Acórdão nº 315/12.5PHMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelEDUARDA LOBO
Data da Resolução30 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 315/12.5PHMTS.P1 1ª secção I - RELATÓRIO No âmbito do Processo Comum com intervenção do Tribunal Singular que corre termos na Secção Criminal – J1 da Instância Local de Matosinhos, Comarca do Porto com o nº 315/12.5PHMTS.P1, foi submetido a julgamento o arguido B…, acusado da prática de um crime de violência doméstica p. e p. no artº 152º nºs. 1 al. a), 2 e 4 a 6 do Cód. Penal, tendo a final sido proferida sentença, depositada em 05.02.2015, que condenou o arguido pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples p. e p. no artº 143º nº 1 do Cód. Penal, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), bem como a pagar à demandante C… a compensação no montante de € 400,00 (quatrocentos euros).

Inconformado com a sentença condenatória, dela veio o arguido interpor o presente recurso, extraindo das respetivas motivações as seguintes conclusões: 1. Em sede de audiência de discussão e julgamento não foi produzida prova testemunhal, documental, pericial ou outra que permitisse ao tribunal dar como provado que: “Em 09/12/11, cerca das 14:00 horas, no interior da referida residência, o arguido dirigiu-se à assistente e apertou-lhe o pescoço com as duas mãos, como consequência direta do que esta se quedou ruborizada e sentiu dor”; 2. As declarações da assistente não mereceram credibilidade para o Tribunal que as qualificou como “acossadas”, “tendenciosas”, “excessivamente parciais” e “incongruentes”; 3. A falta de credibilidade das declarações da assistente está igualmente suportada pelas conclusões da perícia médico-legal realizada em sede de inquérito que conclui que: “A examinada conta que sofre dos nervos desde que o marido saiu de casa (…) No contexto de crise conjugal terá tido vários comportamentos de características aparentemente apelativas alguns de caracter para-suicidário. Neste contexto é possível admitir que, alguns comportamentos, mencionados como hostis ou eventuais tentativas de homicídio se possam inscrever fenomenologicamente num quadro de natureza histeriforme. Nestes termos é de admitir que o seu depoimento se encontre revestido da mesma carga emocional e da mesma intencionalidade e, deste modo, refletir mais um desejo expresso ainda que inconscientemente do que uma realidade factual” (folhas 265 e ss. dos autos); 4. O tribunal considerou que os depoimentos das testemunhas apresentadas pela assistente/demandante cível – D…, E… e F… – também não merecem credibilidade por serem “artificiais”, “destituídos de isenção” e visando claramente favorecer a tese da assistente em prejuízo do arguido”; 5. Para além de se tratarem de depoimentos de favor não incidiram sequer sobre os factos ocorridos no dia 09-12-2011 razão pela qual nunca poderiam servir para prova dos mesmos; 6. O arguido em audiência de julgamento negou a agressão; 7. A testemunha G…, filho do arguido e da assistente, mereceu a credibilidade do tribunal que, não obstante esse facto, qualificou o seu depoimento como tendo “escassos laivos de parcialidade”; 8. Na verdade, mais do que parcial a testemunha demonstrou hostilidade e ressentimento que justificou com questões relacionadas com a falta de auxílio económico por parte do arguido, tendo renegado a sua qualidade de pai qualificando-o como mero “progenitor” (cfr. gravação áudio do depoimento dos 00:20 aos 00:37 segundos e dos 48:00 aos 50:10 minutos); 9. Seja como for a testemunha admitiu não ter assistido a nenhuma agressão física do arguido à assistente (cfr. gravação áudio do depoimento dos 08:00 aos 08:38minutos); 10. A sentença recorrida não obstante conter um exame crítico exaustivo e fiel da prova produzida não expõe os motivos de facto que fundamentam a condenação do arguido para além de toda a dúvida razoável; 11. A lei impõe um especial dever de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, exigindo que o julgador desvende o percurso lógico que trilhou na formação da sua convicção indicando os meios de prova em que a fez assentar; 12. O tribunal a quo não desvendou o percurso lógico que trilhou na formação da sua convicção porque a sua convicção se formou de modo puramente subjetivo, emocional e portanto insuscetível de motivação ou fundamentação; 13. A decisão do tribunal a quo violou o disposto no artigo 32º nº 2 da Constituição da República Portuguesa e no artigo 374º nº 2 do CPP; 14. Pelas razões expostas o arguido deve ser absolvido do crime de ofensa à integridade física simples; 15. Admitindo-se, apenas por mera cautela de patrocínio, que o tribunal ad quem poderá entender não existir erro na apreciação da matéria de facto, argui-se subsidiariamente e sem prescindir, o erro do tribunal a quo na determinação da medida da pena aplicada ao arguido; 16. O arguido é primário; 17. Os danos causados à integridade física da assistente são insignificantes (mera ruborização do pescoço); 18. O arguido vive em Esposende e a assistente em …; 19. O arguido refez a sua vida sentimental; 20. O risco de desentendimentos que originem eventuais agressões é inexistente; 21. O filho do arguido e da assistente, a testemunha G…, admitiu que os conflitos – discussões – entre os pais partiam sempre da assistente que tecia constantes acusações ao arguido (vide fundamentação da matéria de facto); 22. A mesma testemunha referiu que no dia 09/12/2011 a discussão se ficou a dever ao facto da assistente não querer que o arguido saísse de casa, tendo-se colocado à frente da porta para o impedir de sair; 23. Foi a assistente quem, uma vez mais, despoletou a altercação e provocou o arguido; 24. O arguido está insolvente (vide documento junto com a contestação a fls. … dos autos); 25. É artesão e aufere de rendimento uma média mensal de 300 Euros; 26. A pena de 180 dias de multa à taxa diária de 5 Euros, num total de 900 Euros, é injusta, excessiva e inadequada à situação financeira do arguido e à gravidade dos seus atos; 27. O valor da multa aplicada equivale a três meses de vencimento do arguido; 28. Pesquisando a jurisprudência não se encontra decisão paralela a esta; 29. A ser aplicada uma pena ao arguido a mesma deve ser especialmente atenuada atenta a circunstância da sua conduta ter sido determinada por forte solicitação ou tentação da assistente; 30. Só uma pena de multa de quantitativo não superior a 40 dias à razão diária de 5 Euros, num total de 200 Euros, será justa, adequada e equilibrada; 31. O tribunal a quo violou o disposto nos artigos 40º nº 2, 71º e 72º nº 2 alínea b), todos do Código Penal.

