Acórdão nº 16391/15.6T9PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelPEDRO VAZ PATO
Data da Resolução19 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 16391/15.6T9PRT.P1 Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto I – O assistente J… veio interpor recurso do douto despacho da 1ª Secção de Instrução Criminal (J5) da Instância Central do Porto do Tribunal da Comarca do Porto que não pronunciou o arguido B… pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181.º do Código Penal, e de um crime de difamação, p. e p. pelo artigo 180.º do mesmo Código, que a este eram imputados na acusação particular por ele deduzida.

São as seguintes as conclusões da motivação do recurso: «1. O presente recurso vem interposto da decisão do Tribunal de Instrução Criminal do Porto de não pronúncia do Arguido B…, 2. Com fundamento de não reunirem os autos elementos que sustentem a sujeição do Arguido a julgamento, por não resultar existir probabilidade séria e razoável de lhe vir a ser aplicada uma pena pelo cometimento dos crimes de injúrias e difamação porquanto, 3. As expressões que resultam da mensagem electrónica dos autos, de 21 de Maio de 2015, “… situam-se no terreno da crítica por parte do arguido e no uso do princípio da liberdade de expressão, donde estar excluída a ilicitude, se não ao abrigo do disposto no art. 180º, n.º 2 do Cód. Penal, ao abrigo do disposto no art. 31º, n.º 2 do mesmo diploma legal”, 4. “… não se revelando como absolutamente gratuitas, desproporcionadas, nem ultrapassando manifestamente a necessidade própria do exercício do seu direito de crítica e de liberdade de expressão, não podem deixar de se enquadrar na esfera da atipicidade ou como enquadrando situação de exclusão de ilicitude ou de causa de não punibilidade, não se verificando os elementos constitutivos dos crimes de que vem acusado”, 5. Não podendo ao Arguido “… ser assacada a intenção de denegrir a imagem, o bom nome a reputação do Assistente”.

6. O Meritíssimo Juiz a quo não analisou, conveniente e correctamente, toda a prova carreada para e produzida nos autos, documental e testemunhal, 7. Desde logo, ao considerar, somente, a parte da mensagem que se encontra evidenciada a negrito, não a entendendo nos seus contexto, amplitude e totalidade.

8. Daquela prova, resultam elementos bastantes para justificar a submissão do Arguido a julgamento, por demonstrarem uma probabilidade séria de lhe vir a ser aplicada uma pena, por haver cometido estes crimes, 9. Pelo que deveria ter sido proferido despacho de pronúncia, nos termos do art. 308º C. P. P..

10. A fase da instrução visa formar a convicção de que existe probabilidade razoável de o Arguido haver cometido os crimes que lhe são imputados e, consequentemente, lhe ser aplicada uma pena, convicção que se baseia em indícios bastantes e sinais de ocorrência de um crime.

11. Refere o art. 181º do Código Penal (C. P.) que “quem injuriar outra pessoa, imputando-lhe factos, mesmo sob a forma de suspeita, ou dirigindo-lhe palavras, ofensivas da sua honra e consideração, é punido com pena de prisão até 3 meses ou com pena de muta até 120 dias” e 12. O art. 180º C. P. menciona que “quem, dirigindo-se a terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivo da sua honra e consideração, ou reproduzir uma tal imputação em juízo, é punido com pena de prisão ate seis meses ou com pena de multa até 240 dias”.

13. Na sua acusação particular, que foi acompanhada pelo Ministério Público, o Recorrente demonstrou encontrarem-se preenchidos os elementos constitutivos destes crimes e que os mesmos haviam sido praticados pelo Arguido.

14. A mensagem electrónica dos autos, de 21 de Maio de 2015, foi enviada a sete voluntários do C…, todos membros da Direcção e do Conselho Fiscal, entre os quais o Assistente, órgãos do C…, compostos por pessoas que, de alguma forma, se evidenciaram, e evidenciam, no exercício e desenvolvimento das respectivas actividades profissionais, 15. Razão pela qual, geral e maioritariamente, são convidadas para a prática dessas funções junto daquela Instituição de Solidariedade Social, por se entender que os seus saber, experiência, personalidade e competência profissional constituem uma mais-valia para o desenvolvimento do fim último desta entidade.

16. É neste contexto que a mensagem dos autos deve ser inserida, analisada, circunstanciada.

17. A douta decisão ora sob recurso refere que “… o carácter injurioso de determinada palavra ou acto é fortemente dependente do lugar, do ambiente em que ocorre, das pessoas entre quem ocorre e do modo como ocorre …”, devendo ser tidas em conta “… as condições ambientais, a classe social do ofendido e do seu agressor … os hábitos de linguagem, a formação moral, etc”.

18. As palavras proferidas pelo Arguido contêm, em si mesmas, a formulação de um juízo de desvalor acerca da pessoa e conduta, no âmbito da sua presença no C…, do Ofendido / Assistente.

19. O Arguido lança a suspeita sobre o Ofendido / Assistente de querer colocar em causa o Presidente da Direcção do C… e desvirtuar os princípios que regem a actividade desta Instituição, a favor de determinada funcionária, para além de lhe imputar a prossecução de interesses próprios ou de terceiro, em detrimento dos do C…, através da disseminação de intrigas e maldizeres, 20. Considerações, por parte do Arguido ao Ofendido / Assistente, que comportam, em si mesmas, um juízo de desvalor quanto à pessoa deste, por haverem sido proferidas no âmbito do desenvolvimento de actividade de solidariedade social 21. Que, por definição, se identifica com valores de caridade, altruísmo, generosidade, benevolência, auxílio e respeito pelo próximo.

22. Valores que, de acordo com a imputação que o Arguido formula, o Ofendido / Assistente afasta, contraria e depõe, 23. O que, por não corresponder, de todo, à realidade, conforme, aliás, suportado pelas testemunhas produzidas, só poderá ser entendido como atentatório e ofensivo da honra e consideração do Ofendido / Assistente.

24. Quando se trata de imputar a um agente uma determinada violação ilícita, é necessário que essa actuação haja sido dolosa, 25. Bastando que, no caso das injúrias e difamação, arts. 180º e 181º C. P., se verifique o dolo genérico, ou seja, consciência, por parte do agente, de que a sua conduta é de molde a produzir a ofensa e consideração de alguém.

26. Sendo o Arguido Advogado, assume um papel de interveniente na Justiça, conhecendo as suas especificidades e procedimentos, tem sensibilidade e conhecimentos mais presentes e evidenciados dos que os de um homem médio, não sendo crível, por isso, que o Arguido não tivesse essas consciência e finalidade, 27. Porque poderia, e deveria, o Arguido ter agido de outro modo, 28. Não podendo considerar-se, assim, o preenchimento cumulativo dos pressupostos do n.º 2 do art. 180º C. P. e excluir-se a ilicitude do comportamento do Arguido.

29. Não colhe o argumento do confronto entre direitos fundamentais constitucionalmente garantidos, inviolabilidade da integridade moral e física das pessoas, reconhecimento ao bom nome e reputação e liberdade de expressão, que, quando em confronto, deverão sofrer limitações, no sentido de se respeitar o núcleo essencial de cada um.

30. A mensagem electrónica que o Arguido dirigiu a membros da Direcção e Conselho Fiscal do C…, formula um juízo de desvalor, directamente contra a pessoa do Ofendido / Assistente, imputando-lhe, inveridicamente, comportamentos e atitudes destituídas de quaisquer valores dignos e com os quais este não se identifica ou pratica, 31. Visando, dessa forma, denegrir a sua imagem, consideração e reputação perante os restantes membros daqueles órgãos sociais do C…, 32. Nunca podendo, considerando a contextualização descrita, ser o juízo de desvalor proferido pelo Arguido considerado como críticas vertidas sobre a prestação ou contributo, para o C…, do Ofendido / Assistente mas, antes, como agressão, directa e pessoal a este, 33. Pelo que não se poderá considerar, com essa finalidade, o uso, pelo Arguido, do princípio da liberdade de expressão, como pressuposto para preterir os direitos da inviolabilidade da integridade moral e física das pessoas e o do reconhecimento ao bom nome e reputação.

34. Resulta clara a existência de indícios bastantes e de sinais de ocorrência de crime, de modo a formar a convicção de que existe probabilidade razoável de o Arguido haver cometido os crimes de injúrias e difamação, 35. O que, aliás, também resulta do facto de o Ministério Público haver acompanhado a acusação particular do Ofendido / Assistente e haver pugnado pelo proferimento de, em fase de instrução, despacho de pronúncia, 36. Pelo que deve a decisão ora sob recurso ser revogada, proferindo-se despacho de pronúncia, 37. Sob pena de, assim não sucedendo, existir inconstitucionalidade, por violação de direitos fundamentais plasmados na Constituição da República Portuguesa (C. R. P.), arts. 25º e 26º, no sentido de haverem sido preteridos, ilicitamente, por outro, o da liberdade de expressão, 38. Por os juízos proferidos serem de desvalor e constituírem agressão, directa e pessoal, ao Ofendido / Assistente.

Foram violados: Arts. 180º e 181º C. P.; Arts. 308º e 283º, n.º 2 C. P. P.; Arts. 25º e 26º C. R. P.;» O arguido apresentou resposta a tal motivação, pugnando pelo não provimento do recurso.

O Ministério Público junto do Tribunal de primeira instância apresentou resposta a tal motivação, pugnando pelo não provimento do recurso.

O Ministério Público junto desta instância emitiu douto parecer, reiterando a posição assumida pelo Ministério Público junto do Tribunal de primeira instância Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir.

II – A questão que importa decidir é, de acordo com as conclusões da motivação do recurso, a de saber se se verificam, ou não, indícios suficientes da prática, pelo arguido, dos crimes de injúria e difamação que lhe foram impuados na acusação particular contra ele deduzida peloa assistente e recorrente.

III- Da fundamentação do douto despacho...

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