Acórdão nº 953/11.3T2AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 02 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelCAIMOTO J
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 953/11.3T2AVR.P1 - APELAÇÃO Relator: Desem. Caimoto Jácome (1509) Adjuntos: Desm. Macedo Domingues Desem. Oliveira Abreu ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 1-RELATÓRIO B…, S.A.

, com sede na …, freguesia …, concelho de Aveiro, intentou acção declarativa, sob a forma de processo comum sumário, contra C…, residente na Rua …, …, …, Aveiro, pedindo a condenação deste a restituir-lhe o veículo que identifica no artigo 4º da petição inicial e a pagar-lhe a quantia de €10.000,00, a título de lucros cessantes pelo facto de ter estado impedida de usar o dito veículo na sua actividade comercial, pelo menos, durante quatro anos; bem assim a quantia diária de €25,00, a contar da data da citação até que concretize a restituição do dito veículo.

Alega, em síntese, que é uma sociedade comercial, que se dedica ao comércio e aluguer de veículos sem condutor e que o réu dedica-se à reparação de veículos automóveis.

Mais alega que à semelhança do que já tinha acontecido anteriormente, no dia 28/11/2003, entregou na oficina do réu o veículo, da marca Toyota, marca …, com a matrícula ..-..-VC, da sua propriedade, para que fosse efectuada, a 19/12/2003, uma peritagem, por o veículo se encontrar acidentado. Algum tempo depois da realização da peritagem, a autora deu ordem de reparação do veículo ao réu. Acontece que, por razões desconhecidas e nunca explicadas pelo réu, este nunca procedeu à reparação do veículo, e muito menos o restituiu à autora, retendo-o na sua posse sem qualquer motivo válido para o fazer, o que se verifica até aos dias de hoje.

Por causa desta situação, a autora ficou privada do uso do veículo no exercício da sua actividade comercial, pelo menos durante 4 anos. Com efeito, durante este período, e considerando que o tipo de veículo em causa tem uma taxa de utilização quase diária, a autora deixou de auferir um lucro, no total de €10.000,00 (cerca de €2.500,00 ano).

Citado, o réu contestou (fls 11-16), alegando que só não entregou a viatura por a autora não lhe ter pago a reparação. Aliás, o réu tem conhecimento que a companhia de seguros procedeu ao pagamento da reparação à autora e o veículo está reparado há anos, como a autora bem sabe.

O demandado deduziu reconvenção (procedeu à reparação do veículo) pedindo a condenação da autora a pagar-lhe a quantia de €4.900,84, ou seja, o valor da reparação que foi arbitrado pela companhia de seguros, quantia esta acrescida de juros de mora, a contar da citação até integral e efectivo pagamento.

Houve resposta da autora/reconvinda, na qual alega que o réu, pelo menos até à propositura da acção, não tinha reparado o veículo em causa, nem o restituiu, como lhe foi solicitado por várias vezes, nunca lhe comunicou que o veículo estava reparado, nunca enviou a respectiva factura, nunca solicitou o pagamento do custo da reparação. Mais refere que, em meados de 2007, perante as suas insistências, o réu pediu a esta determinado valor, que lhe foi entregue e cujo comprovativo protestou juntar.

**Saneado e instruído o processo, após julgamento, foi proferida sentença, na qual se decidiu (dispositivo): “Nestes termos, de acordo com o supra exposto, decido: a)julgar improcedente a acção, por não provada e, em consequência, absolver o réu C… dos pedidos formulados pela autora B…, S.A. (actualmente massa insolvente desta); b)julgar improcedente a reconvenção, por não provada e, em consequência, absolver a autora do pedido formulado pelo réu.

»Custas da acção pela autora e da reconvenção pelo réu - cfr. artigo 527º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil, por referência ao artigo 6º, n.º1 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela I-A anexa ao dito Regulamento.

» Valor da acção: o estabelecido no despacho saneador.”.

**Inconformada, a autora apelou da sentença tendo formulado, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1. A Recorrente não se conforma com a decisão que a julgou parte ilegítima para intentar a presente ação e pedir a condenação do Recorrido a restituir-lhe um veículo de que é proprietária e que se encontra na garagem daquele para reparação, desde 2003, bem como a pagar-lhe lucros cessantes pelo facto de estar impedida de usar o veículo na sua atividade comercial, assim como uma determinada quantia por cada dia de atraso na reparação e entrega da viatura.

  1. Em primeiro lugar, porque considera que a data que deve ser tida por referência a fim de aferir da sua qualidade de proprietária do veículo em questão nos autos é a data da propositura da ação, e não a data da celebração do contrato de prestação de serviços/da ordem de reparação. O que apenas pode levar a concluir que tem legitimidade para pedir a condenação do Recorrido a entregar-lhe a viatura, já que, a essa data, já a havia adquirido, detendo, assim, a sua propriedade.

  2. Em segundo lugar, porque considera que não foi tomado em conta o regime da locação financeira, verificando-se, deste modo, erro na determinação da norma aplicável.

  3. A Recorrente, na data em que ordenou ao Recorrido a reparação, estava incumbida de manter e conservar o veículo, porquanto assumia a posição de locatária no contrato que havia celebrado com a D…, S.A., aqui se inserindo a responsabilidade pela perda ou deterioração do mesmo (15.º e 10.º n.º 1 als. e) e f) do Decreto-Lei n.º 149/95 de 24/06).

  4. Entre a Recorrente e a D…, S.A., existia um contrato de locação financeira, na modalidade de ADL (Aluguer de Longa Duração), através do qual a segunda concedeu à primeira o gozo temporário e retribuído do bem móvel em causa.

  5. À data em que o Recorrido aceitou receber o veículo na sua garagem para reparação, a Recorrente era locatária do veículo, pelo que, embora não sua proprietária (mas sim a locadora), assumia os deveres de um verdadeiro proprietário (despesas de transporte, montagem, instalação e reparação do bem locado, bem como despesas referentes ao seguro, de que se torna tomador).

  6. Tendo celebrado com o Recorrido um válido contrato de prestação de serviços, e perante o seu incumprimento, toda a legitimidade assistia à Recorrente para apresentar uma ação de condenação do mesmo a restituir-lhe a viatura que o Recorrido estava obrigado a reparar por força do contrato celebrado entre as partes.

  7. O objecto do contrato de prestação de serviços é o resultado do trabalho, neste caso, a reparação da viatura. A qual nunca se concluiu.

  8. O tribunal a quo decidiu, e bem, que o Recorrido não poderia ter invocado a exceção de não cumprimento para justificar a retenção do veículo, por não ter concluído a reparação (sendo o crédito daí decorrente inexigível).

  9. Contudo, errou ao considerar que a propriedade da Recorrente não se verifica à data que, supostamente, releva, pelo que a mesma apenas pode ser parte ilegítima na ação. Decisão com a...

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