*Na 1ª instância o Ministério Público respondeu às motivações de recurso, defendendo a manutenção do decidido.

*Neste Tribunal da Relação do Porto o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido da total improcedência do recurso.

*Cumprido o disposto no artº 417º nº 2 do C.P.P., não foi apresentada qualquer resposta.

*Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência.

* *II – FUNDAMENTAÇÃO A sentença sob recurso considerou provados os seguintes factos: [transcrição] 1. Arguido e assistente, C…, casaram em 23/02/80 e divorciaram-se em 15/11/12, tendo residido na …, em …, Matosinhos.

  1. Na constância do seu casamento, nasceram G… e H…, respetivamente, em 03/09/82 e em 29/05/84, o último dos quais integrou aquele agregado familiar até ao referido divórcio.

  2. Desde data não concretamente apurada, por problemas passionais entre outros, o arguido apodou a assistente, por um número indeterminado de vezes, de “puta” e de “vaca”, algumas das quais escutadas pelo filho de ambos G….

  3. Em 09/12/11, cerca das 14:00 horas, no interior da referida residência, o arguido dirigiu-se à assistente e apertou-lhe o pescoço com as duas mãos, como consequência direta do que esta se quedou ruborizada no mesmo e sentiu dor.

  4. Sabia que, ao assim proceder, a molestava no seu corpo e saúde.

  5. Não ignorava ser tal conduta proibida e punida por lei.

  6. Não obstante o que não deixou de atuar como na realidade atuou, agindo livre e conscientemente.

  7. O arguido é divorciado; vive em união de facto, em casa pertença da sua companheira; é artesão, em razão do que aufere um rendimento mensal médio de cerca de € 300,00 (trezentos euros), sendo aquela auxiliar de uma escola, percebendo um salário de € 500,00 (quinhentos euros) por mês e acompanhando-o nas feiras quando pode; tem dois filhos maiores; completou o 9.º ano de escolaridade.

  8. Não lhe são conhecidos antecedentes criminais.

  9. Para além de problemas passionais, relacionados com infidelidades por parte do arguido, este e a assistente discutiam acerca de questões atinentes à gestão de dinheiros do agregado familiar.

  10. O arguido devastou a tranquilidade e estabilidade de vida da assistente, quer pessoal, quer ao nível da sua saúde.

  11. Em abstrato, avalia negativamente crimes da natureza dos que lhe são imputados, bem como eventuais consequências para as vítimas, relativamente aos presentes autos verbalizando não se rever nos factos conforme estão descritos na acusação, adotando uma postura de autovitimização e atribuição à ofendida de responsabilidades.

  12. Cresceu integrado num grupo familiar onde esteve exposto a um modelo educativo algo rígido e punitivo; apresenta um percurso laboral regular como motorista de longo curso, nos últimos tempos tendo optado por se dedicar a tempo inteiro à sua atividade de artesão; revela historial relacional conjugal conturbado, marcado por episódios de infidelidade da sua parte, dificuldades de gestão adequada dos recursos económicos do agregado e situações de confrontação com os restantes elementos do agregado familiar restrito.

  13. Separou-se em 2011, posteriormente ao que foi decretado o seu divórcio, desde aquela altura vivendo em união de facto, mantendo uma relação aparentemente estável e gratificante com a sua atual companheira; no contexto social apresenta conduta ajustada e bem inserida, não lhe sendo atribuídos comportamentos anómalos.

*Foram considerados não provados os seguintes factos: [transcrição]...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT