Acórdão nº 506/13.1GCETR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 18 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelNETO DE MOURA
Data da Resolução18 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 506/13.1 GCETR.P1 Recurso penal Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório No âmbito do processo comum que, sob o n.º 506/13.1 GCETR, correu termos pelo Juízo de Instância Criminal da Comarca do Baixo Vouga (e agora corre pela Secção de Competência Genérica da Instância Local de Estarreja, Comarca de Aveiro), B…, melhor identificado nos autos, foi submetido a julgamento, por tribunal singular, acusado pelo Ministério Público da prática, em concurso real, de um crime de violência doméstica, dois crimes de ofensa à integridade física qualificada, sendo um na forma tentada e outro consumado, e dois crimes de ameaça agravada.

C…, melhor identificada nos autos, foi admitida a intervir como assistente e deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido (fls. 149).

Por seu turno, D… deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido (fls. 157).

Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, foi proferida sentença em 29.10.2014[1] (fls. 259 e segs.), depositada na mesma data, com o seguinte dispositivo: “Em face do exposto e ao abrigo das referidas disposições legais: Na parte criminal: 1) Absolvo o arguido B… da prática de um crime de ofensas à integridade física qualificada, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, 23º, nº 1, 143º, nº 1, 145º, nº1, al. a) e nº 2 e 132º, nº 2, al. a), todos do C.P., e de um crime de ameaça agravada, p. e p. pelos artigos 153º, nº 1 e 155º, nº 1, al. a), ambos do C.P., de que vinha acusado.

2) Condeno o arguido B… pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.ºs 1, alínea a), 2, 4 e 5, do Código Penal, na pessoa de C…, na pena parcelar de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão; 3) Condeno o arguido B… pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos artigos 143º, nº 1, 145º, nº1, al. a) e nº 2 e 132º, nº 2, al. a), todos do Código Penal, na pessoa de D…, na pena parcelar de 6 (seis) meses de prisão; 4) Condeno o arguido B… pela prática de um crime de ameaça agravada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 153º, nº 1 e 155º, nº 1, al. a), todos do Código Penal, na pessoa de D…, na pena parcelar de 4 (quatro) meses de prisão; 5) Em cúmulo jurídico das penas parcelares antes aplicadas, condeno o arguido B… na pena única de 2 (dois) anos e 7 (sete) meses de prisão, cuja execução se suspende por igual período de 2 (dois) anos e 7 (sete) meses, acompanhada de regime de prova assente num plano de reinserção social, a definir e a executar com vigilância e apoio pelos serviços de reinserção social, de forma a alcançar os seguintes objectivos: a) Prevenir o cometimento no futuro de factos de idêntica natureza; b) Permitir o confronto do arguido com as suas acções e tomada de consciência das suas condicionantes e consequências; c) Promover a consciência e assunção da responsabilidade do comportamento violento e a utilização de estratégias alternativas ao mesmo, objectivando a diminuição de comportamentos desconformes aos valores do Direito; d) Alcançar o conhecimento de alternativas de comportamentos mas integrados do ponto de vista social e pessoal e a tomada de consciência das vantagens de adopção de tais comportamentos.

Ficando desde já condicionada a: a. Responder a convocatórias do magistrado e do técnico de reinserção social responsável pela execução: b. Receber visitas do técnico de reinserção social e comunicar-lhe ou colocar à sua disposição informações e documentos dos seus meios de subsistência, se tal for determinado; c. Informar o técnico de reinserção social sobre alterações de residência e de emprego, bem como sobre qualquer deslocação superior a oito dias e sobre a data do previsível regresso; d. À frequência de programas considerados adequados com vista à sua reinserção social, e o seu encaminhamento a consulta para despistagem de problemas associados ao consumo em excesso de álcool, caso seja obtida a concordância do arguido para o efeito; Na parte civil: 6) Condeno o demandado B… no pagamento ao demandante D… da quantia de €600,00 (seiscentos euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora calculados à taxa legal desde a data da prolação da presente sentença até efectivo e integral pagamento, absolvendo-o no demais peticionado pelo demandante.

7) Condeno o demandado B… no pagamento à demandante C… da quantia de €1.000,00 (mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora calculados à taxa legal desde a data da prolação da presente sentença até efectivo e integral pagamento, absolvendo-o no demais peticionado pela demandante”.

Inconformado com a decisão condenatória, dela veio o arguido interpor recurso para esta Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação que condensou nas seguintes conclusões (em transcrição integral): 1.

