Acórdão nº 435/10.0TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelM. PINTO DOS SANTOS
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. 435/10.0TVPRT.P1 – 2ª Secção (apelação) ________________________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Francisco Matos Des. Maria de Jesus Pereira* * *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, residente nesta cidade do Porto, instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum ordinário, contra C…, SA, com sede também nesta cidade [actualmente D… – Companhia de Seguros, SA, por incorporação daquela nesta], pedindo a condenação desta a pagar-lhe, a título de indemnização, a quantia de 125.000,00€ [cento e vinte e cinco mil euros], acrescida de juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento, e ainda a suportar todos os custos em que venha a incorrer com a sua sujeição a intervenções cirúrgicas necessárias em consequência das lesões que sofreu no acidente que relata, bem como com tratamentos, medicamentos e consultas médicas, tudo a liquidar posteriormente.

Alegou, para tal, que em consequência do acidente de viação em que interveio o veículo por si conduzido e o veículo segurado na Ré, ambos identificados na p. i., ocorrido no dia 12/05/2007 e causado por este último, cujo condutor conduzia distraído e imprimia ao veículo velocidade superior a 90 km/h, em local sujeito ao limite legal de 50 Km/h, e que, por isso, foi embater na traseira do seu [da autora] veículo, sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais por cuja reparação pretende ver a ré condenada.

A ré, citada, contestou a acção, aceitando a sua responsabilidade pelo sinistro em questão, mas impugnou os danos alegados pela demandante, tendo concluído no sentido da acção dever ser julgada em conformidade com o que viesse a provar-se em sede própria.

Foi cumprido o disposto no art. 1º nº 2 do DL 59/89, de 22/02, não tendo sido deduzido qualquer pedido de reembolso por parte do Instituto da Segurança Social.

Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador tabelar e foram seleccionados os factos assentes e os controvertidos, estes formando a base instrutória, sem reclamação das partes.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, no termo da qual, após produção da prova, foi proferido despacho de resposta aos quesitos/pontos da base instrutória, novamente sem reclamação das partes.

Após alegações escritas de ambas as partes sobre o aspecto jurídico da causa, foi proferida sentença que decidiu assim: “Nos termos e com os fundamentos expostos, julgo a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, pelo que condeno a Ré a pagar à Autora a quantia global de € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros), sendo € 65.000,00 (sessenta e cinco mil euros) a título de danos patrimoniais e € 10.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação e até integral pagamento sobre o montante de € 65.000,00, e sobre o montante de € 10.000,00 a partir desta data e até integral pagamento.

Custas por Autora e Ré na proporção da respectiva sucumbência.

Notifique e registe.” Inconformada com o sentenciado, interpôs a ré o recurso de apelação em apreço, culminando a motivação com as seguintes conclusões: “1ª. Os únicos elementos de prova considerados pelo Meritíssimo Juiz a quo para o juízo de provado proferido sobre a facto quesitado no artigo 34º da base instrutória, foram as declarações fiscais juntas aos autos a fls. 131 a 162.

  1. Da correcta leitura do conteúdo daqueles documentos infere-se, com elevado grau de exactidão, que a recorrida não auferia, em média, no ano do acidente e nos imediatamente precedentes e subsequentes, um rendimento bruto mensal de aproximadamente 7500 euros.

  2. Analisadas detalhadamente as referidas declarações fiscais, verifica-se tão-somente o seguinte: - no ano de 2005 o sujeito passivo B, ou seja a ora recorrida, inscreveu na sua declaração de rendimentos os montantes de € 52.147,47 de trabalho dependente e € 22.231,37 de prestações de serviços; - no ano de 2006 o sujeito passivo B, ou seja a ora recorrida, inscreveu na sua declaração de rendimentos os montantes de € 49.023,85 de trabalho dependente e € 28.899,72 de prestações de serviços; - no ano de 2007 o sujeito passivo B, ou seja a ora recorrida, inscreveu na sua declaração de rendimentos os montantes de € 48.496,96 de trabalho dependente e € 39.097,25 de prestações de serviços; - no ano de 2008 o sujeito passivo B, ou seja a ora recorrida, inscreveu na sua declaração de rendimentos os montantes de € 51.014,92 de trabalho dependente e € 27.529,35 de prestações de serviços.

  3. Porém, nos termos do disposto no artigo 31º do CIRS apenas se consideravam tributáveis 65% dos rendimentos da categoria B em 2005 e 2006, e 70% em 2007 e 2008.

