Acórdão nº 634/13.3T4AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução07 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Procº nº 634/13.3T4AVR.P1 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 834) Adjuntos: Des. Rui Penha Des. Maria José Costa Pinto Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório A B…, intentou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra C…, S.A.

, e D…, S.A, peticionando a condenação da 1ª R. a pagar-lhe a quantia de €97.758,22 e, da 2ª R, a pagar-lhe a quantia de €66.488,24, acrescida de juros, importâncias essas que deixou de auferir mercê do incumprimento por estas da Convenção Coletiva de Trabalho em vigor.

Para tanto, alegou em síntese que: - É, a A., uma empresa de trabalho portuário licenciada em exclusivo para exercer a atividade de cedência de mão-de-obra portuária.

- As RR., que são empresas de estiva, no mês de Abril de 2013 decidiram colocar diretamente 7 trabalhadores a executar operações portuárias no Porto de Aveiro em lugar de recorrerem aos seus (da A.) trabalhadores como estavam obrigadas a fazer mercê do estipulado nas cláusulas 4ª, 8ª, 10ª, 12ª,19ª, 20ª e 21ª do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a Associação dos Agentes de Tráfego, Estivas e Desestivas do Porto de Aveiro e outros e o Sindicato dos Trabalhadores do Porto de Aveiro, publicado no BTE nº 22/94.

- As RR. sempre respeitaram integralmente o estatuído no referido contrato, apenas tendo deixado de o fazer depois que se afastaram da gestão da A. e só invocaram a respetiva nulidade, em termos objetivos e claros, nas alegações de recurso da providência cautelar, já em incumprimento, pelo que tal invocação constitui um manifesto abuso de direito, nos termos do art. 334º do C.Civil.

- Os 3 trabalhadores contratados diretamente pela C… no período de 2 de Abril a 24 de Junho de 2013, trabalharam em operações portuárias e pelo trabalho pelos mesmos prestado a A. ter-lhe-ia cobrado €66.066,83.

- Os 4 trabalhadores contratados diretamente pela D… também executaram operações portuárias no período de 2.4.2013 a 24.6.2013 e pelo trabalho pelos mesmos prestado a A. ter-lhe-ia faturado €46.800,71.

- Em 2 de Maio de 2013, as RR. contrataram mais 4 trabalhadores que haviam sido despedidos pela A. com invocação de justa causa, dois cada uma, trabalhadores que também passaram a laborar em operações portuárias, substituindo assim o recurso a mão-de-obra da A. para o desempenho das funções por eles exercidas, tendo, por isso, até 4.7.2013, deixado de faturar à C… €24.590,87 e à D… € 19.687,53.

- Por força das clªs 4ª, 8ª, 10ª, 12ª, 19ª e 21ª do CCT as RR. estavam obrigadas a recrutarem à A. os trabalhadores de que necessitem, não apenas para as situações de necessidades pontuais de mão de obra, mas também para o quadro privativo das mesmas.

As RR contestaram alegando em síntese: a.

A R. C… (fls. 28 vº a 50) que: - Em 2 Abril de 2013 contratou diretamente 3 trabalhadores a termo para o exercício de operações portuárias e em Maio do mesmo ano mais 2 trabalhadores despedidos pela A., mas tal contratação foi lícita, pois compete às empresas de estiva definir os meios humanos a afetar à operação portuária, bem como o seu quadro de pessoal, não estando obrigada a requisitar à A. toda a mão-de- obra de que necessitava.

- A pretensão indemnizatória da A. não pode proceder, pois, no período de 2 a 16 de Maio de 2013, reclamou duplamente valores relativos a 2 trabalhadores, e, além disso, nos cálculos efetuados apenas levou em consideração os preços da mão-de-obra que alegadamente deixou de receber das RR., não considerando os custos inerentes a essa mão-de-obra.

- As cláusulas do CCT em que a A. fundamenta a sua pretensão são nulas como já decidiu a Relação de Coimbra no âmbito da providência cautelar que precedeu a presente ação, não tendo a A. qualquer direito exclusivo de recrutamento de trabalhadores portuários.

- Em 17.6.2013, foi emitido pelo IPTM o Alvará nº.., nos termos do qual a E…, foi autorizada a exercer atividade em tudo idêntica à da A..

- Caso a tese da A. viesse a obter acolhimento estaríamos perante uma situação de monopólio, o que violaria o princípio da concorrência, que é um princípio fundamental da ordem jurídica portuguesa, também consagrado no Tratado de Roma.

- No âmbito do plano de insolvência da A. foi deliberado o perdão total da quantia de € 225.000$00 que as RR. lhe haviam adiantado para suprimento de necessidades de tesouraria, o que implicou para estas a perda do referido montante.

E concluindo que a contratação direta de trabalhadores por si efetuada não enferma de qualquer ilegalidade, finalizou pugnando pela improcedência total da ação.

b.

A R. D… (fls. 82 a 96) que: - O acervo factual apurado na providência cautelar deve ser dado como adquirido, devendo ainda considerarem-se outros factos, nomeadamente, a posição assumida pela F… comunicada ao IMT,IP e à APA, que não manifestaram qualquer divergência, o licenciamento da E… para exercer a atividade de cedência de mão-de-obra portuária no Porto de Aveiro e celebração de um novo Acordo Coletivo de Trabalho entre as RR. e a E…, por um lado, e o G…, recentemente constituído.

