Acórdão nº 560/14.9T8AMT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelM. PINTO DOS SANTOS
Data da Resolução10 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. 560/14.9T8AMT.P1 – 2ª Secção (apelação) _________________________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Francisco Matos Des. Maria de Jesus Pereira* * *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, por si e na qualidade de legal representante das suas filhas menores, C… e D…, intentou o presente procedimento cautelar comum contra E…, pedindo que, sem observância do contraditório inicial, atenta a urgência do procedimento e o perigo de lesão grave e irreparável: a) Seja nomeada representante comum dos herdeiros, como cabeça-de-casal, nos termos do art. 223º do CSC; b) Seja nomeada gerente da sociedade “F..., Lda.”; Alegou, para tal, que: ● ela, as suas representadas e a requerida são as únicas e universais herdeiras de G… [a requerente estava casada com este segundo o regime da comunhão de adquiridos e ele é pai das restantes], que faleceu, com testamento, em 19/11/2014: ● o G… e a requerida eram os únicos sócios da sociedade comercial “F…, Lda.”, e ele era o único gerente desta, tendo tal cargo ficado vago com o seu decesso; ● no sentido de nomear um representante comum dos herdeiros e um gerente, a requerente convocou uma assembleia geral extraordinária da sociedade, que teve lugar a 12/12/2014; ● a requerida foi devidamente convocada e, na assembleia, a mesma recusou-se a assinar a acta; ● perante tal atitude, a assembleia foi encerrada, por não ser possível deliberar de acordo com a ordem do dia; ● a referida sociedade está paralisada, por falta de um gerente que possa apor a sua assinatura nos documentos de relevo; ● por via disso, não é possível pagar salários aos 43 empregados da F…, pagar aos fornecedores de areia, cimento ou combustível, pagar a electricidade, pagar os compromissos bancários assumidos, nem pagar os impostos, nomeadamente, o IVA mensal; ● há o perigo real e efectivo desta situação de “vazio de poder” se manter por muito tempo, se for convocada uma nova assembleia geral, ou se for necessário recorrer à acção judicial comum, o que pode inviabilizar o futuro da sociedade e conduzi-la a uma situação de insolvência; ● embora a requerente, de acordo com o art. 1053º e segs. do Novo CPC, possa requerer, em tribunal, a sua nomeação como representante comum dos herdeiros, enquanto a quota se mantiver indivisa e como gerente da sociedade, a eventual demora da decisão judicial poderá inviabilizar o efeito prático da mesma.

Sem audição da requerida, realizou-se a audiência de produção da prova arrolada pela requerente, tendo esta, no seu decurso, requerido a inversão do contencioso.

Foi depois proferida decisão que deferiu a providência cautelar nos seguintes termos: “Julgo procedente, por provada, a presente providência cautelar e, em consequência: a) Nomeio a requerente B… como representante comum dos herdeiros, como cabeça-de-casal, nos termos do art. 223 n.º 3 do CSC; b) Nomeio a requerente B…, gerente da sociedade “F…, Lda.”; c) Decreto a inversão do contencioso, antecipando o juízo da causa principal. Custas pela requerente.

Comunique à sociedade e à Conservatória do Registo Comercial de Felgueiras.

Registe e notifique.” Notificada e inconformada com tal decisão, interpôs a requerida o recurso de apelação em apreço, cujas alegações culminou com as seguintes conclusões: “I. De acordo com o alegado supra em I), vista a inexistência de fundamentação na sentença recorrida sobre a convicção segura acerca do direito acautelado – nos termos do art. 369º do C.P.C. -, a sentença padece de nulidade quanto à decretada inversão do contencioso, plasmada esta na al. b) do nº 1 e no nº 4 do art. 615º do C.P.C., que deve ser declarada; II. No que respeita à nomeação da recorrida como representante da quota comum, esse é acto extra-sociedade, que podia ter sido tomado por maioria à qual não era necessária a anuência da recorrente, pelo que, não corresponde ao decidido que nesta parte tenha sido a actuação da recorrente a paralisar a sociedade.

