Acórdão nº 2890/05.1TBPNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAM
Data da Resolução26 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 2890/05.1TBPNF.P1 Da Comarca do Porto Este – Instância Central de Penafiel, Secção Cível – J3, provinda do extinto 2.º Juízo do Tribunal Judicial do Marco de Canaveses, para onde fora remetida pelo 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Penafiel, a quem fora distribuída em 7/11/2005.

*Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró Acordam no Tribunal da Relação do Porto – 2.ª Secção: I. Relatório B…, com sede no …, Penafiel, instaurou, em 4/11/2005, a presente acção declarativa, com processo comum na forma ordinária, contra C…, Lda., com sede em …, …, Marco de Canaveses, D… e mulher E…, residentes na Rua …, …, …, Marco de Canaveses, e F… e mulher G…, residentes na Rua …, n.º .., ..º esquerdo, Vila Real, pedindo que se declare que os Réus F… e G… não têm direito a reclamar da Autora o valor da fiança prestada e referenciada no documento denominado "garantia bancária", emitido em 8 de Janeiro de 2003, por não se demonstrar que a Ré C… haja caído em incumprimento, culposo e definitivo, do referido contrato promessa.

Para tanto, alegou, em resumo, o seguinte: Os Réus D… e E… são os únicos sócios e gerentes da Ré C….

Esta sociedade, por contrato-promessa de compra e venda celebrado em 8/1/2001, declarou ir proceder à construção de um edifício destinado à habitação e comércio, com lugares de garagem, constituído por dois blocos, designados pelas letras A e B, a erguer no denominado lote n.º ., sito na …, em Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob a ficha 013611080299 e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 2162 de que é dona e legítima possuidora.

Posteriormente, a Autora soube que este contrato-promessa foi celebrado na sequência da transmissão dos Réus F… e G… para a Ré C… do referido lote n.º ., conjuntamente com outros, por escritura pública celebrada em 9/10/2000.

Este contrato-promessa destinava-se a assegurar na prática a permuta daquele lote com as fracções nele identificadas na respectiva cláusula 2.ª.

As partes já se haviam obrigado num outro contrato-promessa de permuta, celebrado em 4/10/2000 entre os Réus F… e G…, como l.ºs outorgantes, e a Ré C…, como 2.ª outorgante.

Por carta datada de 8/1/2000, mas que é seguramente de 8/1/2001, os Réus D… e E… foram junto da Autora solicitar, para além do mais, que "em nosso nome e sob a nossa inteira e exclusiva responsabilidade, emitam uma garantia bancária nos seguintes termos: beneficiário: F…; montante: cem milhões de escudos; finalidade: garantia do contrato promessa compra e venda dos bens imóveis referidos na cláusula número dois do respectivo contrato; prazo: dois anos, de acordo com a cláusula n.º 6 do mesmo contrato, com possível prorrogação por mais um ano".

Nessa sequência e depois de negociados o teor e os termos da garantia, a Autora emitiu, com data de 8/1/2000, mas que seguramente é de 8/1/2001, o documento de fls. 52, declarando que "presta a favor da C…, uma garantia bancária, no valor de cem milhões de escudos, para garantia do pagamento a F…"… " ou esposa G… …", " relativo ao contrato promessa de compra e venda dos bens imóveis referidos na cláusula número dois do respectivo contrato. Esta garantia é válida pelo prazo de dois anos, de acordo com a cláusula número seis do mesmo contrato, com possível prorrogação por mais um ano".

Com data de 8/1/2003, os Réus F… e G… dirigiram a comunicação de fls. 53, cujo conteúdo foi levado ao conhecimento da Ré C…, em que solicitavam à Autora que honrasse o compromisso de pagamento imediato de 498.797,89 € ou a prorrogação por mais um ano da garantia bancária, em virtude da C… não ter cumprido com o fixado na cláusula 6.ª do contrato-promessa celebrado em 8/1/2001.

Com a anuência dos Réus D… e E…, a Autora emitiu com data de 8/1/2003 a nova garantia bancária de fls. 54, mediante a qual renovava a garantia emitida em 8/1/2001 pelo prazo de um ano.

Entretanto, os Réus C…, D… e E…, por um lado, e os Réus F… e G…, por outro, desentenderam-se, começando mutuamente a culpar-se pelo incumprimento do contrato-promessa.

Na diversa troca de correspondência trocada ressalta a ideia de que o atraso no cumprimento se ficou a dever aos Réus F… e E…, os quais não terão assegurado as necessárias condições para as obras prosseguirem ao ritmo desejado, nomeadamente junto da Conservatória do Registo Predial, dos Serviços Municipalizados, da EDP, da Câmara Municipal de Vila Real, e que tinham a ver, no essencial, com a conclusão e aprovação do loteamento da responsabilidade daqueles Réus.

Tendo em atenção as condições e os fins para os quais a garantia foi prestada e a posição manifestamente contraditória dos Réus, a Autora carece de ver definida esta questão de forma definitiva, entendendo, ainda assim, que não está obrigada a pagar a aludida garantia, porquanto o contrato-promessa por ela garantido não foi incumprido definitivamente pela Ré C….

Os Réus C…, D… e E… contestaram, por excepção e impugnação, invocando as excepções dilatórias da incompetência territorial do Tribunal Judicial de Penafiel, da falta de interesse em agir da Autora e da ilegitimidade dos segundos Réus para os termos da acção, bem como a excepção peremptória inominada da manifesta inviabilidade do pedido deduzido, sustentando que não assiste qualquer razão à Autora ao instaurar a presente acção e quando defende a inexigibilidade do pedido formulado pelos 3.ºs Réus enquanto não se apurar se houve ou não incumprimento contratual por parte dos 3.ºs Réus, os quais, na qualidade de beneficiários da garantia bancária em causa apenas tinham de invocar que a garantida C… não cumprira as suas obrigações contratuais para obter o pagamento do Banco. Em sede de impugnação motivada, sustentaram que a garantia bancária caducou em 8/1/2003 e que os 3.ºs Réus não cumpriram para com a 1.ª Ré C… as obrigações a que contratualmente se obrigaram, entregando-lhe o lote do terreno devidamente apto à construção pois que não concluíram as infra-estruturas do empreendimento, nem obtiveram junto do Município de Vila Real a aprovação do licenciamento, pelo que a 1.ª Ré teve que paralisar, por completo, os trabalhos no empreendimento, face à recusa dos serviços das águas e da electricidade em fazer a ligação das condutas de água e de electricidade do empreendimento à rede pública, facto que aquela 1.ª Ré deu a conhecer aos 3.ºs Réus, por inúmeras vezes, dando-lhes nota de todos os prejuízos que este facto lhe estava a causar, incumprindo a cláusula 4.ª do contrato de permuta de 2000/10/04, assistindo, assim, à 1.ª Ré o direito de recusar o cumprimento do contrato-promessa de compra e venda enquanto os 3.ºs Réus não cumprissem com as obrigações que assumiram perante a mesma de dar por concluído o loteamento aprovado junto o Município de Vila Real, não assistindo aos 3.ºs Réus o direito de invocarem a violação por parte da 1.ª Ré da cláusula sexta do contrato-promessa de compra e venda para accionarem a garantia. Concluíram pela procedência das excepções dilatórias, com a remessa do processo para o tribunal competente e a sua absolvição da instância, e, subsidiariamente, pela improcedência da acção com a consequente absolvição do pedido.

Os Réus F… e G… contestaram, por impugnação, e deduziram reconvenção, alegando, em síntese, que: Foi solicitado à Autora que emitisse a favor dos 3.ºs Réus uma garantia bancária autónoma à primeira solicitação de 100.000.000$00, tal como havia sido acordado entre todos, pelo que deveria dar cumprimento a esse acordo através da emissão da garantia bancária nesses termos e pagá-la quando lhe foi solicitada, em 8/1/2004.

Porém, a Autora não cumpriu nem uma coisa nem outra. Nunca disse, clarificou ou sequer aflorou que não iria emitir uma garantia autónoma à primeira solicitação, revelando má fé negocial e abuso de direito e litigando de má fé.

Ainda assim, a garantia que prestou obriga-a a pagar-lhes a quantia garantida, inexistindo o pretenso incumprimento dos 3.ºs Réus.

Ao invés, verifica-se o incumprimento da 1.ª Ré, pois ainda não concluiu os prédios do lote n.º ., sendo esse o verdadeiro motivo por que esta não celebrou os contratos prometidos, o que é do conhecimento da Autora.

A escritura definitiva da compra e venda das fracções prometidas vender deveria ter sido celebrada no prazo de dois anos, a contar da data da assinatura do contrato-promessa, ou seja, até 8/1/2003, o que não aconteceu dado que o prédio não estava concluído, tal como não o está actualmente.

Em parte alguma do contrato-promessa de compra e venda, do texto da garantia ou ainda do texto que solicitou a dita garantia bancária resulta que o pagamento da quantia garantida estivesse dependente da obrigação de os 3.ºs Réus procederem ao loteamento, pelo que a Autora não pode escusar-se ao pagamento da quantia garantida com esse alegado fundamento.

A Autora sabia que as partes pretendiam uma garantia bancária autónoma à primeira solicitação, cobrando-se por isso, emitiu uma declaração à qual atribuiu o nome de garantia bancária, pelo que, ao pretender que emitiu uma fiança e que aquilo a que se obrigou equivale a uma fiança, age com abuso de direito.

Concluíram pela improcedência da acção e pela procedência da reconvenção pedindo que a Autora seja condenada a pagar-lhes a quantia de 498.797,90 €, acrescida de juros vencidos desde 8/1/2004 até 19/12/2005, no montante de 38.865,24 €, e dos vincendos, à taxa legal até efectivo e integral pagamento. Pediram, ainda a condenação da Autora como litigante de má fé em multa e em indemnização a favor dos 3.ºs Réus, nunca inferior a 10.000,00 €.

A Autora replicou, defendendo a improcedência das excepções invocadas, mantendo a versão dos factos apresentada na petição inicial, impugnando parte da matéria alegada na reconvenção, alegando que os reconvintes bem perceberam a garantia que lhes foi concedida e concluindo pela improcedência do pedido reconvencional.

Os 3.ºs Réus treplicaram sustentando não terem capacidade de deslindar as especificidades jurídicas...

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