- No período de 2.4.2013 a 4.7.2013, a A. faturou à D… 105 períodos de trabalho ficcionado, no valor de € 15.311,77, pois apesar de lhe terem sido requisitados trabalhadores para executarem operações portuárias nesses períodos a mesma não os tinha disponíveis.

- As empresas de estiva, designadamente, a D… são inteiramente livres de contratar os trabalhadores que entendam necessários para a sua atividade (diretamente ou através de empresas de trabalho temporário) desde que possuam aptidões e qualificação adequadas.

- As cláusulas da CCT, designadamente a 8ª, não podem ser invocadas pela A. porquanto se se entender que as mesmas regulam direitos dos trabalhadores ou do sindicato outorgante a mesma não tem legitimidade para tal e, caso se entenda, como a A. parecer pretender, que as mesmas visam estabelecer regras entre compartes empregadores, então é manifesta a sua inaplicabilidade, por visarem regular a atividade económica dos empregadores e até mais especificamente o trabalho temporário portuário, sendo nulas face ao disposto no art.478º, nº1, als. a) e b) do C.T.

- O teor literal de tais cláusulas não confere à A. qualquer direito de exclusividade de recrutamento e fornecimento de mão-de-obra portuária no Porto de Aveiro, a única leitura razoável é no sentido de que as mesmas apenas preveem expressamente a possibilidade de as RR. recrutarem os trabalhadores portuários de que necessitam por contratação dos trabalhadores da A., pois a interpretação preconizada por esta determinaria a sua nulidade por restringirem a atividade económica das empresas de estiva, limitando a sua liberdade de iniciativa e as sua capacidade de gestão, o que é vedado aos instrumentos de regulamentação coletiva pelo referido art. 478º do CT.

- A sua atuação ao contratar diretamente alguns trabalhadores aptos e qualificados para o exercício da atividade portuário foi legítima, pois a lei consentia-lho e inexistia qualquer norma convencional válida que lho pudesse interditar e também não pode ser qualificada como culposa face às orientações que recebeu da Associação empresarial do sector e às alterações introduzidas pela Lei 3/2013 no regime jurídico do trabalho portuário.

- Ainda que se entendesse o contrário, ou seja, que a sua conduta foi ilícita e culposa, a pretensão indemnizatória da A. não pode proceder porque se baseou no valor bruto da faturação potencial, que reclamou como prejuízo sofrido, não considerando os custos inerentes, nomeadamente com a respetiva remuneração e encargos sociais, sendo que, como já ficou dito, em vários dias, a A. não teve trabalhadores disponíveis para satisfazer as requisições que lhe foram efetuadas.

Terminou sustentando a improcedência total da ação.

A A. respondeu (fls 106 e segs), alegando, em suma, que os custos da mão-de-obra se manteriam idênticos se as RR. tivessem recorrido aos seus serviços, na medida em que haveria trabalhadores permanentes em número suficiente que, nesse qualidade são sempre pagos, quer existia ou não trabalho.

Juntou um parecer jurídico, inserto a fls 107 e segs dos autos, elaborado pelo Exmº Professor Doutor Júlio Gomes.

Notificada a R. C… veio, a fls 199 e segs., infirmar o alegado pela A., referindo que nos meses de Abril, Maio e Junho, a A. não satisfez integralmente as suas requisições por insuficiência de mão de obra disponível para completar as equipas de trabalho, verificando-se nesse período um total de 376 “ faltados”, ou seja, de trabalhadores requisitados que não foram colocados pela A. e cujos períodos de trabalho foram faturados, ascendendo o seu valor a € 66.126,71.

A Ré D… veio juntar o parecer jurídico de fls. 547 a 579 elaborado pela Exmª Professora Doutora Maria do Rosário Palma Ramalho.

A fls 581 e segs, a A., para além do mais, veio alegar, em síntese, que o uso de “faltados” é uma prática aceite há dezenas de anos, funcionando as equipas com menos trabalhadores do que os requisitados quando não há trabalhadores suficientes para evitar atrasos nas operações de carga e descarga de navios.

Realizou-se audiência prévia, conforme ata de fls. 651 a 653, nos termos da qual foi proferido despacho saneador e dela constando, para além do mais, o seguinte: “(…) De seguida, a Sra Juiz instou os Il. mandatários das partes sobre o âmbito da factualidade relevante que aceitam como assente, tendo estes respondido que consideram como definitivamente provados os factos assentes na providência cautelar e que, por acordo, aceitam ainda os seguintes: (…) Face às posições das partes o objecto do litígio assenta nas seguintes questões: - Determinar se são válidas ou nulas as cláusulas do CCT em que a A. alicerça a sua pretensão.

- Determinar se a A. tem direito à indemnização peticionada.

E os temas de prova são os seguintes: 1) Saber se foi após o afastamento da gestão da A. que as RR deixaram de lhe requisitar a totalidade da mão-de-obra de que necessitavam como estabelece o CCT.

2) (…) 3) (…) 4) (…)...

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