Acórdão nº 698/13.0TXPRT-F.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 18 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelERNESTO NASCIMENTO
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo 698/13.0TXPRT-F.P1 do 1º Juízo do Tribunal de Execução das Penas do Porto Relator - Ernesto Nascimento Adjunto – Artur Oliveira Acordam, em conferência, na Secção Criminal da Relação do Porto: I. Relatório: I. 1. Instaurados os autos de liberdade condicional, culminaram com a decisão de não colocar o arguido B… em liberdade condicional.

  1. 2. Inconformado, com o assim decidido, recorreu o condenado – pugnando, pela revogação de tal despacho e pela consequente concessão da liberdade condicional – tendo apresentado as conclusões que se passam a transcrever: 1. da leitura de fls. 57 a 61, 64, 65, 66 a 70, 76, 77 e 78 ressalta, incontornavelmente, que o recorrente, desde a sua detenção, interiorizou o desvalor da sua conduta e, desde então, foi-se preparando para uma vida futura de acordo com as normas legais vigentes; 2. disso é sinal visível o seu comportamento prisional e actos e atitudes que assumiu durante todo o tempo de reclusão; 3. face ao comportamento que tem tido não se verificam necessidades específicas de prevenção geral ou especial; 4. verifica-se um juízo de prognose claramente favorável no sentido de que conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável e sem risco de cometer crimes; 5. a sua libertação, nesta fase, é perfeitamente compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social; 6. ao ter entendido de outra forma a decisão recorrida violou o artigo 61.º/2 alíneas a) e b) C Penal; 7. deve, pois, ser revogada e substituída por outra que o coloque em liberdade condicional.

  2. 3. Na sua resposta, a Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal de 1ª instância, defendeu a improcedência do recurso, por se lhe afigurar estar a decisão recorrida, correcta e bem fundamentada, quer em termos de facto, quer de Direito, não merecendo censura.

  3. 4. Foi proferido despacho a sustentar o decidido.

  4. Subidos os autos a esta Relação, a Exma. Sra. Procuradora Geral Adjunta emitiu parecer no sentido, igualmente, da improcedência do recurso.

    Seguiram-se os vistos legais.

    Foram os autos submetidos à conferência e dos correspondentes trabalhos resultou o presente acórdão.

  5. Fundamentação.

  6. 1. Tendo presente que o objecto dos recursos é balizado pelas conclusões da motivação apresentada pelo recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas - a não ser que sejam de conhecimento oficioso - e, que nos recursos se apreciam questões e não razões, bem como, não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, então, a questão suscitada nos presentes resumem-se, tão só em saber se, no caso concreto se verificam ou não, os pressupostos de que depende a concessão da liberdade condicional facultativa, por ter o condenado atingido o meio da pena de 5 anos e 6 meses de prisão em que fora condenado.

  7. 2. Vejamos então.

  8. 2. 1. Primeiramente, o teor da decisão recorrida.

    “I. Corre o presente processo de liberdade condicional referente ao condenado B…, identificado nos autos.

    Foram elaborados os pertinentes relatórios.

    Reuniu o Conselho Técnico, que emitiu parecer favorável (por unanimidade) à concessão da liberdade condicional, e procedeu-se à audição do recluso, que consentiu na aplicação de tal regime.

    O Ministério Público pronunciou-se pela não concessão da liberdade condicional.

    Cumpre decidir, nada obstando.

  9. Com interesse para a decisão a proferir, consigna-se a seguinte factualidade, resultante do exame e análise crítica do teor da(s) certidão(ões) proveniente(s) do(s) processo(s) da condenação, do CRC do condenado, dos relatórios elaborados em cumprimento do preceituado no artigo 173.º, n.º 1, alíneas a) e b), do CEP, da ficha prisional remetida pelo estabelecimento prisional, da reunião do Conselho Técnico e da audição do recluso, tudo elementos documentados nos autos: O condenado nasceu em 06.02.1977.

    Cumpre a pena de 5 anos e 6 meses de prisão, à ordem do processo n.º 38/10.0GGVNG, da 1.ª Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, no âmbito do qual foi condenado pela autoria de um crime de tráfico de estupefacientes, cometido desde fins de Janeiro ou princípios de Fevereiro de 2011 até 08.12.2011 (ao longo desse período, em diversas ocasiões e normalmente no interior da sua residência, vendeu canábis a diversos indivíduos, em quantidades e por preços não concretamente apurados; na altura da sua detenção detinha 562,811 gramas dessa substância).

    Atingiu a metade da pena em 08.09.2014, atingirá os dois terços da mesma em 08.08.2015, estando o seu termo previsto para 08.06.2017.

    O condenado encontra-se em situação de reclusão pela primeira vez.

    Sofreu uma outra condenação, proferida em 30.01.2013, relativa à prática, em 08.12.2011, de um crime de detenção de arma proibida, pelo qual lhe foi imposta pena de multa, a qual foi declarada extinta em 27.01.2014.

    O condenado faz uma análise crítica ajustada sobre a gravidade e ilicitude do seu comportamento, compreendendo a legitimidade do sistema legal na protecção dos bens jurídicos em causa, entendendo a existência de vítimas e danos provocados pela sua conduta (análise técnica de fl. 59).

