Acórdão nº 1489/12.0PPPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelARTUR OLIVEIRA
Data da Resolução25 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO – SECÇÃO CRIMINAL (QUARTA) - no processo n.º 1489/12.0PPPRT.P1 - com os juízes Artur Oliveira [relator] e José Piedade, - após conferência, profere, em 25 de março de 2015, o seguinte Acórdão I - RELATÓRIO 1. No processo comum (tribunal coletivo) n.º 1489/12.0PPPRT, da Secção Criminal (J7) – Instância Local do Porto, Comarca do Porto, em que é demandante civil B… e é arguido e demandado civil C…, foi proferido acórdão que decidiu nos seguintes termos [fls. 256]: «(…) Pelo exposto, acordam os Juízes que constituem este Tribunal Coletivo em julgar a acusação procedente e, em consequência condenar o arguido C.., pela prática, em autoria material de 1 crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão, cuja execução não se suspende.

Mais se julga parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado, condenando o arguido a pagar à demandante o montante de 650€ (150€ a título de danos patrimoniais e 500€ a título de danos não patrimoniais), acrescido de juros de mora desde a data da presente decisão até efetivo e integral pagamento; (…)» 2. Inconformado, o arguido recorre, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [fls. 286, vº a 293, vº]: «(…) 1. Vem o presente recurso interposto do acórdão proferido nos presentes autos, que condenou o arguido na pena de 1 ano e 3 meses de prisão efetiva, 2. Pena essa que o arguido entende revelar-se excessiva e desproporcional, devendo a mesma ser suspensa na sua execução.

  1. Constitui ainda entendimento do arguido que se impõe a modificação da decisão do tribunal a quo sobre a matéria de facto, uma vez que, face à prova produzida, foi este erradamente condenado pelo crime de roubo, devendo o arguido ser condenado apenas pela tentativa de roubo e, em consequência, ser a respetiva pena especialmente atenuada.

  2. Em qualquer das soluções, não prescinde o arguido que lhe seja aplicado o regime penal especial para jovens, previsto no D.L. 401/82, de 23 de setembro, uma vez que tinha apenas 19 anos à data da prática dos factos e há sérias razões para acreditar que dessa atenuação especial resultam vantagens para a reinserção social do condenado.

  3. A isto acresce que o tribunal “a quo”, tendo aplicado a pena de 1 ano e 3 meses de prisão e tendo entendido não ser de suspender a execução daquela pena (o que não se concebe, nem concede, mas por mero dever de patrocínio se equaciona), não ponderou, todavia, a substituição da pena aplicada pela pena de prestação de trabalho a favor da comunidade, o que constitui nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do n.º 1, alínea c) do art. 379.º e 425.º, n.º 4 do CPP.

    DA MATÉRIA DE FACTO PONTOS DE FACTO QUE O RECORRENTE CONSIDERA INCORRECTAMENTE JULGADOS (al. a) do n.º 3 do art. 412º do C. P. Penal) 6. O considerar-se como provado que “3 – O arguido agiu com o propósito de fazer seu, por meio de violência, do(?) referido fio em ouro, como efetivamente fez relativamente a uma parte do fio apesar de saber que o mesmo não lhe pertencia e que agia contra a vontade da sua legítima dona” – 4.º (quarto) parágrafo da Fundamentação do acórdão (sic., mas sublinhado nosso), 7. Não se ter considerado como provado que o arguido devolveu parte do fio de ouro à queixosa, e 8. Não se ter considerado como provado que parte do fio de ouro foi encontrado no chão.

    PROVAS QUE IMPÕEM DECISÃO DIVERSA DA RECORRIDA (al. b) do n.º 3 do art. 412º do C. P. Penal) Declarações prestadas pelo arguido em audiência de discussão e julgamento 9. O arguido depôs de forma coerente, credível e espontânea relativamente a prática dos factos que lhe são imputados.

  4. “O arguido confessou os factos de que foi acusado, refereindo (?) que o fio se partiu tendo ficado com uma parte que devolveu, depois de ter sido capturado. Além disso referiu que esteve com a queixosa à procura da restante parte do fio, tendo-a encontrado e devolvido.” - 3.º (terceiro) parágrafo da página 6 do acórdão (sic., mas sublinhado nosso), 11. O arguido afirmou o seguinte (ata de audiência de discussão e julgamento, gravada em suporte digital): - minuto 02:36: “É verdade eu ter (…) esgaçado o fio, eram momentos em que eu andava a consumir, infelizmente, andava aqui um bocado perdido, momentos apertados em que não tinha dinheiro e uma pessoa cometia coisas que eram escusadas. Fui eu que puxei o fio. Tudo verdade eu ter puxado o fio e ter roubado o fio sim.” - minuto 03:30: “Não, não, não, o fio foi entregue, o fio foi entregue, a senhora ficou com o fio, porque quando eu puxei o fio o fio caiu no chão e ficou no chão. Faltou acho que um bocadinho de fio, mas o fio quase completo foi entregue à senhora novamente, simplesmente acho que não se encontrou um bocadinho do fio, porque aquilo era um fio acho que às bolinhas e quando eu puxei aquilo partiu tudo e ficou lá tudo no chão. Onde eles apanharam e ficaram com esse fio, quase todo completo.

    - minuto 04:18: “Não, não, não fiquei com o fio, o fio caiu no chão”.

