Acórdão nº 5295/13.7TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 5295/13.7TBVNG.P1 Vila Nova de Gaia Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório.

  1. B…, divorciado, economista, residente na Rua …, nº …, .º dto, …, Vila Nova de Gaia, instaurou contra C…, residente na Rua …, nº …, .º dto, …, Vila Nova de Gaia, D…, residente na Rua …, nº …, .º esq, …, Vila Nova de Gaia, e E…, residente na Rua … nº …., …, Santa Maria da Feira, ação declarativa com processo sumário.

    Alegou, em síntese: Que por contrato celebrado em 21/9/2009, com a primeira ré e seu marido, entretanto falecido, tomou de arrendamento a fração autónoma designada pelas letras “AA”, correspondente a uma habitação, no 2ºandar direito – Bloco …, com entrada pela Rua …, lugar de garagem e arrumo, ambos na sub-cave, inscrita na matriz predial respetiva sob o artº 8157-AA.

    Por contrato celebrado em 17/1/2013, os primeiros réus venderam à terceira ré, entre outras, a referida fração, sem lhe haver sido comunicada a projetada e agora concretizada, venda e os seus elementos essenciais.

    Na qualidade de arrendatário da fração há mais de três anos goza do direito de preferência na compra e venda e procedeu ao depósito da quantia de € 35.000.00, a título de preço.

    Conclui pedindo o reconhecimento deste direito, a nulidade dos registos de aquisição posteriores à data da venda objeto da preferência e o direito a fazer suas as rendas que vierem a ser pagas no decurso da ação.

    Defendeu-se a ré E… sustentando, em síntese, que a venda da fração arrendada ao autor foi realizada em conjunto com outras cinco frações do mesmo prédio, pelo valor global de € 300.000,00 e com as demais condições que anota.

    E isto porque, à data, a fração objeto da preferência e as frações “E” e “G”, do dito prédio, encontravam-se penhorados, pelos Juízos de Execução de Vila Nova de Gaia, para pagamento da quantia exequenda de € 181.927,22 e o contrato de compra e venda teve como propósito evitar a venda judicial e permitir aos executados pagar a quantia exequenda, bem como a dívida dos vendedores à Fazenda Nacional no montante de € 6.518,43, pagamento este que era indispensável à liquidação do IMT e do imposto de selo.

    Foi dado conhecimento ao autor das condições deste negócio tendo ele optado por não preferir.

    O negócio teve, assim, por objeto o conjunto das seis frações, permitindo aos vendedores levantar as penhoras e pagar a dívida fiscal, desiderato que a venda isolada de uma fração não permitiria e, de qualquer forma, a contestante não estava disponível para efetuar a compra de parte das frações, ou comprava todas, ou não comprava nenhuma.

    Termos em que conclui pela improcedência da ação.

    O autor ainda respondeu para afirmar a improcedência desta defesa.

  2. Foi proferido despacho saneador que afirmou a validade e regularidade da instância e, sem reclamações, foi exarado despacho que identificou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova.

    Teve lugar a audiência de discussão e julgamento e depois foi proferida sentença em cujo dispositivo se consignou: “Pelo exposto, julgo a acção procedente e, em consequência, condeno os RR. a:

    1. Reconhecerem ao Autor o seu direito de preferência na aquisição da fracção autónoma designada pelas letras "AA" melhor identificada na alínea A) dos factos provados, no que se refere ao acto de compra e venda de 17 de Janeiro de 2013, lavrado por Título de Compra e Venda na Segunda Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, em que foram vendedores C… e D…, donos, em comum e sem determinação de parte ou direito, como herdeiros de F…, e compradora E…, substituindo esta, na posição de adquirente, pelo Autor.

    2. A abrir mão da fracção autónoma designada pelas letras "AA", objecto de venda, a favor do Autor.

    3. Vai decretada a nulidade de todos os registos de aquisição posteriores à data da venda objecto da preferência.

    4. E as rendas pagas pela fracção "AA", na pendência da presente acção, sejam pertença do mesmo A.” 3.

    O recurso.

    É desta sentença que a ré E… interpõe recurso, exarando as seguintes conclusões que se transcrevem: “1ª O Tribunal deu erradamente, como provada a factualidade constante da alínea O), considerando que o preço da fracção AA foi de Eur: 35.000,00€, uma vez que da prova produzida em audiência não pode, resultar provada tal factualidade.

    1. Apenas por imposição legal, para que se formalizasse a venda desta e das demais fracções, é que foi atribuído um valor patrimonial a cada uma o que não significa, nem foi o que aconteceu, que esse valor tivesse correspondência com a realidade dos factos.

    2. O negócio foi realizado de uma forma mais abrangente e global, englobando diversas fracções, que foram adquiridas como um todo, por um valor global, Eur: 300.000,00€.

    3. Sendo que os valores parcelares atribuídos a cada urna das fracções foram definidos de forma aleatória, tal como resulta da prova testemunhal supra transcrita e para a qual se remete.

    4. O negócio foi celebrado tendo como pressuposto a transmissão da propriedade sobre a totalidade das fracções em causa e o preço foi fixado para a globalidade e não para cada uma das fracções.

