Acórdão nº 1020/10.2TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelVIEIRA E CUNHA
Data da Resolução24 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

● Rec. 1020/10.2TVPRT.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Desembargadores Maria Eiró e João Proença Costa. Decisão de 1ª instância de 29/09/2014.

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto Súmula do Processo Recurso de apelação interposto na acção com processo comum e forma ordinária nº1020/10.2TVPRT, da 1ª Secção da Instância Central Cível da comarca do Porto.

Autores – B…, no decurso da acção passada a representar por seu filho, curador ad litem, C…, e este mesmo C… e D… e mulher E…, enquanto únicos herdeiros da herança ilíquida e indivisa por óbito de F…, admitidos em incidente de intervenção principal provocada.

Réu – G… (advogado).

Pedido Que o Réu seja condenado a pagar ao Autor a quantia indemnizatória de € 91.201,93, a título de danos patrimoniais, e € 20.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescidas de juros, até integral pagamento.

Tese do Autor Conjuntamente com seu falecido marido, constituiu o Réu seu mandatário, a fim de se defender em duas execuções com base em letras de câmbio, contra si instauradas.

Nesses processos, o Réu, apesar de ter recebido da Autora e de seu marido avultadas quantias em dinheiro, não pagou, entre o mais, a taxa de justiça subsequente, nem taxa de justiça devida pela interposição de recurso, o que impediu os executados e oponentes, num dos processos, de produzirem prova, no outro, de deduzirem oposição.

Idênticas razões (falta de pagamento da taxa de justiça inicial e multa) conduziram ao desentranhamento de um articulado de oposição à providência cautelar de arresto instaurada contra a Autora e seu falecido marido.

A Autora registou, a final, um prejuízo equivalente ao valor das execuções e da providência cautelar, que prosseguiram.

Tese do Réu Impugna motivadamente a tese da Autora.

Sentença Na sentença proferida pelo Mmº Juiz “a quo”, a acção foi julgada improcedente, com a consequente absolvição dos pedidos formulados.

Conclusões do Recurso de Apelação apresentado pelos Autores A. Discordam os aqui Recorrentes da decisão sobre a matéria de facto considerada como provada, uma vez que no entendimento dos mesmos existem elementos de prova suficientes para que fosse tomada uma decisão diferente.

  1. Com efeito, resultam dos documentos juntos aos Autos, os quais não foram impugnados, bem como até reforçados por registos bancários juntos pelo R., de que o Réu recebeu da Autora e marido as quantias de € 145,00 e € 300,00 nas datas de 13/10/2006 e 16/10/2006, € 250,00 a 9/1/2007, € 100,00 a 26/3/2007 e € 100,00 a 4/7/2007.

  2. Assim sendo, documentalmente encontra-se demonstrado que o Réu recebeu dos AA. a quantia global de € 895,00.

  3. Sendo que, da prova testemunhal admite-se, com um grande grau de probabilidade que o Réu recebeu ainda mais quantias em dinheiro suficientes para liquidação das taxas de justiça dos processos nos quais foi mandatado, bem como para liquidação dos seus honorários e despesas.

  4. Não obstante os recebimentos, o Réu não liquidou sequer as taxas de justiça, apesar de deter fundos suficientes para o efeito.

  5. Com efeito, np pº nº 41/06.4TBOVR-A, que correu termos na comarca de Ovar, o Réu liquidou através da sua conta bancária a quantia de € 445,00, a título de taxa de justiça e multa, restando ainda ao Réu a quantia de € 450,00.

  6. No pº nº 412/06.6TBVLC-A, que correu termos na comarca de Vale de Cambra, os AA. teriam que liquidar somente a quantia de € 344,00 a título de taxa de justiça a ser liquidada em prestações mensais de € 60,00, pelo facto de aos AA. ter sido deferido o Apoio Judiciário faseado.

  7. Sendo que o Réu, não obstante deter fundos suficientes, somente liquida a 11/6/2007 uma única prestação, no montante de € 60,01.

    I. Em virtude do não pagamento das taxas de justiça, as oposições dos AA. às execuções que lhes foram intentadas não foram sequer objecto de sindicância pelo tribunal, apesar de os mesmos terem argumentos válidos e prova testemunhal suficientes para a improcedência das execuções.

