Acórdão nº 95961/13.8YIPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 95961/13.8YIPRT.P1-Apelação Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto 3º Juízo Cível Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Caimoto Jácome 2º Adjunto Des. Macedo Domingues Sumário: I- A injunção de valor inferior à alçada do Tribunal da Relação, após deduzida a oposição, segue o procedimento previsto para as acções especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias, comportando apenas dois articulados: a petição inicial e a contestação.

II- Deduzida na contestação a excepção de compensação e o cumprimento defeituoso, em obediência ao princípio do contraditório plasmado no artigo 3.º, n.º 4, do CPCivil, pode a Autora responder-lhe oralmente no início da audiência de discussão e julgamento.

III- Fora dos casos previstos (artigo 584.º), no actual CPCivil desapareceu o articulado réplica como o articulado normal de resposta às excepções deduzidas na contestação, a não ser que se defenda que é possível que o juiz convide a parte a apresentar um terceiro articulado, ao abrigo do princípio da adequação formal (artigo 547.º do CPCivil).

IV- Não obstante a inexistência de tal articulado, há que conjugar o disposto no artigo 3.º, n.º 4, com os artigos 572.º al. c) e 587.º, n.º 1 do CPCivil, não tendo este último deixado de prever que “A falta de impugnação dos novos factos alegados pelo réu”, seja na audiência prévia, caso haja lugar a esta, seja no início da audiência final, tem o efeito previsto no artigo 574.º do mesmo diploma (admissão por acordo dos factos não impugnados), sob pena de os referidos normativos ficarem esvaziados de conteúdo.

V- E, se isso é assim para o processo declarativo comum deixa de se poder utilizar o argumento decorrente do artigo 505.º do anterior CPCivil (falta de apresentação de articulado quando este é admissível ou a falta de impugnação nele dos novos factos) para os processos especiais no âmbito dos quais estejam previstos apenas também dois articulados e, em concreto, para o procedimento de injunção.

VII- Razão pela qual o estatuído pelo legislador no artigo 3.º, nº 4 do CPCivil, não pode ser visto apenas como uma faculdade que a parte pode usar ou não, sem que daí decorram quaisquer efeitos cominatórios, antes tem de ser visto como sendo o momento processual que o legislador deferiu à parte para responder às excepções deduzidas com o último articulado, sob pena de se verificarem os efeitos decorrentes da falta do ónus de impugnação.

VIII- No actual CPCivil parece resultar que a compensação de créditos deve ser sempre objecto de um pedido reconvencional, uma vez que a compensação ultrapassa a mera defesa, sendo uma pretensão autónoma, ainda que não exceda o montante do crédito reclamado pelo autor.

IX- O recurso à compensação, postula, como sucede no direito substantivo, o reconhecimento de um crédito, ao qual se opõe um contra-crédito, pelo que, a parte respectiva, não pode pretender a compensação se nega a existência do crédito invocado pelo autor.

*I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B…, S.A.”, com sede no …, Maia intentou a presente acção destinada a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergente de contrato (injunção) contra C…, residente na Rua …, nº …, Porto, pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de € 9.918,65, acrescida de Juros vencidos no montante de € 159,13 e vincendos até efectivo e integral pagamento à taxa legal.

Alega para o efeito e em síntese que contratou com o Réu serviços de telecomunicações. Acontece que, tendo o Réu utilizado referidos serviços, emitidas as facturas correspondentes, ainda não pagou algumas delas além de não ter respeitado o período de fidelização a que se obrigou.

*O Réu tendo deduzido oposição, defendeu-se invocando a nulidade da denominada “Cláusula de Fidelização” por violação por parte da Autora do dever de informação, o cumprimento defeituoso do contrato por parte desta e ainda a compensação.

*Realizou-se audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais.

*A final foi proferida sentença que julgou improcedente, por não provada, a presente acção e consequentemente absolveu o Réu do pedido.

*Não se conformando com o assim decidido veio a Autora interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte: 1. Decidiu o tribunal a quo pela improcedência da acção; 2. No entanto, constando da sentença ter ficado “…demonstrado que a Autora é titular dum crédito sobre o Réu referente a serviços não pagos, de €1517,58”, deveria, desde logo, ter julgado o pedido da Apelante parcialmente procedente, no montante de €1517,58, a título de facturas, acrescido dos correspondentes juros de mora, à taxa legal, desde a data de vencimento até efectivo e integral pagamento; 3. Foi admitida, pelo tribunal a quo, a excepção de compensação; 4. Porém, atendendo à natureza do crédito invocado pelo Apelado, que alegou “prejuízos deverão ser objecto de indemnização” (cfr. art.º 34º da oposição) e “chegou mesmo a deixar de realizar alguns negócios” (cfr. art.º 31 da oposição), tal configura uma situação de responsabilidade civil contratual ou obrigacional derivada da violação de uma obrigação, ou seja, atribuiu à Apelante não uma obrigação de prestar, mas um dever de indemnizar; 5. Os factos articulados pelo Apelado não configuram, por isso, um direito de crédito nessa altura exigível, carecendo de ser judicialmente reconhecido por via da verificação do ilícito contratual culposo, do dano e do nexo de causalidade entre este e aquele; 6. Deste modo, não se encontrava preenchido o requisito de ordem substantiva de funcionamento da compensação previsto no art.º 847º, n.º 1, alínea a) do CC, pelo que não poderia o tribunal recorrido tê-la admitido; 7. Foi julgada admitida por acordo a matéria das excepções invocadas na oposição, porque a “…Autora não quis (expressamente) tomar posição quanto aquelas questões..”; 8. Não foi, por isso, relativamente às excepções de cumprimento defeituoso e compensação, considerada a prova produzida em audiência de julgamento, mas assumiu-se terem sido confessadas; 9. No entanto, a sentença recorrida é ambígua e ininteligível, porque não concretiza se a falta de tomada de posição, pela Apelante, foi no início da audiência ou durante a audiência; 10. Na hipótese do tribunal a quo se ter referido ao início da audiência, a ausência de pronúncia sobre as excepções, por parte da Apelante, não determinaria a confissão, uma vez que o que resulta do art.º 3º, n.º 4 é uma faculdade e não um ónus; e seguindo os autos o regime das acções especiais para o cumprimento de obrigações pecuniárias, caracterizado por dois articulados, o ónus de impugnação especificada previsto no artigo 574º, n.º 2, do CPC não tem aplicação aos casos em que a excepção tenha sido deduzida no último articulado legalmente admissível, nem se aplica o artigo 587º do CPC, reservado às situações em que existe articulado de resposta (réplica); 11. Pelo que, no início da audiência de julgamento, não se tendo pronunciado, a Apelante não confessou; 12. No início da audiência de julgamento, não se tendo pronunciado, a Apelante declarou - tomando, por isso, posição - ““…que não houve um cumprimento defeituoso, houve uma prestação de serviços que não foi paga e, por isso, procedeu à desactivação …” (gravação de dia 12.11.2013 - 09:55:37 às 09:56:13); 13. Durante a audiência a Apelante tomou posição sobre as excepções: por requerimentos juntos aos autos em 17.12.2013 e 01.03.2014, na inquirição das testemunhas, nas alegações; 14. Não poderia, por isso, a sentença recorrida tomar como pressuposto a confissão das excepções, a não “tomada de posição” pela Apelante, uma vez que (i) a Apelante tomou posição sobre as excepções na audiência (ii) e a ausência de pronúncia no início da audiência constitui uma faculdade, não lhe correspondendo efeito cominativo; 15. Existiu, porém, uma confissão, que o tribunal a quo deveria ter considerado, e não o fez: a que resulta da alegação do Apelado, quando invocou a compensação do seu, suposto, crédito de €5000,00 no valor que fosse condenado a pagar; 16. Não admitindo as acções especiais para o cumprimento de obrigações pecuniárias deduzir reconvenção, tendo sido invocado, como excepção peremptória, um crédito e a sua compensação, constitui pressuposto de invocação da referida excepção a admissão, pelo Apelado, da sua dívida à Apelante em montante não inferior a €5000,00, confissão que deveria ter sido considerada; 17. Tal determina a impugnação da matéria de facto, por se ter considerado, indevidamente, a confissão da Apelante e, indevidamente, não se ter considerado a confissão do Apelado; 18. Relativamente à matéria de facto considerada provada na sentença recorrida, porque não se verifica o pressuposto da confissão que a determinou, deverá a mesma ser alterada, (i) passando a constarem, como não provados, os pontos 6 a 12 dos factos provados, relativos à excepção de cumprimento defeituoso (ii) constarem, como não admitidos, os pontos 13 a 22 dos factos provados relativos à compensação, ou não provados, em função da decisão relativa à excepção de cumprimento defeituoso; 19. Deverá integrar o elenco dos factos provados a confissão de dívida que resulta da excepção de compensação que o Apelado deduziu, em igual montante ao crédito que invocou; 20. Ainda que o tribunal recorrido não tenha atendido à prova produzida na decisão sobre as excepções, as partes tiveram oportunidade de produzir prova, sendo certo que cabia ao Apelado o ónus de provar os factos constitutivos do direito que alegou (art.º 342º do CC); 21. Em relação à excepção de cumprimento defeituoso: (i) não foram juntos pelo Apelado documentos que o provassem; (ii) a Apelante provou, por documentos e através da sua testemunha, que prestou o serviço sem falhas e que o serviço foi, efectivamente utilizado; (iii) como decorre da transcrição das gravações, a testemunha do Apelado, seu funcionário, assumiu não ter conhecimento directo dos factos e nada concretizou; (iv) não foram...

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