    5. O preço fixado para cada uma das fracções foi definido de forma aleatória, sem qualquer rigor ou base factual, mas apenas para cumprir com as imposições legais, designadamente para que pudesse ser liquidado o IMT e o imposto de selo.

    6. Ou seja, não pode o Tribunal dar como provado que o preço daquela específica fracção foi de Eur. 35,000,00, uma vez que este valor foi atribuído de forma aleatória para cumprir urna determinação legal, já que o preço efectivamente fixado foi de Eur: 300.000,00€ para a totalidade das fracções.

    7. Ou seja, a matéria referida na alínea d) da factualidade assente deve ser dada como não provada, já que o que ficou demonstrado foi que o preço definido foi de 300.000,00€, como preço global para todo o negócio.

    8. Por Outro lado, e relativamente à matéria elencada em b), d), e) e k) da matéria não provada, deveria a mesma ter sido dada como provada.

    9. Desde logo com base nos depoimentos supra transcritos, mas também na demais prova produzida nos autos.

    10. É inequívoco que os vendedores/Réus, apenas venderam estes prédios numa situação de grande dificuldade e porque estavam na eminencia de ver os mesmos ir à praça pública para serem vendidos no âmbito de um processo executivo, em razão das dividas à H… e à Fazenda Publica.

    11. E foi esta a razão da pressa na realização da venda, e que todos os intervenientes referiram.

    12. Por outro lado, é por demais evidente que o foi em razão do volume das dívidas, próxima dos duzentos mil euros (a esta duas entidades), mas que se depreende existirem outras, atentas as declarações do Réu supra transcritas do Réu D….

    13. Jamais seria possível a realização do negócio apenas relativamente à fracção objecto de preferência.

    14. Até porque, conjugadas as declarações supra transcritas com as regras de experiencia e os conhecimentos de que o Tribunal, por razões funcionais deve dispor, de que não é possível a alguém com dividas à Fazenda Publica conseguir proceder à liquidação de IMT e Imposto de Selo, para efectuar uma transmissão de um imóvel.

    15. Como também não pode desconhecer e as regras de experiência também o ditam, que sem o pagamento da totalidade da divida, o credor banco, não autoriza o distrate de qualquer hipoteca.

    16. Ou seja, a única forma de conseguir pagar as dividas e assim obter o distrate quer da penhora quer das hipotecas seria sempre pela realização de dinheiro suficiente para o pagamento de todas as dívidas elencadas.

    17. Logo, estando em causa urna divida próxima dos Eur: 200.000C, não seria com a venda da fracção objecto da preferência que o conseguiria fazer.

    18. Logo, cremos não restar qualquer dúvida que o que está em causa nos presentes autos será a venda da fracção juntamente com outras por um valor global.

    19. E, tal como prevê o art.º 417º n.2 1, é licito que se exija que o preferente exerça a preferência relativamente à totalidade do negócio, uma vez que, caso o mesmo não tivesse sido realizado de forma global, o mesmo sofreria, previsivelmente um prejuízo apreciável.

    20. Prejuízo que resultava da impossibilidade de realizar qualquer negócio e com isso se sujeitar a ver os bens serem vendidos no âmbito de um processo judicial.

    21. Já que nem a venda da fracção AA poderia ser realizada de forma isolada, pois não seria possível o distrate da penhora e da hipoteca por não se proceder ao pagamento da totalidade das dívidas; 23ª Nem sequer seria possível a liquidação do IMT e consequentemente, realizar a escritura de compra e venda.

    22. Ou seja, é por demais evidente a existência de prejuízo apreciável com a não venda em bloco dos bens objecto do negócio celebrada pela Ré.

    23. Consequentemente, além de não estar definido o valor pelo qual o Autor poderia preferir, uma vez que o valor de Eur: 35.000,00 não corresponde ao valor da venda e consequentemente não pode ser este o valor que deveria ser depositado aquando do exercido da preferência.

    24. Também está perfeitamente demonstrado que, atendendo ao facto de a venda ter sido realizada na globalidade, nos termos do disposto no art.º 417º n.º 1 do CC, o preferente deveria ter exercido o direito de preferência quanto à globalidade do negócio, uma vez que a não realização do mesmo naqueles termos causaria um prejuízo.

    25. No caso concreto, impedia-o de proceder ao pagamento das dividas indicadas e consequentemente obter o distrate das hipotecas e penhoras e assim impedir a venda da mesma no âmbito do processo executivo.

    26. Por esta razão não poderia ser reconhecido o direito do Autor a exercer a preferência apenas quanto ao negócio da fracção AA, e muito menos pela valor de Eur: 35.000,00C; 29ª Uma vez que não se provou ser este o valor da venda em causa.

    27. Mas tão só um valor atribuído de forma aleatória, inclusivamente não foi definido pelos intervenientes, compradora ou vendedores.

    28. Deve pois, ser revogada a decisão recorrida.

    Nestes termos, E nos melhores de direito que V. Ex.ªs doutamente suprirão, deve o presente Recurso ser...

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