal considera suficientemente indiciados os seguintes factos: 1) O assistente D… é médico especialista de Cirurgia Geral do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho, com a categoria profissional de Assistente Graduado Sénior de Cirurgia Geral desde 11/7/2001, onde também desempenha as funções de Director do referido Serviço desde 5/12/2002, e, paralelamente, é Professor titular de Cirurgia da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade F… e Presidente do Conselho Científico dessa Universidade, é Chefe de Serviço de Carreira Médica Hospitalar e Vice-Presidente da G… – cfr. fls. 166; 2) Os arguidos eram pais de E…, nascida em 30 de Outubro de 1981 – cfr. fls. 82; 3) O arguido B… é funcionário administrativo, actualmente desempregado – cfr. fls. 136 e 741; 4) A arguida C… é auxiliar de acção educativa (empregada da limpeza) – cfr. fls. 143 e 743; 5) A E… era montadora de circuitos eléctricos, sofria de asma profissional e alergia a ácaros – cfr. fls. 254; 6) Era fumadora, e medicada com broncodilatadores e corticoides, tendo sido observada pelo médico de Medicina do Trabalho no contexto de episódios repetidos de parestesias peri-orais pós pandriais – cfr. fls. 254; 7) Foi-lhe detectada uma hipoglicemia de 28gr/dl e, após consulta externa de Endocrinologia no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho, foi sujeita a uma avaliação profunda da sua situação clínica, tendo realizado por 3 vezes o teste de intolerância à glicose com resultados positivos – cfr. fls. 254; 8) Após uma T.A.C. abdominal realizada a 16/12/2008, foi detectada a existência de um tumor de natureza desconhecida, localizado no retroperitoneu superior, no território do tronco celíaco, estendendo-se inferiormente pelo espaço porto-cava, entrando em contacto íntimo com a região cefálica do pâncreas e estendendo-se para o hilo hepático – cfr. fls. 19 a 21, 325 a 328; 9) Foi orientada para a consulta de Cirurgia Geral do mesmo Centro Hospitalar, tendo sido observada a 23/1/2009, e foi-lhe proposta cirurgia de exérese (vulgo, remoção) dessa lesão descrita na T.A.C. por suspeita clínica e imagiológica de insulinoma (cancro do pâncreas), a qual poderia acarretar ressecção major do pâncreas – cfr. fls. 21 in fine e 20 (“...podendo estes aspectos corroborar a suspeita clínica de lesão pancreática, nomeadamente insulinoma”) cfr. fls. 254; 10) O caso da doente E… foi discutido em reunião do corpo clínico do Serviço de Cirurgia, antes da marcação da cirurgia e nessa reunião, não foi apresentado nenhum diagnóstico alternativo ao do insulinoma – cfr. fls. 779; 11) Pela gravidade da doença, a E… foi inscrita na lista de espera de cirurgia com carácter prioritário, tendo sido internada no dia 2 de Fevereiro de 2009 e submetida a laparotomia (vulgo, barriga aberta) no dia 3 de Fevereiro de 2009 – cfr. fls. 22, 23 e 308; 12) A equipa cirúrgica foi constituída pelo Dr. H… como cirurgião principal e Dra. I… e pelo aqui assistente, D…, como cirurgiões assistentes/ajudantes – cfr. fls. 22; 13) Nessa cirurgia, foi efectuada ecografia intra-operatória à E…, observando-se uma massa (vulgo, tumor) irregular, dura, em posição supra cefalopancreática e atingindo o hilo hepático – cfr. fls. 22; 14) E iniciou-se a remoção da referida massa, que se encontrava adjacente à veia porta, local particularmente melindroso – cfr. fls. 22, 325 a 328; 15) Após a identificação da artéria hepática e via biliar, iniciou-se a remoção da referida massa, que se encontrava adjacente à veia porta, a qual estava incluída na referida massa tumoral – cfr. fls. 22; 16) E, enquanto o Dr. H…, com os instrumentos cirúrgicos, procedia à dissecação periportal (vulgo, em redor da veia porta) daquela massa e tentava separá-la da veia porta, ao laquear a veia gástrica esquerda, involuntariamente, provocou uma laceração da veia porta na sua porção posterior, cuja hemóstase se revelou particularmente difícil – cfr. fls. 22, 309, 314, 321 e 254; 17) Foi efectuada clampagem da veia porta acima e abaixo e foi efectuada sutura da laceração com