    - minuto 06:00: “Eu quando puxei esse fio sei que ele desmantelou-se todo e ficou no chão, agora outros bocados não apanhei nada, ainda andei lá, andamos todos à procura, entretanto eu fiquei com receio e acabei por fugir de lá desse sítio, ficou todo lá”.

    - minuto 07:20: “Eu sei porque eu andei lá à procura mais eles à procura do fio e o fio estava quase todo completo quando a gente deu à senhora. Eu fartei-me de pedir desculpas à senhora, que estava muito mal, fiz isto mesmo escusadamente. Depois peguei e fui-me embora porque estava com medo de ir para o posto, estava a ressacar, acabei por fugir para ir tentar matar a porcaria da ressaca, naquele momento estava a ressacar, andava a consumir drogas.”; “Não sei, sei que andei, sei perfeitamente que as pessoas que me apanharam, andei mais elas à procura do fio, e encontramos praticamente o fio quase todo completo, faltava uma miniaturazinha, que não foi encontrada” - minuto 08:41: “Não, porque é assim, eu quando puxei o fio sei que que ele partiu, caiu no chão, e para uni-lo faltava uma dobra, a gente andamos à procura e não conseguimos encontrar. Mas encontramos esse pedaço desse fio todo praticamente completo e foi-lhe entregue, o que lhe faltava era um…” “Foi entregue por essas pessoas que não sei quem são. “, “Falei com a senhora que estava lá fora, fartei-me de lhe pedir desculpas, não sei como é que tinha feito aquilo, estava mal…” “Tirando essa dobra, o resto ficou com ela”.

    Declarações prestadas pela queixosa B…, em audiência de discussão e julgamento 12. A testemunha de acusação, nas suas declarações (ata de audiência de discussão e julgamento, gravada em suporte digital, minuto 01:20) foi inquirida pelo Exmo. Magistrado do Ministério Público que lhe perguntou o seguinte: “Ele confessou isso tudo, que isso tinha acontecido, que tinha roubado o fio à senhora, nós só estamos aqui com uma dúvida, eu pelo menos estou, porque ele diz que puxou o fio, que o fio que rebentou e que terá caído ali todo no chão, que não levou nenhum bocado com ele”.

  5. Ao que a testemunha, demandante cível, respondeu: “Não acredito, porque a gente andou lá, para aí meia hora, para trás e para a frente, e não se viu o fio. Viu-se um bocado, que eu tenho em casa, o resto não apareceu.” 14. No que interessa, a testemunha demandante cível limitou-se a repetir que ficou com parte do fio e que o resto ninguém viu.

  6. Mais esclareceu, ao minuto 05:23: “Até porque ele, eu disse muita vez, ele dizia para eu lhe perdoar e eu disse não perdoo, dá-me o meu fio que eu perdoo-te, até te deixo ir, até te perdoo, mas dá-me o meu fio, e ele nunca deu” 16. Analisados os depoimentos, dúvidas não parecem restar que não foi produzida prova que permita dar como provado que o arguido fez sua parte do fio.

  7. Em momento algum o arguido foi visto, por quem quer que fosse, com o pedaço do fio alegadamente em falta na sua posse.

  8. O facto de faltar um bocado do fio não prova que o arguido tivesse ficado com ele.

  9. Ora, em Setembro, pelas 8:45, a … (em frente ao …) é uma artéria bastante movimentada, sendo plausível e até expectável que um objeto que caia ao chão não seja facilmente encontrado, não só face à extensão da artéria em causa, como à existência de buracos, grelhas de saneamento e proximidade com a estrada, e pelo facto de que qualquer pessoa que fosse a passar pudesse ter pegado num bocado de fio que se encontrasse no chão, sem que a demandante se apercebesse.

  10. Relativamente à “maior credibilidade conferida à queixosa”, afirmado, no 2.º § da página 7 do acórdão sob recurso, sempre se dirá que a atuação da queixosa nos presentes autos não se pautou pela seriedade ou pela credibilidade, pois nem quando apresentou a queixa, nem quando formulou o seu pedido de indemnização civil a queixosa informou que havia recuperado parte do fio.

  11. Só confrontada com o teor das declarações do arguido, é que a queixosa esclareceu que quando se andava à procura “se viu um bocado de fio”.

  12. Assim, entende o arguido que não ficou provada em audiência de discussão e julgamento a apropriação, por parte do arguido, do fio ou de parte dele, 23. Bem como ficou provado que o arguido devolveu uma parte do fio e que outra foi encontrada no chão.

  13. Deve passar a constar dos factos provados a devolução, por parte do arguido, de parte do fio, bem como que outra parte foi encontrada no chão, 25. Bem como deverá ficar a constar da matéria de facto não provada que o arguido fez seu o fio ou parte dele.

    DO DIREITO 26. Tendo em conta o que se vem de expor, entende o arguido que, corrigida a matéria de facto nos termos pretendidos e expostos supra, aquela integra a prática, pelo arguido, de um crime de roubo, na forma tentada.

  14. A jurisprudência e doutrina maioritárias hodiernas, nacionais e internacionais, perfilham o entendimento de que “O crime de roubo, tal como o de furto, consuma-se “quando a coisa entra, de uma maneira minimamente estável, no domínio de facto do agente da infracção, ou seja, quando este adquiriu...

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