  1. Assim, e nesta parte, conforme resulta de II) supra, o decidido viola o vertido nos arts. 22º, 223º e 224º do C.S.C. e art. 1407º do C.C., impondo-se a sua revogação.

  2. Por outro lado, é manifesto que ainda nesta parte, e de acordo o invocado em II supra, os fundamentos estão em contradição com o decidido, ocorrendo nulidade da sentença, nos termos do art. 615º, nº 1, al. c) do C.P.C., que se pretende seja declarada.

  3. Por fim e no que ao ponto III) da motivação supra se refere, é manifesto também que a recorrente não tinha competência para convocar a reunião da sociedade, a decisão não levou em conta que, na falta do gerente assumem tal qualidade todos os sócios, que é imputável à recorrida a inexistência de representante comum da quota, como supra se defendeu, além de que não está facticamente demonstrado um único evento que revele a paralisação da empresa, sendo certo que a recorrente, sócia originária, qualidade que a recorrida nunca teve, nunca se furtou a conduzi-la.

  4. A recorrente simplesmente não tem que se subjugar aos instintos desenfreados da recorrida na sua pretensão de afastamento daquela do giro societário, não tem que a admitir como sócia que não é, não tem que aceitar que esta convoque, ilegalmente, assembleias gerais ou se assuma como presidente de tal assembleia, ignorando e passando por cima da qualidade de sócia que esta tem desde o início da sociedade e aquela, sua madrasta, nunca teve.

  5. A douta sentença violou, assim, pois e nesta parte, o vertido nos arts. 21º, nº 1, al. b), 248º, nº 1, 252º, nº 2, 253º do C.S.C. e 1407º do C.C., pelo que, nesta parte, se impõe e requer a sua revogação.

  6. Deve ser levado em conta o vertido supra em IV) da motivação, e a recorrida sancionada condignamente, nos termos do art. 542º, nº 2 do C.P.C.

E assim, V. Exas., Venerandos Desembargadores, dando provimento ao presente recurso, com o mui douto suprimento dos altos conhecimentos que se reconhecem, farão a costumada, Justiça!” A requerente/recorrida contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e pela confirmação do decidido.

* * *II. Questões a apreciar e decidir: Face às conclusões das alegações da recorrente [que delimitam o «thema decidendum» a cargo desta 2ª instância, conforme dispõem os arts. 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2 do Novo CPC, aqui aplicável, por já se encontrar em vigor à data da instauração do procedimento], as questões a apreciar e decidir são as seguintes: ● Se é de manter a decretada inversão do contencioso; ● Se o Tribunal podia ter nomeado a requerente como representante comum dos herdeiros do falecido gerente da sociedade; ● Se ocorrem os pressupostos para o decretamento da nomeação da requerente como gerente da sociedade; ● Se há que condenar a requerente/recorrida como litigante de má fé.

* * *III. Circunstancialismo fáctico: A decisão recorrida considerou “indiciariamente demonstrados” os seguintes factos: 1º- A requerente, as suas representadas e a requerida são as únicas herdeiras de G…, ex-cônjuge da requerente, com quem casou no regime da comunhão de adquiridos e pai das restantes, e que faleceu, com testamento, no passado dia 19 de Novembro de 2014, como consta da escritura de habilitação de herdeiros de fls. 11.

  1. - O G… e a requerida E… eram os únicos sócios da sociedade comercial que gira sob a firma “F…, Lda.”, NIPC n.º ………, com sede no …, freguesia …, concelho de Felgueiras.

  2. - O falecido G… era o único gerente daquela sociedade, que se obrigava com a sua assinatura e, após o seu óbito, o cargo de gerente ficou vago.

  3. - No sentido de nomear um representante comum e um gerente, foi convocada a Assembleia Geral Extraordinária, que teve lugar no passado dia 12 do corrente, pelas 17 horas [esclarece-se que esta convocatória foi feita pela requerente, como decorre de fls. 17].

  4. - A requerida foi devidamente convocada por carta registada datada de 24/11/2014, junta a fls. 17.

  5. - Estando...

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