  8. Com efeito, as letras que foram os títulos executivos que serviam de base às execuções em que a A. e marido eram executados não eram válidas, não tendo as obrigações nelas contidas qualquer validade.

  9. Sendo esse facto do conhecimento do Réu, tendo sido o mesmo mandatado enquanto advogado para os defender perante as acções executivas, não tendo o mesmo realizado com o mínimo de diligência a tarefa a que se encontrava obrigado.

    1. Com efeito, dos dinheiros que recebeu, nunca apresentou contas, e do que recebeu nem sequer liquidou as taxas de justiça como era sua obrigação legal, pois M. Determina o Estatuto da Ordem dos Advogados na versão dada pela Lei nº 15/2005 de 26/1 (EOA), nos seus artºs 96º, 97º e 98º que, relativamente aos valores entregues pelos clientes, o advogado deverá depositar os mesmos em conta específica (artº 97º nº1 al.

    1. EOA), mantendo registos completos e precisos relativos a todas as operações efectuadas, bem como manter tais registos à disposição dos clientes (artº 97º nº1 al.c) EOA).

  10. Mais determina o EOA, no seu artº 98º, que relativamente a dinheiros entregues pelos clientes o Advogado é responsável por aplicar os mesmos no pagamento de despesas, nomeadamente de taxas de justiça e demais encargos relacionados com o processo, sob pena de ser responsável pelo não pagamento das mesmas – artº 98º nº3 EOA, salvo se os dinheiros forem aplicados para pagamento de honorários e seja do conhecimento dos clientes.

  11. Ora, atento o supra exposto e atento o que até somente documentalmente resultou provado, o Réu não liquidou as respectivas taxas de justiça, apesar de deter dinheiro em conta e para o efeito.

  12. Em algum momento o Réu logrou demonstrar ter usado os referidos fundos entregues pelos AA. em despesas, honorários ou taxas de justiça havidos por conta dos AA.

  13. Nem o poderia, atendendo a que lhe foram entregues mais dinheiros, por conta de honorários, despesas e outras taxas, não tendo sequer o Réu logrado exibir esses recebimentos e pagamentos.

  14. Assim sendo, o Réu é responsável pelos prejuízos que tenha causado, pelo não pagamento das referidas taxas de justiça, e o Tribunal “a quo” deveria ter julgado provados os factos alegados pelos AA. e transpostos para 1º a 15º da Base Instrutória.

  15. E por consequência não provados os alegados pelo Réu.

  16. Assim sendo, o Tribunal “a quo” não teve em consideração todos os documentos juntos aos autos, bem como não extraiu dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência, o que implicaria uma decisão diversa sobre a matéria de facto e por consequência uma decisão favorável aos AA.

  17. Por conseguinte, o Tribunal “a quo” não aplicou devidamente o estipulado nos artºs 341º, 350º nº1, 362º e 380º nº1 CCiv, 411º, 412º nº2, 413º e 607º nº5 CPCiv.

    V. Ao considerarem-se como provados os factos alegados pelos AA., a decisão de direito é necessariamente diferente, procedendo a acção com a condenação do Réu nos pedidos.

    Factos Apurados

    1. O réu G… exerce a profissão liberal de advogado, estando inscrito no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados, sendo portador da Cédula Profissional n.º …...

    2. A autora B… e o seu falecido marido necessitaram dos serviços de um advogado por força de duas execuções contra si intentadas e, por isso, contrataram os serviços do réu.

    3. Foi intentada execução contra a autora e o seu falecido marido para pagamento de quantia certa, no dia 12 de abril de 2006, por H….

    4. Tal execução tinha por fundamento o alegado não pagamento de uma letra de câmbio no valor de € 70.000,00 (setenta mil euros).

    5. A autora e o falecido marido foram citados, por notificação datada de 29 de setembro de 2006, no âmbito do processo executivo n.º 412/06.6TBVLC, do Tribunal Judicial de Vale de Cambra, para o pagamento da quantia de € 20.699,99.

    6. O réu deduziu oposição à execução, dando entrada da mesma em juízo em 26 de setembro de 2006, não pagando taxa de justiça.

    7. O exequente nessa execução contestou a oposição deduzida, em 3 novembro de...

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