Tendo o recorrente já interposto um anterior recurso, nestes autos, relativo a uma decisão interlocutória (não admissão da contestação e rol) vem, expressamente, nos termos e efeitos do artigo 412.°-5 do CPP, comunicar que mantém interesse nesse recurso, pelo que o mesmo deverá ser apreciado e em primeiro lugar.

  1. A douta sentença violou o disposto no artigo 358.º do CPP, o princípio do contraditório e das garantias de defesa em processo penal, pois fez uma alteração não substancial dos factos não tendo comunicado a mesma ao arguido/recorrente.

  2. Ao ter dado por provado outros factos que transmitem uma ordem cronológica distinta, deveria ter dado de tal conhecimento ao arguido e dar-lhe prazo para organizar a sua defesa. Atento o modo de como se teve de defender a alteração do encadeado dos factos era uma questão essencial à sua defesa e devia ter-lhe sido dada a oportunidade de defesa acabando a decisão por ser uma decisão surpresa.

  3. Para além dos factos que dão uma nova versão cronológica aos acontecimentos, outros houve que não constavam da acusação mas que foram dados por provados e integrados na fundamentação da douta sentença na parte penal, sem que tivessem sido previamente comunicados ao arguido, o que viola frontalmente os supra citados preceitos e princípios.

  4. Dos factos provados não é possível de extrair que houve especial censurabilidade ou perversidade na atuação do arguido, pelo que não poderia ser condenado num crime de ofensas à integridade física qualificada”.

    *Como se refere na transcrita conclusão 1.ª, o arguido já havia interposto recurso do despacho que não admitiu, por extemporaneidade, a contestação e o rol de testemunhas apresentados, sintetizando os respectivos fundamentos nas seguintes conclusões: 1. “Estando o arguido/recorrente acusado de vários crimes, entre os quais o de violência doméstica, não pode considerar-se tal processo como urgente no seu todo sob pena de violação do princípio da legalidade, já que coarta ao arguido o seu direito de defesa, impondo um modo de contagem de prazo apenas admissível em processos urgentes e que não se aplica aos demais crimes de que vinha acusado.

  5. Mesmo que se entendesse que na parte do crime de violência doméstica o processo seria urgente não há norma que o imponha nos demais crimes, pelo que ao assim não entender o douto despacho violou o princípio da legalidade, bem como violou o disposto no artigo 315.º do CPP ao considerar extemporânea a contestação e rol de testemunhas.

  6. A notificação efetuada ao recorrente ao não ter indicado o modo de como o prazo para contestar e indicar o rol de testemunhas deveria ser contado, nomeadamente que não era interrompido em férias, violou o disposto no artigo 235.º do CPC”.

    Pretende, assim, a revogação do despacho recorrido e a sua substituição por outro que admita aquela peça processual.

    *Admitidos os recursos (despachos a fls. 248 e 313) e notificados os sujeitos processuais por eles afectados, à respectiva motivação respondeu, apenas, o Ministério Público, pugnando pela improcedência de ambos.

    *Ordenada a subida dos autos ao tribunal ad quem, e já nesta instância, na intervenção prevista no art.º 416.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer em que manifestou a sua concordância com a posição tomada pelo Ministério Público na 1.ª instância, pronunciando-se pela improcedência dos recursos.

    *Foi cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, com resposta do recorrente a reafirmar o anteriormente alegado.

    *Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência, cumprindo, pois, apreciar e decidir.

    II – Fundamentação Sabendo-se que são as conclusões pelo recorrente extraídas da motivação do recurso que, sintetizando as razões do pedido, recortam o thema decidendum (cfr. artigo 412.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal) e, portanto, delimitam o objecto do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso, está evidenciada a importância desse ónus a cargo do recorrente.

    O assistente é bem claro na delimitação do objecto de cada um dos recursos: No que tange ao recurso interlocutório, considera que a contestação (com rol de testemunhas) apresentada foi-o tempestivamente porque o processo não tem, todo ele, natureza urgente, pelo que se impõe a revogação do despacho que não admitiu aquela peça processual.

    No recurso principal, o recorrente invoca uma alteração (não substancial) de factos que exigia o cumprimento do disposto no artigo 358.º do Código de Processo Penal.

    Por outro lado, discorda do enquadramento jurídico-penal dos factos provados no que respeita ao crime de ofensa à integridade física, pois considera não se verificar qualquer circunstância qualificativa.

    As questões a decidir podem, então, ser assim equacionadas: - natureza urgente do processo e respectivas consequências, nomeadamente em matéria de contagem de prazos da prática de actos processuais; - alteração não substancial de factos e cumprimento do disposto no artigo 358.º do Cód...

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