Acórdão nº 82/13.5T2OBR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelANABELA DIAS DA SILVA
Data da Resolução12 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação Processo n.º 82/13.5T2OBR.P1 Comarca de Aveiro – Oliveira do Bairro – Instância Local – Secção Competência Genérica – J2 Recorrente – B…, Ld.ª Recorrida – C… Relatora – Anabela Dias da Silva Adjuntas – Desemb. Ana Lucinda Cabral Desemb. Maria do Carmo Domingues Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível) I – C…, divorciada, residente na Rua …, …, …, Mealhada, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo sumário, contra B…, Ld.ª, sociedade comercial por quotas, com sede na …, freguesia …, Oliveira do Bairro, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de €9.900,00, respeitantes à remuneração da gerência até 23 de Janeiro de 2013, bem como as que se forem vencendo na pendência da acção, acrescidas de juros legais, desde a citação até integral pagamento.

Para tanto alegou, em síntese, que é sócia da sociedade ré, que se dedica à actividade de restauração e de aluguer de espaços para festas, banquetes e afins, cujo capital social de 5.000,00, se encontra divido em duas quotas de €2.500,00, uma pertencente à autora e a outra a D…, seu ex-marido.

Mais, alega, que em assembleia geral de 29 de Abril de 1996, foram ambos os sócios designados gerentes, sendo que o art.º 4.º do contrato de sociedade prevê a remuneração da gerência ou não, conforme for deliberado em assembleia geral.

Alega, ainda, que na referida assembleia, que designou a gerência datada de 29 de Abril de 1996, os sócios acordaram receber remuneração pela gerência, não obstante tal deliberação não ter sido reduzida a escrito, que foi fixada em €1.000,00 brutos/mês.

Por fim, alega, que desde Novembro de 2010 - data da separação de facto dos sócios gerentes - a autora não mais recebeu remuneração e o que o seu ex-marido, sócio gerente, não permite a sua entrada nas instalações da sociedade ré.

*A ré, pessoal e regularmente citada, veio contestar pedindo a improcedência da acção.

Para tanto alegou que nunca existiu qualquer deliberação social quanto à remuneração dos gerentes da sociedade. Aduziu, também, que nunca existiu remuneração fixa dos gerentes, sendo que os proveitos retirados da actividade da ré se destinavam a pagar os custos de funcionamento da sociedade e os encargos e despesas normais do ex-casal e que a inscrição como sócios remunerados nas finanças se destinou a proceder a descontos para a segurança social e impostos, a fim de beneficiarem de pensão de reforma, o que era do conhecimento da autora.

*Foi proferido despacho saneador e dispensada a elaboração da base instrutória, atenda a simplicidade da matéria de facto controvertida nos autos.

*Por requerimento de fls. 191, veio a ré, na sequência da junção de documentos pela autora, em sede de audiência de julgamento - recibo de vencimento e declaração de vencimento de funcionário -, invocar a excepção da incompetência do tribunal em razão da matéria, defendendo que a relação jurídica objecto da acção versava sobre um contrato de trabalho dependente.

Apreciando de tal questão, a 1.ª instância julgou improcedente a excepção invocada e, em consequência, declarou-se o tribunal competente em razão da matéria para conhecer e decidir da presente acção.

*Procedeu-se a julgamento da matéria de facto, após o que foi proferida sentença que “julgou procedente a acção, por provada e, em consequência, condenou a ré B…, Ld.ª, a pagar à autora a quantia de €9.900,00 e, bem assim, a remuneração de gerente, que se venceram na pendência da acção, à razão de €1.000,00 ilíquidos, acrescidas de juros desde a citação, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento”.

*Inconformada com tal decisão, dela veio a ré recorrer de apelação pedindo que a mesma seja revogada e substituída por outra que julgue procedente a invocada excepção da incompetência em razão da matéria, absolvendo-se a ré da instância ou, caso assim não se decida, deverá ser a ré absolvida dos pedidos formulados pela autora.

A apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões: 1. A recorrente não se conforma com a douta sentença recorrida tanto no que se refere à decisão sobre a matéria de facto, como no que toca às questões de direito, tanto no que diz respeito à decisão que mereceram os seus pedidos.

  1. Conforme se verifica da acta de audiência de discussão e julgamento de 04.03.2014, a autora juntou aos autos um recibo de vencimento referente a Abril de 2013 e uma declaração de rendimentos de funcionários, os quais figuram como docs. 1 e 2.

  2. Da análise de tais documentos verificou-se que quanto ao doc.1, trata-se de um “recibo de remunerações”, cuja categoria profissional da autora não mencionada é de Chefe de Mesa, e o doc.2 trata-se de uma “declaração de rendimentos de funcionários”.

  3. Com a junção de tais documentos pela autora, a tese que esta defende na P.I. desmoronou-se por completo. A ré, em resposta à junção de tais documentos, preconiza que o presente Tribunal é incompetente em razão da matéria para conhecer o objecto do processo, o que determinaria a absolvição da ré da instância.

