Acórdão nº 5500/10.1TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelCAIMOTO J
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 5500/10.1TBVNG.P1 - APELAÇÃO Relator: Desem. Caimoto Jácome(1512) Adjuntos: Desem. Macedo Domingues Desem. Oliveira Abreu ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 1-RELATÓRIO B…, Lda, com os sinais dos autos, intentou a presente acção declarativa de condenação, na forma de processo comum sumário, contra C…, com os sinais dos autos, pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia correspondente à indemnização fixada na sentença proferida na acção referida na petição - € 10.600,00 – acrescida de juros de mora desde a data em que as rés foram citadas no processo administrativo.

Alega, em síntese, que conferiu mandato à ré (advogada), através da outorga de procuração com poderes gerais forenses, para a propositura de acção administrativa para efectivação de responsabilidade civil extracontratual.

A ré interpôs tal acção, na qual conseguiu ganho de causa, mas, posteriormente, não obstante lhe ter solicitado que diligenciasse, judicial ou extrajudicialmente, pelo pagamento da indemnização sentenciada, a ré nada mais fez, tendo deixado prescrever o prazo para a propositura de execução.

Mais alega que a ré se furtava a prestar-lhe os esclarecimentos que sucessivamente lhe solicitava, chegando, falsamente, a informar ter interposto acção executiva, fazendo-a crer que o processo executivo se encontrava em curso, tendo-se, assim, locupletado com honorários que recebeu da autora relativos a serviço que nunca prestou.

Conclui, assim, que com esta sua conduta, a ré violou os deveres consignados nos arts. 83º/2, 92º e 95º/1/a)/b), do Estatuto da Ordem dos Advogados.

Citada, a ré contestou, impugnando parte da factualidade descrita pela autora e sustenta que a advertiu do curto prazo de que dispunham para propositura da execução, tendo o legal representante da autora referido que preferia ele mesmo tomar conta da situação para não prejudicar a posição da sociedade que geria em concursos e outras obras que fazia para uma das rés na acção que correu termos na jurisdição administrativa.

E que, mais tarde, quando a contactou para prosseguir com a execução, o prazo para a respectiva interposição já tinha expirado, apenas restando tentar a resolução extrajudicial da questão, do que aceitou incumbir-se, sendo que o pagamento apenas não foi efectuado por uma dessas rés devido a interferências do legal representante da autora e seus subordinados.

Afirma, ainda, que sempre prestou à autora todas as informações solicitadas, tendo sempre procurado colocar o seu legal representante ao corrente da situação.

Mais sustenta que, desde Outubro de 2006, a autora sabe estar-lhe vedada a via executiva, pelo que o direito de indemnização que por meio da presente acção pretende efectivar já se mostra prescrito ao abrigo do disposto no art. 498º/1, do Código Civil.

Finalmente, peticionou a intervenção principal provocada de D…, Lda, alegando ter celebrado com a mesma seguro de responsabilidade civil profissional.

A autora respondeu, impugnando a factualidade alegada pela ré na sua contestação e declarando nada ter a opor à requerida intervenção de terceiro.

A requerida intervenção foi admitida.

Citada a interveniente, a mesma veio a contestar, confirmando a existência do mencionado seguro, afirmando ter o mesmo uma franquia de €5.000,00 a cargo do segurado.

Impugna a factualidade invocada pela autora e faz sua a defesa da ré, reiterando ter esta cumprido todos os deveres a que estava obrigada.

Mais invoca que, estando consciente das circunstâncias inerentes ao assunto em causa, designadamente quanto ao risco de não execução da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal, não pode a autora alegar qualquer frustração de expectativas.

Finalmente, sustenta que, mesmo que se admitisse a factualidade invocada pela autora, tal consubstanciaria uma actuação intencional e consciente por parte da ré, não correspondendo à existência de lapso e/ou omissão cobertos pela apólice em causa.

Houve resposta da demandante.

*Saneado e instruído o processo, procedeu-se à audiência de discussão e julgamento.

Após julgamento, foi proferida sentença, na qual se decidiu (dispositivo): “Assim, ao abrigo do disposto e das disposições legais citadas, considera-se a presente acção improcedente, absolvendo-se ré e interveniente do pedido.

Custas pela autora (art. 446º, nºs 1 e 2, do CPC).”.

*Inconformada, a autora apelou, tendo, na sua alegação, formulado as seguintes conclusões: 1ª Entende a Apelante que a matéria de facto foi correctamente apreciada e julgada, não merecendo qualquer reparo ou censura, pelo que, o recurso cinge-se exclusivamente à matéria de Direito.

  1. Ante a factualidade ajuizadamente dada como provada, o Tribunal a quo entendeu que a Ré/Apelada violou para com a A., aqui Recorrente, vários deveres deontológicos a que estava adstrita na sua actividade profissional de Advogada, na medida em que, faltou à verdade ao referir ter proposto uma acção que não chegou a propor, colocando deste modo em causa a “honestidade, probidade, rectidão, lealdade, cortesia e sinceridade” a que está profissionalmente obrigada perante o seu constituinte, nos termos do artº 83º nº 2 do EOA e violou o seu dever de informação pois não só prestou uma informação falsa – a de que intentou a acção quando não o fez – como se furtou, sem nenhuma razão válida para o efeito, aos pedidos de informação escrita feitos pela autora.