  4. Ademais, sempre resulta das regras da experiência comum que um qualquer profissional médico, máxime anestesiologista, como era a recorrida, que trabalhe por conta própria, tem forçosamente que afectar uma parte do seu rendimento ao pagamento de despesas exclusivamente incorridas com a obtenção de tais rendimentos, nas quais se inscrevem necessariamente e de uma forma significativa despesas de transporte.

  5. Não se considerando rendimento tributável, isto é, rendimento sujeito a impostos, por se presumir afecto a despesas inerentes e imprescindíveis à obtenção de um dado proveito, 30% do valor deste, e tendo sido este (rendimento tributável) o critério único de que o Julgador se serviu para calcular o rendimento médio mensal da recorrida, não podia este deixar de ter em consideração tal factor de correcção e, nessa exacta medida, restringir a resposta dada ao quesito 34º da BI a um valor aproximado de € 6.000 e nunca dar como provado, sem mais, o valor alegado pela então A., mas não demonstrado nem comprovado.

  6. Impõe-se pelas razões expendidas, com data vénia, uma alteração da decisão da matéria de facto provada, no apontado sentido: - a resposta ao artigo 34º da BI deverá passar de «provado» para «provado apenas que a A. auferia mensalmente em média aproximadamente € 6.000 ( seis mil euros)», o que se requer.

    Sem Prescindir: 8ª. Para além da indicada correcção da decisão da matéria de facto, a recorrente insurge-se contra o arbitramento, a título de danos patrimoniais, da quantia de € 65.000.

  7. Tendo em conta a factualidade assente a final, com relevância para a análise do segmento decisório que se pretende colocar em crise, inexiste qualquer fundamentação legal para o arbitramento de uma indemnização a título de danos patrimoniais na vertente da perda de capacidade de ganho futura.

  8. Muito ao contrário do que erradamente se defendeu na sentença em crise, as perícias médico legais realizadas quantificaram em termos percentuais (nos aludidos 6 pontos) a incapacidade corporal ou biológica de que a recorrida ficou afectada, mas apenas enquanto dano à saúde.

  9. Ao contrário do que o Julgador da primeira instância afirmou na sua douta sentença, inexiste qualquer evidência probatória de que a recorrida tenha ficado com uma IPP de 6 pontos.

  10. Não havendo afectação da capacidade de ganho, quer no presente quer no futuro, não pode a indemnização ressarcitória ser calculada matematicamente a partir dos rendimentos médios auferidos e ficcionadamente diminuídos por referência ao período de vida activa restante.

  11. De outro modo, embora não o assumindo explicitamente, estar-se-ia, como inelutavelmente sucedeu na sentença em crise, a fixar um quantum indemnizatório baseado numa incapacidade funcional/laboral que, de todo, não sobreveio.

  12. In casu, entende-se, por conseguinte, que o dano à saúde da recorrida avaliado que foi em 6 pontos deverá ser indemnizado na vertente de danos não patrimoniais na justa medida em que os esforços acrescidos que terá que fazer por força das sequelas verificadas ao nível da cervical serem uma inevitabilidade própria do avançar da idade, para além de serem mais facilmente suportáveis, atenta a profissão de anestesiologista, que pela sua natureza não se materializa em actividades repetitivas e constantes no dia-a-dia laboral, ao contrário do que sucede com a maioria das restantes profissões.

  13. A avaliação médico-legal dos danos sofridos pela recorrida foi realizada nos termos e ao abrigo do disposto no Dec-lei 352/2007 de 23 de Outubro e na Portaria nº 377/2008 de 26 de Maio actualizada pela Portaria 679/2009 de 25/06.

  14. O valor indemnizatório do dano biológico consistente numa IPG de 6 pontos reconhecida à recorrida, não tendo que ser forçosamente calculada de acordo com as previsões da Portaria 337/2008 de 26 de Maio, revista pela Portaria 679/2009 de 25 de Junho, deve pelo menos tê-las como referente.

  15. Tais diplomas legais têm de ser considerados no processo de formação das decisões judiciais que fixarem indemnizações devidas por incapacidades avaliadas em direito civil, sob pena de, para além do mais, resultar afectada injustificadamente a unidade do sistema jurídico vigente.

  16. Ora, de acordo com tais portarias, considerando a idade da apelada e o referido deficit de 6 pontos à sua integridade físico-psíquica, a indemnização por tal dano deverá criteriosamente ser fixada em quantia não superior a € 5.000 euros.

  17. E nunca nos sentenciados € 65.000 que, de resto, é incompreensivelmente superior à quantia que a generalidade da jurisprudência atribui hoje ao dano morte – incomensuravelmente maior que qualquer outro dano.

  18. A indemnização global devida à recorrida não...

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