  4. É que, de facto, com a junção de tais documentos denota-se existir constituída uma relação jus laboral entre autora e ré, facto que também a douta sentença recorrida na parte atinente à “motivação de facto” faz alusão a essa relação laboral.

  5. Assim, ao decidir-se na douta sentença pela improcedência da alegada excepção, andou mal o Tribunal recorrido, devendo ser revogada a douta sentença, julgando-se a incompetência em razão de matéria do Tribunal recorrido para decidir a questão objecto do processo, violando o disposto no artigo 64.º do CPC.

  6. Consta dos pontos 21, 23, 24, 25, 26 e 27 dos factos provados que a autora após cessar a sua baixa médica procurou regressar às instalações da ré para exercer as suas funções e o gerente D… não permitiu que a mesma acedesse às instalações de estabelecimento da ré, comunicando por carta que pretendia receber a partir de 12.07.2012 o seu vencimento.

  7. Ora, se tal tivesse ocorrido (impedimento de aceder ao estabelecimento da ré e exercício de funções), o que não é verdade e, como aliás a douta sentença recorrida o comprova, (em total contradição com a matéria dada como provada em 21 e 25), a ré B…, Ld.ª, nunca poderia ser responsável por tal acto alegadamente praticado por um dos sócios, e, como tal, nunca poderia ter sido condenada como o foi, erradamente.

  8. Qualquer acção por tal alegado facto teria de ser intentada contra o sócio da ré e não contra esta.

  9. Aliás, se bem analisarmos a matéria dada como provada no facto 27 dos factos provados, verifica-se que o sócio D… nunca impediu a autora de aceder às instalações da ré e tão pouco a impediu de exercer funções. Senão vejamos: “27. O sócio gerente D… não permite o exercício das funções da autora, por entender que devido às desinteligências do ex-casal que culminou com o divórcio, não existindo possibilidade de coexistirem naquele espaço”. E, da “motivação da matéria de facto”, a Meritíssima Juiz vem ainda reforçar mais a ideia e o facto de que a autora não foi impedida de exercer funções pelo sócio da ré D…, bem como não impediu o acesso às instalações do estabelecimento da mesma ré. De facto, refere o seguinte a este propósito: “no que tange à matéria vertida no nº 21 e 25 dos factos provados, o Tribunal sustentou-se no depoimento da testemunha E…, que declarou que a autora, sua mãe, não tinha capacidade para gerir o negócio, na admissão do sócio gerente D…, de que não existiam condições para coexistirem no mesmo local após o divórcio, e o facto de a autora se ter apresentado nas instalações da ré para exercer as suas funções de gerente… Perante este quadro factual, do sócio D… se recusar a exercer funções no mesmo espaço físico da autora, revela a não permissão desta no acesso às instalações da ré por parte da autora e impedimento da execução das suas funções como gerente”.

  10. Ora, se o sócio da ré D… se recusou a exercer funções no mesmo espaço físico da autora, não se pode extrair, como erradamente o fez a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, que tenha impedido a autora do que quer que fosse. Consequentemente, os factos 21 e 25 e a 1.ª parte do ponto 27 dos factos provados, foram julgados incorrectamente.

  11. Houve, assim, nítido e grave erro de julgamento e da apreciação da prova, com a consequente subsunção ao direito aplicável.

  12. E, se qualquer obstáculo se tivesse verificado por parte do sócio da ré D… em relação à autora quanto ao acesso às instalações e exercício de funções, sempre esta disporia de meios legais coercivos para as afastar, o que não se verificou. Pelo exposto, a matéria dada como provada nos pontos 21, 25 e 1.ª parte do 27 dos factos provados, não poderá ser considerada como tal, antes e ao invés, deverá ser eliminada de tais factos. Também nunca foi junto qualquer recibo de vencimento pela autora referente à sua alegada remuneração como gerente, não foi junto pela mesma qualquer documento bancário que provasse que os alegados pagamentos eram efectuados para uma conta-ordenado sua, (como refere a filha dos ex-cônjuges, E…), não se provou que em momento algum a ré lhe tivesse feito qualquer pagamento. Provou-se apenas o alegado pela ré e que consta do facto 26 dos factos provados que “os proveitos que a sociedade ré obtinha destinavam-se a satisfazer os encargos da mesma com o seu funcionamento e respeitante à vida comum do ex-casal”.

  13. Assim, também jamais se poderia dar como provada a matéria dos pontos 10 no que respeita a “pagamento de remunerações e atribuições a órgãos sociais”, 14, 15, 16, 17, 18 dos factos provados.

  14. Conforme prescreve o pacto social da sociedade ré, a remuneração da gerência teria obrigatoriamente de ser fixada por deliberação social escrita, a qual depende de deliberação dos sócios reunidos em assembleia geral para o efeito - cfr. artigos 246.º, 247.º e 248.º do Código das Sociedades Comerciais.

  15. 16.ª- No caso em apreço jamais existiu qualquer deliberação social nesse sentido.

  16. E, as deliberações dos sócios só podem ser...

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