    Ouvido, declarou que: na altura do crime consumia haxixe e começou a vender para os seus consumos; sabe do mal que estava a fazer a si e aos outros, pois os jovens começam pelo haxixe e depois partem para outras drogas; não consome drogas desde que preso, sem ter tido necessidade de tratamento.

    Iniciou o consumo de haxixe aos 17/18 anos de idade, na altura em que padeceu de um tumor nos pulmões, que demandou intervenção cirúrgica; esses consumos não desenvolveram um quadro de dependência; denota, no presente, afastamento do consumo dessas substâncias, não tendo sido alvo de acompanhamento nos serviços clínicos.

    Ao longo do cumprimento da pena não foi alvo da aplicação de medidas disciplinares e, desde 28.08.2012, tem vindo a manter-se integrado na lavandaria, com responsabilidade, pontualidade e assiduidade no cumprimento das respectivas funções.

    Beneficiou, com êxito, de duas licenças de saída jurisdicional, tendo sido colocado em RAI em 04.02.2014, regime que tem decorrido em condições de normalidade.

    Se colocado em liberdade condicional, regime no qual consente, projecta ir residir com a sua mãe; é sua vontade reatar a vida em comum com a sua companheira de há cerca de nove anos e com o filho menor de ambos.

    Tem colocação laboral assegurada na Junta de Freguesia …, com o apoio do Centro social da respectiva paróquia; habilitado com o 9.º ano do ensino, teve anteriormente outras experiências de trabalho, nomeadamente em reparações auto, em casa, e no café do seu pai.

    No meio social de inserção, o condenado não é alvo de animosidade nem suscita sentimentos de alarme, sendo conhecida a sua situação penal.

  10. Apreciando.

    Verificados que estão os pressupostos formais para a concessão da liberdade condicional (aquisição temporal e consentimento do condenado, este último imposto pelo artigo 61.º, n.º 1, do Código Penal), cumpre avaliar o preenchimento dos respectivos requisitos de natureza material, os quais, dada a presente fase da execução da pena, são os estabelecidos no artigo 61.º, n.º 2, alíneas a) e b), do Código Penal.

    Em primeira linha, cumpre considerar que o crime de tráfico de estupefacientes em presença se reveste de acentuada gravidade, aferida, desde logo, pela síntese fáctica acima constante, resultando fortes as (notórias) exigências de prevenção ao nível geral que operam no caso em análise, atento o elevado número de vezes que tal tipo de crime é cometido entre nós, assim como a correlativa e consabida danosidade social.

    Trata-se, neste âmbito, de preservar a ideia da reafirmação da validade e vigência da norma penal violada com a prática desse crime (v., a propósito do requisito da alínea b) do n.º 2 do artigo 61.º, do Código Penal, as Actas da Comissão de Revisão do Código Penal, ed. Rei dos Livros, 1993, p. 62), o que se mostra incompatível com a aplicação do regime da liberdade condicional nesta fase do cumprimento da pena de prisão, antes demandando acrescido período de prisão efectiva.

    Tal como se entendeu no acórdão de 14.07.2010, proferido pelo Tribunal da Relação do Porto no âmbito do Recurso n.º 2318/10.5TXPRT-C.P1, processo n.º 2318/10.5TXPRT-C, do 1.º Juízo deste TEP do Porto, cumpre “que se tenha em consideração que, como se salienta no Ac. R. de Lisboa de 28/10/2009, Proc. nº 3394/06.TXLSB-3, em www.dgsi.pt, “em caso de conflito entre os vectores da prevenção geral e especial, o primado pertence à prevenção geral. No caso de se encontrar cumprida apenas metade da pena, a prevenção geral impõe-se como limite, impedindo a concessão de liberdade condicional quando, não obstante o prognóstico favorável sobre o comportamento futuro do condenado, ainda não estiverem satisfeitas as exigências mínimas de tutela do ordenamento jurídico”, sob pena de se fazer tábua rasa da tutela dos bens jurídicos, se banalizar a prática de crimes (incluindo os de gravidade significativa) e, no fundo, se defraudarem as expectativas da comunidade, criando nos seus membros forte sentimento de insegurança, potenciando a perda de confiança dos cidadãos no próprio Estado como principal regulador da paz social” (v., também, em www.dgsi.pt).

    No acórdão do mesmo tribunal superior proferido em 16.05.2012 (Recurso n.º 2412/10.2TXPRT-H.P1), considerou-se que as exigências de prevenção geral “não ficam satisfeitas pela circunstância de não se verificar rejeição social no meio em que a mesma [condenada] se insere, já que o que está em causa é ‘a suportabilidade comunitária do risco da libertação’, entendendo-se aqui a comunidade jurídica e não apenas o meio social restrito em que a arguida se encontra inserida”. Na decisão sumária proferida pelo Tribunal da Relação do Porto em 03.07.2012 (Recurso n.º 1350/11.6TXPRT-D.P1), entendeu-se que o preenchimento do requisito da alínea b) do artigo 61.º, n.º 2, do Código Penal, “não pode satisfazer-se com a mera...

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