  2. Considerou igualmente o Tribunal a quo que a Ré-Apelada não actuou de forma zelosa, no processado subsequente à obtenção da sentença condenatória do Tribunal Administrativo, pois tendo esta condenado uma entidade pertencente à administração indirecta do Estado, enquanto empresa pública e tendo-se provado a vontade inequívoca da Autora de receber o valor indemnizatório, até pela via executiva, aqueloutra descurou o disposto no artº 170º do CPTA, mormente, no seu nº 2, que estabelece o prazo de seis meses, contados a seguir aos 30 dias referidos no nº 1 do mesmo preceito, para que o interessado instaure a acção executiva, sob pena de caducidade.

  3. Na esteira do alegado na acção pela aqui Apelante, o Tribunal recorrido subsumiu a questão no quadro legal da responsabilidade civil contratual, porquanto, e seguindo a jurisprudência maioritária, se o advogado não cumpre ou cumpre defeituosamente as obrigações que tem para com o seu cliente, obrigações que apenas para com ele tem, incorre em responsabilidade civil contratual.

  4. Feita a subsunção da questão no conceito da responsabilidade civil contratual, o Tribunal a quo entendeu estarem os respectivos pressupostos da ilicitude dos factos praticados pela Ré/ Recorrida e da sua culpa, já que esta não logrou afastar a presunção de culpa que sobre a mesma impendia nos termos do disposto no artº 799º do Código Civil.

  5. Porém, considerou o Tribunal a quo que, no tocante ao pressuposto da existência de um dano, o mesmo não se encontra verificado, in casu, atendendo ao disposto no artº 563º do C.C. que consagra a teoria da causalidade adequada, segundo a qual a indemnização se confina “aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão do seu direito ou interesse protegido”, cfr. Almeida Costa, in “Direito das Obrigações”, pág. 521 e, bem assim, ao estatuído no artº 564º do C. C., segundo o qual, o dever de indemnizar compreende o prejuízo causado e os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência do facto lesivo, podendo ainda ser tidos em conta danos futuros, desde que previsíveis.

  6. Considerou ainda o Tribunal a quo que, mesmo tendo caducado o direito da A./Apelante executar a E…, sempre subsistiria a possibilidade de executar a outra entidade condenada em sede de Tribunal Administrativo – a sociedade F…, Ldª -, já que se trata de pessoa de direito privado e sujeita ao disposto o art. 157º nº 2 do CPTA, por força do qual: “A execução das sentenças proferidas pelos tribunais administrativos contra particulares também corre nos tribunais administrativos, mas rege-se pelo disposto na lei processual civil”.

  7. Pese embora faça referência expressa ao conceito de dano de “perda de chance” ou “perda de oportunidade”, reconhecido pela jurisprudência como um dano autónomo, indemnizável de per si, com recurso à equidade, o Mmº Juíz a quo concluiu que o dano patrimonial que a aqui Recorrente invocou não é um dano presente, uma vez que ainda não se acha sedimentado, verificado, mas antes um dano futuro e de verificação incerta, pelo que, não é indemnizável ao abrigo do disposto no art. 564º nº 2 do Código Civil.

  8. Entende a aqui Apelante que o Mmº Juíz a quo não fez adequada ponderação do referido conceito de indemnização da “perda de chance”, afastando, indevidamente, a sua aplicação ao caso vertente.

  9. A teoria da “perda da chance” tem sido aplicada pelos Tribunais para caracterizar a responsabilidade civil em casos de negligência de profissionais liberais, em que sobre estes impende a obrigação de meios e não de resultados, como é o caso dos advogados.

  10. Nestes casos, mesmo não havendo um dano certo e determinado, existe um prejuízo para a vítima, decorrente da frustração da legítima expectativa que a mesma possuía de obter um benefício patrimonial e da probabilidade real de tal vir a suceder.

  11. A teoria da “perda de chance” não visa o ressarcimento pela vantagem perdida mas sim pela perda da oportunidade de conquistar aquela vantagem (ou evitar um prejuízo), totalmente desvinculada do resultado final.

  12. É mister que a chance seja séria e real, isto é, algo que certamente iria ocorrer, mas cuja concretização se frustrou em virtude do facto ilícito, excluindo-se as meras expectativas e possibilidades hipotéticas.

  13. A chance não pode ser analisada como a perda de um resultado favorável mas sim como a perda da possibilidade de angariar aquela vantagem.

  14. A aqui Apelante não partilha a afirmação contida na Douta Sentença recorrida de que o dano por si invocado não é um dano presente mas antes, um dano futuro, de verificação incerta.

  15. O denominado dano de perda de...

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