Acórdão nº 528/10.4TBVPA.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Março de 2015
Magistrado Responsável | M. PINTO DOS SANTOS |
Data da Resolução | 10 de Março de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Proc. 528/10.4TBVPA.P1 – 2ª Secção (apelação) ________________________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Francisco Matos Des. Maria de Jesus Pereira* * *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório: B…, residente em Vila Pouca de Aguiar, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum sumário, contra C…, SA, com sede em Lisboa, pedindo a condenação desta a pagar-lhe, a título indemnizatório, a quantia 24.070,84€.
Alegou, para o efeito que no dia 30/01/2009, pelas 22,30h, sofreu um acidente na auto-estrada A24, na zona de Vila Pouca de Aguiar, quando conduzia o veiculo de matricula ..-..-TT, de sua propriedade, por ter sido surpreendido pela inesperada existência de um lençol de agua que ocupava toda a largura da faixa de rodagem que lhe estava destinada e por onde circulava, apesar da chuva fraca que caía, por virtude do qual perdeu o controlo da viatura e despistou-se, tendo embatido num «rail» de protecção do lado direito, atento o seu sentido de marcha; que devido a tal acidente sofreu diversos danos patrimoniais e não patrimoniais, que descreveu, e que pretende ver ressarcidos pela ré, concessionária da exploração da A24, por o sinistro lhe ser imputável ao abrigo da Base LXXIII do DL 323-G/2000, de 19/12, em virtude de ter omitido os deveres de manutenção e vigilância da dita AE, a que estava obrigada.
A ré contestou, pugnando pela improcedência da acção, por considerar que não é responsável pelo sinistro, nem pelo pagamento dos danos peticionados.
Requereu a intervenção principal provocada da D…, SA e da companhia de seguros E…, aquela com sede em Lamego e esta com sede em Paris, França.
Por despacho de 30/01/2012, foi admitida a intervenção principal provocada da D…, SA e da Companhia de Seguros E…, as quais apresentaram as respectivas contestações, pugnando igualmente pela improcedência da acção.
Por despacho de 14/06/2012, foi ordenada a notificação das partes para, querendo, se pronunciarem quanto à eventual incompetência, em razão da matéria, dos tribunais comuns.
Apenas o autor se pronunciou, defendendo que os tribunais comuns são materialmente competentes para dirimir o presente litigio, por considerar que a ré é uma entidade privada [sociedade anónima], constituída segundo o regime de direito privado e que, apesar de ser uma concessionaria, a quem compete, nos termos do DL 323-G/2000, a concepção, projecto, construção, aumento do numero de vias, financiamento, conservação e exploração das auto-estradas referidas na Base anexa ao referido DL, nada existe na lei que lhe torne aplicável o regime específico da responsabilidade do Estado.
No saneador, foi proferida decisão que considerou que “a competência material para julgar o pleito pertence ao Tribunal Administrativo [art. 4º nº 1 i) do ETAF e art. 1º nº 5 do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei nº 67/2007]” e, por via disso, julgou o tribunal de Vila Pouca de Aguiar incompetente em razão da matéria para conhecer do mérito da acção, absolvendo a ré e os intervenientes da instância, tendo, ainda, condenado o autor nas custas devidas.
Inconformado com tal decisão, dela interpôs o autor o recurso de apelação ora em apreço, cujas alegações culminou com as seguintes conclusões: “I – A presente situação não se enquadra em nenhuma das alíneas do ETAF que referem quais as situações de responsabilidade civil extracontratual que cabe aos Tribunais Administrativos apreciar, a saber as alíneas g), h) e i) do n.º 1 do art.º 4º.
II – Para a determinação do Tribunal competente deve-se atender à versão apresentada pelo A. na petição inicial, sendo certo que da forma como o A. configura a sua pretensão não está em causa qualquer acto de gestão pública ou relação jurídica administrativa.
III – A jurisprudência tem admitido que nos casos em que se discute a responsabilidade civil de entes públicos por actos de gestão pública, se admite a intervenção, a título principal, do lado passivo, da seguradora para a qual foi transferida esta responsabilidade.
IV – Nestas situações aprecia-se um facto ilícito imputado a um ente público, gerador de responsabilidade civil extracontratual, em que não existe coincidência processual entre o ente responsável e o obrigado ao pagamento da indemnização decorrente dessa responsabilidade.
V – Nos presentes autos discute-se a responsabilidade de uma entidade privada, pelo que não lhe é aplicável o regime específico da responsabilidade do Estado.
VI – Aliás, no art.º 73º do DL 392-A/2007 de 27 de Dezembro o Estado concedente afastou de si, e da sua natureza pública, as relações da Ré com terceiros, reconduzindo a concessionária à sua natureza de pessoa colectiva de direito privado que responde nos termos da lei geral.
VII – Assim, o Tribunal comum é o competente para apreciar a presente acção.
VIII – Pelo que deverá o presente recurso ser julgado procedente.
IX – A decisão recorrida violou, pelos motivos supra expostos, entre outros, o disposto no art.º 212º da Constituição da República Portuguesa, e os art.ºs 1 e 4º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
Termos em que deve ser alterada a decisão recorrida e serem os Tribunais Comuns julgados competentes para apreciar a presente situação.” Não foram apresentadas contra-alegações.
* * *2. Questão a apreciar e decidir: Em atenção à delimitação decorrente das conclusões das alegações do recorrente – que fixam o «thema decidendum» a cargo desta Relação -, a única questão a apreciar e decidir consiste em saber se o julgamento da presente acção é da competência dos tribunais comuns ou se, pelo contrário, é dos tribunais administrativos.
* * *3. Apreciação jurídica: A questão jurídica que vem suscitada pelo recorrente, na sequência do que foi decidido a fls. 911-916, tem sido objecto de várias decisões das Relações, do STJ e do Tribunal de Conflitos, que, por esmagadora...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO