Acórdão nº 7018/11.6IDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelAUGUSTO LOUREN
Data da Resolução13 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 7018/11.6IDPRT.P1 Acordam, em conferência, os Juízes da 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto RELATÓRIO No âmbito do processo nº 7018/11.6IDPRT que correu termos no Tribunal Criminal do Porto, foram as arguidas B…, Ldª e C…, julgadas pela prática de crime de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artº 105º nº 1 da Lei 15/01, de 05.06 e realizado o julgamento, foi proferida a seguinte decisão: - «Por todo o exposto: - Julgo improcedente por não provada a acusação deduzida contra C… e B…, Ldª pela prática de crime de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artº 105º nº 1 da Lei 15/01, de 05.06, pelo que as absolvo do mesmo.

Sem custas criminais».

*Inconformado com a decisão absolutória, recorreu o Ministério Público, nos termos constantes de fls. 399 a 418, tendo terminado a sua motivação de recurso com as seguintes conclusões: «1. Com o devido respeito pelo entendimento explanado na douta fundamentação da decisão a quo permitimo-nos discordar da solução do caso concreto por se nos afigurar que a factualidade apurada não deveria conduzir à absolvição das arguidas.

  1. Pelo contrário, porque se mostram preenchidos os elementos objectivos e subjectivos e os demais pressupostos legais do crime, e, independentemente da qualificação da exigência constante da nova redacção do artº 105º, nº 4 do R.G.I.T., deveriam as arguidas ter sido condenadas na pena adequada.

  2. No decurso da audiência de discussão e julgamento provaram-se, entre outros, os seguintes factos: a) A segunda arguida actuou sempre em representação e no interesse da primeira arguida, sabedora que, nos termos do artigo 27º, nº 1 do CIVA, estava obrigada a entregar nos cofres do Estado a quantia que a primeira arguida apurasse como sendo devida ao Estado a título de IVA no mês de Maio de 2011 mas, mesmo assim, agiu do modo descrito, não entregando à Fazenda Pública a quantia € 33.920,40 que recebeu, dentro do prazo legal que dispunha, e que terminou no dia 10 de Julho de 2011, nem nos noventa dias que se lhe seguiram, o que quis e fez.

    1. Sabedora que tal quantia não era de sua pertença, nem da sociedade em nome da qual agia e que, assim, causava ao Estado Português um prejuízo equivalente, pelo menos, à referida quantia de € 33.920,40, o que igualmente quis.

    2. Agiu de modo livre, voluntário e consciente, sabedora da censurabilidade e punibilidade da sua actuação.

    3. No dia 11 de Setembro de 2012, momento em que foi efectuada a notificação da arguida, descrita em j) para, querendo, pagar, no prazo de 30 dias, o montante em dívida a título de IVA relativo a 05/2011, a administração tributária tinha conhecimento de que em 18 de Janeiro de 2012, a primeira arguida, por via da actuação da segunda, procedeu ao pagamento da quantia de € 28,417,48, por conta do IVA apurado a favor do Estado no mês de Maio de 2011, conforme descrito em i), tendo contabilizado o pagamento aí descrito; e) Em 11 de Janeiro de 2013, e para imputação na dívida supra descrita, foi efectuado pagamento de 4.830,52 €.

  3. Entendeu a Mmª Juiz a quo que aquela notificação, não tendo em conta o montante efectivamente devido a título de IVA, nem os pagamentos efectuados por conta da dívida e não comunicando ao contribuinte o montante dos juros e coima não teve méritos para desempenhar a função de dar ao arguido a oportunidade de extinguir a sua responsabilidade criminal, por não lhe transmitir a informação do montante que teria de dispor para aquele efeito.

  4. Consequentemente, julgou não verificada a condição de punibilidade e absolveu as arguidas.

  5. É inquestionável que a notificação prevista na alínea b) do nº 4 do artº 105º do R.G.I.T., reportando-se ao montante inicial, feito constar pela arguida da Declaração Periódica oportunamente enviada à Administração Fiscal (36.336.76 €), indica uma quantia diferente da quantia em dívida, desde logo por não ter sido considerado o valor de IVA efectivamente recebido pela arguida e não entregue (33.920,40 €).

  6. Quanto aos pagamentos, anteriores e subsequentes, sem prejuízo dos procedimentos previstos nos códigos tributários relativamente à imputação de quantias entregues pelo contribuinte devedor, não resultou apurado que os mesmos fossem suficientes para a regularização da dívida.

  7. A questão a decidir reconduz-se, assim, a saber de que modo a inexactidão constante da notificação afecta a regularidade da mesma e se repercute no preenchimento do crime.

  8. São conhecidos os diferentes entendimentos doutrinários e jurisprudenciais suscitados ainda no âmbito da aplicação da lei no tempo, em face da entrada em vigor, no dia 1 de Janeiro de 2007, da Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro da nova redacção atribuída ao nº 4 do artº 105º do RGIT pelo artº 95º da citada Lei nº 53 -A/2006 (Lei do Orçamento), destacando-se, a favor da caracterização da L. N. como lei despenalizadora, a posição de A. Taipa de Carvalho[1] e a crítica ali expendida no que se refere ao tratamento maioritário da questão da consumação do crime de abuso de confiança fiscal bem como ao não estabelecimento de prazo para a administração fiscal efectuar tal notificação.

  9. Tal controvérsia esteve na génese do pedido de fixação de jurisprudência que culminou com o douto Acórdão do STJ nº 6/2008 de 15.05.2008 no sentido da corrente jurisprudencial e doutrinária que considerava que aquele artigo 95º, ao alterar a redacção do nº 4 do artigo 105º do Regime Geral das Infracções Tributárias, manteve a anterior condição de punibilidade agora plasmada na alínea a) e estabeleceu uma nova condição com a manutenção do recorte do tipo legal de crime.

  10. Entendem os defensores desta posição que, não obstante a alteração do regime punitivo, o crime de abuso de confiança fiscal se consuma com a omissão de entrega, no vencimento do prazo legal, da prestação tributária e que, em sede de tipicidade, aquela Lei Orçamental nada alterou. Todavia, ressalvam a aplicabilidade do disposto no artigo 2º, nº 4, do Código Penal (…) 12. Tal posição reivindica apoio na intenção publicitada do legislador, de conceder uma última possibilidade de o agente evitar a punição da sua conduta omissiva.

  11. Na verdade, preconiza o relatório do OE/2007, que “… não deve ser criminalizada a conduta dos sujeitos passivos que, tendo cumprido as suas obrigações declarativas, regularizem a situação tributária em prazo a conceder, …” 14. Por sua vez, o Tribunal Constitucional no douto Acórdão nº 409/2008, de 31 de Julho de 2008, decidiu que “não é inconstitucional a norma constante do artigo 105º, nº 4, alínea b), do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, na redacção dada pelo artigo 95º da Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro, interpretado no sentido de que pode o tribunal de julgamento determinar a notificação aí prevista.” 15. Ainda nos termos do citado acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14.01.2009, de que foi relator o Exmo. Senhor Desembargador Luís Ramos, in www.dgsi.pt “resulta claro do aludido Acórdão (do Tribunal Constitucional) que a entidade competente para determinar a notificação prevista na alínea b) do nº 4 do...

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