rafia (azul) com prolene 4/0, com o apoio da Cirurgia Vascular – cfr. fls. 22 e 308; 18) Apesar das manobras, a hemorragia persiste, embora em menor quantidade, optando-se pela colocação de Tissucol e compressão – cfr. fls. 22; 19) Apesar de tais manobras e das transfusões de GR e plaquetas, a hemorragia persiste em toalha e sem foco identificável, pelo que foi colocado packing com 13 compressas – cfr. fls. 22; 20) A porção de massa retirada à E… nessa cirurgia, foi enviada para análise histológica pelo serviço de Anatomia Patológica a fim de se fazer o diagnóstico da doença de que ela padecia – cfr. fls. 24; 21) Revelando tratar-se de uma linfadenopatia granulamatosa necrosante, sem sinais de malignidade – cfr. fls. 24, 29 e 312; 22) A PCR ulterior veio confirmar o diagnóstico de tuberculose ganglionar – cfr. fls. 255 e 312; 23) No pós-operatório imediato a doente foi internada na U.C.C.I. (Unidade de Cuidados Intensivos) em coma induzido, tendo sido intensamente medicada, incluindo a administração de concentrados eritrocitários, plasma e plaquetas – cfr. fls. 255; 24) As análises do dia da intervenção revelam, nomeadamente através de valores muito elevados, das amino-transferoses (TGO 2.185, TGP 2.665), que teria existido uma intensa citólise hepática – cfr. fls. 255; 25) No dia 6 de Fevereiro (3° dia do pós-operatório) a melhoria do estado clínico da E… tornou possível à mesma equipa cirúrgica reoperar a doente, extraindo, sem qualquer complicação, o packing de compressas referido em 19) e, quando foi retirado tal packing, foram visualizados vestígios de bílis no hilo hepático – cfr. fls. 25 e 255; 26) Após esta intervenção, a doente permaneceu sob vigilância e terapêutica intensivas na U.C.I., dado persistirem alterações clínicas (sinais sugestivos de uma pneumopatia e de insuficiência hepática) e laboratoriais relevante – cfr. fls. 255; 27) Iniciou tuberculostáticos em 12/2/2009 (tratamento para a tuberculose ganglionar) – cfr. fls. 780; 28) No relatório da T.A.C. efectuada no dia 12/2/2009 refere-se “que não foi visualizado o ramo esquerdo da veia porta; veia porta e ramo direito permeáveis e de normal calibre. As três veias supra-hepáticas encontram-se permeáveis e com fluxo. O conjunto é compatível com múltiplos enfartes hepáticos, já com extensas áreas de necrose” – (vulgo, morte) – “no lobo esquerdo....; ascite livre de moderado volume distribuída pelos diversos recessos peritoneais, derrame pleural livre de médio volume, bilateralmente; no parênquima pulmonar observam-se ténues opacidades mal definidas, com distribuição bilateral e difusa, sugestivas de complicação inflamatória/infecciosa” – cfr. fls. 28; 29) O tratamento anti-tuberculoso referido em 27) teve que ser modificado devido a toxicidade hepática, mas a melhoria progressiva da sua situação clínica permitiu que fosse extubada no dia 18/2/2009 – cfr. fls. 255; 30) No dia 18/2/2009 foi efectuada outra T.A.C. à E…, revelando “...derrame pleural bilateral de médio volume, ...associado a atelectasia do pulmão adjacente... Fígado ...exibindo extensas áreas hipodensas e não captantes, com atingimento sub-total do lobo esquerdo, com áreas de enfarte cuja dimensão e disposição é sobreponível ao estudo anterior. Não é possível definir a artéria hepática desde a origem do tronco celíaco. Os ramos esquerdos da porta têm calibre reduzido mas estão permeáveis. (...)” – cfr. fls. 30; 31) Submetida a terapêutica intensiva, observou-se uma melhoria no estado geral que permitiu que a doente regressasse ao Serviço de Cirurgia no dia 20 de Fevereiro de 2009 – cfr. fls. 255; 32) Foi realizada outra T.A.C. à E… no dia 26/2/2009 revelando que “persiste derrame pleural de médio volume à direita e de pequeno volume à esquerda, com atelectasia subsegmentar do parênquima pulmonar do lobo inferior adjacente. Fígado com dimensões normais, apresentando extensas áreas hipodensas, ...compatíveis com áreas de enfarte, com atingimento de praticamente todo o lobo esquerdo e com algumas...

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